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Manejo de risco na gestão do cuidado especializado a pessoas vivendo com aids* * Extraído da tese "Coordenação do cuidado às pessoas vivendo com HIV/aids: desafios no contexto da assistência ambulatorial especializada", Universidade Federal da Paraíba, 2015.

Resumo

OBJETIVO

Analisar a oferta de ações relacionadas ao manejo de risco clínico na gestão do cuidado especializado a pessoas vivendo com aids.

MÉTODO

Estudo transversal realizado em ambulatório de referência na Paraíba, com amostra de 150 adultos com aids. Os dados foram coletados por meio de fontes primárias e secundárias utilizando-se de formulário estruturado, e analisados através de estatística descritiva, análise de correspondência múltipla e modelo de regressão logística para averiguar a associação entre "oferta" e "risco clínico".

RESULTADOS

As ações de oferta satisfatória expressam foco biologicista do cuidado; as dimensões que mais contribuíram para o julgamento satisfatório da oferta foram "avaliação clínica e laboratorial" e "prevenção e estímulo ao autocuidado"; 45,3% dos participantes foram categorizados em risco clínico alto, 34% em risco clínico médio, e 20,7% em risco clínico baixo; e verificou-se associação positiva entre oferta e risco clínico.

CONCLUSÃO

Ficou evidente a necessidade da utilização de tecnologias de classificação de risco para direcionar o planejamento da oferta local, considerando-se as necessidades, e assim qualificar o cuidado produzido nestes espaços.

Descritores
Síndrome de Imunodeficiência Adquirida; Assistência Ambulatorial; Doença Crônica; Fatores de Risco; Prevenção Secundária; Enfermagem em Saúde Pública

Abstract

OBJECTIVE

Analyzing the provision of actions related to managing clinical risk in managing specialized care for people living with AIDS.

METHOD

A cross-sectional study carried out in a reference outpatient clinic in Paraíba, with a sample of 150 adults with AIDS. Data were collected through primary and secondary sources using a structured questionnaire, analyzed using descriptive statistics, multiple correspondence analysis and logistic regression model to determine the association between "providing care" and "clinical risk."

RESULTS

Actions with satisfactory provision express a biological care focus; the dimensions that most contributed to a satisfactory assessment of care provision were "clinical and laboratory evaluations" and "prevention and self-care incentivization"; 45.3% of participants were categorized into high clinical risk, 34% into average clinical risk, and 20.7% into low clinical risk; a positive association between providing care and clinical risk was found.

CONCLUSION

The need to use risk classification technologies to direct the planning of local care provision became evident considering its requirements, and thus qualifying the care provided in these areas.

Descriptors
Acquired Immunodeficiency Syndrome; Ambulatory Care; Chronic Disease; Risk Factors; Secondary Prevention; Public Health Nursing

Resumen

OBJETIVO

Analizar la oferta de acciones relacionadas con el manejo de riesgo clínico en la gestión del cuidado especializado a personas viviendo con SIDA.

MÉTODO

Estudio transversal realizado en ambulatorio de referencia en el Estado de Paraíba, con muestra de 150 adultos con SIDA. Los datos fueron recolectados por medio de fuentes primarias y secundarias utilizándose formulario estructurado y analizados mediante estadística descriptiva, análisis de correspondencia múltiple y modelo de regresión logística para averiguar la asociación entre "oferta" y "riesgo clínico".

RESULTADOS

Las acciones de oferta satisfactoria expresan enfoque biologicista del cuidado; las dimensiones que más contribuyeron al juicio satisfactorio de la oferta fueron "evaluación clínica y de laboratorio" y "prevención y estímulo al autocuidado"; el 45,3% de los participantes fueron categorizados en riesgo clínico alto, el 34% en riesgo clínico medio y el 20,7% en riesgo clínico bajo; y se verificó asociación positiva entre oferta y riesgo clínico.

CONCLUSIÓN

Resultó evidente la necesidad de la utilización de tecnologías de clasificación de riesgo para dirigir la planificación de la oferta local, considerándose las necesidades, y así calificar el cuidado producido en esos espacios.

Descriptores
Síndrome de Inmunodeficiência Adquirida; Atención Ambulatoria; Enfermedad Crónica; Factores de Riesgo; Prevención Secundaria; Enfermería en Salud Pública

Introdução

A aids, em virtude de suas características biológicas específicas e das repercussões biopsicossociais inerentes à convivência com a infecção/adoecimento/tratamento, gera várias demandas de atenção à saúde cujas resoluções demandam cuidados multiprofissionais em diferentes serviços da rede. Estas demandas de cuidados requerem o planejamento das ações com base em modelos de atenção responsivos a sua cronicidade11 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: OPAS; 2011.-22 Figueiredo LA, Lopes LM, Magnabosco GT, Andrade RLP, Faria MF, Goulart VC, et al. Provision of health care actions and services for the management of HIV/Aids from the users perspective. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(6):1024-31. .

