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Pseudopuberdade Precoce Causada Por Tumor de Células da Granulosa Juvenil

Pseudo-precocious Puberty Due to a Juvenile Granulosa Cell Tumor

Resumos

Descrevemos um caso de tumor ovariano das células da granulosa cuja manifestação inicial foi puberdade precoce isossexual, em criança de 7 anos e 4 meses, de evolução progressiva e rápida, associada a massa hipogástrica palpável. A avaliação hormonal demonstrou estradiol: 296pg/ml; 17alfaOH-progesterona: 20ng/ml; S-DHEA: 27µg/dl; betahCG: 0,66mUI/ml; testosterona: 120ng/dl; progesterona: 3,4ng/ml; LH: 0,5mUI/ml; e FSH: 0,01mUI/ml e não responsivos ao estímulo com o GnRH, (Relisorm®: 100µg iv). Exames de imagem confirmaram massa tumoral em ovário esquerdo. A paciente foi submetida à salpingo-ooforectomia esquerda com retirada completa do tumor que pesou 656g e mediu 14,5 x 10,0 x 7,0cm, restrito ao ovário e cujo exame histopatológico demonstrou tumor de células da granulosa juvenil. Durante a cirurgia amostras sangüíneas foram obtidas da veia ovariana ipsilateral ao tumor e as concentrações de esteróides foram estudadas. Níveis elevados de estradiol (969pg/ml), progesterona (15,8ng/ml), 17alfaOH-progesterona (34ng/ml) e testosterona (158ng/dl) foram encontrados. No pós-operatório observou-se rápida regressão das mamas, dos pêlos pubianos, com normalização das concentrações hormonais. Durante o seguimento, a paciente apresentou desenvolvimento puberal normal, e não há sinais de reincidência do tumor.

Pseudopuberdade precoce; Tumor ovariano; Tumor de células da granulosa; Tratamento; Evolução


We report a case of juvenile granulosa cell tumor of the ovary in a 7.4 years old girl, who presented isosexual pseudo-precocious puberty of progressive outcome and palpable hypogastric mass. Hormonal measurements showed: oestradiol: 296pg/ml; 17-alpha-OH-progesterone: 20ng/ml; DHEAS: 27µg/dl; betahCG: 0.66mIU/ml; testosterone: 120ng/dl; progesterone: 3.4ng/ml; LH: 0.5mIU/ml; and FSH: 0.01mIU/ml not responsive to GnRH test (Relisorm®: 100µg iv). Abdominal images confirmed left ovarian mass. Unilateral salpingo-oophorectomy was performed with complete resection of a 656g and 14.5 x 10 x 7cm tumor restricted to the left ovary. The histologic analysis revealed a juvenile granulosa cell tumor. During the surgery blood from left ovary vein was obtained and steroids concentration were analyzed. Elevated levels of oestradiol (969pg/ml), progesterone (15.8ng/ml), 17-alpha-OH-progesterone (34ng/ml) and testosterone (158ng/dl) were found. Few days after the surgery, rapid regression of breast and pubic hair was observed, with return of steroid concentrations to the normal pre-pubertal levels. During 9 years of follow-up, normal pubertal development happened at an expected age, and no signs of tumor relapse were found.

Precocious puberty; Ovarian tumor; Juvenile granulosa cell tumor; Treatment; Outcome


apresentação de caso

Pseudopuberdade Precoce Causada Por Tumor de Células da Granulosa Juvenil

Maria de Fátima Borges

Marcus Aurelho de Lima

Eddie Fernando C.Murta

Débora Isis Dias

Elvi Rojas Fonseca

Beatriz Pires Ferreira

Disciplina de Endocrinologia e

Metabologia, Departamento de

Clínica Médica e Disciplina de

Ginecologia e Obstetrícia,

Departamento Materno-

Infantil, Faculdade de

Medicina do Triângulo

Mineiro, Uberaba, MG.

