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Tratamento do microcarcinoma de tireóide

Treatment of papillary microcarcinoma of the thyroid

Resumos

Avaliamos, retrospectivamente, a recorrência, presença de metástases distantes e mortalidade em 78 pacientes com microcarcinoma papilífero seguidos durante 6,8 anos, em média. Dos 56 pacientes com tumor unifocal sem metástases, nenhum apresentou recorrência, independente do tratamento (22 loboistmectomia, 11 tireoidectomia total sem ablação e 23 com ablação). O mesmo ocorreu nos 15 casos de tumor multicêntrico restrito à tireóide e tratados com tireoidectomia total e radioiodo. Dos 7 casos com metástases na apresentação inicial e submetidos a cirurgia extensa e terapia ablativa, recorrência cervical ocorreu em apenas 1 paciente. A presença de anticorpos anti-tireoglobulina foi mais comum após a lobectomia (22,7% vs. 9%) e a especificidade da tireoglobulina (Tg) ficou comprometida com este procedimento, mas não nos pacientes com tireoidectomia total sem ablação. Observou-se dois casos de hipoparatireoidismo definitivo no gruposubmetido à tireoidectomia total (3,5%) e nenhum com lobectomia. O presente estudo concorda que a loboistmectomia pode ser suficiente para o tratamento do microcarcinoma papilífero único restrito à tireóide. No entanto, a especificidade da Tg no seguimento fica comprometida. Para tumores multicêntricos ou com linfonodos acometidos, recomenda-se a tireoidectomia total, mas o uso rotineiro da radioiodoterapia é controvertido.

Microcarcinoma de tireóide; Tratamento


We retrospectively analyzed the recurrence, distant metastases and mortality of 78 patients with papillary microcarcinoma during a mean period of 6.8 years. None of the 56 patients with unifocal tumors without metastases relapsed, irrespective of the type of treatment (22 submitted to lobectomy, 11 to total thyroidectomy without ablation and 23 with ablation). The same occurred for the 15 cases of multicentric tumors restricted to the thyroid and treated with total thyroidectomy and radioiodine. Of the 7 patients with metastases in the initial presentation and treated with extensive surgery and ablative therapy, cervical recurrence was observed in 1 case. Detectable anti-thyroglobulin antibodies were more common after lobectomy (22.7% vs. 9%) and the specificity of thyroglobulin was compromised by this procedure, but not in patients submitted to total thyroidectomy without ablation. Two cases of definitive hypoparathyroidism were observed in the group submitted to total thyroidectomy (3.5%) and no cases with lobectomy. The present study agrees that lobectomy can be sufficient for the treatment of single microcarcinoma restricted to the thyroid. However, the Tg specificity is compromised. Total thyroidectomy is recommended for multicentric tumors or with lymph nodes metastases, but the routine use of radioiodine is a matter of controversy.

Thyroid microcarcinoma; Treatment


ARTIGO ORIGINAL

Tratamento do microcarcinoma de tireóide

Treatment of papillary microcarcinoma of the thyroid

Pedro Weslley S. do Rosário; Tales Alvarenga Fagundes; Saulo Purisch

Departamento de Tireóide, Serviço de Endocrinologia e Metabologia da Santa Casa de Belo Horizonte, MG

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Pedro Wesley Souza do Rosário Centro de Estudos e Pesquisa Clínica de Endocrinologia e Metabologia (CEPCEM) Av. Francisco Sales 1111, 5º andar, Ala D 30150-221 Belo Horizonte, MG Fax: (31) 3213-0836 E-mail: pedrorosario@globo.com.br

RESUMO

Avaliamos, retrospectivamente, a recorrência, presença de metástases distantes e mortalidade em 78 pacientes com microcarcinoma papilífero seguidos durante 6,8 anos, em média. Dos 56 pacientes com tumor unifocal sem metástases, nenhum apresentou recorrência, independente do tratamento (22 loboistmectomia, 11 tireoidectomia total sem ablação e 23 com ablação). O mesmo ocorreu nos 15 casos de tumor multicêntrico restrito à tireóide e tratados com tireoidectomia total e radioiodo. Dos 7 casos com metástases na apresentação inicial e submetidos a cirurgia extensa e terapia ablativa, recorrência cervical ocorreu em apenas 1 paciente. A presença de anticorpos anti-tireoglobulina foi mais comum após a lobectomia (22,7% vs. 9%) e a especificidade da tireoglobulina (Tg) ficou comprometida com este procedimento, mas não nos pacientes com tireoidectomia total sem ablação. Observou-se dois casos de hipoparatireoidismo definitivo no gruposubmetido à tireoidectomia total (3,5%) e nenhum com lobectomia. O presente estudo concorda que a loboistmectomia pode ser suficiente para o tratamento do microcarcinoma papilífero único restrito à tireóide. No entanto, a especificidade da Tg no seguimento fica comprometida. Para tumores multicêntricos ou com linfonodos acometidos, recomenda-se a tireoidectomia total, mas o uso rotineiro da radioiodoterapia é controvertido.