Após a instituição da Terapia Antirretroviral (TARV), as evidências mundiais da alteração dos padrões de morbimortalidade associados ao agravo deram destaque a algumas comorbidades com potencial capacidade de gerar prejuízos para a sobrevida das pessoas em tratamento33 Granich R, Gupta S, Hersh B, Williams B, Montaner J, Young B, et al. Trends in AIDS deaths, new infections and ART coverage in the top 30 countries with the highest AIDS mortality burden: 1990-2013. PloS One [Internet]. 2015 [cited 2016 Apr 28];10(7):e0131353. Available from: Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4493077/
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles...

4 Nunes AA, Caliani LS, Nunes MS, Silva AS, Mello LM. Profile analysis of patients with HIV/AIDS hospitalized after the introduction of antiretroviral therapy. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [cited 2016 Apr 29];20(10):3191-8. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/en_1413-8123-csc-20-10-3191.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/en_1...
-55 Domingues C-SB, Waldman EA. Causes of death among people living with AIDS in the pre-and post-HAART eras in the city of São Paulo, Brazil. PloS One [Internet]. 2014 [cited 2016 Apr 27];9(12):e114661. Available from: Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4263674/
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles...
. Além disso, embora não se conheça com exatidão os mecanismos subjacentes, admite-se o potencial patogênico do HIV para o aumento do risco de doenças não associadas ao imunocomprometimento66 Freiberg MS, Bebu I, Tracy R, So-Armah K, Okulicz J, Ganesan A, et al. D-Dimer levels before HIV seroconversion remain elevated even after viral suppression and are associated with an increased risk of non-AIDS events. PLoS One [Internet]. 2016 [cited 2016 Apr 28];11(4):e0152588. Available from: Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4835105/
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles...
. Estes aspectos corroboram a relevância da abordagem preventiva de desfechos clínicos indesejáveis na atenção às pessoas infectadas e em tratamento específico, para que haja manejo adequado da infecção com vistas à melhoria da condição de saúde e qualidade de vida, e redução da mortalidade associadas ao HIV/aids77 Righetto RC, Reis RK, Reinato LAF, Gir E. Comorbidities and co-infections in people living with HIV/AIDS. Rev Rene. 2014;15(6):942-8. .

Além dos fenômenos descritos, as metas mundialmente estabelecidas na direção do controle da infecção nas próximas duas décadas88 Joint United Nations Program on HIV/AIDS (UNAIDS). Global report: UNAIDS report on the Global AIDS epidemic 2013 [Internet]. Geneva: UNAIDS; 2013 [cited 2015 May 18]. Available from: Available from: http://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/UNAIDS_Global_Report_2013_en_1.pdf
http://www.unaids.org/sites/default/file...
) exigem esforços no campo da gestão do cuidado para além da terapêutica medicamentosa. No contexto da atenção especializada, é necessário ações voltadas à identificação e intervenção sobre vulnerabilidades a condições que resultem em instabilidade clínica e agudizações, provenientes da patogênese viral e dos efeitos tóxicos medicamentosos, com potenciais para comprometer a condição clínica das pessoas em tratamento99 Boulware DR, Hullsiek KH, Puronen CE, Rupert A, Baker JV, French MA, et al. Higher levels of CRP, D-dimer, IL-6, and hyaluronic acid before initiation of Antiretroviral Therapy (ART) are associated with increased risk of AIDS or death. J Infect Dis [Internet]. 2011 [cited 2015 May 20];203(11):1637-46. Available from: Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3096784/
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles...
.

Assim sendo, é notório que no rol das ações para o manejo da infecção, a investigação da severidade do HIV/aids deve considerar não apenas a complexidade clínica da doença em si e sua repercussão para a qualidade de vida da pessoa, mas os riscos da ocorrência de eventos que possam induzir agudizações11 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: OPAS; 2011.. Estes riscos são considerados no presente estudo como "riscos clínicos", com potencial para influenciar no planejamento da oferta de ações e na mobilização de recursos e tecnologias mais eficazes.

A lógica de gestão de cuidados1010 Cecilio LCO. Apontamentos teórico-conceituais sobre processos avaliativos considerando as múltiplas dimensões da gestão do cuidado em saúde. Interface. 2011;15(37):589-99. baseada na estratificação de risco permite dimensionar ordenadamente as ações e os recursos (clínicos, humanos, financeiros) segundo padrões singulares e diferenciados. Deste modo, em condições crônicas de menor risco, seriam empregadas tecnologias de autocuidado apoiado, tendo como foco os serviços de atenção básica, enquanto condições de risco mais elevado exigiriam maior concentração de cuidados da atenção especializada11 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: OPAS; 2011..

Dentre os fatores programáticos associados à gestão do risco de eventos mórbidos destaca-se o acesso às informações, aos recursos e tecnologias de prevenção/diagnóstico precoce/tratamento de infecções oportunistas; acesso aos exames e medicamentos antirretrovirais (ARV); abordagem das repercussões biopsicossociais do diagnóstico/adoecimento/tratamento; e o fortalecimento da rede de apoio social visando melhor qualidade de vida para as pessoas em acompanhamento22 Figueiredo LA, Lopes LM, Magnabosco GT, Andrade RLP, Faria MF, Goulart VC, et al. Provision of health care actions and services for the management of HIV/Aids from the users perspective. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(6):1024-31. ,1111 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em adultos. Brasília: MS; 2013..

