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Educação permanente em saúde na atenção básica: percepção dos gestores municipais de saúde

Educación permanente en salud en la atención basica: percepción de los gestores de salud municipal

RESUMO

Objetivos

Conhecer as estratégias de educação em saúde preconizadas e desenvolvidas aos trabalhadores da atenção básica pelosgestores.

Método

O estudo está caracterizado como uma pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória. Para a coleta de dados, utilizou-se a entrevista semiestruturada. A população amostral foi escolhida de forma intencional, tendo como público-alvo 26 gestores municipais de saúde adscritos a uma coordenadoria regional de saúde, localizada no norte/noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

Resultados

A análise temática permitiu a construção de duas categorias empíricas: estratégias educativas, compartimentadas, descontínuas e de bases tecnicistas; e a incipiência/ausência de propostas educativas.

Considerações finais

Os resultados demonstram uma realidade que precisa ser transformada por todas as pessoas envolvidas no processo de trabalho em saúde: docentes e discentes, usuários, membros dos conselhos de saúde, trabalhadores e gestores. Realisticamente, buscam-se transformações nos serviços para que se qualifique a integralidade da atenção em saúde.

Gestão em saúde; Educação em saúde; Saúde pública; Atenção primária à saúde

RESUMEN

Objetivos

Conocer, desde de la perspectiva de los gestores, las estrategias de educación para la salud que son promovidas y desarrolladas para los trabajadores de atención primaria.

Método

El estudio se caracteriza como una investigación cualitativa, descriptiva, exploratoria. Para la recolección de datos se utilizó una entrevista semiestructurada. La población de la muestra se eligió intencional, dirigida a 26 gestores municipales de salud de una coordinación regional de salud, localizada al norte/noroeste del estado de Rio Grande do Sul.

Resultados

El análisis temático permitió la construcción de dos categorías empíricas: las estrategias educativas discontinuas, compartimentadas; y escasez o ausencia de propuestas educativas.

Conclusión

Los resultados muestran una realidad que necesita ser transformada por las personas involucrados en el proceso, profesores/estudiantes, usuarios, miembros de los consejos de salud, trabajadores y gestores. Siendo realistas, buscar los cambios en los servicios, con el fin de calificar la integralidad de la atención sanitaria.

Gestión en salud; Educación en salud; Salud pública; Atención primaria de salud

ABSTRACT

Objectives

To know the health education strategies advocated and developed for workers of primary care, in the view of managers.

Method

The study is characterized as a qualitative, descriptive and exploratory research. A semistructured interview was used to collect data. The sample population was chosen intentionally, with an audience of 26 municipal health managers ascribed to a regional health coordination office, located in the north/northwest of the Rio Grande do Sul State.

Results

The thematic analysis allowed the construction of two empirical categories: educational strategies, compartmentalized, discontinuous and with technicist bases; and the insipience/absence of educational proposals.

Final considerations

The results show a reality that needs to be transformed by all people involved in health work process: teachers and students, users, members of health councils, workers and managers. Realistically, there is a quest for change in services, to qualify the comprehensiveness of health care.

Health management; Health education; Public health; Primary Health Care

INTRODUÇÃO

A estruturação, a organização dos serviços, o contínuo desenvolvimento e valorização dos trabalhadores da saúde na atenção básica, representam um dos maiores desafios à implantação e fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), razão da importância do trabalho desses profissionais na implementação das políticas de saúde e na geração de mudanças do modelo assistencial. Os modelos de gestão da atenção básica com viés parcelar e fragmentado precisa transcender para um padrão que valorize as condições de trabalho, a gestão de pessoas, a utilização de tecnologias, o trabalho integrativo pela equipe multiprofissional, a ênfase no planejamento e, principalmente, implantação de programas de educação permanente11. Seidl H, Vieira SP, Fausto MCR, Lima RCD, Gagno J. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde Debate. 2014;38(spe):94-108..

A gestão, na atenção básica, precisa considerar as relações de trabalho, situação em que a participação dos sujeitos seja fundamental para a efetividade dos serviços. Pensar formas diferenciadas de gestão inclui a observação das políticas de saúde, a estruturação e organização dos serviços, a definição qualitativa e quantitativa de pessoal, a estruturação de programas de educação permanente, razão da contínua necessidade de aprimoramento e revitalização do processo de trabalho e a consequente qualificação da atenção em saúde11. Seidl H, Vieira SP, Fausto MCR, Lima RCD, Gagno J. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde Debate. 2014;38(spe):94-108..

A gestão do trabalho em saúde, em especial, a gestão de pessoas, envolve diversas estratégias, como a estruturação, a organização e a inserção do trabalhador no espaço de trabalho, assim como o compromisso com seu contínuo desenvolvimento, sendo a Educação Permanente em Saúde (EPS) um dos pilares de sustentação. Enseja-se que a implantação da EPS esteja consignada com os princípios do SUS, comprometida com a resolução dos problemas encontrados no processo de trabalho e nas especificidades reais nos serviços de saúde22. Mora CTR, Rizzotto MLF. Gestão do trabalho nos hospitais da 9ª região de saúde do Paraná. Saúde Debate. 2015;39(107):1018-32..