Recebido em 11/05/01

Revisado em 08/08/01 e em 21/01/02

Aceito em 24/01/02

RESUMO

Descrevemos um caso de tumor ovariano das células da granulosa cuja manifestação inicial foi puberdade precoce isossexual, em criança de 7 anos e 4 meses, de evolução progressiva e rápida, associada a massa hipogástrica palpável. A avaliação hormonal demonstrou estradiol: 296pg/ml; 17aOH-progesterona: 20ng/ml; S-DHEA: 27µg/dl; bhCG: 0,66mUI/ml; testosterona: 120ng/dl; progesterona: 3,4ng/ml; LH: 0,5mUI/ml; e FSH: 0,01mUI/ml e não responsivos ao estímulo com o GnRH, (Relisorm®: 100µg iv). Exames de imagem confirmaram massa tumoral em ovário esquerdo. A paciente foi submetida à salpingo-ooforectomia esquerda com retirada completa do tumor que pesou 656g e mediu 14,5 x 10,0 x 7,0cm, restrito ao ovário e cujo exame histopatológico demonstrou tumor de células da granulosa juvenil. Durante a cirurgia amostras sangüíneas foram obtidas da veia ovariana ipsilateral ao tumor e as concentrações de esteróides foram estudadas. Níveis elevados de estradiol (969pg/ml), progesterona (15,8ng/ml), 17aOH-progesterona (34ng/ml) e testosterona (158ng/dl) foram encontrados. No pós-operatório observou-se rápida regressão das mamas, dos pêlos pubianos, com normalização das concentrações hormonais. Durante o seguimento, a paciente apresentou desenvolvimento puberal normal, e não há sinais de reincidência do tumor. (Arq Bras Endocrinol Metab 2002;46/2:197-202)

Descritores: Pseudopuberdade precoce; Tumor ovariano; Tumor de células da granulosa; Tratamento; Evolução

ABSTRACT

Pseudo-precocious Puberty Due to a Juvenile Granulosa Cell Tumor.

We report a case of juvenile granulosa cell tumor of the ovary in a 7.4 years old girl, who presented isosexual pseudo-precocious puberty of progressive outcome and palpable hypogastric mass. Hormonal measurements showed: oestradiol: 296pg/ml; 17-a-OH-progesterone: 20ng/ml; DHEAS: 27µg/dl; bhCG: 0.66mIU/ml; testosterone: 120ng/dl; progesterone: 3.4ng/ml; LH: 0.5mIU/ml; and FSH: 0.01mIU/ml not responsive to GnRH test (Relisorm®: 100µg iv). Abdominal images confirmed left ovarian mass. Unilateral salpingo-oophorectomy was performed with complete resection of a 656g and 14.5 x 10 x 7cm tumor restricted to the left ovary. The histologic analysis revealed a juvenile granulosa cell tumor. During the surgery blood from left ovary vein was obtained and steroids concentration were analyzed. Elevated levels of oestradiol (969pg/ml), progesterone (15.8ng/ml), 17-a-OH-progesterone (34ng/ml) and testosterone (158ng/dl) were found. Few days after the surgery, rapid regression of breast and pubic hair was observed, with return of steroid concentrations to the normal pre-pubertal levels. During 9 years of follow-up, normal pubertal development happened at an expected age, and no signs of tumor relapse were found. (Arq Bras Endocrinol Metab 2002;46/2:197-202)

Keywords: Precocious puberty; Ovarian tumor; Juvenile granulosa cell tumor; Treatment; Outcome

OS TUMORES OVARIANOS SÃO RAROS na infância, sendo mais freqüentes os de origem germinativa e que se apresentam clinicamente com dor abdominal aguda ou crônica e massa pélvica (1). Os tumores da granulosa perfazem 4% dos tumores ovarianos na criança e, por serem produtores de esteróides, manifestam-se mais comumente como puberdade precoce isossexual (2).

Scully (3) reconheceu uma entidade peculiar entre os tumores da granulosa, uma variante juvenil, definindo seus critérios diagnósticos. Clinicamente caracterizam-se pelo aparecimento numa faixa etária que vai dos 6 meses aos 20 anos, sendo muito mais freqüentes antes dos 10 e raros acima dos 30 anos. Ao contrário dos tumores da granulosa encontrados na mulher adulta, têm um curso clínico benigno. Histologicamente, as células tumorais apresentam-se luteinizadas, com freqüentes figuras de mitose e atipias nucleares. O tumor pode apresentar um padrão difuso ou macrofolicular sendo raros ou ausentes os corpúsculos de Call-Exener.

A partir da definição destes critérios diagnósticos, seguiu-se a publicação de várias casuísticas (1,2,4-11), que muito contribuíram para o conhecimento de variáveis relacionadas ao prognóstico. Contudo, são escassos os dados sobre produção hormonal destes tumores (12) consistindo, na maioria dos casos, apenas da determinação das concentrações plasmáticas do estradiol.

