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Prevalência de deficiência e insuficiência de vitamina D e sua correlação com PTH, marcadores de remodelação óssea e densidade mineral óssea, em pacientes ambulatoriais

Prevalence of vitamin D deficiency and its correlation with PTH, biochemical bone turnover markers and bone mineral density, among patients from ambulatories

Resumos

A deficiência de vitamina D (VD) leva ao raquitismo e à osteomalacia e sua insuficiência, caracterizada pelo hiperparatireoidismo secundário, pode resultar osteoporose. Apesar de amplamente prevalente, a insuficiência de VD ainda é pouco reconhecida e subtratada. Os autores estudaram 180 pacientes atendidos em ambulatório de endocrinologia em Belo Horizonte, que tiveram os níveis de 25(OH)VD mensurados, correlacionando-os com paratormônio (PTH), marcadores de remodelação óssea e densidade mineral óssea. Para caracterização de níveis insuficientes de VD, foram correlacionados os níveis de 25(OH)VD com os de PTH, definindo-se, nesta série, ponto de corte de 25(OH)VD de 32 ng/ml. Foi encontrada correlação inversa e significativa entre 25(OH)VD e PTH e entre 25(OH)VD e C-telopeptídeo. A prevalência de insuficiência de VD na população estudada foi de 42,4%. Conclui-se que a insuficiência de VD tem alta prevalência entre pacientes que freqüentam nossos consultórios, alertando para a importância da sua investigação na prática clínica e na instituição de políticas para sua prevenção.

Vitamina D; Paratormônio; Marcadores de remodelação óssea; Densidade mineral óssea; Insuficiência de vitamina D


Consequences of VD deficiency include rickets and osteomalacia. However, marginal concentrations of 25-hydroxyvitamin D (25(OH)VD) are associated with secondary hyperparathyroidism and osteoporosis. In this context, levels of 25(OH)VD capable to elevate parathyroid hormone (PTH) could be considered as insufficient. The VD insufficiency, although widely prevalent, is still under-recognized and under-treated. The authors have studied 180 patients followed in a endocrinology clinic in Belo Horizonte, who had 25(OH)VD measured, correlating it with PTH, biochemical bone turnover markers and bone mineral density. To determine the sufficiency of VD, 25(OH)VD was correlated with PTH and the cutoff found was of 32ng/ml. CTX-1 and PTH were significantly negative correlated to 25(OH)VD and the prevalence of VD insufficiency was 42%. One concludes that the VD insufficiency is widely prevalent among patients who frequently come to our offices, alerting us for the importance to assess VD status more often and to practice politics for prevention of VD insufficiency.

Vitamin D; Parathyroid hormone; Bone turnover markers; Bone mineral density; Vitamin D insufficiency


ARTIGO ORIGINAL

Prevalência de deficiência e insuficiência de vitamina D e sua correlação com PTH, marcadores de remodelação óssea e densidade mineral óssea, em pacientes ambulatoriais

Prevalence of vitamin D deficiency and its correlation with PTH, biochemical bone turnover markers and bone mineral density, among patients from ambulatories

Bárbara C. Carvalho SilvaI; Bruno Muzzi CamargosII; Julienne Borges FujiiIII; Eduardo Pimentel DiasIV, V; Maria Marta Sarquis SoaresV, VI

IAmbulatório de Doenças Osteometabólicas do Serviço de Endocrinologia da Santa Casa de Belo Horizonte, MG, Brasil

IIDensimater – Serviço de Densitometria Óssea do Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG, Brasil

IIIFelicoop – Núcleo de Apoio à Pesquisa, Belo Horizonte, MG, Brasil

IVServiço de Endocrinologia do Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil

VInstituto Felício Rocho de Pesquisa e Educação Continuada (Iferpec), MG, Brasil

VIDepartamento de Clínica Médica da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil

Endereço para correpondência Endereço para correpondência: Bárbara C. C. Silva Rua Uberaba, 370, sala 901 - Barro Preto 30180-080, Belo Horizonte MG Email: barbaracampolina@mac.com

RESUMO

A deficiência de vitamina D (VD) leva ao raquitismo e à osteomalacia e sua insuficiência, caracterizada pelo hiperparatireoidismo secundário, pode resultar osteoporose. Apesar de amplamente prevalente, a insuficiência de VD ainda é pouco reconhecida e subtratada. Os autores estudaram 180 pacientes atendidos em ambulatório de endocrinologia em Belo Horizonte, que tiveram os níveis de 25(OH)VD mensurados, correlacionando-os com paratormônio (PTH), marcadores de remodelação óssea e densidade mineral óssea. Para caracterização de níveis insuficientes de VD, foram correlacionados os níveis de 25(OH)VD com os de PTH, definindo-se, nesta série, ponto de corte de 25(OH)VD de 32 ng/ml. Foi encontrada correlação inversa e significativa entre 25(OH)VD e PTH e entre 25(OH)VD e C-telopeptídeo. A prevalência de insuficiência de VD na população estudada foi de 42,4%. Conclui-se que a insuficiência de VD tem alta prevalência entre pacientes que freqüentam nossos consultórios, alertando para a importância da sua investigação na prática clínica e na instituição de políticas para sua prevenção.

