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Debriefing na simulação clínica em enfermagem: uma análise a partir da teoria da aprendizagem experiencial

RESUMO

Objetivo:

Compreender o significado do processo de debriefing realizado nas atividades de simulação clínica em um curso de enfermagem, a partir da Teoria da Aprendizagem Experiencial de Kolb.

Método:

Qualitativo do tipo estudo de caso, realizado num curso de enfermagem de uma Universidade do Sul do Brasil, de março a junho de 2018. Para a coleta de dados, utilizou-se a pesquisa documental, a entrevista baseada no Instrumento de Estilo de Aprendizagem de Kolb, com 29 participantes, e a observação direta de oito cenas de debriefing. Para análise, utilizaram-se as unidades integradas de análise obtidas a partir da construção de explanação.

Resultados:

Os dados documentais e o Inventário contribuíram para o entendimento da simulação clínica e o debriefing foi categorizado em quatro modos de aprendizagem.

Conclusão:

A simulação clínica como metodologia de aprendizagem experiencial relaciona a experiência, a percepção, a cognição e o comportamento com elementos identificados no debriefing pelos estudantes.

Palavras-chave:
Enfermagem; Simulação; Equipamentos e provisões; Aprendizagem; Aprendizagem baseada em problemas; Educação em enfermagem

ABSTRACT

Objective:

To understand the meaning of the debriefing process performed in clinical simulation activities in a nursing course, based on Kolb's Theory of Experiential Learning.

Method:

Qualitative, case study type, carried out in a nursing course at a University in southern Brazil, from March to June 2018. For data collection, documentary research was used, the interview based on Kolb’s Leaning Style Instrument, with 29 participants and direct observation of eight debriefing scenes. For analysis, the integrated units of analysis obtained from the construction of explanation were used.

Results:

Documentary data and the Inventory contributed to the understanding of clinical simulation and debriefing was categorized into four learning modes.

Conclusion:

Clinical simulation as an experiential learning methodology relates experience, perception, cognition and behavior with elements identified in the debriefing by students.

Keywords:
Nursing; Simulation technique; Equipment and supplies; Learning; Problem-based learning; Education, nursing

RESUMEN

Objetivo:

Comprender el significado del proceso de debriefing realizado en actividades de simulación clínica en un curso de enfermería, basado en la Teoría del Aprendizaje Experiencial de Kolb.

Método:

Cualitativo, tipo estudio de caso, realizado en un curso de enfermería en una Universidad del sur de Brasil, de marzo a junio de 2018. Para la recolección de datos se utilizó la investigación documental, la entrevista basada en el Instrumento de Estilo de Aprendizaje de Kolb, con 29 participantes. y observación directa de ocho escenas de interrogatorio. Para el análisis se utilizaron las unidades integradas de análisis obtenidas de la construcción de la explicación.

Resultados:

Los datos documentales y el Inventario contribuyeron a la comprensión de la simulación clínica y el debriefing se clasificó en cuatro modos de aprendizaje.

Conclusión:

La simulación clínica como metodología de aprendizaje experiencial relaciona la experiencia, la percepción, la cognición y el comportamiento con elementos identificados en el debriefing por los estudiantes.

Palabras clave:
Enfermería; Simulación; Equipos y suministros; Aprendizaje; Aprendizaje basado en problemas; Educación en enfermería

INTRODUÇÃO

A Teoria da Aprendizagem Experiencial consiste em um conjunto de aprendizagens relacionadas ao desenvolvimento profissional dos indivíduos11. Kolb DA. Experiential learning. New Jersey: Prentice Hall; 1984.. A profissionalidade é um percurso permanente de aprendizagem, do qual as pessoas vão se apropriando e evoluindo a partir de suas experiências relacionadas com a atuação profissional. A teoria está construída a partir da investigação em dois principais aspectos: as modalidades de aprendizagem e o desenvolvimento dos processos afetivos, perceptivos, cognitivos e comportamentais presentes ao longo do percurso profissional22. Ruoff AB, Kahl C, Oliveira SN, Melo LV, Andrade SR, Prado ML. Experiential learning and knowledge creation: applications in nursing. Rev Min Enferm. 2016;20:e986. doi: https://doi.org/10.5935/1415-2762.20160056
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A perspectiva holística e integrativa da aprendizagem experiencial se aproxima das tendências contemporâneas que destacam as contribuições do pensamento reflexivo com ênfase na qualidade da formação22. Ruoff AB, Kahl C, Oliveira SN, Melo LV, Andrade SR, Prado ML. Experiential learning and knowledge creation: applications in nursing. Rev Min Enferm. 2016;20:e986. doi: https://doi.org/10.5935/1415-2762.20160056
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. Contudo, a acepção Kolbiana segue um caminho próprio, original, com grande potencial de aplicação para estudos e propostas formativas no campo do desenvolvimento profissional11. Kolb DA. Experiential learning. New Jersey: Prentice Hall; 1984., como no caso de atividades que envolvam a simulação clínica para os estudantes de enfermagem.

Estudos destacam que a teoria da aprendizagem experiencial de Kolb pode atingir os objetivos de aprendizagem e fundamentar teoricamente o desenvolvimento e o uso da estratégia da simulação clínica na educação em enfermagem33. Amod HB, Brysiewicz P. Promoting experiential learning through the use of high-fidelity human patient simulators in midwifery: a qualitative study. Curationis. 2019;42(1):a1882. doi: https://doi.org/10.4102/curationis.v42i1.1882
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-44. Kolb AY, Kolb DA. Experiential learning theory as a guide for experiential educators in higher education. Exp Learn Teach High Educ. 2017 [cited 2021 Mar 25];1(1):7-44. Available from: https://nsuworks.nova.edu/elthe/vol1/iss1/7
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A simulação clínica é uma metodologia de ensino-aprendizagem que possui resultados positivos no que se refere ao aprendizado da prática clínica, identificando a valorização da aprendizagem ativa em decorrência da aproximação à realidade assistencial55. Garner SL, Killingsworth E, Bradshaw M, Raj L, Jhonson SR, Abijah SP, et al. The impact of simulation education on self-efficacy towards teaching for nurse educators. Int Nurs Rev. 2018;65(4):586-95. doi: https://doi.org/10.1111/inr.12455
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. Por meio das vivências de cenários de simulação, os estudantes são incentivados a refletir sobre seus conhecimentos e suas experiências, tendo em vista que o processo de aprendizagem inclui, além da realização da simulação, o momento destinado à devolutiva da qualidade das ações executadas pelos estudantes.