Como Já descrito, a EPS está vinculada ao desenvolvimento de propostas educativas que (re)signifiquem o processo de trabalho, situação em que o cotidiano de trabalho se constitui em fonte de conhecimento, permitindo-se estabelecer reflexões e problematizar a realidade dos serviços de saúde33. D’Avila LS, Assis LN, Melo MB, Brant LC. Adesão ao Programa de Educação Permanente para médicos de família de um estado da região sudeste do Brasil. Ciênc. Saúde Coletiva. 2014;19(2):401-16.. A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) tem como princípio a gestão democrática e participativa, constituindo-se em uma estratégia profícua de aperfeiçoamento do processo educativo. Nas ações educativas concernentes à EPS, o principal diferenciador está na inserção do protagonismo dos trabalhadores, usuários e controle social. As propostas educativas, congruentes a EPS, portanto, são concebidas e desenvolvidas a partir das necessidades evidenciadas no processo de trabalho e na utilização de diferentes preceitos educativos, em especial, a aprendizagem significativa44. Moraes KG, Dytz JLG. Política de educação permanente em saúde: análise de sua implementação. ABCS Health Sci. 2015;40(3):263-9.. Na PNEPS, a aprendizagem significativa é um dos preceitos educativos difundidos, razão que propõe ao educando um papel mais ativo no processo educativo e de valoração das experiências prévias55. Silva CT, Terra MG, Camponogara S, Kruse MHL, Roso CC, Xavier MS. Permanent health education based on research with professionals of a multidisciplinary residency program: case study. Rev Gaúcha Enferm. 2014;35(3):49-54..

A EPS não é um apêndice, carece ser entendida pelos gestores como parte integrante da gestão do trabalho em saúde, tem como base as práticas institucionalizadas de saúde e sua implementação tem como referência os problemas cotidianos das equipes de saúde, que procuram gerar mudanças nas práticas, na organização, nas relações e no processo de trabalho55. Silva CT, Terra MG, Camponogara S, Kruse MHL, Roso CC, Xavier MS. Permanent health education based on research with professionals of a multidisciplinary residency program: case study. Rev Gaúcha Enferm. 2014;35(3):49-54.. Como já referido11. Seidl H, Vieira SP, Fausto MCR, Lima RCD, Gagno J. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde Debate. 2014;38(spe):94-108.,33. D’Avila LS, Assis LN, Melo MB, Brant LC. Adesão ao Programa de Educação Permanente para médicos de família de um estado da região sudeste do Brasil. Ciênc. Saúde Coletiva. 2014;19(2):401-16., a EPS pode contribuir para mudanças na gestão em saúde, transformando o espaço de trabalho, mediante atuações críticas, reflexivas, socialmente comprometidas e tecnicamente competentes55. Silva CT, Terra MG, Camponogara S, Kruse MHL, Roso CC, Xavier MS. Permanent health education based on research with professionals of a multidisciplinary residency program: case study. Rev Gaúcha Enferm. 2014;35(3):49-54.. As mudanças na gestão do trabalho na atenção básica, em especial a partir do processo de trabalho, portanto, coadunam-se com a proposta da EPS66. Santos AM, Nóbrega IKS, Assis MMA, Jesus SR, Kochergi CN, Bispo Junior JP, et al. Desafios à gestão do trabalho e educação permanente em saúde para a produção do cuidado na estratégia saúde da família. Rev APS. 2015 jan/mar;18(1):39-49..

O estudo se justifica na importância que EPS representa para a gestão, a atenção, e a formação em saúde e da repercussão que seus resultados possam gerar na atenção básica, em especial, pelo que representa para os sujeitos envolvidos no processo. No estudo, procurou-se evidenciar, como os gestores municipais de saúde percebem a EPS, como atuam na viabilização, condução e implementação de propostas educativas concernentes com os preceitos da PNEPS. É estratégica, portanto, para gestores, trabalhadores e usuários, a implantação e o desenvolvimento da educação permanente. Ademais, a qualificação da atenção aos usuários dos serviços de saúde encontra guarida no contínuo desenvolvimento e aperfeiçoamento dos trabalhadores. A implantação e efetividade das atividades educativas requerem a participação dos trabalhadores, gestores, docentes e discentes, com um olhar especial do controle social.

A questão de pesquisa busca respostas à seguinte questão: “Que estratégias educativas vêm sendo preconizadas e desenvolvidas para os trabalhadores na atenção básica, na visão dos gestores municipais de saúde?”. O objetivo, por conseguinte, foi conhecer as estratégias de educação em saúde, preconizadas e desenvolvidas aos trabalhadores da atenção básica, na visão dos gestores.

