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Crescimento puberal e altura final em 40 pacientes com diabetes mellitus tipo 1

Pubertal growth and final height in 40 patients with type 1 diabetes mellitus

Resumos

OBJETIVO: O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é a mais importante doença endócrino-metabólica crônica entre crianças e adolescentes, podendo ser causa de atraso do crescimento e da puberdade. Avaliamos a influência do DM1 no estirão de crescimento e na puberdade de indivíduos com doença iniciada antes ou no começo desta fase. CASUÍSTICA E MÉTODOS: Foram avaliados retrospectivamente os prontuários de 40 pacientes (25 meninas), que apresentavam altura final, com coleta dos dados para o cálculo do tempo total de doença, os escores de DP da altura e do peso a cada consulta, a altura-alvo parental, as velocidades de crescimento (VC) anuais, o pico do estirão de crescimento, a duração da puberdade, o ganho total de crescimento durante o estirão puberal e a hemoglobina glicada (HbG). RESULTADOS: Em relação à adequação da altura final para a altura-alvo parental, 37 pacientes ficaram dentro da previsão e 3 ficaram abaixo do limite inferior. Não houve associação entre as variáveis analisadas com exceção da VC no pico do estirão, quando esta foi menor ou igual a 6cm/ano. A idade de início do DM1 e do pico do estirão puberal coincidiram com a faixa etária descrita na literatura; não foi observado atraso na idade de início da puberdade. No entanto, o ganho de altura durante a puberdade foi menor que o descrito na literatura, o mesmo ocorrendo em relação ao pico de VC puberal. De acordo com os valores da HbG, todos os pacientes avaliados apresentaram um controle crônico ruim do DM1. CONCLUSÕES: Neste grupo de DM1 com controle inadequado da doença, houve um prejuízo na altura final em relação à altura do início do DM1, provavelmente causado por uma baixa VC durante a puberdade, que, no entanto, não teve influência na altura final em relação ao alvo parental.

Crescimento; DM tipo 1; Estirão de crescimento; Puberdade


OBJECTIVE: Type 1 diabetes mellitus (DM1), the most important chronic endocrine-metabolic disease in children and adolescents, may lead to delayed growth and puberty. In this study we analyzed the influence of DM1 on growth spurt and puberty of patients whose onset of the disease was before or at the beginning of this phase. PATIENTS AND METHODS: Data from 40 patients, 25 females, who had attained final height were retrospectively obtained, including duration of disease, patient's height and weight SDS at each consultation, parental target height, yearly growth velocities (GV), peak of growth spurt, duration of puberty, magnitude of growth spurt and glycated hemoglobin (HbA1C) levels. RESULTS: 37 patients had an adequate final height to parental target height, and only 3 were below the lower limit. There was no significant association among the variables and the appropriate final height to the target height, except for GV on growth spurt, when it was lower than or equal to 6cm/year. The age of onset of DM1 and the age of peak of growth spurt was similar to previously data reported; regarding the age of the onset of puberty, there was no delay. However, the magnitude of the growth spurt and the peak of GV were lower. According to HbA1C levels, all patients exhibited a bad chronic control of DM1. CONCLUSIONS: In this group of inadequately controlled patients, the final height was lower than expected when compared to the height at onset of DM1, probably due to a slow GV during puberty, which however had no influence on the final height to parental target height.

Growth; Growth spurt; Puberty; Type 1 DM


ARTIGO ORIGINAL

Crescimento puberal e altura final em 40 pacientes com diabetes mellitus tipo 1

Pubertal growth and final height in 40 patients with type 1 diabetes mellitus

Sheila de Oliveira Meira; André Moreno Morcillo; Sofia H.V. de Lemos-Marini; Maria F.V.M. Paulino; Walter José Minicucci; Gil Guerra-Júnior

Unidade de Endocrinologia Pediátrica, Ambulatório de Diabetes em Pediatria do Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e Hospital de Clínicas, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas, SP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Gil Guerra-Júnior Rua Giuseppe Máximo Scolfaro 371, casa 18 13083-100 Campinas, SP E-mail: gilguer@fcm.unicamp.br

RESUMO

OBJETIVO: O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é a mais importante doença endócrino-metabólica crônica entre crianças e adolescentes, podendo ser causa de atraso do crescimento e da puberdade. Avaliamos a influência do DM1 no estirão de crescimento e na puberdade de indivíduos com doença iniciada antes ou no começo desta fase.