Descritores: Microcarcinoma de tireóide; Tratamento

ABSTRACT

We retrospectively analyzed the recurrence, distant metastases and mortality of 78 patients with papillary microcarcinoma during a mean period of 6.8 years. None of the 56 patients with unifocal tumors without metastases relapsed, irrespective of the type of treatment (22 submitted to lobectomy, 11 to total thyroidectomy without ablation and 23 with ablation). The same occurred for the 15 cases of multicentric tumors restricted to the thyroid and treated with total thyroidectomy and radioiodine. Of the 7 patients with metastases in the initial presentation and treated with extensive surgery and ablative therapy, cervical recurrence was observed in 1 case. Detectable anti-thyroglobulin antibodies were more common after lobectomy (22.7% vs. 9%) and the specificity of thyroglobulin was compromised by this procedure, but not in patients submitted to total thyroidectomy without ablation. Two cases of definitive hypoparathyroidism were observed in the group submitted to total thyroidectomy (3.5%) and no cases with lobectomy. The present study agrees that lobectomy can be sufficient for the treatment of single microcarcinoma restricted to the thyroid. However, the Tg specificity is compromised. Total thyroidectomy is recommended for multicentric tumors or with lymph nodes metastases, but the routine use of radioiodine is a matter of controversy.

Keywords: Thyroid microcarcinoma; Treatment

MICROCARCINOMA PAPILÍFERO (MCP), definido como tumor de até 10mm, é a forma mais comum de carcinoma diferenciado de tireóide (CDT), que usualmente permanece clinicamente silencioso até o diagnóstico incidental no ultra-som (US), material cirúrgico ou autópsia, com incidência variando de 3 a 36% nesta última situação (1). Ocasionalmente, pode manifestar-se como linfadenopatia cervical metastática e, mais raramente, com metástases à distância. A história natural desta patologia é pouco conhecida, e o comportamento biológico destes tumores é extremamente variado, desde casos de redução espontânea (2) a metástases distantes e até óbito (3-9). Esta variabilidade na evolução gera uma grande controvérsia no tratamento, qual seja, a defesa de procedimentos menos invasivos, como a lobectomia, devido ao excelente prognóstico da maioria dos casos ou uma conduta mais agressiva, como tireoidectomia total seguida de radioiodoterapia, na tentativa de reduzir a recorrência e a mortalidade que, apesar de raras, são relevantes.

O tratamento inicial do CDT consiste na tireoidectomia total seguida da ablação de remanescentes normais ou tumorais com iodo 131 em muitos pacientes (10-13). Porém, os benefícios desta conduta não são comprovados para todos os casos, e pacientes com microcarcinoma único e restrito à tireóide podem ser suficientemente tratados apenas com loboistmectomia (2,4-7,13-16) por verificar-se baixa taxa de recorrência mesmo nos casos abordados desta forma. Nesta condição específica, além da recidiva ser incomum e não alterada pela ressecção extensa, o maior risco de complicações de uma cirurgia mais ampla (17-19) ou de uma reoperação (16,20,21) fundamentam terapia mais conservadora, ao passo que a retirada ampla do tecido tireoideano poderia resultar em outros benefícios, como diminuir o risco de tireotoxicose e reações locais caso a terapia ablativa seja necessária durante o seguimento (22,23). A tireoidectomia total aumenta a especificidade da tireoglobulina (Tg) sérica (24,25) e a sensibilidade da varredura de corpo inteiro em identificar metástases (26) durante o acompanhamento dos pacientes. Além disso, quando realizada por cirurgiões experientes, a tireoidectomia total primária é um procedimento seguro (27-30), assim como a reoperação (31-33). Quanto ao radioiodo, a terapia ablativa não modifica a evolução dos tumores menores do que 1cm e restritos à tiróide (10-13,34).