MÉTODO

O estudo é caracterizado como uma pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória. A população amostral foi escolhida de forma intencional77. Polit DF, Bech CT. Fundamentos da pesquisa em enfermagem. 7. ed. Porto Alegre: Artmed; 2011. p. 339-71., tendo como público-alvo 26 gestores municipais de saúde adscritos a uma coordenadoria regional de saúde. A coleta de dados ocorreu na sede dos municípios. As entrevistas eram previamente agendadas com gestores. Os dados foram considerados saturados por unidade pesquisada, quando se averiguou que os tipos de enunciados eram suficientes e novas entrevistas não agregariam mais elementos para a discussão em relação aos já existentes88. Fontanella BJB, Luchesi BM, Saidel MGB, Ricas J, Turato ER, Melo D. Amostragem em pesquisas qualitativas: proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. Cad Saúde Pública. 2011;27(2):388-94.. Para a apreciação e interpretação dos dados, utilizou-se o método da análise temática. A organização da análise está cronologicamente, composta por: pré-análise com a exploração do material, tratamento dos resultados, a inferência, e a interpretação. A codificação e a categorização99. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011. p.123-58..

Incluíram-se todos os gestores que, após o contato, agendamento de dia e horário para a realização da entrevista e exposição das perguntas e esclarecimentos relativos às questões éticas, concordaram em participar da pesquisa e assinaram em duas vias, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Não houve exclusões em razão de que todos os participantes aderiram ao estudo. Os dados foram coletados no período de junho a dezembro de 2013. As entrevistas foram realizadas a partir de um instrumento com questões semiestruturadas gravadas em sistema digital. No rol de perguntas constavam questões relativas a formação dos gestores, tempo de exercício na função, como definiam as estratégias e a implementação dos módulos educativos. A coleta de dados ocorreu na sede dos municípios que foram incluídos no estudo. As entrevistas, após a transcrição, foram disponibilizadas aos sujeitos do estudo, para a validação dos dados e consequente análise. Os preceitos éticos foram seguidos conforme determina a legislação em vigor1010. Ministério da Saúde (BR), Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil. 2013 jun 13 [citado 2015 jun 15];150 (112 Seção 1):59-62. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html.
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, sendo o projeto de pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria (Termo Consubstanciado nº 306.040). Os participantes do estudo estão identificados no texto pela letra ‘G’, seguida da ordem de como foram realizadas as entrevistas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados da pesquisa advêm das entrevistas realizadas com os 26 gestores municipais de saúde componentes de uma determinada coordenadoria regional de saúde, localizada no norte, noroeste do Rio Grande do Sul, Brasil; ou seja, entrevistaram-se 100% dos gestores municipais de saúde da coordenadoria pautada no estudo. Quanto à formação dos gestores em saúde, quatro são técnicos em enfermagem, dois enfermeiros, dois assistentes sociais, um odontólogo, um médico, três professores (matemática, biologia e pedagogia), dois administradores, um advogado, um design de modas, um tecnólogo em gestão ambiental e um técnico em agropecuária; três gestores têm ensino fundamental e quatro, ensino médio. A média de tempo que os gestores estão no cargo era de 25 meses, no período em que se realizou a pesquisa.

Sobre o perfil dos gestores, estudos1111. Melo CF, Alchieri JC, Neto JLA. Avaliação do perfil técnico-profissional de gestores do Sistema Único de Saúde (SUS). Rev Enferm UFPE on line. 2013;7(7):4670-80. destacam que embora alguns gestores possuíssem curso superior, aproximadamente um terço não tinha formação na área da saúde e nem da área administração. Ainda que não seja um pré-requisito de formação na área, para ser gestor em saúde, a função incorpora diversas especificidades atinentes ao processo de gestão em saúde, de forma especial, o conhecimento sobre o SUS. Evidencia ainda o estudo1010. Ministério da Saúde (BR), Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil. 2013 jun 13 [citado 2015 jun 15];150 (112 Seção 1):59-62. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html.
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que, aproximadamente, 50% dos gestores havia feito algum tipo de capacitação para o exercício do cargo, ratificando-se que estes não possuíam experiência anterior na função, e cerda de dois terços dos gestores não conheciam as especificidades do SUS e as suas diretrizes, tampouco os diferentes níveis de atenção, básica, intermediária e terciária, a regulação do sistema e os diferentes níveis de complexidade1111. Melo CF, Alchieri JC, Neto JLA. Avaliação do perfil técnico-profissional de gestores do Sistema Único de Saúde (SUS). Rev Enferm UFPE on line. 2013;7(7):4670-80..