Portanto, objetivou-se analisar a oferta de ações relacionadas ao manejo de risco clínico na gestão do cuidado especializado a pessoas vivendo com aids.

O estudo justifica-se pela relevância dos cuidados ofertados nos Serviços de Assistência Especializada (SAEs) para a identificação e intervenção oportuna sobre o risco de desfechos clínicos indesejados (risco clínico), com potencial para comprometer a qualidade de vida das pessoas infectadas e em uso de TARV. Ancora-se ainda no potencial da classificação de risco como elemento organizativo da atenção à saúde e norteador da gestão do cuidado11 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: OPAS; 2011..

Método

Estudo transversal, tipo inquérito, desenvolvido de julho de 2011 a julho de 2012 em ambulatório especializado no atendimento de pessoas vivendo com HIV/aids (PVHA ‒ SAE), integrado a uma unidade de referência na Paraíba para o tratamento de doenças Infecciosas e Parasitárias, localizada em João Pessoa. A referida unidade dispõe de estrutura para atendimento ambulatorial e leitos de internamento em clínica e unidade de terapia intensiva.

A população do estudo foi constituída por 1.260 pessoas, notificadas entre 1980 e 2011 no Sistema de Informação de Agravos de Notificação, maiores de 18 anos, residentes no estado. Utilizando-se de cálculo amostral para populações finitas, nível de significância de 5%, erro amostral (d) de 0,08, nível de confiança de 95%, P igual a 0,50, expressão n = Z2.p.q.N/d2(N - 1) + Z2.p.q, e correção para uma perda potencial de 10%, determinou-se o tamanho da amostra como sendo de 150 usuários do SAE.

Elegeu-se como critério de inclusão na amostra o uso da TARV por mais de 6 meses, e como critérios de exclusão, ter idade inferior a 18 anos, estar na condição de gestante e em situação de privação de liberdade, em virtude das especificidades inerentes ao manejo clínico destas populações e organização da rede de atenção local.

Para garantir que participassem do estudo pessoas usuárias do serviço, evitando assim viés de informação, utilizou-se de amostragem por acessibilidade, com o recrutamento dos participantes durante as consultas de rotina no ambulatório. Após os esclarecimentos sobre a pesquisa e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, deu-se início à coleta dos dados, primeiramente através de entrevista estruturada e posterior consulta aos prontuários para obtenção de dados clínicos.

Com vistas ao alcance dos objetivos propostos pelo estudo, o formulário estruturado contemplou variáveis sociodemográficas e clínicas (contagem de linfócitos T-CD4 positivos/CD8 positivos e quantificação de carga viral), com possibilidades de respostas dicotômicas ou múltiplas com resposta única; e variáveis de avaliação da oferta, amparadas conceitualmente na dimensão elenco de serviços1212 Starfield B. Atenção primária: equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília: Ministério da Saúde; 2002. . Para estas últimas havia possibilidades de respostas intervalar do tipo likert, com valores entre 1 e 5, representando ascendentemente a condição de concordância com as afirmações.

O instrumento foi utilizado preliminarmente em estudo piloto com 10 participantes, submetido à validação de conteúdo pelo grupo de Estudos Operacionais em HIV/aids da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, e à análise de fidedignidade através do coeficiente Alfa de Cronbach (= 0,789), cujo valor permitiu afirmar sua consistência interna. Verificou-se ainda que a remoção de cada item que compôs o instrumento não alterou fortemente o valor desta medida, mostrando um equilíbrio da participação de cada variável na sua estruturação.

Para a classificação de risco clínico, inicialmente foram atribuídos os indicadores 1, 2 e 3 aos valores de linfócitos T-CD4+/CD8 (LT-CD4+/CD8), carga viral (CV), quantidade de doenças oportunistas, quantidade de doenças crônicas e quantidade de manifestações clínicas. A atribuição destes indicadores considerou os respectivos parâmetros laboratoriais e clínicos preditivos de prognóstico, resposta à TARV, magnitude para principais condições oportunistas e complicações clínicas1111 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em adultos. Brasília: MS; 2013.. Aos parâmetros positivos conferiu-se o valor mais baixo (1) e aos negativos, o mais alto (3). Em seguida, calculou-se a variável risco categorizado (somatório dos indicadores das cinco variáveis), cujos valores situaram-se numa escala de 5 a 14, considerando-se risco baixo = 5, risco médio = 6 e risco alto > 6.

Os dados foram analisados através do Software Statistica 9.0 da Statsoft, adotando-se níveis de confiança de 5% para todos os procedimentos. Para fins de caracterização sociodemográfica dos participantes, utilizou-se de estatística descritiva com a apresentação de medida de frequência.