Tivemos a oportunidade de acompanhar uma criança portadora de puberdade precoce isossexual com tumor de células da granulosa juvenil, diagnosticado na Unidade de Endocrinologia Pediátrica da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro (FMTM), na qual as concentrações dos esteróides sexuais foram estudadas no plasma e na veia ovariana ipsilateral ao tumor.

RELATO DO CASO

Paciente do sexo feminino, com idade de 7 anos e 4 meses, parda, nascida de parto cesáreo, sem intercorrências durante seu desenvolvimento e crescimento. Dois meses antes da primeira consulta a mãe observou telarca e pubarca de progressão rápida, evoluindo, em dois meses, para menarca associada a aumento da velocidade de crescimento. Ao interrogatório dirigido negava cefaléia, distúrbios visuais e ingestão de medicamentos.

Ao exame físico pesou 25kg, mediu 131cm, com envergadura de 131cm; desvio padrão para altura e peso de +1,33 e 0,0 respectivamente; distância vértice-púbis: 63cm; distância púbis-plantar: 68cm; FC: 102 bpm; pulsos presentes; tireóide normo-palpável. Apresentou mamas e pêlos pubianos no estágio IV de Tanner, além de clitoromegalia e hiperpigmentação de mamilos, linha alba e pequenos lábios. À palpação abdominal observou-se, na região hipogástrica, volumosa massa chegando até a cicatriz umbilical, endurecida, móvel, indolor e aderida aos planos superficiais.

Os exames laboratoriais gerais mostraram: hemácias: 4,4 x 106/mm3; hemoglobina: 11,6g%; hematócrito: 35,4%; leucograma normal; plaquetas: 381.000/mm3; proteínas totais: 6,8g% (albumina: 3,8g% e globulina: 3,0g%). Após estímulo com GnRH (Relisorm®:100µg iv.), LH e FSH não responderam, permanecendo menores que 0,5mUI/ml, em todos os tempos do teste; 17b-estradiol: 296pg/ml (< 30); 17aOH-progesterona: 20ng/ml (0,07-0,60); sulfato de dehidroepiandrosterona (S-DHEA): 27µg/dl (8,0-350,0); cortisol: 8,1µg/dl (5,0-25,0); gonadotrofina coriônica (bhCG): 0,66mU/ml (0,0-0,5). A citologia vaginal revelou trofismo elevado para a idade.

A ultrassonografia pélvica evidenciou massa de 6,9cm em ovário esquerdo com ecogenicidade heterogênea. A tomografia computadorizada de abdome demonstrou massa sólida, lobulada, com áreas de necrose medindo 7,8 x 6,0cm em seus maiores diâmetros. (figura 1). A idade óssea foi de 8 anos e 10 meses. O enema opaco e a urografia excretora revelaram compressão de retossigmóide e ureteropielocaliectasia moderada à esquerda, respectivamente.


A paciente foi submetida a salpingo-ooforectomia esquerda com retirada completa do tumor que não se rompeu e não estava aderido aos planos adjacentes, estando presumivelmente em estadio Figo IA (13,14). À macroscopia a massa tinha formato oval, pesou 656g e mediu 14,5 x 10 x 7cm, apresentando superfície externa lisa, rósea, brilhante (figura 2). A superfície de corte demonstrou tecido de aspecto nodular, macio, ora amarelo, ora branco-acinzentado, elástico e brilhante com cavidade periférica vazia, medindo 3,5cm de diâmetro (figura 3). A microscopia evidenciou neoplasia benigna constituída por células fusiformes ora lembrando fibroblastos, ora células tecais dispostas de forma compacta (figura 4), ao lado de grande número de células redondas, uniformes, dispostas em arranjos sólidos e com ocasionais cavidades redondas preenchidas por fluido róseo e circundadas por células com projeções citoplasmáticas luminais. As figuras de mitose foram variáveis, sendo de sete em dez campos de grande aumento em áreas hipercelulares e zero em dez campos em áreas com celularidade moderada.



A pesquisa de lipídios revelou discreta quantidade dispersa na massa tumoral. A coloração para retículo demonstrou áreas com riqueza de fibrilas que, freqüentemente, envolvem individualmente as células. A histologia encontrada corresponde ao diagnóstico de tumor de células da granulosa juvenil (3).

Durante a cirurgia, antes da exérese do tumor ovariano, foram obtidas amostras sangüíneas simultâneas de veia periférica e da veia ovariana esquerda, e as concentrações hormonais determinadas estão representadas na tabela 1.