O debriefing é considerado o ponto central de aprendizagem do processo de simulação, desenvolvido para gerar sinergias, encorajar o pensamento crítico, criativo e reflexivo dos estudantes66. Bryant K, Aebersold ML, Jeffries PR, Kardong-Edgren S. Innovations in simulation: nursing leaders’ exchange of best practices. Clin Simul Nurs. 2020;41:33-40.E1. doi: https://doi.org/10.1016/j.ecns.2019.09.002
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. É definido como o momento no qual se realiza uma análise reflexiva sobre o que foi vivenciado durante a realização das atividades no cenário de simulação, bem como a descoberta do que de fato foi aprendido. Constitui-se numa estratégia relevante e eficaz para a construção do aprendizado após a vivência de experiências reais55. Garner SL, Killingsworth E, Bradshaw M, Raj L, Jhonson SR, Abijah SP, et al. The impact of simulation education on self-efficacy towards teaching for nurse educators. Int Nurs Rev. 2018;65(4):586-95. doi: https://doi.org/10.1111/inr.12455
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Nessa etapa da simulação, os estudantes expressam seus pensamentos, sentimentos, falam suas dúvidas, incertezas e limitações em sua capacidade de agir, autoavaliar suas ações, decisões, comunicações e atitudes, e assim aprendem com as próprias experiências e com a de seus colegas77. Boostel R, Felix JVC, Bortolato-Major C, Pedrolo E, Vayego SA, Mantovani MF. Stress of nursing students in clinical simulation: a randomized clinical trial. Rev Bras Enferm. 2018;71(3):967-74. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0187
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. Estudos indicam que esse processo de análise das ações qualifica a atividade simulada e é um recurso extremamente importante66. Bryant K, Aebersold ML, Jeffries PR, Kardong-Edgren S. Innovations in simulation: nursing leaders’ exchange of best practices. Clin Simul Nurs. 2020;41:33-40.E1. doi: https://doi.org/10.1016/j.ecns.2019.09.002
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-88. Góes FSN, Jackman D. Development of an instructor guide tool: “three stages of holistic debriefing”. Rev Latino-Am Enfermagem. 2020;28:e3229. doi: http://doi.org/10.1590/1518-8345.3089.3229
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, tendo em vista que envolve a discussão e a reflexão orientadas pelos objetivos dos cenários55. Garner SL, Killingsworth E, Bradshaw M, Raj L, Jhonson SR, Abijah SP, et al. The impact of simulation education on self-efficacy towards teaching for nurse educators. Int Nurs Rev. 2018;65(4):586-95. doi: https://doi.org/10.1111/inr.12455
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e estes vão ao encontro das competências e habilidades estabelecidas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais de Enfermagem (DCN) do Conselho Nacional de Educação (CNE)99. Ministério da Saúde (BR), Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 573, de 31 de janeiro de 2018. Diário Oficial União. 2018 nov 6 [cited 2021 Mar 25];155(213 Seção 1):38-42. Available from: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=06/11/2018&jornal=515&pagina=38&totalArquivos=83
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Considerando a relevância da simulação clínica para a construção do conhecimento de modo crítico-reflexivo no âmbito das práticas de ensino com ênfase na experiência dos indivíduos, este estudo tem por objetivo compreender o significado do processo de debriefing realizado nas atividades de simulação clínica de um curso de graduação em enfermagem, a partir da Teoria da Aprendizagem Experiencial proposto por David A. Kolb11. Kolb DA. Experiential learning. New Jersey: Prentice Hall; 1984..

A relevância e justificativa deste estudo está alicerçada na importância da simulação clínica como estratégia de ensino-aprendizagem que permite aos estudantes vivenciarem situações não complexas ou complexas em ambientes controlados e seguros antes da experiência prática em ambiente real. Esta deve ser orientada por modelos teóricos que direcionem o facilitador no planejamento, na implementação e na avaliação das atividades.

Na enfermagem, o modelo mais utilizado é da National League Nursing/ Jeffries Simulation Theory, que preconiza a realização da simulação, observando-se os seguintes critérios: objetivos, fidelidade, solução de problemas, apoio ao estudante e debriefing66. Bryant K, Aebersold ML, Jeffries PR, Kardong-Edgren S. Innovations in simulation: nursing leaders’ exchange of best practices. Clin Simul Nurs. 2020;41:33-40.E1. doi: https://doi.org/10.1016/j.ecns.2019.09.002
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-1010. Cowperthwait A. NLN/Jeffries simulation framework for simulated participant methodology. Clin Simul Nurs. 2020;42:12-21. doi: https://doi.org/10.1016/j.ecns.2019.12.009
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Todos os critérios do planejamento da simulação são importantes; entretanto, a revisão das ações tomadas na cena simulada é considerado o componente central dessa estratégia88. Góes FSN, Jackman D. Development of an instructor guide tool: “three stages of holistic debriefing”. Rev Latino-Am Enfermagem. 2020;28:e3229. doi: http://doi.org/10.1590/1518-8345.3089.3229
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. Ele deve ser conduzido baseado nos objetivos de aprendizagem estabelecidos antes da execução do cenário simulado, a fim de encorajar o pensamento crítico, criativo e reflexivo dos estudantes1111. Beroz, S. A statewide survey of simulation practices using NCSBN simulation guidelines. Clin Simul Nurs. 2017;13(6): 270-7. doi: http://doi.org/10.1016/j.ecns.2017.03.005
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MÉTODO