CASUÍSTICA E MÉTODOS: Foram avaliados retrospectivamente os prontuários de 40 pacientes (25 meninas), que apresentavam altura final, com coleta dos dados para o cálculo do tempo total de doença, os escores de DP da altura e do peso a cada consulta, a altura-alvo parental, as velocidades de crescimento (VC) anuais, o pico do estirão de crescimento, a duração da puberdade, o ganho total de crescimento durante o estirão puberal e a hemoglobina glicada (HbG).

RESULTADOS: Em relação à adequação da altura final para a altura-alvo parental, 37 pacientes ficaram dentro da previsão e 3 ficaram abaixo do limite inferior. Não houve associação entre as variáveis analisadas com exceção da VC no pico do estirão, quando esta foi menor ou igual a 6cm/ano. A idade de início do DM1 e do pico do estirão puberal coincidiram com a faixa etária descrita na literatura; não foi observado atraso na idade de início da puberdade. No entanto, o ganho de altura durante a puberdade foi menor que o descrito na literatura, o mesmo ocorrendo em relação ao pico de VC puberal. De acordo com os valores da HbG, todos os pacientes avaliados apresentaram um controle crônico ruim do DM1.

CONCLUSÕES: Neste grupo de DM1 com controle inadequado da doença, houve um prejuízo na altura final em relação à altura do início do DM1, provavelmente causado por uma baixa VC durante a puberdade, que, no entanto, não teve influência na altura final em relação ao alvo parental.

Descritores: Crescimento; DM tipo 1; Estirão de crescimento; Puberdade

ABSTRACT

OBJECTIVE: Type 1 diabetes mellitus (DM1), the most important chronic endocrine-metabolic disease in children and adolescents, may lead to delayed growth and puberty. In this study we analyzed the influence of DM1 on growth spurt and puberty of patients whose onset of the disease was before or at the beginning of this phase.

PATIENTS AND METHODS: Data from 40 patients, 25 females, who had attained final height were retrospectively obtained, including duration of disease, patient's height and weight SDS at each consultation, parental target height, yearly growth velocities (GV), peak of growth spurt, duration of puberty, magnitude of growth spurt and glycated hemoglobin (HbA1C) levels.

RESULTS: 37 patients had an adequate final height to parental target height, and only 3 were below the lower limit. There was no significant association among the variables and the appropriate final height to the target height, except for GV on growth spurt, when it was lower than or equal to 6cm/year. The age of onset of DM1 and the age of peak of growth spurt was similar to previously data reported; regarding the age of the onset of puberty, there was no delay. However, the magnitude of the growth spurt and the peak of GV were lower. According to HbA1C levels, all patients exhibited a bad chronic control of DM1.

CONCLUSIONS: In this group of inadequately controlled patients, the final height was lower than expected when compared to the height at onset of DM1, probably due to a slow GV during puberty, which however had no influence on the final height to parental target height.

Keywords: Growth; Growth spurt; Puberty; Type 1 DM

O DIABETES MELLITUS TIPO 1 (DM1) é a mais importante doença endócrino-metabólica de evolução crônica entre crianças e adolescentes. Caracteriza-se pelo comprometimento do metabolismo da glicose e de outras substâncias produtoras de energia, bem como pelo desenvolvimento tardio de complicações vasculares e neuropáticas, relacionadas com o grau de controle metabólico, como provado por estudos como o Diabetes Control and Complications Trial (DCCT) (1).