O objetivo deste estudo foi avaliar a recorrência, aparecimento de metástases distantes e mortalidade a médio prazo em pacientes com MCP de tireóide com diferentes modalidades de tratamento e realizar um revisão da literatura sobre a abordagem destes tumores.

PACIENTES E MÉTODOS

Pacientes

Avaliamos, retrospectivamente, 78 pacientes sem passado de radiação cervical ou história familiar de CDT com MCP único e sem invasão de cápsula tireoideana ou metástases linfonodais em 56, multifocal restrito à tireóide em 15 e com metástases na apresentação inicial em 7 (6 para linfonodos e 1 para pulmão). Os primeiros foram divididos em três grupos, de acordo com o tratamento inicial: 22 pacientes foram tratados com loboistmectomia, 11 foram submetidos à tireoidectomia total sem ablação com radioiodo e 23 tratados com tireoidectomia e radioiodoterapia. Todos os casos tratados apenas com loboistmectomia foram de MCP único (pelo anátomo-patológico e US do lobo remanescente) diagnosticado após cirurgia por doença benigna e que, por opção do médico assistente, familiares ou do paciente, não foram reoperados. Pacientes com tumores multicêntricos ou metástases foram tratados invariavelmente com tireoidectomia total seguida de ablação. Não houve diferença significativa entre os grupos quanto ao sexo e idade (tabela 1). O período mínimo entre a cirurgia e a presente avaliação foi de 5 anos (variando de 5 a 8,8 anos, média de 6,8 anos).

Foi avaliada a recorrência acumulada, aparecimento de metástases distantes, bem como mortalidade neste período. O estadiamento da doença foi definido através da Tg sérica, varredura de corpo inteiro (nos pacientes submetidos à tireoidectomia total), outros métodos de imagem e confirmação histológica.

Hipoparatireoidismo definitivo foi diagnosticado na presença de concentrações séricas diminuídas de PTH (< 20pg/ml) associado a concentrações séricas de cálcio baixas (< 8,5mg/dl) ou normais (até 9,5mg/dl) se estivesse fazendo reposição de cálcio e vitamina D.

Este estudo foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas da instituição.

Métodos

As concentrações séricas de Tg foram determinadas pelo método imunorradiométrico (ELSA-hTG, CIS Bio International, France) com sensibilidade funcional de 1ng/ml, com valores de referência estabelecidos pelo laboratório de 3 a 42ng/ml. Os pacientes, excetuando-se os submetidos à lobectomia, nos quais a terapia não foi suspensa, apresentavam TSH maior que 30mUI/ml no momento da dosagem da Tg. Anticorpos anti-tireoglobulina (TgAc) foram determinados por ensaio quimioluminescente (Chemiluminescent ICMA, Nichols Institute Diagnostics, San Juan Capistrano, CA) com limite de detecção de 1UI/ml e referência de até 2UI/ml. Para considerarmos a Tg, era necessário que estes anticorpos estivessem indetectáveis.

O cálcio sérico foi dosado por método colorimétrico com referência para adultos normais de 8,5 a 10,5mg/dl, e todos os pacientes selecionados apresentavam albumina sérica maior que 3,5g/dl. O PTH foi dosado por método imunorradiométrico (DSL 8000 Active Intact PTH IRMA, Diagnostic Systems Laboratories, Webster, Texas) com valores de referência de 9 a 55pg/ml.

Varredura foi realizada com dose traçadora de 5mCi de iodo 131 após a suspensão de levotiroxina por até 6 semanas e prescrição de dieta hipoiódica durante duas semanas antes do exame. Imagens anteriores e posteriores de corpo inteiro foram obtidas 72h após a administração do iodo. Varredura pós-dose foi realizada sete dias após a dose ablativa, seguindo o mesmo protocolo anterior. Os resultados foram classificados como negativo, captação cervical (leito tireoideano ou ectópica) e metástases distantes. Outros métodos de imagem usados para definir a presença ou não de doença foram o US cervical, radiografia simples e tomografia de tórax e mediastino, radiografia óssea e varredura com sestamibi.

Análise estatística

Para comparar os pacientes dos diferentes grupos (de acordo com a modalidade de tratamento) quanto à distribuição do sexo e idade, foi realizado o teste do qui-quadrado e valores de p< 0,05 considerados significantes.