Contextualmente, a inserção dos gestores nos cargos ocorre por questões políticas partidárias, ficando o critério técnico em segundo plano. Outro fator que se sobrepõe refere-se à temporalidade no cargo e à escolha das estratégias de atenção e educação em saúde: a ênfase das ações destina-se à resolução de doenças, ficando a prevenção, os agravos e a promoção da saúde em plano secundário. Cabe aos gestores superar seus próprios limites profissionais e procurar suprir as carências de infraestrutura, sistema de apoio de diagnóstico e tratamento deficientes, bem como a ausência de modelos de atenção com base em evidências/necessidades. Outro desafio a ser superado refere-se às estratégias educativas dos trabalhadores, às condições precárias de trabalho, à baixa profissionalização dos gestores e à falta de controle social1212. Mendes EV. A construção social da atenção primária à saúde. 2. ed. Brasília: OPAS, 2011 [citado 2015 fev 24]. Disponível em: http://www.saude.sp.gov.br/resources/ses/perfil/gestor/documentos-de-planejamento-em-saude/elaboracao-do-plano-estadual-de-saude-2010-2015/textos-de-apoios/redes_de_atencao_mendes_2.pdf.
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A análise temática99. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011. p.123-58. possibilitou conhecer as percepções dos gestores municipais de saúde em relação às propostas de EPS preconizadas e desenvolvidas nos seus respectivos municípios. Feito o recorte necessário, construíram-se duas categorias empíricas: na primeira, destacam-se as estratégias educativas compartimentadas, descontínuas e de bases tecnicistas; e a segunda, tem como enfoque: A incipiência, ausência de propostas educativas.

Estratégias educativas compartimentadas, descontínuas e de bases tecnicistas

Evidencia-se, nas respostas dos gestores de saúde, que não há ou não constam no planejamento, propostas de educação destinadas aos trabalhadores. Os extratos das entrevistas registram apenas a existência de ações educativas isoladas e compartimentadas. A ênfase no tecnicismo e a descontinuidade são constatadas a partir das informações relativas à participação nas atividades educativas:

[...] Eu ainda considero falho. Os nossos trabalhadores não estão participando como deveriam. Eu acho que falta muito ainda educação, para eles, educação de serviço pra eles. Acho bastante falho. E também porque é oferecido muito pouco (G4).

[...] A gente trabalhou determinadas patologias relacionadas à saúde mental, como forma de aprimorar a humanização, o companheirismo, o coleguismo (G7).

As meninas fazem algum treinamento sobre algum acidente ou incidente que aconteceu no trabalho, mas ainda não é desenvolvido nenhum trabalho específico (G10).

Sempre que solicitado, a gente proporciona palestras, cursos de aperfeiçoamento (G16).

As respostas dos entrevistados denotam que as ações educativas preconizadas e desenvolvidas se distanciam dos preceitos que regem a EPS. Razão, que concepção de EPS vincula as ações educativas às necessidades dos educandos. A forma de prospectar estas necessidades inclui o diagnóstico de ações educativas dos trabalhados e usuários, os problemas do cotidiano de trabalho, a intersecção com a academia, a introdução de novas técnicas, tecnologias, metodologias de trabalho, em especial a ressignificação e reestruturação do processo de trabalho. A inserção de temas pontuais, como as capacitações, não deve ser desconsiderada, pois podem ser importantes no fazer diário. O óbice que se interpõe a pontualidade educativa está na unicidade de temática de preparo para o trabalho, muitas vezes desconectado das necessidades dos trabalhadores envolvidos no processo e dos propósitos da EPS.

A EPS é uma das formas mais profícuas de qualificar os trabalhadores da atenção básica, o que contribui para a valorização e a satisfação dos servidores, sendo também um valioso instrumento no aperfeiçoamento do processo de trabalho11. Seidl H, Vieira SP, Fausto MCR, Lima RCD, Gagno J. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde Debate. 2014;38(spe):94-108.. A educação permanente, portanto, tem, entre seus propósitos, a superação do aprendizado para o trabalho e da lógica pontual das capacitações, aperfeiçoamentos e atualizações66. Santos AM, Nóbrega IKS, Assis MMA, Jesus SR, Kochergi CN, Bispo Junior JP, et al. Desafios à gestão do trabalho e educação permanente em saúde para a produção do cuidado na estratégia saúde da família. Rev APS. 2015 jan/mar;18(1):39-49..

Mostra um estudo11. Seidl H, Vieira SP, Fausto MCR, Lima RCD, Gagno J. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde Debate. 2014;38(spe):94-108. que, embora haja a oferta e a valorização da EPS nos serviços de atenção básica, a participação dos trabalhadores é baixa, situação que indica a necessidade de ações que fortaleçam a participação, envolvimento e comprometimento, para que possam atrelar as ações educativas com as necessidades de trabalhadores e usuários11. Seidl H, Vieira SP, Fausto MCR, Lima RCD, Gagno J. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde Debate. 2014;38(spe):94-108.. A baixa inserção nos programas de EPS, também é evidenciada nos serviços hospitalares, mostrando que o envolvimento com as ações educativas são esporádicas, pouco participativas e pontuais, sendo efetiva em uma ínfima quantidade de estabelecimentos22. Mora CTR, Rizzotto MLF. Gestão do trabalho nos hospitais da 9ª região de saúde do Paraná. Saúde Debate. 2015;39(107):1018-32..