Trata-se de um estudo de caso único com duas Unidades Integradas de Análise (UIA), explanatório e descritivo, de abordagem qualitativa1212. Polit DF, Beck CT. Fundamentos de pesquisa em enfermagem. 9. ed. Porto Alegre: Grupo A, 2019.. A construção e a produção deste artigo foram realizadas com base no Consolidated criteria for reporting qualitative research1313. Tong A, Sainsbury P, Craig J. Consolidated criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ): a 32- item checklist for interviews and focus group. Int J Qual Heal Care. 2007;19(6):349-57. doi: https://doi.org/10.1093/intqhc/mzm042
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. O estudo de caso possibilitou apreender os aspectos envolvidos na interação com os estudantes, contemplando o objeto do estudo e possibilitando contato direto com os sujeitos e seus significados.

Visando ao aprofundamento da análise dos significados atribuídos pelos participantes, optamos por uma abordagem qualitativa que assegurasse o desvelar dos significados do processo de debriefing obtidos por meio das atividades de simulação clínica em um curso de graduação em Enfermagem, a partir da Teoria da Aprendizagem Experiencial de David A. Kolb.

O significado tem um papel central tanto no processo social, quanto inerente ao objeto. O ser humano atribui ideias ou conceitos que as outras pessoas têm em relação a ele e ao objeto, surgindo o significado como produto da vida social, ou seja, da interação com outros seres humanos.

O contexto da pesquisa foi o Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). O estudo de caso foi a Simulação Clínica e as Unidades Integradas de Análises (UIA) consistiram em duas disciplinas do Curso.

A obtenção das informações ocorreu entre os meses de março e junho de 2018. Para obter as informações, foi utilizada a técnica de triangulação na etapa de coleta, a partir de três fontes de evidência: análise documental do Projeto Pedagógico do Curso (PPC), do Planos de Ensino (PE) e Planos de Aula (PA) das UIA; entrevista de levantamento de informações com o Instrumento de Estilo de Aprendizagem e observação direta da simulação.

Para organizar e analisar os dados coletados, atribuímos nomes fictícios usando a letra D e um número de 1 a 8 para as cenas de debriefing; não numeramos os participantes e sim as cenas, por se trata de um caso no qual o objetivo do estudo foi encontrar, nessa etapa da simulação, a busca dos significados manifestados nos achados e, dessa forma, escolhemos a técnica da análise de construção de explanação.

Iniciou-se a coleta com a análise documental, contatando-se o coordenador do curso, a fim de solicitar autorização para a realização da pesquisa. Foi disponibilizado o Projeto Pedagógico do Curso e os planos de ensino das disciplinas e, após a análise, identificaram-se quatro fases (semestres) do curso em que a simulação clínica é utilizada. Como critério de inclusão dos documentos, foram considerados os planos de ensino das disciplinas específicas da enfermagem com foco na assistência clínica. Como critério de exclusão, foram utilizadas as disciplinas que propunham como metodologia apenas uma abordagem teórica ou que utilizavam a simulação sem a etapa do debriefing.

Após, foram contatados os docentes das fases selecionadas; na ocasião, explicou-se o objetivo da pesquisa e solicitou-se acesso aos planos de aula para análise. Foram selecionadas duas disciplinas, correspondendo ao eixo fundamental, intituladas: “O cuidado no processo de Viver Humano II - a condição cirúrgica”, da quinta fase do curso, representando, a Unidade Integrada de Análise 1 (UIA 1); e a disciplina: “O cuidado no processo de Viver Humano V - atenção básica e saúde mental”, da sétima fase do curso, sendo esta a Unidade Integrada de Análise 2 (UIA 2) do caso estudado. As demais fases, quarta e sexta, foram excluídas da pesquisa, pois não aconteciam no prazo da coleta de dados estabelecidos.

As informações dos dados documentais foram coletadas a partir de um instrumento previamente elaborado e testado pela equipe de pesquisa. O instrumento para análise dos documentos foi composto por ementa, objetivos e competências do PPC, dos planos de ensino e de aula.

Após essa etapa, foi solicitada autorização aos docentes, a fim de convidar os estudantes para participar da pesquisa. O convite foi realizado de forma presencial em sala de aula por um pesquisador membro da equipe, com titulação de especialista, apresentando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), após assinatura do termo procedeu-se à coleta de dados por meio do preenchimento do Inventário e da observação do debriefing, após a cena simulada. Após assinado o TCLE pelo participante, iniciou-se imediatamente a coleta de dados referentes ao Inventário e informou-se a data da observação.

A entrevista de levantamento de dados foi guiada pelo Instrumento de Estilo de Aprendizagem e foi respondido por 29 estudantes do curso de Graduação em Enfermagem, regularmente matriculados nas disciplinas elegíveis aos critérios de inclusão da pesquisa e que participaram das atividades de prática simulada. Os riscos da pesquisa foram relacionados à expressão de sentimentos e emoções de acordo com as vivências dos participantes; para isso foram salientados cuidados necessários e a possibilidade de desistência a qualquer momento da pesquisa. Os benefícios foram a divulgação do estudo no meio científico e a realização de uma oficina pedagógica com base nos resultados aos participantes do estudo. Participaram 11 estudantes da UIA 1 e 18 da UIA 2, das respectivas disciplinas e não houve desistências ou recusas dos participantes. Foram descartados três questionários por preenchimento incompleto.