Para a análise da oferta considerou-se a satisfação dos participantes em relação a cada variável, a qual foi expressa numa escala de 1 a 5, sendo verificados os valores medianos de satisfação. Em seguida, estas variáveis foram categorizadas em cinco dimensões segundo as similaridades dos seus conteúdos. Para o conjunto de variáveis de cada dimensão determinou-se o escore soma às respostas de todos os participantes, dando origem ao escore bruto de satisfação, os quais foram transformados em percentuais (escala de 0 a 100) através da equação: escore % = (escore - mínimo escore) x 100 / (máximo escore - mínimo escore), utilizada para dirimir possíveis vieses oriundos das diferenças na composição das variáveis de cada dimensão. Em seguida, calculou-se a média dos percentuais de satisfação dos usuários, respectivos desvios-padrão e intervalos de confiança a 95%.

Para explicar a influência das dimensões da oferta (variáveis independentes) sobre a determinação dos escores da oferta (variável dependente dicotomizada), utilizou-se de regressão logística, na qual o teste geral para nulidade dos parâmetros apresentou valor-p (< 0,05) desejável para sua aplicação e R2 de Nagelkerke (= 0,98) bastante próximo de 1. O teste Hosmer-Lemeshow (valor-p > 0,05) aceitou a hipótese de adequação dos dados ao modelo, o qual atingiu na matriz de classificação 99,9% de acerto.

Utilizou-se ainda da análise de correspondência para explicar a associação entre os escores de oferta (variável independente) e risco clínico categorizado (variável dependente), a qual apresentou na dimensão 1 maior poder explicativo (apresentou 92,1% da inércia total, que foi de 100%).

Trata-se de recorte de uma pesquisa aprovada em outubro de 2010 pelo Comitê de Ética da Universidade Federal da Paraíba - UFPB, sob o protocolo nº 612/10.

Resultados

O perfil sociodemográfico dos participantes mostrou predominância do sexo masculino (58,0%), faixa etária de 40 a 59 anos (48,7%), cor parda (58,7%), solteiros (54,7%), heterossexuais (68,5%), escolaridade de ensino fundamental (53,3%), aposentados e pensionistas (42,0%), residentes em domicílio próprio (62,0%).

No que se refere à classificação de risco clínico, 45,3% (68) dos usuários foram incluídos na categoria de risco alto (risco > 6); 34% (68) na categoria de risco médio (risco = 6); e 20,7% (31) na categoria de risco baixo (risco = 5).

Para análise da oferta de ações relacionadas ao manejo do risco, categorizaram-se as variáveis em cinco dimensões segundo valores medianos da escala de satisfação (Tabela 1).

Tabela 1
‒ Dimensões da oferta segundo a categorização das variáveis - Paraíba, Brasil, 2012.

Na dimensão Prevenção e estímulo ao autocuidado, destacaram-se com avaliação satisfatória (mediana = 5) a oferta de preservativos e indicadores correspondentes às orientações de promoção da saúde. Por outro lado, a oferta de vacinas e de orientações sobre planejamento familiar (nas situações em que se aplicavam) foram negativamente avaliadas.

Na dimensão Avaliação clínica e laboratorial, a oferta foi satisfatória para as variáveis atendimento médico, de enfermagem, ginecológico e exames laboratoriais. As variáveis relacionadas à oferta de visitas domiciliares, avaliação dermatológica, função auditiva, atendimento odontológico e de intercorrências foram avaliadas como regulares ou insatisfatórias.

Todas as variáveis da dimensão Diagnóstico de coinfecção TB/HIV foram avaliadas como insatisfatórias (mediana = 1) ou regulares (mediana = 2), enquanto na dimensão Apoio psicossocial apenas a oferta de apoio psicológico foi avaliada como satisfatória (mediana = 5).

Na dimensão Tratamento, atribuiu-se avaliação insatisfatória à oferta de medicamentos, tanto para evitar/diminuir efeitos colaterais da TARV quanto para evitar doenças oportunistas (mediana = 1). Destaca-se que 16,0% (24) dos usuários admitiram sentir a necessidade de medicamentos para os efeitos colaterais, mas alegaram que nunca foram ofertados.

Quanto aos valores médios dos percentuais de satisfação dos usuários segundo as dimensões da oferta (Tabela 2), verificou-se que em uma escala de 0 a 100 nenhuma das dimensões alcançou satisfação média percentual de 70%, e que a dimensão apoio psicossocial foi a de menor satisfação média.

Tabela 2
‒ Valor médio dos percentuais, desvio-padrão e intervalo de confiança da satisfação dos usuários sobre as dimensões da oferta - Paraíba, Brasil, 2012.

Os coeficientes produzidos por regressão logística e utilizados para expressar a contribuição das dimensões na determinação dos escores da oferta apresentaram valores numéricos que, apesar de não terem significância estatística, sugeriram que as dimensões que mais contribuíram para a oferta satisfatória foram a avaliação clínica e laboratorial (coeficiente = 10,600) e a prevenção e estímulo ao autocuidado (coeficiente = 8,919). Por outro lado, as dimensões que mais contribuíram para a avaliação insatisfatória da oferta foram o tratamento (coeficiente = 2,528), apoio psicossocial (coeficiente = 2,825) e diagnóstico de coinfecção TB/HIV (coeficiente = 2,910).