As ações educativas concernentes à EPS têm como referência a participação dos trabalhadores que atuam ativamente na construção de propostas concernentes à problematização do cotidiano de trabalho e da formação em saúde. O processo de transformação da realidade está vinculado ao diálogo e à reflexão coletiva no processo de trabalho1212. Mendes EV. A construção social da atenção primária à saúde. 2. ed. Brasília: OPAS, 2011 [citado 2015 fev 24]. Disponível em: http://www.saude.sp.gov.br/resources/ses/perfil/gestor/documentos-de-planejamento-em-saude/elaboracao-do-plano-estadual-de-saude-2010-2015/textos-de-apoios/redes_de_atencao_mendes_2.pdf.
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. Os preceitos que regem a proposta de educação permanente está comprometido com a transformação das práticas profissionais e, consequentemente, dos serviços, via (re) organização do processo de trabalho66. Santos AM, Nóbrega IKS, Assis MMA, Jesus SR, Kochergi CN, Bispo Junior JP, et al. Desafios à gestão do trabalho e educação permanente em saúde para a produção do cuidado na estratégia saúde da família. Rev APS. 2015 jan/mar;18(1):39-49..

Observa-se, nos extratos de respostas que seguem, os participantes do estudo procurando transferir as responsabilidades pelas dificuldades de implantação de programas educativos para os trabalhadores, quando afirmam que:

São difíceis essas estratégias, porque, geralmente, hoje as funcionárias não são fáceis; não é fácil trabalhar com as funcionárias hoje. Tem funcionário bom, e tem outros que é difícil de tentar fazer com que eles desenvolvam um bom trabalho; mas a gente está tentando, fazendo reuniões, nós tínhamos algumas reuniões explicando e tentando formações (G17).

Os trabalhadores, na questão geral do município, não têm muito assim, não são muito capacitados, através de palestra e coisa. Mas o pessoal da área de saúde, aqui, sempre tem curso. A gente procura mandar o pessoal fazer curso pelo menos duas vezes por ano (G24).

A gestão da EPS não cabe, por óbvio, somente a um sujeito, gestor ou não; a responsabilidade é também dos trabalhadores, docentes, discentes e usuários. Cabe aos Colegiados de Gestão Regional (COGEREs) a responsabilidade de formular e promover a gestão da EPS, orientados pela integralidade da atenção à saúde. Necessita-se, portanto, criar estruturas de coordenação e de execução da política de formação e desenvolvimento, assim como promover atos de cooperação com o Estado e municípios circunvizinhos conforme sua região de saúde1212. Mendes EV. A construção social da atenção primária à saúde. 2. ed. Brasília: OPAS, 2011 [citado 2015 fev 24]. Disponível em: http://www.saude.sp.gov.br/resources/ses/perfil/gestor/documentos-de-planejamento-em-saude/elaboracao-do-plano-estadual-de-saude-2010-2015/textos-de-apoios/redes_de_atencao_mendes_2.pdf.
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O desenvolvimento de modos diferenciados e inovadores de gestão estão atrelados ao compromisso com as mudanças. Embora existam diferentes modelos, a gestão participativa permite o desenvolvimento de ações que possibilitam reconfigurar o processo de trabalho de forma democrática e inovadora. A gestão em saúde, portanto, é multifacetada, pois envolvem questões técnicas, processos, relações e, de forma especial, busca a congregação de pessoas em prol de objetivos comuns1313. Medeiros AC, Pereira QLC, Siqueira HCH, Cecagno D, Moraes CL. Gestão participativa na educação permanente em saúde: olhar das enfermeiras. Rev Bras Enferm. 2010;63(1):38-42..

A PNEPS representa uma importante estratégia de aperfeiçoamento do processo de trabalho e geração de mudanças pró-ativas na gestão em saúde. Fato que a proposta de EPS, conforme concebida permite transcender a unicidade e repetição das atividades educativas focalizadas, tecnicistas e desvinculadas das necessidades do cotidiano de trabalho. Infelizmente, tendo como base as respostas obtidas, evidencia-se que os gestores, ou desconhecem, ou não valorizam esse importante instrumento de revitalização do conhecimento, de aperfeiçoamento pessoal, de geração de mudanças e, ainda, de qualificação gestão e da atenção.

A incipiência, ausência de propostas educativas

A categoria ‘incipiência, ausência de propostas educativas’ denota que os preceitos de EPS, enquanto conceito e política de educação, não adentraram em alguns dos serviços de saúde pesquisados, os extratos de respostas registram o desconhecimento ou o não interesse dos gestores em estabelecer, nos seus respectivos municípios, ações educativas sistematizadas e de acordo com as necessidades dos trabalhadores e usuários. Uma análise mais aguçada sobre os dados revela que essa postura dos gestores independe da sua formação, pois nenhum dos gestores pesquisados fez menção de utilizar a EPS como estratégia educativa de desenvolvimento dos trabalhadores e a consequente qualificação do cuidado e, em contrapartida, a renovação da gestão.

Em algumas secretarias de saúde, porém, existe uma interação com outros órgãos, como a Coordenadoria Regional de Saúde (CRS) e a universidade. De qualquer modo, para os gestores entrevistados, a educação no trabalho em saúde está vinculada ao desenvolvimento de parcerias.