O instrumento Inventário de Estilo de Aprendizagem utilizado neste estudo foi validado no Brasil em 20001414. McGuire M, Goldstein C, Claywell L, Patton R. Analysis of student reflections of experiential learning in nursing health policy courses. Nurse Educ. 2017;42(2):95-9. doi: https://doi.org/10.1097/NNE.0000000000000321
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, elaborado por David A. Kolb, em 1976, e revisado em 1985 e 1993, passando a ser composto de doze séries de palavras, permanecendo na ordenação crescente do grau 1 a 4 para cada terminação das letras A até D1515. Kolb DA. Learning-style inventory: self-scoring inventory and interpretation booklet. Boston: Hay McBer; 1993.. O Inventário mede o impacto dos quatro modos de aprendizagem nos estudantes que são parte de um ciclo. Após o preenchimento para obter o resultado, é necessário aplicar a fórmula representada na Figura 1, que resulta nos Estilos que são a Experiência Concreta, a Observação Reflexiva, a Conceituação Abstrata e a Experimentação Ativa.

Figura 1 -
Fórmula do Inventário de Estilo de Aprendizagem.

A observação direta pela pesquisadora foi realizada somente na etapa de debriefing, realizado na sala de videoconferência do Laboratório de Simulação, a partir da análise da gravação em vídeo. Foram observados oito grupos de estudantes, sendo três grupos da UIA 1, com três participantes na cena simulada e cinco grupos da UIA 2, com dois participantes em cada cena. O tempo médio de cada etapa foi de 20 a 30 minutos.

O registro das observações ocorreu em diário de campo, o qual não continha questões fechadas a serem respondidas, pontuavam-se as observações de acordo com a atuação dos estudantes na cena, observando-se os vídeos da cena simulada e os discursos dos estudantes. Os registros foram realizados por um pesquisador, membro da equipe, com titulação de especialista; as informações foram pertinentes à pesquisa que não haviam sido captadas pela análise documental e pelo preenchimento do Inventário.

Os documentos foram analisados a partir da ementa, objetivos, competências do Projeto Político Pedagógico (PPC), planos de ensino e de aula, redigidas em planilhas do Microsoft Word®. As anotações das observações foram feitas em tabelas no programa do Microsoft Word®, codificadas por D1, D2, D3, nas cenas realizadas pelos participantes da UIA 1, e D4 a D8, nas cenas dos participantes da UIA 2. Os dados do Inventário foram transcritos e submetidos à aplicação da fórmula1414. McGuire M, Goldstein C, Claywell L, Patton R. Analysis of student reflections of experiential learning in nursing health policy courses. Nurse Educ. 2017;42(2):95-9. doi: https://doi.org/10.1097/NNE.0000000000000321
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, no programa Microsoft Excel®, por uma analista de sistema. Para comprovar o resultado, realizou-se dupla conferência dos dados, com análise manual e digital do instrumento.

A apresentação dos dados ocorreu pelos seguintes códigos: Planos de Ensino (PE 01 e PE 02), Planos de Aula (PA 01 e PA 02), o Instrumento de Estilo de Aprendizagem por apresentação em Figura 2 dos Estilos: Experiência Concreta, Observação Reflexiva, Conceituação Abstrata e Experimentação Ativa e a Observação da etapa de debriefing (D1, D2, D3, D4, D5, D6, D7 e D8).

Os dados foram analisados de acordo com a estratégia analítica geral das proposições teóricas de Kolb nas quatro fases do processo de aprendizagem: o sentir, o pensar, o observar e o fazer; com isso, pretendeu-se comparar as descobertas da simulação clínica com a declaração teórica inicial sobre a aprendizagem experiencial de David A. Kolb, a fim de construir uma explicação final sobre esse processo1212. Polit DF, Beck CT. Fundamentos de pesquisa em enfermagem. 9. ed. Porto Alegre: Grupo A, 2019.. A construção dessa explicação ocorreu de forma narrativa, refletindo algumas proposições teoricamente significativas, sendo provavelmente o resultado de uma série de interações questionadas para este estudo: o curso propõe simulação clínica para a formação de enfermeiros? Existe um estilo predominante de aprendizagem nos estudantes de enfermagem? Como a aprendizagem experiencial ocorre na estratégia do debriefing da simulação clínica?

A proposição norteou a organização da análise, apontando condições relevantes a serem descritas a fim de buscar uma explicação para o fenômeno estudado, estipulando o conjunto de elos casuais do caso, que refletem os insights críticos ligados ao processo do caso1212. Polit DF, Beck CT. Fundamentos de pesquisa em enfermagem. 9. ed. Porto Alegre: Grupo A, 2019..

Este estudo foi apresentado ao Comitê de Ética em Pesquisa sob CAAE nº 84512418.1.0000.0121, e aprovado pelo parecer nº 2.675.941. Todos os participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), consentindo o preenchimento do instrumento e a observação na simulação clínica, em conformidade com a Resolução nº466/12.

RESULTADOS

A simulação clínica é uma estratégia de ensino-aprendizagem abordada no PPC e nos planos de ensino do caso, entendida como um elemento teórico-prático, com conteúdo desenvolvido em consonância com os planos de aula das disciplinas. Para as experiências de aprendizagem, utilizou-se a carga horária da disciplina teórico-prática, na qual buscou-se identificar, a partir da análise documental do projeto político pedagógico, a descrição para utilizar a estratégia da simulação clínica:

Para as experiências de aprendizagem que serão propiciadas e desenvolvidas durante a disciplina, dividiu-se em um núcleo teórico-prático central e um núcleo flexível [...]. As atividades teórico-práticas podem ser realizadas em Práticas de Laboratório - referem-se a atividades práticas em ambiente tecnologicamente preparado e sob orientação de um professor e monitor, destinadas ao desenvolvimento de técnicas, procedimentos, observação, simulação e treinamento que dão suporte e aprofundamento às atividades teóricas. (PE 1 e 2)

Outro fator que contribuiu para a prática da simulação no curso foi um Guia Metodológico para Simulação em Enfermagem.