Antes da descoberta da insulina em 1922, as crianças com DM1 tornavam-se gravemente desnutridas e, em geral, viviam poucos meses. Nos primeiros anos após a disponibilidade comercial da insulina, as crianças foram poupadas da morte precoce, porém ainda mantinham uma desnutrição grave devido à dieta extremamente restritiva e a apenas 1 ou 2 aplicações de insulina de ação rápida ao dia (2). Os distúrbios de crescimento descritos em diabéticos a partir da década de 30 continuaram a ser freqüentes e relacionados ao tempo e ao grau de controle da doença (2-10).

Os dados sobre a época da puberdade e o crescimento puberal em diabéticos são conflitantes, alguns estudos mostram não haver alteração na época da puberdade (11,12) ou na intensidade do estirão (13), enquanto outros relatam atraso puberal (8,14,15) ou inadequado estirão puberal, principalmente nas meninas (11,12,14,16,17).

Alguns autores associam o crescimento com o controle metabólico, relatando recuperação estatural em crianças descompensadas após a melhora do controle da doença (18-20) ou modificações na altura final (5,7,21); entretanto, a maioria dos estudos não relata essa associação (4,6,11,22-25). Em 1973, Tattersal e Pyke, avaliando 12 pares de gêmeos idênticos, sendo que um dos membros desenvolveu DM1 antes da puberdade e o outro não, relataram que em todos, com exceção de um, os membros afetados eram muito mais baixos. Os autores acreditam que esta diferença de crescimento se justifica pelo controle metabólico inadequado, mostrando que o tratamento convencional do DM1 utilizado na época resultava quase sempre em resultados ruins (26).

No entanto, nos pacientes com DM1 e altura final prejudicada em relação à população controle e/ou à altura-alvo parental, ainda permanece sem esclarecimento qual fase do crescimento pode ter sido alterada, ou seja, se ocorreu um prejuízo nos anos pré-puberdade, na puberdade ou em ambos (14).

Devido ao escasso número de trabalhos publicados em relação ao estirão de crescimento e à grande variação de resultados obtidos em relação à altura final em pacientes com DM1, este estudo teve por objetivo avaliar a influência desta doença no estirão de crescimento da puberdade e na puberdade de indivíduos com doença iniciada antes ou no começo da puberdade.

CASUÍSTICA

Foi composta de todos os pacientes com DM1 acompanhados no Ambulatório de Diabetes em Pediatria do Hospital de Clínicas (HC) da UNICAMP que apresentavam altura final, sendo esta definida por velocidade de crescimento menor que 0,5cm/ano e idade superior a 18 anos.

MÉTODOS

Por meio de um estudo retrospectivo com avaliação de prontuários, analisaram-se as seguintes variáveis: sexo, as datas de nascimento, de início do DM1, de cada consulta a partir de então com intervalo de 6 meses entre elas e a da menarca, as alturas dos pais, do paciente no início da doença e a cada consulta, o peso no início da doença e a cada consulta e os valores de hemoglobina glicada a cada consulta.

A partir destes dados foram calculados o tempo total de doença (meses) e os escores de desvio-padrão (z escore) da altura e do peso do paciente a cada consulta, utilizando-se como padrão os dados do National Center of Health Statistics de 2000 (27). A altura-alvo parental (AAP) foi calculada a partir da altura dos pais corrigida para o sexo do paciente e calculados os z escores da média e dos limites superiores e inferiores da normalidade, utilizando-se também os dados do NCHS de 2000, conforme técnica abaixo (28,29):

A partir dos dados de altura durante o desenvolvimento do paciente, com intervalo de seis meses entre cada registro, foram calculadas as velocidades de crescimento anuais, sendo considerada o pico do estirão de crescimento a época da maior velocidade de crescimento (PVC), e a duração da puberdade o período compreendido entre 2 anos antes e 2 anos após o PVC (30). A partir destes dados foram calculadas as variáveis idades (meses) de início da puberdade e no pico do estirão, e ganho total de crescimento durante o estirão puberal (cm).

