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Nem tudo o que brilha é câncer: criptococose pulmonar mimetizando linfoma na tomografia por emissão de pósitrons com [(18)] F fluoro-2-desoxi-D-glicose

Resumos

Relato de caso de criptococose pulmonar mimetizando linfoma num exame de tomografia por emissão de pósitrons (PET-scan). Homem de 62 anos com resolução completa, ao PET-scan, de seu linfoma não Hodgkin de células B, lesões abdominais e pulmonares, após três ciclos de quimioterapia baseada em ritoximabe (R-CHOP). Entretanto, o mesmo exame mostrou também novos nódulos pulmonares, sugestivos de lesões do linfoma. Granuloma inflamatório crônico foi observado no exame anatomopatológico, com estruturas circulares compatíveis com fungo. Cultura revelou Cryptococcus neoformans. As lesões desapareceram após 6 semanas de fluconazol, e o paciente pôde continuar a quimioterapia sem complicações infecciosas.

Tomografia por emissão de pósitrons; Linfoma não Hodgkin; Criptococose; Pneumopatias; Cryptococcus neoformans; Relatos de casos


We report of a case of pulmonary cryptococcosis mimicking lymphoma in a positron emission tomography (FDG-PET) scan. A 62-year old man with diffuse large B-cell lymphoma had complete resolution of abdominal and pulmonary lesions after three cycles of rituximab-based chemotherapy (R-CHOP). However, FDG-PET showed new pulmonary nodules, suggesting active lymphoma. Chronic inflammatory granuloma was seen in the histopathological exam, with round-shaped structures compatible with fungus, later identified as Cryptococcus neoformans on culture. The lesions disappeared after 6 weeks of fluconazole therapy, and the patient could continue chemotherapy without further infectious complications.

Positron-emission tomography; Lymphoma, non-Hodgkin; Cryptococcosis; Lung diseases; Cryptococcus neoformans; Case reports


RELATO DE CASO

IHematologia e Hemoterapia, Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE, São Paulo (SP), Brasil

IIHospital Israelita Albert Einstein - HIAE, São Paulo (SP), Brasil

IIIMedicina Nuclear, Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE, São Paulo (SP), Brasil

Autor correspondente

RESUMO

Relato de caso de criptococose pulmonar mimetizando linfoma num exame de tomografia por emissão de pósitrons (PET-scan). Homem de 62 anos com resolução completa, ao PET-scan, de seu linfoma não Hodgkin de células B, lesões abdominais e pulmonares, após três ciclos de quimioterapia baseada em ritoximabe (R-CHOP). Entretanto, o mesmo exame mostrou também novos nódulos pulmonares, sugestivos de lesões do linfoma. Granuloma inflamatório crônico foi observado no exame anatomopatológico, com estruturas circulares compatíveis com fungo. Cultura revelou Cryptococcus neoformans. As lesões desapareceram após 6 semanas de fluconazol, e o paciente pôde continuar a quimioterapia sem complicações infecciosas.

Descritores: Tomografia por emissão de pósitrons; Linfoma não Hodgkin; Criptococose; Pneumopatias; Cryptococcus neoformans; Relatos de casos

INTRODUÇÃO

A tomografia por emissão de pósitrons com [(18)] F fluoro-2-desoxi-D-glicose (FDG-PET) é um modalidade de imagem baseada no efeito Warburg, que consiste na propensidade das células cancerígenas de manter a glicólise elevada na presença do oxigênio(1). Tal procedimento tem mostrado grande valor na distinção entre as lesões benignas e malignas(2) e emerge como a técnica padrão-ouro para estadiamento do linfoma Hodgkin e linfoma não Hodgkin agressivo (LNH)(3,4).

Diversos relatos descrevem as armadilhas do diagnóstico por imagem com FDG-PET. Lesões inflamatórias/infecciosas benignas podem ter taxas metabólicas aumentadas e ser classificadas incorretamente como lesões malignas. A imagem por FDG-PET de um nódulo pulmonar solitário pode ser particularmente difícil para avaliar, já que a micobactéria ou o granuloma fúngico podem parecer um câncer pulmonar(5). O valor padronizado de captação máximo (SUV max), uma medida calculada da captação do contraste, tem sido utilizado para diferenciar a etiologia fundamental de tais lesões. Os baixos valores da SUV (até 2,5) são vistos com mais frequência em lesões benignas, e o alto valor de captação (acima de 2,5) é mais frequente com lesões malignas(6). O julgamento clínico e a avaliação laboratorial completa podem auxiliar para estabelecer um diagnóstico correto, porém, geralmente, a biópsia é necessária.

RELATO DE CASO

Paciente masculino, 62 anos, encaminhado à instituição devido à perda de peso, febre, dor abdominal e icterícia. A tomografia computadorizada (TC) de seu abdômen relevou massa peri-hepática infiltrada de 6 cm, nódulos no fígado, esplenomegalia periaórtica e nódulos linfáticos aumentados. A TC do tórax revelou nódulos múltiplos no pulmão e nódulos aumentados no axilar, cervical e mediastinal. A biópsia da massa hepática diagnosticou linfoma difuso de grandes células B (LDGC-B), CD20+.