“Este guia está apresentado com protocolos para as boas práticas de simulação para os casos de enfermagem, com informação de que o curso dispõe de sala especial equipada para videoconferência, utilizada em disciplinas que requerem essa tecnologia, possuindo televisão para a realização do debriefing das atividades realizadas nos laboratórios de simulação”. (PE 1 e 2)

Os planos de ensino das UIA1 e da UIA2 apresentam-se da mesma forma, contendo o conteúdo programático e as metodologias para as atividades teóricas. As atividades teórico-práticas foram apresentadas em ambos os planos por meio da estratégia de simulação clínica.

Os planos indicaram que as simulações foram de alta fidelidade e complexidade; as cenas ocorreram em espaços físicos com atuação para a postura profissional que simularam a realidade da melhor maneira possível. Na UIA 1, a atividade simulada aconteceu no Laboratório de Práticas Simuladas, em uma sala organizada com ambiente realístico de uma unidade de terapia intensiva. O caso simulado foi com manequim, representando um paciente com sintomas de hipotensão arterial e taquicardia, conectado ao monitor cardíaco, com batimentos cardíacos e respiratórios. A sala possuía materiais como máscaras, luvas, oxigenoterapia, cateter ventilatório e soroterapia, medicamentos para administração intravenosa.

Na UIA 2, a atividade ocorreu no laboratório de simulação da sala de atendimento, caracterizando um consultório de enfermagem no serviço de saúde, com um ator (estudante do curso de graduação em Artes Cênicas) assumindo o papel de paciente. O ator representou sintomas de ansiedade em diversas situações sociais de seu cotidiano, sudorese, dificuldades em realizar o trabalho de conclusão de curso e incertezas da escolha profissional.

Observou-se que a estratégia de aprendizagem da simulação clínica foi elaborada com base na avaliação de habilidades e competências:

Demonstrar habilidade para identificar as intercorrências e complicações apresentadas pelo paciente... Apresentar capacidade de priorizar os cuidados de enfermagem a serem desenvolvidos junto ao paciente [...]. Prestar cuidados de enfermagem para prevenir o agravamento do caso. (PA01)

Realizar o exame psíquico do paciente [...]. Fazer contatos com a família do paciente. Avaliar periodicamente as metas traçadas. (PA02)

Com relação ao Inventário, foram analisados um total de 26 instrumentos. A análise dos dados caracterizou o perfil dos estudantes, sendo 88% do sexo feminino e 12% do sexo masculino; 85% dos estudantes com faixa etária entre 20 e 30 anos e 15% com mais de 30 anos; 35% dos participantes estão na quinta fase do curso; e, na sétima fase, 65%.

O Inventário de Estilo de Aprendizagem de Kolb identificou os estilos de aprendizagem, nomeados por Kolb de Experiência Concreta (EC), Experimentação Ativa (EA), Conceituação Abstrata (CA) e Observação Reflexiva (OR).

A Observação Reflexiva foi o modo predominante dos estudantes do curso de enfermagem, seguida da Experimentação Ativa, da Conceituação Abstrata e, por último, da Experiência Concreta, conforme figura apresentada a seguir:

Figura 2 -
Estilo de Aprendizagem de Kolb dos estudantes respondentes do Inventário.

Os resultados da observação indicam a transição dos estudantes pelas quatro fases do processo de aprendizagem:

Experiência Concreta, em que o estudante aprende por meio dos sentimentos e do uso dos sentidos:

Me senti ansiosa com a ansiedade do paciente, tenho que saber conduzir [...]. Tenho que fazer uma consulta rápida e efetiva. (D7)

Importância do caso do paciente, como pensar nele, o que ele considera importante, vínculo com o paciente, empoderar o paciente sobre suas escolhas (estratégia de atuação). Me senti importante em assumir o ser enfermeira. (D5)

Estou com os mesmos sintomas do paciente, estou com as mãos molhadas iguais às da paciente, sinto as mesmas coisas. (D6)

Eu me senti segura ao trabalhar com o colega, fiquei feliz ao ver o colega assumindo-se como enfermeira. (D4)

Eu tive atenção ao me dirigir ao paciente; questionamos o paciente perguntado por que ele escolheu a profissão; queremos entender o porquê ele estava trabalhando no TCC e a namorando; importância do tratamento e do acolhimento ao paciente. (D4)

Conceituação abstrata, em que o estudante aprende por meio de ideias, criando esquemas e interpretações abstratas:

Explicamos para o paciente onde ele estava, situamos e localizamos o paciente, avaliamos o curativo. Conversamos com o paciente, explicamos a ele o que iríamos executar. Se PA baixa - instalar um ringer lactado [...]. Elevar a cabeceira: tem motivo? Pelo caso clínico, não devemos. Avaliamos as pupilas [...]. Nos organizamos para realizar as tarefas, estávamos em sincronia [...]. Conseguimos pensar no que fazer, avaliamos o paciente e fizemos. (D3)

Senti dificuldade, o que tenho na teoria, não consegui colocar na prática, me senti limitada [...]. A importância de relacionar teoria com a prática [...]. Precisamos estudar mais, sinto falta mais de prática do que teoria, queria realizar novamente a cena. (D6)

Observação Reflexiva, diz respeito ao estudante que aprende observando e refletindo:

Fiquei observando-o, se ele estava prestando atenção no que eu estava falando... paciente agitado, não tem olhar fixo, apresenta dificuldade de prestar atenção, ficava mexendo os pés e as mãos [...]. Nós observávamos, mas não conseguia avaliar [...]. É meio subconsciente; observava o que ele falava junto, eu observava como ele agia; linguagem corporal e verbal. (D7)

Não sabia o que fazer, fiquei observando o paciente, a forma dele agir. (D8)

Experimentação Ativa, em que o estudante atua especificamente nas situações, a fim de influenciar e modificar:

Eu sugeri para ele fazer caminhadas por questão de dinheiro, precisamos sugerir o que o paciente pode fazer [...]. Foi um ganho relacionar prática e teoria e a simulação [...]. Essa vez eu fiz o que tinha que fazer, consegui falar ao paciente o mais importante no momento da simulação [...]. (D8)