Foram ainda calculadas as seguintes variáveis: diferença entre os z escores da altura final e inicial (os pacientes foram divididos em 3 grupos: maior, menor ou inalterada) e adequação do z escore da altura final em relação à altura-alvo parental (os pacientes foram divididos em 2 grupos: adequado e inadequado).

A hemoglobina glicada foi realizada pela técnica HPLC no Laboratório de Patologia Clínica do Hospital de Clínicas da UNICAMP, com valores considerados normais entre 3,9 e 6,1%. Foi feito o cálculo da média dos valores coletados durante a puberdade, com pelo menos 3 dosagens anuais.

Os pacientes foram também divididos em grupos de acordo com o tempo (meses) de evolução da doença (> 144, entre 97 e 144, e < 97), a idade (meses) da menarca (> 180, entre 157 e 180, e < 157), a velocidade de crescimento (cm/ano) no pico do estirão (> 9,0, entre 7,5 e 9,0, entre 7,5 e 6,0, e < 6,0), a idade (meses) do PVC (> 170, entre 144 e 170, e < 144), e o ganho total de altura (cm) durante o estirão de crescimento da puberdade (> 20, entre 16 e 20, e < 16).

Foi feita análise descritiva dos dados com cálculos de média, desvio-padrão e variação dos dados. O teste de Wilcoxon foi utilizado na comparação do z da altura e do peso no início do DM1 contra, respectivamente, o z da altura e do peso após a puberdade; e do z da altura final em relação ao z da média da altura-alvo. Foi também calculado o Odds ratio e aplicados os testes de qui-quadrado ou Fisher na comparação das variáveis diferença entre os z escores da altura final e inicial e adequação do z escore da altura final em relação à altura-alvo parental, em relação aos grupos de valores (%) de hemoglobina glicada, de tempo (meses) de evolução da doença, de idade (meses) da menarca, de velocidade de crescimento (cm/ano) no pico do estirão, de idade (meses) do PVC e de ganho total de altura (cm) durante o estirão de crescimento da puberdade. Para todos os testes aplicados foi considerado um nível de significância menor que 5%.

RESULTADOS

Foram avaliados 40 pacientes com DM1, sendo 25 do sexo feminino. A tabela 1 mostra os dados de média, desvio-padrão e variação das variáveis idade de início do diabetes mellitus (meses), a idade de início da puberdade (meses), o tempo de doença antes do início da puberdade (meses), o incremento de altura durante a puberdade (cm), a velocidade de crescimento no pico do estirão (cm/ano), a idade no pico do estirão de crescimento (meses) e a idade da menarca (meses). Em relação à época do estirão de crescimento, o início do DM1 ocorreu antes da puberdade em 27 casos, e nos demais durante a puberdade.

Separando por sexo, respectivamente nas mulheres e nos homens a média da idade do pico de velocidade de crescimento foi de 135 meses com DP de 16 meses (variando de 106 a 174) e 169 meses com DP de 24 meses (variando de 134 a 227); a média do pico de velocidade de crescimento foi de 6,7cm com DP de 1,3cm (variando de 4,4 a 10,1) e 8,7cm com DP de 2,0cm (variando de 5,2 a 13,5); a média do ganho total de crescimento durante o estirão foi de 17,6cm com DP de 4,0cm (variando de 10,1 a 25,2) e 21,9cm com DP de 4,8cm (variando de 9,9 a 28,2).