Após três ciclos de quimioterapia baseado em rituximabe (R-CHOP), o paciente relatou febre diária de até 38ºC. A investigação extensiva laboratorial e por imagem de doença infecciosa foi inconclusiva. O estudo por FDG-PET revelou resolução completa de lesões anteriores no abdome e pulmão. Apesar disso, novos nódulos pulmonares, com até 2,5cm de extensão e com SUV max de 13,6 foram observados no lobo posterior direito do pulmão, sugerindo linfoma (Figura 1).


Realizou-se biópsia aberta do pulmão para elucidar o diagnóstico. Uma inflamação crônica granulomatosa foi observada no exame histopatológico, com estruturas circulares compatíveis com fungos (Figura 2). A cultura do tecido pulmonar revelou Cryptococcus neoformans. Foi iniciado o fluconazol (150mg). Após 6 meses, as lesões no pulmão desapareceram e o paciente ficou assintomático, podendo continuar o tratamento quimioterápico sem outras complicações infecciosas.


DISCUSSÃO

A criptococose pulmonar (CP) é uma doença infecciosa causada por fungo, sendo geralmente encontrada em hospedeiros imunocomprometidos. Diversos fatores de risco têm sido descritos, incluindo a infecção por HIV, malignidades, transplante de célula tronco ou órgão, sendo estes tratados com glicocorticoides ou antagonistas do fator de necrose tumoral(7,8). No caso descrito, o uso de glicocorticoides, tanto para malignidade e quanto cronicidade, apresentou risco para infecção fúngica.

A FDG-PET é muito sensível e exata no estadiamento do LNH e de sua reavalição. Todavia, é sabido que pacientes imunocomprometidos podem ter apresentação clinica atípica de doenças infecciosas, e a biópsia pode ser necessária para um diagnóstico correto. O uso de SUV para discriminação entre doença benigna ou maligna tem sido analisado extensivamente, e a maioria dos estudos estabelecem a SUV de 2,0 a 5,0 como ponto de corte racional(9). Particularmente, em criptococose, poucos relatos têm sido conclusivos, como, por exemplo, o de Huang et al.(6), que observaram um SUV max variando de 2,2 a 11,6. No paciente deste estudo, um SUV de 13,6 foi altamente sugestivo de LNH. Porém, com a resposta clínica e radiológica impressionante observada em outras áreas afetadas e após a avaliação judiciosa dos nódulos pulmonares, suspeitou-se de diagnóstico diferente de infecção fúngica. Este relato enfatizou a importância do diagnóstico histopatológico antes de iniciar/alterar o tratamento.

REFERÊNCIAS

  • 1. Kelloff GJ, Hoffman JM, Johnson B, Scher HI Siegel BA, Cheng EY, et al. Progress and promise of FDG-PET imaging for cancer patient management and oncologic drug development. Clin Cancer Res. 2005;11(8):2785-808.
  • 2. Collins CD. PET/CT in oncology: for which tumours is it the reference standard? Cancer Imaging. 2007;7 Spec No A:S77-87.
  • 3. Buchmann I, Reinhardt M, Elsner K, Bunjes D, Altehoefer C, Finke J, et al. 2-(fluorine-18)fluoro-2-deoxy-D-glucose positron emission tomography in the detection and staging of malignant lymphoma. A bicenter trial. Cancer. 2001;91(5):889-99.
  • 4. Sasaki M, Kuwabara Y, Koga H, Nakagawa M, Chen T, Kaneko K, et al. Clinical impact of whole body FDG-PET on the staging and therapeutic decision making for malignant lymphoma. Ann Nucl Med. 2002;16(5):337-45.
  • 5. D'Souza MM, Tripathi M, Shrivastav M, Sharma R, Mondal A. Tuberculosis mimicking malignancy. Hell J Nucl Med. 2009;12(1):69-70.
  • 6. Huang CJ, You DL, Lee PI, Hsu LH, Liu CC, Shih CS, et al. Characteristics of integrated 18F-FDG PET/CT in pulmonary cryptococcosis. Acta Radiol. 2009;50(4):374-8.
  • 7. Finke R, Strobel ES, Kroepelin T, Guzman J, Klein PJ, Schaefer HE, et al. Disseminated cryptococcosis in a patient with malignant lymphoma. Mycoses. 1988;Suppl 1:102-8.
  • 8. Arend SM, Kuijper EJ, Allaart CF, Muller WH, Van Dissel JT. Cavitating pneumonia after treatment with infliximab and prednisone. Eur J Clin Microbiol Infect Dis. 2004;23(8):638-41.
  • 9. Kishi K, Homma S, Kurosaki A, Kohno T, Motoi N, Yoshimura K. Clinical features and high-resolution CT findings of pulmonary cryptococcosis in non-AIDS patients. Respir Med. 2006;100(5):807-12.
  • Nem tudo o que brilha é câncer: criptococose pulmonar mimetizando linfoma na tomografia por emissão de pósitrons com [(18)] F fluoro-2-desoxi-D-glicose

    Nelson HamerschlakI; Jacyr PasternakII; Jairo WagnerIII; Guilherme Fleury PeriniI
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      23 Maio 2012
    • Aceito
      17 Jul 2012
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