No mapa de associação (Figura 1), produzido por análise de correspondência múltipla, observou-se, tendo como referência a dimensão 1 (92,1% da inércia total), que pela proximidade que se encontram, os níveis Oferta Insatisfatória e Risco Alto estão associados, assim como os níveis Oferta Satisfatória e Risco Baixo. De forma análoga, associados estão também os níveis Oferta Regular e Risco Médio. De modo complementar, a medida de associação d de Somers acusa valor negativo (-0,062), reforçando o entendimento de que Oferta e Risco estão na direção contrária.

Figura 1
‒ Diagrama das associações entre risco e oferta de ações - Paraíba, Brasil, 2012.

Discussão

Considerando-se que 45,3% e 34% dos participantes foram respectivamente classificados como de risco clínico alto e médio, a satisfação dos usuários perante a oferta de ações da dimensão avaliação clínica e laboratorial (54,29%) indica a necessidade de ampliar a capacidade do serviço para além dos cuidados médicos, de enfermagem e laboratoriais.

Não se desconsidera a importância do monitoramento da situação imunológica, bem como das consultas médicas e de enfermagem, como intervenções estratégicas norteadoras de condutas subsequentes. Sabe-se que o acompanhamento clínico possibilita a identificação e manejo oportuno das necessidades singulares dos usuários, assim como a contagem de LT-CD4+/CD8 e CV possibilita a detecção de casos mais propensos a manifestações de sintomas da doença, a infecções oportunistas e ao uso de maior número de medicamentos1313 Mermin J, Ekwaru JP, Were W, Degerman R, Bunnell R, Kaharuza F, et al. Utility of routine viral load, CD4 cell count, and clinical monitoring among adults with HIV receiving antiretroviral therapy in Uganda: randomised trial. BMJ [Internet]. 2011[cited 2015 Dec 27];343:d6792. Available from: Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3213241/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
-1414 Geocze L, Mucci S, De Marco MA, Nogueira-Martins LA, Citero VA. Quality of life and adherence to HAART in HIV-infected patients. Rev Saúde Pública [Internet]. 2010 [cited 2015 Feb 05];44(4):743-9. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v44n4/en_19.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rsp/v44n4/en_19...
. Os resultados em foco justificam, porém, a necessidade de uma abordagem transdisciplinar para o manejo do risco de agudizações e outros eventos capazes de levar à morte.

A classificação de risco observada nos escores mais elevados (escala ≥ 6) e respectivas variáveis componentes mostram que esses casos necessitam de maior atenção. Sabe-se que as competências da equipe mínima exigida para o SAE, as fragilidades na oferta de visita domiciliar e de avaliação/acompanhamento da saúde do parceiro/familiar impetram investimentos na extensão das ações para os contextos familiares. Melhorias do serviço incluem o desenvolvimento de uma clínica que reconheça o indivíduo e sua família como um sistema, buscando neste núcleo o suporte social necessário para melhor compreensão da situação de saúde da pessoa, e consequente redução nos efeitos deletérios da doença1515 Bekele T, Rourke SB, Tucker R, Greene S, Sobota M, Koornstra J, et al. Direct and indirect effects of perceived social support on health-related quality of life in persons living with HIV/AIDS. AIDS Care. 2013;25(3):337-46. .

Outra fragilidade do serviço nessa dimensão envolveu a capacidade de resposta a agudizações já instaladas, observada a partir da satisfação regular sobre a oferta de atendimento de intercorrências, uma importante lacuna no sentido de minimizar desfechos desfavoráveis relacionados à infecção, a doenças associadas e aos efeitos colaterais da TARV1616 Lopes LM, Magnabosco GT, Andrade RLDP, Ponce MAZ, Wysocki AD, Ravanholi GM, et al. Coordenação da assistência prestada às pessoas que vivem com HIV/AIDS em um município do Estado de São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública. 2014;30(11):2283-97. . Ressalta-se que infecções oportunistas são reconhecidas nos cenários internacional e nacional, em proporções distintas, como causas de internamento e óbito de pessoas com HIV/aids, mesmo após a instituição da TARV44 Nunes AA, Caliani LS, Nunes MS, Silva AS, Mello LM. Profile analysis of patients with HIV/AIDS hospitalized after the introduction of antiretroviral therapy. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [cited 2016 Apr 29];20(10):3191-8. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/en_1413-8123-csc-20-10-3191.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/en_1...
,77 Righetto RC, Reis RK, Reinato LAF, Gir E. Comorbidities and co-infections in people living with HIV/AIDS. Rev Rene. 2014;15(6):942-8. .