Ficamos pensando o que iremos fazer em campo de estágio, relacionando com o que fizemos na simulação[...] eu consigo me imaginar na atuação profissional [...]. (D4)

DISCUSSÃO

O curso de enfermagem está alicerçado em tendências pedagógicas atuais da educação, pautadas na inovação, no senso crítico e na reflexão, que configuram o currículo com metodologias ativas, que atendem às competências e às habilidades preconizadas pelas Diretrizes Curriculares Nacionais do Conselho Nacional de Educação99. Ministério da Saúde (BR), Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 573, de 31 de janeiro de 2018. Diário Oficial União. 2018 nov 6 [cited 2021 Mar 25];155(213 Seção 1):38-42. Available from: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=06/11/2018&jornal=515&pagina=38&totalArquivos=83
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O laboratório de atividades práticas, apresentado no projeto político pedagógico, está descrito como um ambiente apropriado, com infraestrutura e planejado estrategicamente para abordar a metodologia da simulação clínica, cabendo aos docentes, em seus planos de aula, fazer uso da proposta.

Para isso, os planos de aula das disciplinas do caso apoiavam-se nesta metodologia, com objetivos, fidelidade do cenário, solução de problemas, briefing e debriefing, conforme configurado no modelo mais utilizado da National League Nursing/Jeffries Simulation Theory1010. Cowperthwait A. NLN/Jeffries simulation framework for simulated participant methodology. Clin Simul Nurs. 2020;42:12-21. doi: https://doi.org/10.1016/j.ecns.2019.12.009
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para a estratégia da simulação clínica.

Compreende-se que o curso adota metodologias ativas, que promovem a constituição do processo de reflexão e de crítica, a partir das competências e habilidades eleitas para a realidade na qual está inserido. Ao construir o significado dos conteúdos aprendidos, relacionando a aprendizagem aos contextos e práticas, proporciona que o estudante seja ativo e colaborativo nos processos experienciais, com comprometimento frente a situações vivenciadas1616. Lima VV. Constructivist spiral: an active learning methodology. Interface. 2017;21(61):421-34. doi: http://doi.org/10.1590/1807-57622016.0316
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Dessa forma, a simulação clínica, já conceituada como estratégia de ensino-aprendizagem, complementa-se em uma metodologia ativa, por estimular a participação ativa e reflexiva do estudante em um ambiente de aprendizagem; e por tratar-se de uma tecnologia complementada por modernos manequins anatômicos, cada vez mais sofisticados, que conseguem e permitem reproduzir funções vitais do ser humano, além de desenvolver cenários clínicos complexos com cena gravada.

Caracteriza-se também como um recurso pedagógico, por apresentar alternativas viáveis para alcançar a autonomia e o estímulo da curiosidade dos estudantes, proporcionando a formação de um ser íntegro, crítico, proativo, inovador e humanizado, contribuindo também para o desenvolvimento do pensamento crítico dos estudantes com vistas à tomada de decisão clínica acurada dos futuros enfermeiros1717. Riegel F, Crossetti MGO. A theoretical model to measure holistic critical thinking in the teaching of diagnosis process in nursing. Rev Pensam Actual; 2020;20(34):128-38. doi: https://doi.org/10.15517/PA.V20I34.41880
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. E, por último, possibilita uma aprendizagem experiencial, em que o estudante aprende pela experiência, praticando para entender, para refletir sobre a ação e sobre o próprio processo de aprendizagem.

Nesse sentido, a aprendizagem experiencial contribui para a constante transformação da educação, influenciada pelo contexto social do indivíduo, que é capaz de criar e recriar o seu próprio conhecimento por meio da experiência. Em determinado estudo da revisão integrativa1818. Bresolin P, Martini JG, Lazzari DD, Galindo IS, Rodrigues J, Barbosa MHPA. Experiential learning and national curriculum guidelines for nursing undergraduate courses: integrative review of the literature. Cogitare Enferm. 2019;24:e59024. doi: http://doi.org/10.5380/ce.v24i0.59024
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, evidencia-se a simulação como a estratégia de aprendizagem mais citada, capaz de possibilitar a vivência de experiências de forma segura e pedagogicamente planejada.

A aprendizagem experiencial parte da premissa de que todo desenvolvimento profissional prospectivo resulta da aprendizagem atual, assim como o conhecimento já constituído é imprescindível para o aprendizado22. Ruoff AB, Kahl C, Oliveira SN, Melo LV, Andrade SR, Prado ML. Experiential learning and knowledge creation: applications in nursing. Rev Min Enferm. 2016;20:e986. doi: https://doi.org/10.5935/1415-2762.20160056
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. É a partir desse pensamento que a simulação clínica se faz presente para integrar a Teoria Kolbiana11. Kolb DA. Experiential learning. New Jersey: Prentice Hall; 1984.. A aprendizagem experiencial acontece por meio da metodologia da simulação clínica, pois ao realizar o briefing, o estudante adquire conhecimento interno, no momento da cena; aprende pelas circunstâncias externas do ambiente, sendo necessária uma ação; já no debriefing, o estudante reflete sobre o que ocorreu durante a realização da simulação. Assim, para apropriar-se dos saberes procedentes da experiência, demanda processos contínuos de ação e reflexão1919. Oliveira SN, Massaroli A, Martini JG, Rodrigues J. From theory to practice, operating the clinical simulation in nursing teaching. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 4):1791-8. doi: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0180
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É pela espiral entre ação e a reflexão consciente sobre as experiências, a fim de transformá-las em aprendizagens e passíveis de replicação, que o ciclo da aprendizagem experiencial de Kolb integra os quatro modelos adaptativos de aprendizagem, sendo a experiência concreta, a conceituação abstrata, a observação reflexiva e a experimentação ativa11. Kolb DA. Experiential learning. New Jersey: Prentice Hall; 1984..