[...] Nós vamos utilizar as ferramentas que temos hoje. A própria CRS nos ajuda bastante, a própria universidade também é um parceiro para que possamos melhorar isso, e a ideia é que nós tenhamos uma equipe qualificada (G1).

A CRS oferece alguns cursos de formação. Na medida do possível, nos fizemos presentes. Muitas vezes não se pode deixar o trabalho daqui para ir participar de uma capacitação, por mais que quiséssemos ir. Então, às vezes, na prática, é complicado isso, mas estamos sempre tentando (G5).

Mostra o estudo que há escassez/incipiência/ausência de projetos de EPS na região em que ocorreu a pesquisa. Por isso, preconiza-se que a articulação de projetos de educação com a participação das Comissões de Integração Ensino-Serviço (CIES) seja preponderante para o desenvolvimento de propostas educativas concernentes a realidade, particularidade regional ou necessidade específica de educação e atenção. A análise dos dados remete ao entendimento de que as razões para a não construção de propostas educativas estejam vinculadas ao desconhecimento da PNEPS, à falta de planejamento, à atenção centrada na resolução da doença, tendo como objetivo principal suprir as necessidades básicas de consultas, exames e medicação1414. Signor E, Silva LAA, Gomes IEM, Ribeiro RV, Kesler M, Weiller TH, et al. Educação permanente em saúde: desafios para a gestão em saúde pública. Rev Enferm UFSM. 2015;5(1):1-11..

Estudos1515. Peres C, Silva RF, Barba PCSD. Desafios e potencialidades do processo de educação permanente em saúde.Trab Educ Saúde. 2016;14(3):783-801. evidenciam que as dificuldades para a implantação dos programas de educação permanente, relacionam-se ao desenvolvimento de cursos focados em capacitações, sem a participação dos trabalhadores na elaboração dos planos, resultando em atividades educativas eventuais e dissociadas do processo de trabalho; agregue-se a isso a falta de diálogo e o desconhecimento dos trabalhadores e gestores sobre o que é, efetivamente, a educação permanente1515. Peres C, Silva RF, Barba PCSD. Desafios e potencialidades do processo de educação permanente em saúde.Trab Educ Saúde. 2016;14(3):783-801..

As CIES pouco se articulam com as partes que a compõem, gestores, trabalhadores, docentes, discentes, em especial, e menos ainda com o controle social. As ações são desenvolvidas de forma isolada e, também, desarticuladas da gestão dos processos. A efetividade nas propostas educativas, por isso, precisa ser socializada entre os gestores de saúde e os usuários dos serviços de saúde, para que essas realmente estejam consignadas com as necessidades de todos os segmentos e indivíduos envolvidos no processo educativo e buscam, coletivamente, a qualificação da atenção1616. Oliveira FMCN, Ferreira EC, Rufino NA, Santos MSS, Educação permanente e qualidade da assistência à saúde: aprendizagem significativa no trabalho da enfermagem. Aquichán. 2011;11(1):48-65..

O desafio da EPS, portanto, está em estimular o desenvolvimento dos profissionais no seu contexto e sua responsabilidade no processo contínuo de educação. Para tanto, é necessário rever os métodos educativos, ao prever e prover processos sistematizados e participativos, tendo como cenário o espaço de trabalho, situação em que o pensar e o fazer fundamentam o processo de trabalho1616. Oliveira FMCN, Ferreira EC, Rufino NA, Santos MSS, Educação permanente e qualidade da assistência à saúde: aprendizagem significativa no trabalho da enfermagem. Aquichán. 2011;11(1):48-65..

A incipiência e a eventualidade na elaboração de propostas educativas são evidenciadas, também, com os recortes de entrevistas abaixo relacionados, nos quais os gestores afirmam que as ações educativas ocorrem em períodos esparsos.

Uma vez por semana os trabalhadores da saúde se reúnem aqui e discutem o que nós estamos fazendo aqui nesta área: o que está dando certo, o que não está dando certo, o que nós temos que mudar, o que nós temos que alterar, e esses treinamentos também são passados nessas reuniões para eles, eles discute isso (G6).

Em termos de trabalhadores, conforme vai chegando a demanda está-se atendendo, mas não temos nada específico. Mas de agora em diante praticamente vai ter ações voltadas à saúde do trabalhador (G8).

A incipiência das ações educativas concernentes às ‘capacitações’ incorrem na simplificação das técnicas pedagógicas focalizadas sem a compreensão estratégica do contexto político e institucional. Entre os fatores que fragilizam a implantação dos programas de EPS, estão à falta de apoio institucional, o desconhecimento das atividades educativas, a falta de interação setorial, a falta de comunicação e o comprometimento com as mudanças1717. Koerich C, Erdmann AlL. Gerenciando práticas educativas para o cuidado de enfermagem qualificado em cardiologia. Rev Bras Enferm. 2016;69(5):872-80..