Considerando-se que o status de infectado pelo HIV gera para o indivíduo algumas responsabilidades no cuidado com a saúde, a construção de habilidades para a autoproteção é fundamental para mudanças da rotina de vida (envolvendo prática sexual, alimentação e atividade física). Também se faz necessário maior politização e socialização das pessoas, em virtude das adversidades físicas e repercussões psicossociais da infecção e do adoecimento1717 Lima ICV, Galvão MTG, Paiva SS, Brito DMS. Ações de promoção da saúde em serviço de assistência ambulatorial especializada em HIV/Aids. Ciênc Cuid Saúde [Internet]. 2011 [citado 2015 mar. 20];10(3):556-63. Disponível em: Disponível em: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/CiencCuidSaude/article/view/13193/pdf
http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/C...
-1818 Caixeta CRCB, Morraye M, Villela WV, Rocha SMM. Social support for people living with AIDS [abstract]. J Nurs UFPE On Line [Internet]. 2011[cited 2015 Apr 2];5(8):1920-30. Available from: Available from: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/viewArticle/1866
http://www.revista.ufpe.br/revistaenferm...
.

Neste contexto, a dimensão prevenção e estímulo ao autocuidado foi bem avaliada por parte dos usuários (69,57%), sinalizando a oferta de insumos e de orientações fundamentais para o empoderamento dos usuários na adoção de práticas de vida mais saudáveis, prevenindo complicações associadas ao imunocomprometimento e à terapêutica. A oferta satisfatória de preservativos, insumos importantes na prevenção de complicações decorrentes do contato sexual desprotegido, estimula o exercício da sexualidade de modo responsável e seguro, além de prevenir a infecção de parceiros soronegativos, transmissão vertical, e exposição a outras doenças sexualmente transmissíveis1919 Reis RK, Santos CBD, Dantas RAS, Gir E. Qualidade de vida, aspectos sociodemográficos e de sexualidade de pessoas vivendo com HIV/AIDS. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2011[citado 2015 mar. 20];20(3):365-575. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/19.pdf
http://www.scielo.br/pdf/tce/v20n3/19.pd...
-2020 Sun W, Wu M, Qu P, Lu S, Wang L. Quality of life of people living with HIV/AIDS under the new epidemic characteristics in China and the associated factors. PLoS One [Internet]. 2013 [cited 2015 Sep 12];8(5):e64562. Available from: Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3669301/
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles...
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Na medida em que intervêm orientando os usuários para as mudanças de comportamentos em relação às suas condições de saúde, os profissionais do serviço, além de desempenhar seu papel educativo, estimulam a postura proativa sobre a gestão da saúde, comportamento fundamental no manejo de condições crônicas11 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: OPAS; 2011..

Entretanto, observou-se uma assimetria entre as orientações acerca de vacinas e a oferta insatisfatória deste importante insumo de prevenção de infecções oportunistas, tendo em vista a existência de esquemas especiais que atendem às especificidades desta população no que se refere à imunogenicidade e aos riscos da utilização de agentes vivos atenuados1111 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em adultos. Brasília: MS; 2013..

Destaca-se que as dimensões que mais contribuíram para a avaliação insatisfatória da oferta foram: Tratamento, Apoio Psicossocial e Diagnóstico de coinfecção TB/HIV. Embora a oferta de medicamentos ARV tenha sido avaliada satisfatoriamente, a complexidade do tratamento (tempo prolongado, número de doses e drogas, mudanças no estilo de vida e efeitos colaterais) contrapõe-se aos benefícios em diversas proporções, criando desafios à adesão terapêutica que demandam uma atuação colaborativa entre usuários e equipe para seu enfrentamento nos microespaços de provisão do cuidado. Assim sendo, é necessária a implementação de modelos de atenção dirigidos à pessoa e que subsidiem a corresponsabilização destas sobre a produção de melhorias na sua saúde11 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: OPAS; 2011..