A paciente tem sido acompanhada desde então, perfazendo atualmente 9 anos de seguimento, com dosagens hormonais periódicas e, tanto do ponto de vista clínico, laboratorial e de imagens, não mais apresentou anormalidades. Foi observada, após a cirurgia, rápida regressão das mamas e dos pêlos pubianos, com normalização das concentrações hormonais, testosterona < 10ng/dl; S-DHEA: 11,5µg/dl; estradiol: 20pg/ml; prolactina: 3ng/dl; bhCG < 1mUI/mI; LH: 3,2mUI/ml; FSH: 3,6mUI/ml; 17aOH-progesterona: 0,54ng/ml; a-feto-proteína: 2,3ng/ml (< 30).

A paciente apresentou, posteriormente, desenvolvimento puberal normal, com menarca aos 12 anos e 6 meses, ciclos menstruais normais, e após 9 anos de seguimento não há sinais de reincidência do tumor.

DISCUSSÃO

Desde a definição dos critérios diagnósticos do tumor de células da granulosa juvenil, por Scully (3), cerca de 200 casos, incluindo descrições isoladas e casuísticas, já foram publicadas na literatura (1,2,4,11) enfatizando, sobretudo, os aspectos anátomo-patológicos, sendo que na maioria dos casos a avaliação endócrina consistiu apenas da dosagem de estradiol plasmático. No caso estudado, a cateterização da veia ovariana esquerda, ipsilateral ao tumor, nos possibilitou quantificar a produção de esteróides e comparar os níveis da veia ovariana com a periférica.

Cronjé e cols. (2), analisando os casos descritos na literatura com idade de até 10 anos, chegaram à conclusão de que 66% foram diagnosticados entre o nascimento e os 4 anos de idade, e que das mortes relacionadas a este tipo de tumor, 9% ocorreram em pacientes que não expressaram puberdade precoce e se apresentaram com quadro atípico. Neste caso, a paciente manifestou puberdade precoce de progressão rápida, sendo que à primeira consulta se encontrava em estádio IV de Tanner, e com a informação de já ter apresentado menarca associada a crescimento estatural acelerado. A presença de clitoromegalia, hiperpigmentação de mamilos, linha alba e pequenos lábios, associada à palpação de massa pélvica indicava tumor produtor de esteróides, não só de estrógenos, mas também de progestágenos e andrógenos.

A concentração plasmática elevada de estradiol associada à ausência de resposta do LH e FSH ao estímulo com GnRH indicou que se tratava de pseudopuberdade precoce decorrente de tumor envolvendo o ovário esquerdo, confirmado pelos exames de imagem.

Durante a cirurgia foi encontrado tumor de grandes proporções, pesando 656g e medindo 14,5cm em seu maior diâmetro, mas restrito ao ovário esquerdo, sem aderência às estruturas adjacentes, tendo sido retirado sem rompimento de cápsula. Foi realizada apenas salpingo-ooforectomia esquerda, sem necessidade de complementação do tratamento cirúrgico (8).

Segundo critérios de Scully (3,7), trata-se de um tumor de células da granulosa juvenil. Ocorrem predominantemente antes dos 20 anos e se caracterizam histologicamente por, no mínimo, dois dos seguintes critérios: 1) padrão difuso ou macrofolicular; 2) raros corpúsculos de Call-Exner, ou ausentes; 3) freqüente luteinização das células da granulosa e da teca; 4) freqüentes figuras de mitose; 5) atipias nucleares. No presente caso, encontramos os primeiros 4 critérios.

As concentrações de esteróides na veia ovariana esquerda (tabela 1) mostram um gradiente de 3:1 em relação ao sangue periférico para a progesterona, 17aOH-progesterona e estradiol. As elevadas concentrações de testosterona não variaram muito, tanto na veia ovariana quanto na periferia, enquanto as concentrações de S-DHEA foram normais.

As concentrações de LH e FSH estavam supressas tanto na veia ovariana, quanto na periferia. A prolactina aumentada poderia ser explicada pelo estresse cirúrgico, entretanto a concentração de cortisol estava mais baixa no plasma do que na veia ovariana.