RESULTADOS

Em pacientes que fizeram apenas lobectomia (tumor unifocal), TgAc estavam presentes em 22,7%, e, naqueles sem TgAc, Tg durante a terapia supressiva com tiroxina foi inferior a 10ng/ml em todos (3,2 a 9,6ng/ml). Nenhum paciente apresentou evidência de doença e não houve óbito durante o período de acompanhamento. Também não foi diagnosticado hipoparatireoidismo definitivo ou lesão recorrente nestes pacientes.

Concentrações séricas de TSH maiores que 30mUI/ml (35 a 165mUI/ml, média 65,6mUI/ml) foram alcançadas em todos os pacientes submetidos à tireoidectomia total, seguida ou não de ablação. TgAc foram detectados em 9% dos pacientes sem ablação e em 8,8% daqueles que receberam iodo 131 (dose de 100 ou 150mCi). Estes últimos apresentaram concentrações de Tg estimulada menores do que 2ng/ml na ausência de doença, enquanto que, em pacientes sem ablação, os valores foram inferiores a 5ng/ml (menores que 2ng/ml em 70%). Varredura mostrou captação em leito tireoideano em 7/11 pacientes não tratados com radioiodo e em apenas 4/45 daqueles que receberam terapia ablativa e que não apresentavam doença aparente. Nenhum caso de doença evidente foi detectado naqueles pacientes com tumor restrito à tireóide (único ou múltiplo) tratados com tireoidectomia total (com ou sem radioiodo nos tumores únicos e com radioiodo nos multifocais). Uma recorrência cervical (linfonodo) ocorreu entre os 7 casos com metástases na apresentação inicial, a despeito do tratamento com tireoidectomia total seguida de ablação com a dose de 150mCi. Diagnosticamos hipoparatireoidismo definitivo em apenas dois pacientes tratados com tireoidectomia total (3,5%).

DISCUSSÃO

Nesta série, observou-se que o MCP único sem metástases na apresentação inicial apresentou um excelente prognóstico, mesmo nos casos tratados apenas com loboistmectomia, sem recidiva no período de acompanhamento (6,8 anos, em média). Esta evolução favorável é confirmada em várias séries (3-11,14-16,35-38), e o MCP único restrito à tireóide pode ser suficientemente tratado com lobectomia (4-7,10-16,36). Também não foram diagnosticados casos de recorrência durante o seguimento em pacientes com MCP multicêntrico sem metástases na ocasião do diagnóstico, mas a influência da modalidade terapêutica não foi avaliada pelo fato de todos os casos terem sidos tratados com tireoidectomia total seguida de radioiodoterapia. Alguns estudos implicam a multicentricidade do MCP como um fator de risco para recorrência tumoral (4,6,10), levando à recomendação da tireoidectomia total para estes casos (4,12,13,16). Em oposição, outras séries mostram que a extensão da tireoidectomia não influenciou a taxa de recidiva em pacientes sem metástases linfonodais, mesmo com MCP multicêntrico (5-9,15,36). Um importante fator implicado em maior risco de recidiva em casos de microcarcinoma é a presença de metástases linfonodais na apresentação inicial (3,5-8,37,38), e, para estes pacientes, a tireoidectomia bilateral é recomendada (3,4,6,12,13,16,36). Radioiodoterapia não modificou a evolução dos pacientes com MCP, mesmo se multicêntrico e com linfonodos metastáticos (3-6,15,34), sendo sua indicação controvertida.

O principal argumento favorável à lobectomia é o fato deste procedimento associar-se a um menor risco de complicações em relação à tireoidectomia bilateral (17-19), assim como a totalização da cirurgia para microcarcinomas ocultos implicaria em uma maior taxa destas complicações (16,20,21). Apesar de poucos casos, neste estudo a taxa de hipoparatireoidismo definitivo foi de 3,5% com a tireoidectomia total e nenhum caso com a lobectomia. Porém, a tireoidectomia total primária realizada por cirurgiões experientes é um procedimento seguro, com baixa taxa de complicações (27-30). Da mesma forma, a reoperação pode apresentar taxas semelhantes à cirurgia primária, segundo alguns estudos (31-33), o que enfraquece a indicação da lobectomia, sob este aspecto. A preservação funcional com a lobectomia não é um argumento defensável, considerando que, neste e na maioria dos estudos, os pacientes estavam em terapia supressiva com L-tiroxina.