Nessa direção, é oportuna não apenas a oferta de orientações adequadas, mas o acompanhamento e o controle dos efeitos colaterais para prevenir falhas na adesão capazes de redundar em complicações clínicas. Portanto, a avaliação negativa sobre a oferta de medicamentos para evitar/diminuir estes efeitos, cuja necessidade foi observada em 16% dos participantes, representa uma importante lacuna na abordagem preventiva dos entraves de adesão à TARV. Ainda, a avaliação insatisfatória da oferta de medicamentos para evitar doenças oportunistas reafirma a fragilidade da assistência na dimensão tratamento, considerando-se que a ocorrência destas doenças impacta sobre a morbimortalidade e gera prejuízos à qualidade de vida das PVHA2121 Brum JWA, Conceição AS, Gonçalves FVC, Maximiano LHS, Diniz LBMPV, Pereira MN, et al. Parasitoses oportunistas em pacientes com o vírus da imunodeficiência humana. Rev Bras Clin Med [Internet]. 2013 [citado 2015 mar. 20];11(3):280-8. Disponível em: Disponível em: http://files.bvs.br/upload/S/1679-1010/2013/v11n3/a3755.pdf
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A cronicidade da aids e a diversidade de suas repercussões demandam uma assistência profissional que valorize o acompanhamento dos aspectos psicossociais para que os serviços atendam integralmente às demandas de cuidado1515 Bekele T, Rourke SB, Tucker R, Greene S, Sobota M, Koornstra J, et al. Direct and indirect effects of perceived social support on health-related quality of life in persons living with HIV/AIDS. AIDS Care. 2013;25(3):337-46. . Entretanto, apenas a oferta de apoio psicológico foi avaliada positivamente na dimensão apoio psicossocial. Tal fato sinaliza um importante recurso de cuidado, visto que a condição sorológica e o tratamento remetem a problemas psicológicos de gravidades variadas capazes de impactar sobre a condição imunológica, a adesão terapêutica e a qualidade de vida2222 Eller LS, Kirksey KM, Nicholas PK, Corless IB, Holzemer WL, Wantland DJ, et al. A randomized controlled trial of an HIV/AIDS Symptom Management Manual for depressive symptoms. AIDS Care [Internet]. 2013 [cited 2016 June 10];25(4):391-9. Available from: Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3561506/
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Sabe-se que a convivência com a infecção é marcada pelo enfrentamento de desafios diários e que envolve um conjunto de significados construídos e enfrentados no convívio social. Também se reconhece a participação do núcleo familiar sobre o bem-estar psicológico do indivíduo soropositivo, melhorando sua autoestima, autoconfiança e autoimagem, fundamentais ao enfrentamento das adversidades inerentes ao diagnóstico, à convivência com a infecção e às mudanças de hábitos de vida necessárias para a efetividade do tratamento2323 Gomes AMT, Oliveira DCD, Santos ÉID, Santo CCE, Valois BRG, Pontes APMD. As facetas do convívio com o HIV: formas de relações sociais e representações sociais da AIDS para pessoas soropositivas hospitalizadas. Esc Anna Nery [Internet]. 2012 [citado 2015 mar. 25];16(1):111-20. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ean/v16n1/v16n1a15.pdf
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-2424 Silva LMS, Tavares JSC. The family's role as a support network for people living with HIV/AIDS: a review of Brazilian research into the theme. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015 [cited 2015 Mar 2];20(4):1109-18. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n4/1413-8123-csc-20-04-01109.pdf
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Daí a relevância dos grupos de convivência e outras atividades coletivas; apesar de haver espaço físico ideal à sua realização na unidade, contrariando a realidade de outros SAEs2525 Borges MJL, Sampaio AS, Gurgel IGD. Trabalho em equipe e interdisciplinaridade: desafios para a efetivação da integralidade na assistência ambulatorial às pessoas vivendo com HIV/Aids em Pernambuco. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2012 [citado 2016 abr. 28];17(1):147-56. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csc/v17n1/a17v17n1.pdf
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, constituiu uma fragilidade do serviço na dimensão apoio psicossocial.

Considerando-se a atuação histórica da sociedade civil no enfrentamento da aids e ampla difusão em defesa dos direitos das pessoas vivendo com HIV, há de se considerar que os espaços não governamentais têm se destacado na reintegração social destas pessoas e no fomento de alternativas para a redução das vulnerabilidades ao adoecimento2626 Greco DB. Trinta anos de enfrentamento à epidemia da Aids no Brasil, 1985-2015. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2016 [citado 2016 jun. 13];21(5):1553-64. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csc/v21n5/1413-8123-csc-21-05-1553.pdf
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. Portanto, compreender as características do apoio social e das interações familiares dos usuários, bem como conhecer e intervir sobre a disponibilidade de aparelhos sociais com potencial para contribuir com o tratamento1818 Caixeta CRCB, Morraye M, Villela WV, Rocha SMM. Social support for people living with AIDS [abstract]. J Nurs UFPE On Line [Internet]. 2011[cited 2015 Apr 2];5(8):1920-30. Available from: Available from: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/viewArticle/1866
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são ações que merecem ser valorizadas pelo serviço. Esta fragilidade do cuidado ofertado pode ser compreendida como resquício das modalidades tecnoassistenciais de natureza curativa, que fundamentaram a atenção à saúde no sistema brasileiro, colecionando insucessos no cuidado às condições crônicas como o HIV/aids.

Considerando-se que a tuberculose (TB) é a doença oportunista de maior impacto sobre a morbimortalidade por aids no Brasil e no mundo2727 Grinsztejn B, Luz PM, Pacheco AG, Santos DVG, Velasque L, Moreira RI, et al. Changing Mortality profile among HIV-infected patients in Rio de Janeiro, Brazil: shifting from AIDS to non-AIDS related conditions in the HAART Era. PLoS One [Internet]. 2013 [cited 2016 Apr 29];8(4):e59768. Available from: Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3618173/
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, as ações prioritárias da prevenção desta infecção dentre as PVHA incluem a verificação, em todas as consultas, da presença de sintomas sugestivos e oferta de exames diagnósticos1111 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em adultos. Brasília: MS; 2013..

Além de se constituir em recurso para o diagnóstico da TB, a baciloscopia, associada ao teste de sensibilidade dos isolados de Mycobacterium tuberculosis, possibilita o conhecimento do perfil de sensibilidade da bactéria aos medicamentos utilizados para tratar a infecção, auxiliando na instituição de tratamento mais eficaz, visto que a resistência medicamentosa é maior neste grupo. A prova tuberculínica, por sua vez, é importante para o diagnóstico da infecção latente nas PVHA assintomáticas para TB, sobretudo após reconstituição imunológica. Já o raio X, além de contribuir com o diagnóstico diferencial de outras infecções, auxilia na exclusão da TB ativa quando associado a critérios clínicos e ao exame bacteriológico, intervenção necessária antes da indicação do tratamento da infecção latente para evitar a indução de resistência medicamentosa1111 Brasil. Ministério da Saúde; Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em adultos. Brasília: MS; 2013..