Os dados referentes ao Inventário de Kolb apresentaram a observação reflexiva como o estilo com maior escolha pelos estudantes, seguido da experimentação ativa e da conceituação abstrata. A experiência concreta foi a última pontuada.

Os resultados são diferentes entre as UIAs; na quinta fase, a experiência concreta não obteve resultado, enquanto na sétima fase foi opção de um dos participantes, classificando-se como última escolha. A observação reflexiva ficou em primeira posição em ambas as fases do curso, pontuando quatro estudantes na quinta e oito na sétima fase. Em segunda posição, a experimentação ativa foi a escolha de três estudantes da quinta fase e seis da sétima. E, na terceira posição, o resultado foi a conceituação abstrata, escolhida por dois participantes em cada uma das fases.

Indiferente a pontuação que cada estilo recebeu, interessante é a disponibilidade dos estilos na estratégia, a fim de possibilitar um maior alcance dos diferentes perfis e características de aprendizagem dos estudantes. Portanto, é no conjunto dos modos de ensino que a estratégia da simulação clínica se destaca, proporcionando ao estudante novas possibilidades de aprendizagem, não interessando quantas vezes cada modo foi escolhido, e sim que todos os indivíduos possam ser beneficiados de acordo com o seu modo na mesma estratégia ofertada.

Entende-se que os indivíduos possuem diferentes formas de aprender e essas diferenças são o reflexo do equipamento hereditário do ser humano, de suas expectativas de vida particulares, das exigências do ambiente atual; a partir delas, os estudantes puderam escolher o melhor modo entre as quatro estruturas que propõe o Inventário de Estilos de Aprendizagem de Kolb, afirmando assim que a escolha é individual2020. Kolb AY, Kolb DA. learning styles and learning spaces: enhancing experiential learning in higher education. Acad Manag Learn Educ. 2005;4(2):193-212. doi: http://doi.org/10.5465/AMLE.2005.17268566
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. Salienta-se que o conteúdo ao qual os estudantes são submetidos e a estratégia utilizada pode gerar influência no tipo de aprendizagem produzida.

Faz-se importante destacar a ligação entre os Estilos de Aprendizagem identificados no Inventário e a Teoria da Aprendizagem Experiencial proposto pelo autor em seu ciclo, pois, no Inventário, o estudante identifica o modo adequado à sua aprendizagem e a teoria explica como a aprendizagem está alicerçada ciclicamente nesses modos identificados pelo Inventário. Entende-se que a estratégia deve estar pautada em uma experiência, para que o estudante seja confrontado com todos os modos de aprendizagens, formando um ciclo de interação, a fim de que cada nova informação seja experimentada, observada, refletida e conceituada.

Dessa maneira, a experiência concreta vivenciada pelo estudante provoca um sentimento, que gera uma observação reflexiva, envolvendo o ato consciente de observar, para então pensar, que é denominado conceituação abstrata da teoria, e em seguida obtém a experimentação ativa, que é propriamente o fazer2020. Kolb AY, Kolb DA. learning styles and learning spaces: enhancing experiential learning in higher education. Acad Manag Learn Educ. 2005;4(2):193-212. doi: http://doi.org/10.5465/AMLE.2005.17268566
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. A partir de então, o aprendizado gerado na etapa final da simulação é impulsionado pela experiência na simulação clínica, podendo ser evidenciado e classificado nos resultados da observação.

Na etapa experiência concreta, a aprendizagem ocorre por meio de experiências específicas, relacionadas a outras pessoas e sendo sensível a sentimentos e pessoas11. Kolb DA. Experiential learning. New Jersey: Prentice Hall; 1984.. Os resultados da observação demonstram exatamente esses pressupostos: os estudantes expressam-se por sentimentos, como ansiedade, o mais citado, presente no estudante e no paciente da cena simulada. A segurança foi gerada na cena ao interagir com o colega, bem como com a satisfação ao percebê-lo no papel de enfermeiro. Evidenciou-se também a intenção de acolher o paciente, estabelecer vínculo e empoderamento, sentimentos indispensáveis para os profissionais da enfermagem.

Nessa etapa, foi possível identificar de maneira evidente a sensação de pertencimento das estudantes quando se assumem enfermeiras na cena simulada, observando total envolvimento e abertura, conferindo sentido e significado ao processo de formação. Complementa-se que, nessa etapa, o objetivo foi apresentar aos estudantes amostras de objetos, artefatos, processos de comportamento ou fenômenos encontrados na prática; com isso, acredita-se que a simulação de alta fidelidade, com cenários, objetos e caso clínico real sensibilizaram os estudantes em cena77. Boostel R, Felix JVC, Bortolato-Major C, Pedrolo E, Vayego SA, Mantovani MF. Stress of nursing students in clinical simulation: a randomized clinical trial. Rev Bras Enferm. 2018;71(3):967-74. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0187
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Na etapa experimentação ativa, os indivíduos aprendem mostrando a capacidade de realizar tarefas, assumindo riscos e influenciando pessoas e eventos por meio de ações1616. Lima VV. Constructivist spiral: an active learning methodology. Interface. 2017;21(61):421-34. doi: http://doi.org/10.1590/1807-57622016.0316
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. Nessa etapa, ocorre a aplicação do que foi aprendido, os estudantes relacionaram a prática com a teoria e o fazer propriamente na cena, o que exigiu a tomada de decisão e a resolução do problema, à medida que foram confrontados na cena simulada.

Na etapa conceituação abstrata, a aprendizagem ocorre por meio da análise lógica de ideias, planejamento sistemático e ação sobre uma compreensão intelectual da situação1616. Lima VV. Constructivist spiral: an active learning methodology. Interface. 2017;21(61):421-34. doi: http://doi.org/10.1590/1807-57622016.0316
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. Essa etapa ocorreu quando o estudante desempenhou um papel mais ativo no processo de aprendizagem, explicando ao paciente a forma e os motivos de agir daquela maneira, apresentando um raciocínio lógico no momento da cena. A partir disso, conseguiram integrar-se e criaram conceitos diante das observações.