O seguimento de pacientes abordados com loboistmectomia fica comprometido pela presença do lobo remanescente. A varredura com radioiodo tem sua sensibilidade para metástases reduzida se a cirurgia inicial for a lobectomia, pelo seqüestro do traçador pelos remanescentes tireoideanos (26). Miccoli e cols. (26) apresentaram casos de metástases pulmonares e linfonodais diagnosticados pela varredura apenas com a totalização da tireoidectomia. Ressaltamos que não há evidências de que o mesmo ocorra após a tireoidectomia total não seguida de ablação, já que o tecido remanescente é muito pequeno. Da mesma forma, a Tg na presença de restos tireoideanos significativos tem sua especificidade reduzida, mesmo em uso de L-tiroxina, como mostrado naqueles submetidos à loboistmectomia. Após tireoidectomia total, quando permanecem apenas restos discretos (captação < 2%), a especificidade da Tg é alta, com 93% dos pacientes apresentando valores indetectáveis durante a terapia supressiva e 80% após a suspensão desta (34). Além disso, a permanência do tecido tireoideano, fonte antigênica, pode manter a produção de TgAc em pacientes predispostos, enquanto que nos pacientes completamente tireoidectomizados tende a desaparecer na ausência de doença (39-43). Este seria mais um fator limitante da confiabilidade efetiva da Tg em detectar metástases precocemente. Nestes casos, os métodos de imagem, como US, tomografia e imagem por ressonância magnética, passam a ser de grande valor no seguimento destes pacientes.

Outro problema da lobectomia é que, se estes pacientes apresentarem metástases durante o seguimento, apesar de incomuns, a terapia ablativa apresentaria maior risco de reações locais e tireotoxicose (22), além do que o sucesso da ablação pode ser comprometido pela presença de grandes remanescentes tireoideanos (23). Contrário a isto, em pacientes tratados com lobectomia, um estudo mostrou que a dose de 30mCi de iodo 131 promoveu ablação em 80% e apenas 18% apresentaram tireoidite (44), e outro alcançou 57% de eficácia com doses variando de 15 a 60mCi e somente 16% dos pacientes tiveram reações locais após o radioiodo (45). Estes estudos até propõem a radioiodoterapia como alternativa à complementação cirúrgica.

Apesar da tendência atual à conduta mais agressiva, vale ressaltar que não se conhece suficientemente a história natural do MCP. Recentemente, Ito e cols. (2) mostraram que, em 162 pacientes com microcarcinoma não tratados, mais de 70% não apresentaram crescimento do tumor, somente em 10% o tamanho ultrapassou 10mm e em apenas 1,2% apareceram metástases para linfonodos. A perspectiva é de que, no futuro próximo, possamos identificar, com elevada acurácia, através das características biomoleculares e genéticas dos tumores, aqueles com menor ou maior agressividade, racionalizando a conduta mais conservadora ou mais agressiva, como mostrado no recente estudo de Lima e cols. (46), onde uma maior expressão de moléculas como a p53 e bcl-2 foi verificada em tumores de pior prognóstico. Em outro estudo (8), a positividade imuno-histológica para Ki-67 e TGFbeta 3 foram considerados indicadores de agressividade do MCP.

CONCLUSÃO

Independente da modalidade terapêutica, MCP apresentou um bom prognóstico, com baixa recorrência, raramente com metástases distantes e excelente sobrevida. Se, por um lado, a lobectomia é suficiente para o microcarcinoma único restrito à tireóide com menor chance de complicações, por outro a especificidade da Tg no seguimento fica comprometida. Para os casos de multicentricidade ou com metástases na apresentação, fatores associados a pior prognóstico, tireoidectomia total é o procedimento recomendado. Não existem evidências de que a radioiodoterapia de rotina modifique a evolução, mesmo dos pacientes com tumores multifocais e com metástases linfonodais. Reconhecemos que, para uma análise e comparação de diferentes modalidades de tratamento do MCP, é necessário um seguimento mais longo e maior casuística.

Recebido em 12/12/03

Revisado em 27/02/04 e 16/04/04

Aceito em 23/04/04

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  • Endereço para correspondência
    Pedro Wesley Souza do Rosário
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Mar 2005
    • Data do Fascículo
      Dez 2004

    Histórico

    • Aceito
      23 Abr 2004
    • Revisado
      16 Abr 2004
    • Recebido
      12 Dez 2003
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