A avaliação insatisfatória da oferta destes exames é um aspecto preocupante na perspectiva da prevenção de complicações e mortalidade dos usuários do serviço e um indício de fragilidade de desempenho frente ao alcance das metas mundiais de controle da aids e doenças associadas.

As três dimensões da oferta com os menores percentuais de satisfação corroboram a observação de que, apesar dos avanços no tratamento do HIV/aids, as lacunas no cuidado se concentram principalmente no suporte à convivência com a infecção e na atenção às necessidades de natureza psicossocial, que por sua vez repercutem sobre a capacidade de autonomia para o cuidado de si22 Figueiredo LA, Lopes LM, Magnabosco GT, Andrade RLP, Faria MF, Goulart VC, et al. Provision of health care actions and services for the management of HIV/Aids from the users perspective. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(6):1024-31. ,2020 Sun W, Wu M, Qu P, Lu S, Wang L. Quality of life of people living with HIV/AIDS under the new epidemic characteristics in China and the associated factors. PLoS One [Internet]. 2013 [cited 2015 Sep 12];8(5):e64562. Available from: Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3669301/
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Estudo desenvolvido na região sudeste do Brasil sinalizou fragilidades na oferta de ações de serviços especializados no atendimento de necessidades que não estavam relacionadas ao manejo clínico e ao tratamento medicamentoso, incluindo aquelas voltadas ao diagnóstico e manejo de doenças oportunistas, e dentre elas a TB22 Figueiredo LA, Lopes LM, Magnabosco GT, Andrade RLP, Faria MF, Goulart VC, et al. Provision of health care actions and services for the management of HIV/Aids from the users perspective. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(6):1024-31. . Tal fato evidencia que, em realidades socioeconômicas e programáticas diferentes, há semelhantes fragilidades na gestão do cuidado no contexto dos serviços especializados.

A medida de associação entre oferta e risco sugere que na realidade do serviço os usuários com maior risco clínico podem não estar sendo priorizados na oferta de ações às suas necessidades. Tal aspecto merece atenção, pois quando o planejamento da oferta não considera pessoas cujas condições de saúde necessitam de atenção diferenciada segundo a estratificação dos seus riscos, empreendem-se esforços e recursos em intervenções desnecessárias, equivocadas e ineficientes11 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: OPAS; 2011..

Conclusão

Observou-se que a oferta de ações priorizadas pelo ambulatório é coerente com importantes diretrizes programáticas para o controle/manejo do HIV/aids, como a oferta de preservativos e medicamentos ARV, monitoramento da condição imunológica, oferta de consultas de rotina e orientações para o autocuidado, com destaque para a atenção às necessidades de natureza clínica, forte atuação da atenção profissional e valorização dos aspectos psicológicos.

Considerando-se que grande percentual de usuários se situou nas categorias de risco alto e médio e a influência que a oferta exerce sobre o escore de risco, sugere-se que as iniciativas de melhoramento do serviço perpassem pela oferta de ações relacionadas aos efeitos colaterais da TARV; de prevenção/diagnóstico precoce/tratamento de infecções oportunistas, como a TB; pela extensão das ações de cuidado para a família; pela valorização dos recursos sociais no cuidado ofertado; e pela identificação/intervenção dos/sobre os problemas potenciais ou já instalados, de natureza social.

Ressalta-se a relevância da elaboração/utilização de tecnologias para sistematizar a prática profissional e adequar a oferta das ações do ambulatório às necessidades identificadas. Nesta perspectiva, a classificação de risco dos usuários merece ser valorizada como tecnologia da gestão do cuidado especializado. O Enfermeiro, como um dos integrantes da equipe multiprofissional e que tem o cuidado como objeto de trabalho, pode se instrumentalizar e induzir a aplicabilidade prática desta tecnologia no sentido de promover o cuidado alinhado às demandas locais, contribuindo com a melhoria da gestão do cuidado no ambulatório especializado e na rede de atenção à saúde.

A não inclusão de pessoas com diagnóstico da infecção (HIV) na amostra é reconhecidamente uma fragilidade do estudo, tendo em vista que a notificação do HIV e o estabelecimento do tratamento como estratégia de prevenção ocorreram posteriormente ao seu desenvolvimento. Logo, os resultados alcançados poderão incitar a avaliação dos aspectos discutidos, considerando as especificidades/necessidades de atenção das pessoas com HIV, sob o foco em análise, para assim contribuir com a reflexão e o planejamento da atenção à saúde da PVHA, para a produção de cuidado universal, equânime e eficaz.

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    Extraído da tese "Coordenação do cuidado às pessoas vivendo com HIV/aids: desafios no contexto da assistência ambulatorial especializada", Universidade Federal da Paraíba, 2015.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2016

Histórico

  • Recebido
    03 Jun 2016
  • Aceito
    17 Ago 2016
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