As células tumorais são células da granulosa que parecem manter a capacidade de secreção dos esteróides de forma autonômica, sem a influência do LH e FSH, que se encontram supressos, ou do bhCG que está baixo. O estímulo do LH e FSH nas células da teca e granulosa utiliza receptores de membrana associados à adenilciclase, cuja estimulação resulta em conversão da adenosina trifosfato intracelular a adenosina monofosfato (cAMP), que por sua vez se liga a uma subunidade regulatória da proteína quinase, a qual fosforila proteínas intracelulares importantes na esteroidogênese (15).

O fato de termos um tumor produzindo elevadas concentrações de esteróides mediante níveis supressos de gonadotrofinas nos remete, por analogia, àqueles tumores produtores de hGH cujo mecanismo básico da hipersecreção hormonal é a estimulação intrínseca da adenil ciclase por mutação da proteína Gs (estimulação constitutiva de receptores), mesmo na ausência de hormônios tróficos, no caso, o GHRH (16), sendo este um campo interessante de investigação, pois o estudo do presente caso indica que a esteroidogênese, nos tumores das células de granulosa obedece a estímulos intracelulares, seja em nível de transdução ou geração de sinal anômalos ou a fatores parácrinos como IGFs, IGF-BPs, além de outros fatores de crescimento com ação já comprovada em condições fisiológicas (17,18).

Na mulher adulta normal as células da granulosa produzem principalmente estradiol e progesterona. Entretanto, a produção de estradiol requer cooperação das células da teca. Importantes estudos (19-21) estabeleceram as bases bioquímicas da hipótese "2 gonadotrofinas / 2 células", segundo a qual um processo integrado é necessário para a biossíntese dos estrógenos ovarianos. Segundo esta hipótese, na teca os andrógenos são produzidos (a partir do colesterol) na dependência do estímulo do LH e depois aromatizados pelas células da granulosa (na dependência do FSH). Assim, estrona e estradiol seriam derivados da aromatização de seus precursores androgênicos, androstenediona e testosterona. A aromatização envolve a perda do grupo C-19 metil e eliminação de hidrogênio 1b e 2b do anel A do precursor androgênico (22,23). No caso em estudo temos células tumorais que, sem estímulo do LH e do FSH, aromatizaram testosterona a estradiol, o que mostra uma subversão ou um indício contra os mecanismos bioquímicos da esteroidogênese aceitos até o momento, em condições fisiológicas.

Na mulher normal, tanto as células da teca quanto da granulosa são capazes de sintetizar progesterona, sendo importante neste processo a disponibilidade de colesterol (24). O mesmo é convertido a pregnenolona e esta a progesterona, pela ação das enzimas 3b-hidroxiesteróide desidrogenase / D4 e D5-isomerase (25-27). Além disso já se descreveu que as células da granulosa contêm baixos níveis de atividade da 17a-hidroxilase que converte progesterona em 17aOH-progesterona (28). No presente caso não dosamos pregnenolona, mas encontramos elevados níveis de progesterona e 17aOH-progesterona, mostrando a eficácia com que estes tumores produzem progestágenos.

Pelos dados do presente caso, podemos concluir que as células que compõem os tumores da granulosa são eficientes na produção de elevadas concentrações de estradiol, testosterona, progesterona e 17aOH-progesterona de forma autonômica, expressando-se clinicamente como pseudopuberdade precoce.

A retirada do tumor levou a regressão de todas as características sexuais e normalização das concentrações plasmáticas de esteróides. O seguimento pós-cirúrgico, que está no 9° ano, consistiu de avaliações clínica e laboratorial periódicas. A paciente desenvolveu puberdade fisiológica em idade apropriada e tem tido ciclos menstruais normais.

Segundo Young e cols. (6), fatores de bom prognóstico com relação à sobrevida dos pacientes com este tipo de tumor ovariano seriam o diagnóstico em estadiamento inicial, o tamanho do tumor, a atividade mitótica e presença de atipias nucleares, mas para o tumor IA, como é o caso estudado, o prognóstico é sempre bom. Temos considerado, pela evolução até o momento, que a paciente está de fato curada.

Endereço para correspondência:

Maria de Fátima Borges

Disciplina de Endocrinologia e Metabologia

Hospital Escola da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro

Av. Getúlio Guaritá S/N

38025-440 Uberaba, MG

fax: (034) 3333-8710

e.mail: borgesmf@enetec.com

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jul 2002
  • Data do Fascículo
    Abr 2002

Histórico

  • Aceito
    24 Jan 2002
  • Recebido
    11 Maio 2001
  • Revisado
    21 Jan 2002
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