Em outra cena, um estudante relatou sentir dificuldade para colocar em prática o que há conceituado na teoria, evidenciando a dificuldade de compreender e analisar o ambiente em que estava inserido, relatando também a vontade de realizar a cena novamente. Nesse contexto, a simulação clínica oferece o benefício de replicar a atividade simulada quantas vezes for necessário1919. Oliveira SN, Massaroli A, Martini JG, Rodrigues J. From theory to practice, operating the clinical simulation in nursing teaching. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 4):1791-8. doi: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0180
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Por último, na etapa observação reflexiva, o aprendizado acontece observando-se cuidadosamente antes de fazer julgamentos, visualizando questões de diferentes perspectivas e procurando o significado das coisas1616. Lima VV. Constructivist spiral: an active learning methodology. Interface. 2017;21(61):421-34. doi: http://doi.org/10.1590/1807-57622016.0316
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. Evidenciada na cena simulada, a observação reflexiva ocorre quando o estudante relata ter observado o paciente em todos os seus aspectos, expressando a palavra subconsciente, expondo o que tinha em mente, mas não estava ao alcance imediato da consciência, ou seja, observou para após ser capaz de refletir.

As observações das cenas simuladas permitem afirmar que a simulação proporcionou aos estudantes a possibilidade de aprendizagem por meio dos quatros modos do ciclo. E, em diversas observações afirmadas por Kolb, possibilitou-se aos estudantes sentir, observar, pensar e fazer concomitantemente em resposta ao processo de aprendizado.

A teoria da aprendizagem experiencial de Kolb e a simulação clínica se aproximam pela característica do pensamento reflexivo que ambas possuem em seus pressupostos metodológicos. As duas defendem que a aprendizagem é alcançada a partir da experiência e da experimentação deve sempre ser seguida de um espaço para reflexão, e isso é fornecido na última etapa da simulação.

Neste encadeamento, o argumento central é que os estudantes promovem reflexão pós-ação na busca de compreender o que ocorreu e as razões, além da forma que aprenderam e construíram conhecimento para replicar em situações da vida real. O avanço desse conhecimento solidificou a influência do debriefing na estratégia da simulação clínica66. Bryant K, Aebersold ML, Jeffries PR, Kardong-Edgren S. Innovations in simulation: nursing leaders’ exchange of best practices. Clin Simul Nurs. 2020;41:33-40.E1. doi: https://doi.org/10.1016/j.ecns.2019.09.002
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-88. Góes FSN, Jackman D. Development of an instructor guide tool: “three stages of holistic debriefing”. Rev Latino-Am Enfermagem. 2020;28:e3229. doi: http://doi.org/10.1590/1518-8345.3089.3229
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Há de se considerar que as estratégias de ensino-aprendizagem não devem ser compreendidas como mutuamente excludentes; advoga-se em favor da simulação clínica em todas as etapas, pois se considera que o momento da reflexão colaborou para uma aprendizagem experiencial e que os estudantes obtiveram aprendizado individual e coletivo durante o processo. Essa condução na estratégia direciona para o conhecimento, sendo as informações adaptadas conforme a necessidade de cada indivíduo que aprende, para finalmente ocorrer a formulação ou a reformulação da experiência, valorizando a interação vivencial com a experiência e com as sensações geradas em si e no meio ambiente, com conceitos e experiências do outro.

CONCLUSÃO

O Estudo de Caso evidenciou a simulação clínica como uma metodologia de aprendizagem experiencial, por estar relacionada à experiência, à percepção, à cognição e ao comportamento. Tais elementos foram identificados no debriefing pelos estudantes por quatro modos de aprender, os quais representam o sentir, o pensar, o observar e o fazer, pautados na explicação das proposições de Kolb. A estratégia de ensino-aprendizagem da simulação clínica reflete na criatividade do pensar e na necessidade do fazer, em relações complementares com o observar e o sentir dos estudantes de enfermagem.

Essa etapa da simulação é uma experiência em simulação na qual se realiza uma análise ou reflexão guiada pelo facilitador, que fomenta a autoavaliação, o aprendizado reflexivo e significativo, a reflexão sobre a experiência vivida, a discussão sobre os objetivos da aprendizagem, o reforço das boas práticas, o aprendizado sobre os erros, o fortalecimento da tomada de decisões e o trabalho em equipe.

Portanto, deverá ser um momento de descoberta, de aprendizagem compartilhada entre o discente e o facilitador. Deve ir além da avaliação, com o intuito de garantir segurança, confiança e estímulo durante todo o processo de aprendizagem.

Nas limitações deste estudo, evidencia-se a ausência de investigação da temática com o corpo docente, o que poderia trazer mais detalhes e oferecer maior compreensão sobre o fenômeno em questão. Além disso, a ausência de um guia elaborado com elementos da aprendizagem experiencial para orientar o debriefing dificultou o estabelecimento de padrões de análise com relação às atividades realizadas após a prática simulada

Como contribuições, destaca-se a possibilidade de refletir sobre a importância das etapas da simulação clínica para ensinar e aprender a aprender, no nível abstrato do ciclo da aprendizagem experiencial de Kolb, em que a dinâmica do debriefing contribuiu para o questionamento por parte dos estudantes sobre os motivos e os modos como tomaram suas decisões no contexto da prática clínica, bem como, identificou as fortalezas num espaço de autorreflexão dos processos percorridos nos quatro ciclos de aprendizagem.

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  • Fomento/ Agradecimento:

    Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior PROEX/CAPES.

Editado por

Editor associado:

Dagmar Elaine Kaiser

Editor-chefe:

Maria da Graça Oliveira Crossetti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    28 Mar 2021
  • Aceito
    09 Fev 2022
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