A média do z escore do peso no início do DM1 foi de -0,66 com DP de 1,2 (variando de -3,55 a 2,23) e da estatura foi de -0,39 com DP de 1,34 (variando -3,35 a 2,24). Em relação à altura final, o z escore médio foi de -1,18 com DP de 1,12 (variando de -3,85 a 0,66), e o z escore médio do peso nesta época foi de -0,59 com DP de 0,97 (variando de -3,27 a 1,72). Observou-se diferença estatisticamente significante do z da altura inicial em relação ao z da altura final (p= 0,0001), o mesmo não ocorrendo em relação ao z do peso (p= 0,734). A média do z da altura final nas mulheres foi de -1,22 com DP de 1,08 (variando de -2,91 a 0,66) e nos homens de -1,12 com DP de 1,22 (variando de -3,85 a 0,65).

O z escore da média da altura dos pais corrigida para o sexo variou de -2,75 a 0,33, com média de -0,98 e desvio-padrão de 0,7, sendo o z escore médio do limite superior da altura alvo de -0,28 (variando de -1,57 a 1,65) e o inferior de -2,25 (variando de -3,9 a -0,98). Não foi encontrada diferença estatisticamente significante na comparação do z da altura final em relação ao z da média da altura alvo (p= 0,197). Trinta e sete pacientes ficaram dentro da previsão da altura-alvo parental e apenas 3 abaixo desta previsão.

A média dos valores da hemoglobina glicada durante a puberdade foi de 11,8% com desvio-padrão de 1,5% (variando de 8,3 a 15,8%).

A tabela 2 apresenta os resultados do Odds ratio da adequação do z da altura final em relação ao z da altura-alvo dos 40 pacientes com diabetes mellitus tipo 1 em relação à hemoglobina glicada (%), tempo de evolução do diabetes (meses), idade da menarca (meses), velocidade de crescimento no pico do estirão puberal (cm/ano), idade no pico da velocidade de crescimento (meses) e ganho total de altura durante a puberdade (cm). Não foi observada associação destas variáveis analisadas em relação à adequação da altura final para a altura-alvo, com exceção da velocidade de crescimento no pico do estirão, quando esta foi menor ou igual a 6cm/ano (p= 0,008).

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

A avaliação do crescimento e do desenvolvimento puberal no acompanhamento clínico de doenças crônicas, como o DM1, deve ser sempre realizada e documentada. Os serviços que se dedicam ao atendimento destes pacientes devem instituir um modelo de ficha que contemple a anotação de todos os dados clínicos e laboratoriais necessários para avaliar o controle da doença, não se esquecendo da altura dos pais para avaliar a altura-alvo parental, da época da puberdade e presença de obesidade nos pais, irmãos e familiares próximos.

Em nosso serviço, há mais de 10 anos, temos tido o cuidado de manter uma ficha-padrão para avaliação do primeiro atendimento e outra para avaliação das consultas de acompanhamento dos pacientes diabéticos, com anotação de todos os dados clínicos e laboratoriais, incluindo peso, altura, desenvolvimento puberal e valor da hemoglobina glicada, entre outros dados, o que possibilitou a realização deste estudo retrospectivo.

Neste estudo, a idade de início do DM1 foi de 8,1 ± 2,7 anos, coincidindo com a faixa etária descrita na literatura de maior incidência para o início desta doença (9,31-33).

A idade de início da puberdade foi de 10,3 ± 2,0 anos, sendo que apenas 2 pacientes, ambos do sexo masculino, iniciaram a puberdade após os 15 anos de idade (aos 15,6 e aos 16,6 anos). A idade da menarca foi de 14 ± 1,4 anos, sendo a menor idade de 9,8 anos e a maior de 17 anos. Portanto, neste grupo de pacientes avaliado, apesar do controle glicêmico inadequado, não foi observado atraso da puberdade, como descrito em outras doenças crônicas, principalmente aquelas com mau controle (34-36).