A análise das respostas dos participantes do estudo revela a eventualidade de participação das ações educativas. A descontinuidade, a parcialidade, a pontualidade e a eventualidade das ações educativas não são, efetivamente, suficientes para gerar as transformações de acordo com as necessidades sentidas e evidenciadas pelos trabalhadores e usuários dos serviços.

A não existência ou a falta de clareza quanto à oferta de propostas educativas indicam, de igual modo, o não investimento e a não valorização da educação como precursora de mudanças no espaço de trabalho. A transcendência nos modos de transformar a gestão e a atenção está intimamente vinculada às ações educativas, com propostas inovadoras e transformadoras. A ausência de propostas efetivas de EPS se evidencia, também, quando se diz que

[...] a gente está tentando organizar alguma coisa para trabalhar capacitação para os trabalhadores, tanto da atenção básica quanto como aqui, a gente tem um ambulatório 24 horas, por ora não tem nada ainda (G9).

A EPS, conjuntamente com outras atividades, constitui-se em importante instrumento de gestão, contribuindo para a valorização e a satisfação do trabalhador e, principalmente, na qualificação da atenção aos usuários11. Seidl H, Vieira SP, Fausto MCR, Lima RCD, Gagno J. Gestão do trabalho na Atenção Básica em Saúde: uma análise a partir da perspectiva das equipes participantes do PMAQ-AB. Saúde Debate. 2014;38(spe):94-108.. A EPS é um importante recurso da gestão em saúde, pois seus processos têm como base as práticas institucionalizadas e como ponto de partida os problemas das equipes, com vistas a aperfeiçoar suas práticas, gerar mudanças organizacionais, relacionais, interpessoais e aprimorar o processo de trabalho66. Santos AM, Nóbrega IKS, Assis MMA, Jesus SR, Kochergi CN, Bispo Junior JP, et al. Desafios à gestão do trabalho e educação permanente em saúde para a produção do cuidado na estratégia saúde da família. Rev APS. 2015 jan/mar;18(1):39-49..

Embora a educação no trabalho, por si só, não seja totalmente resolutiva, a ausência de propostas educativas contínuas e permanentes, comprometem a geração de mudanças, razão de haver comprometimento com o aprimoramento, revitalização e redimensionamento do processo de trabalho em saúde. Embora alguns gestores, anteriormente citados, salientem a importância da EPS na gestão dos seus serviços de saúde, os gestores abaixo destacados a compreendem a EPS de outra forma:

[...] Estávamos conversando que, na verdade, nós às vezes deixamos os profissionais de lado. Mas talvez às vezes falte uma educação permanente para nós (G11).

Para os trabalhadores em si, da saúde, a gente não tem grupo. Para os trabalhadores do município, não tem (G17).

Neste ano nós não tivemos uma estratégia assim, desenvolvida para trabalhadores da saúde, pretendemos para o próximo ano instalar isso, e fazer mensalmente (G20).

O município não tem estratégia de saúde para a educação dos trabalhadores (G26).

Um estudo envolvendo a equipe multidisciplinar, composta de enfermeiros, médicos, psicólogos, farmacêuticos, registra que os principais limitadores da implantação de uma proposta de EPS são o cansaço físico, a indisponibilidade de horários, o duplo emprego, a resistência a mudanças, a falta de tempo, os excessos de demandas de tarefas, o pouco comprometimento por parte dos profissionais, a remuneração inadequada, a falta de incentivos. Por outro lado, dentre os facilitadores estão o desafio de superação no trabalho, a obtenção de novos conhecimentos, a viabilização de propostas educativas, a correção dos problemas evidenciados no cotidiano, a interação com profissionais de outras institucionais para a troca de experiências teórica e prática, e, ainda, o próprio ambiente de trabalho, associado às constantes necessidades de mudanças, constituindo verdadeiros fatores indutores à contínua aprendizagem1818. Silva LAA, Bonacina DM, Andrade A, Oliveira TC. Desafios na construção de um projeto de educação permanente em saúde. Rev Enferm UFSM. 2012;2(3):496-506..

Os gestores precisam prever e prover continuamente o aperfeiçoamento das estruturas, da organização e, sobretudo, dos processos. Com as constantes mudanças na área da saúde, sobretudo no que se refere à oferta de serviços qualificados, pode-se afirmar que a EPS é a principal estratégia de mudanças pró-ativas de revitalização da atenção e, reciprocamente, da gestão.

A EPS também se constitui na principal estratégia sustentável para a geração de mudanças institucionais, mas o processo de educação permanente requer planejamento e pesquisa sobre as necessidades das pessoas envolvidas, sejam trabalhadores ou usuários, assim como a previsão de ações educativas diversificadas e contínuas. As necessidades sentidas e evidenciadas no espaço de trabalho são o principal elo entre o que se necessita em termos educativos e o que se aborda cotidianamente nas ações educativas.