No entanto, o ganho de altura durante a puberdade foi menor que o descrito na literatura, de 25cm para as mulheres e 28cm para os homens (37), o mesmo ocorrendo em relação ao pico de velocidade de crescimento puberal em relação ao descrito de 7 a 11cm/ano para as mulheres, com média de 8,4cm/ano, e de 7,2 a 13,4cm/ano para os homens, com média de 9,5cm/ano (38). A idade do pico do estirão puberal observada coincidiu com a descrita para as mulheres de 12 anos (39) e de 14 anos para os homens (40).

De acordo com os valores da hemoglobina glicada, 11,8 ± 1,5% (8,3 a 15,8%), todos os pacientes avaliados apresentaram um controle crônico ruim do DM1 segundo o método utilizado por Chase (41), que considera controle adequado quando o paciente apresenta o resultado da divisão do valor da sua hemoglobina glicada pelo valor do limite superior do método menor que 1,33. Nestes pacientes estudados, sabendo-se que o limite superior do método foi de 6,2%, o controle adequado seria menor que 8,2%.

Os dados deste estudo mostram que estes pacientes com DM1 apresentaram uma diminuição do ganho de altura após o início da doença até a altura final, sem a correspondente perda ponderal. Provavelmente, nestes pacientes, este resultado se deve à diminuição da velocidade de crescimento durante a puberdade, especialmente em pacientes com controle metabólico ruim, como neste estudo, e já muito bem documentado por Jackson em 1984 (2) em um grande estudo prospectivo com 252 diabéticos (131 meninas e 121 meninos). Porém, deve-se ressaltar que, no estudo atual, não foi possível avaliar a interferência das variáveis analisadas com a diferença da altura no início da doença em relação à altura no final da mesma, devido ao número reduzido de casos em determinados grupos.

No entanto, ao avaliarmos a adequação da altura final deste grupo de 40 diabéticos em relação à altura-alvo parental, observa-se que 37 deles ficaram dentro da previsão, sendo 17 acima da média, 2 na média e 18 entre a média e o limite inferior. Apenas 3 ficaram abaixo do limite inferior. Estes dados sugerem que o DM1 não interferiu na altura final em relação à altura-alvo, mas pode não ter permitido um ganho maior de altura, pois foi observado um risco significativamente aumentado de prejuízo da altura final em relação à altura-alvo quando a velocidade de crescimento no pico do estirão puberal era menor que 6cm/ano. Este dado, no entanto, deve ser analisado com cuidado, pois o intervalo de confiança obtido foi muito grande, diminuindo o poder do resultado, devendo-se ampliar a casuística para a confirmação do dado.

Em 2003, Lebl e cols., avaliando em um estudo longitudinal o crescimento de 581 diabéticos (317 homens) no início da doença, antes e durante a puberdade, obtiveram os mesmos resultados, mostrando que os diabéticos são mais altos no início da doença, fazem uma puberdade com velocidade de crescimento mais baixa e terminam com estatura final dentro do esperado para o alvo parental. Estes autores comentam que o crescimento acelerado antes da doença pode ocorrer pela elevação dos níveis séricos de hormônio de crescimento, andrógenos e fatores de crescimento semelhantes à insulina em decorrência da resistência insulínica, e a desaceleração subseqüente e na puberdade por problemas psicológicos e/ou mau controle da doença (42).

Portanto, podemos concluir que, neste grupo de 40 diabéticos com controle crônico inadequado da doença, houve um prejuízo da altura final em relação à altura do início do DM1, provavelmente causado por uma baixa velocidade de crescimento durante a puberdade, que, no entanto, não teve influência importante na altura final em relação ao alvo parental.

Recebido em 08/03/04

Revisado em 16/06/04 e 09/11/04

Aceito em 14/02/05

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  • Endereço para correspondência
    Gil Guerra-Júnior
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Out 2005
    • Data do Fascículo
      Jun 2005

    Histórico

    • Recebido
      08 Mar 2004
    • Revisado
      04 Nov 2004
    • Aceito
      14 Fev 2005
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