A EPS se caracteriza por uma série de acepções: a valorização do trabalho no desenvolvimento pessoal; a articulação do fazer educativo com o processo de trabalho; a articulação da educação com a atenção; a integração das ações educativas sob diferentes dimensões, junto à equipe multiprofissional e interdisciplinar; o uso de estratégias educativas em prol de transformações das práticas de saúde e de enfermagem, além de um olhar diferenciado sobre a integralidade da atenção aos usuários e à população.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta de Educação Permanente em Saúde, advinda da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde, representa um importante avanço na revitalização do conhecimento na enfermagem e na saúde. A proposta de EPS, nesse contexto, está ancorada em teorias pedagógicas com vistas ao desenvolvimento integral dos trabalhadores, porque propõe a participação de diferentes segmentos e, acima de tudo, constitui-se em importante estratégia de complementação/superação a propostas educativas reducionistas, tecnicistas, compartimentadas e de caráter reiterativo, em prol de uma práxis inovadora e transformadora.

Embora estabelecida em lei, propõe-se que a condução da EPS possa ocorrer por meio dos Colegiados de Gestão Regional com a participação das Comissões de Integração Ensino-Serviço. Contudo, dados do estudo da pesquisa revelam que os gestores em saúde, de forma geral, são desconhecedores da PNEPS. Evidencia o estudo, que os gestores municipais de saúde no segmento pesquisado, não conhecem e/ou não valorizam as estratégias de educação permanente que são preconizadas e/ou desenvolvidas aos trabalhadores na atenção básica. Transparece que os gestores não valorizam a EPS, com uma das estratégias de mudanças mais profícuas na gestão, em especial, o processo de trabalho, com resultados no aperfeiçoamento da atenção aos usuários.

Os parcos movimentos educativos atualmente desenvolvidos são decorrentes da atuação da coordenadoria de saúde e de uma universidade pública instalada nessa regional; mesmo assim, a participação dos trabalhadores em saúde nesses eventos é exígua. Transparece que um dos motivos da pouca participação está relacionado ao diminuto quadro de pessoal e dificuldade de liberação do trabalho, para participar das atividades educativas. Contudo, pode haver outros fatores intervenientes, dentre os quais a cultura de não valorização das atividades educativas, entendendo-se que estas estão descoladas das respectivas realidades/necessidades e, também, do processo de trabalho.

A institucionalização de uma cultura educativa nos espaços de trabalho significará a reorientação do processo de trabalho. Porém, no cenário real do estudo, o processo de trabalho está vinculado quase que exclusivamente à atenção com vistas à resolução de doenças, ficando a educação em plano paralelo ou secundário. A implementação de programas educativos perenes implica repensar o processo de trabalho, haja vista que a EPS acontece em todos os lugares e momentos, principalmente no espaço de trabalho, fato que leva a repensar e redimensionar processos e, nestes, a atenção, a gestão e a educação passam a ser desenvolvidas de forma congruente no processo de trabalho.

A educação permanente em saúde é, por isso, de suma importância para o desenvolvimento dos trabalhadores em saúde, que, por sua vez, de posse de uma cultura educativa, podem vir a propor e implementar ações educativas perenes aos usuários, com vistas à prevenção de doenças e agravos e, de igual modo, à promoção da saúde. Entre os gestores há pessoas com formação na área da saúde, de áreas diferenciadas e até secretários sem formação específica, não tendo sido possível evidenciar qualitativamente diferenças entre as propostas educativas, razão que reforça o entendimento do não conhecimento da PNEPS e de sua importância enquanto estratégia de gestão.

Por fim, mostra o estudo uma realidade que precisa ser transformada por todas as pessoas envolvidas no processo: trabalhadores, docentes e discentes, usuários, membros dos conselhos de saúde e, em especial, gestores em saúde, que têm a prerrogativa de assumir e facilitar a elaboração da EPS nos seus respectivos municípios, e/ou desenvolver, conjuntamente com a respectiva coordenadoria de saúde, instituições de ensino e municípios circunvizinhos, ações consorciadas de plano regionais de EPS.

A realidade a ser transformada inclui a reestruturação e reorganização dos serviços, buscar implementar as políticas de saúde na sua plenitude, desenvolver estratégias de atenção que incluam efetivamente a prevenção de doenças e agravos, assim como a promoção de saúde. Reconfigurar a gestão, com a estruturação, organização com ênfase na gestão de pessoas, no comprometimento de gestores e trabalhadores, na geração de mudanças em prol de uma sociedade mais justa e igualitária. A utilização da Educação Permanente em Saúde, portanto, é imperiosa para as práticas de gestão, atenção, formação, implementação de políticas públicas e controle social.

Embora um número significativo de entrevistados, considerando o atual contexto, aponta-se, como limitação do estudo, o fato de ser realizado somente em uma regional de saúde. Espera-se que, no futuro, os novos gestores possam adotar posturas diferenciadas, principalmente no que tange à aplicação adequada das estratégias de gestão e, de forma especial, à educação permanente em saúde. O estudo, ora apresentado, suscita, desafia, e nos mobiliza a elaboração de novas pesquisas de aprofundamento temático.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    25 Set 2015
  • Aceito
    14 Fev 2017
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