Palavras-chave: Vitamina D; Paratormônio; Marcadores de remodelação óssea; Densidade mineral óssea; Insuficiência de vitamina D

ABSTRACT

Consequences of VD deficiency include rickets and osteomalacia. However, marginal concentrations of 25-hydroxyvitamin D (25(OH)VD) are associated with secondary hyperparathyroidism and osteoporosis. In this context, levels of 25(OH)VD capable to elevate parathyroid hormone (PTH) could be considered as insufficient. The VD insufficiency, although widely prevalent, is still under-recognized and under-treated. The authors have studied 180 patients followed in a endocrinology clinic in Belo Horizonte, who had 25(OH)VD measured, correlating it with PTH, biochemical bone turnover markers and bone mineral density. To determine the sufficiency of VD, 25(OH)VD was correlated with PTH and the cutoff found was of 32ng/ml. CTX-1 and PTH were significantly negative correlated to 25(OH)VD and the prevalence of VD insufficiency was 42%. One concludes that the VD insufficiency is widely prevalent among patients who frequently come to our offices, alerting us for the importance to assess VD status more often and to practice politics for prevention of VD insufficiency.

Key words: Vitamin D; Parathyroid hormone; Bone turnover markers; Bone mineral density; Vitamin D insufficiency

INTRODUÇÃO

A VITAMINA D (VD), considerada um hormônio esteróide desde meados da década de 1960 (1), é de fundamental importância para a homeostase do cálcio e do fósforo e para a saúde musculoesquelética (2). Além disso, níveis insuficientes de VD vêm sendo implicados na patogênese e na progressão de várias outras desordens, incluindo doenças cardiovasculares, câncer de cólon e próstata, esclerose múltipla, diabetes melito tipos 1 e 2, doença inflamatória intestinal, entre outras (2-11).

A vitamina D3 ou colecalciferol é sintetizada na pele humana pela ação da radiação UV-B a partir do 7-dehidrocolesterol, além de ser encontrada em certos alimentos, como óleo de peixe e gema de ovo (1,12). A vitamina D2 ou ergocalciferol é formada a partir de um esteróide fúngico, o ergosterol, sendo pouco disponível naturalmente nos alimentos, mas usada como suplemento alimentar (12). Uma vez ingerida ou sintetizada na pele, a VD é transportada até o fígado, onde sofre a primeira hidroxilação no carbono 25, convertendo-se a 25-hidroxi-vitamina D (25(OH)VD). A 25(OH)VD é a principal forma de VD circulante, com meia-vida em torno de duas a três semanas. Sua concentração sérica tem estreita correlação com os achados de osteomalacia e raquitismo e com a produção cutânea ou ingesta de VD, refletindo de maneira segura os estoques corporais desta vitamina (1,7,12-14). No rim, a 25(OH)VD sofre nova hidroxilação com a produção de sua forma ativa, a 1,25 dihidroxi-vitamina D (1,25(OH)2D). Apesar de se tratar da forma ativa, os níveis séricos de 1,25(OH)2D não se prestam para uma estimativa do estoque corporal de VD, pois podem estar normais na osteomalacia leve ou moderada, em decorrência do hiperparatireoidismo secundário que acompanha esta condição. Além disso, a 1,25(OH)2D tem meia-vida menor, em torno de seis a oito horas, e sua produção local, como a que ocorre em várias células do organismo, não pode ser estimada pelos níveis circulantes deste metabólito (13).

A deficiência de VD prejudica a mineralização óssea, levando ao raquitismo e à osteomalacia, em crianças, e à osteomalacia, nos adultos (7,12). No entanto, reduções menos graves nos níveis de VD, com concentrações séricas de 25(OH)VD dentro dos valores de referência normais, podem levar à redução na calcemia, resultando hiperparatireoidismo secundário, perda óssea e osteoporose (1,2,7,13-17). Nesse contexto, níveis de 25(OH)VD abaixo dos quais começa haver alteração na homeostase do cálcio e elevação do PTH, caracterizando o hiperparatireoidismo secundário, poderiam ser considerados como insuficientes (1,14,18,19). Muitos autores consideram níveis séricos insuficientes de 25(OH)VD, aqueles abaixo de 30 a 32 ng/ml (7,14,17-19). No entanto, há grande variabilidade entre os ensaios de diferentes laboratórios, dificultando a determinação de um nível ideal universal de 25(OH)VD, e alguns autores sugerem que seria mais prudente a determinação de níveis normais de 25(OH)VD para cada população, para cada método e laboratório (1,14,18). Essa determinação faz-se importante uma vez que a insuficiência de VD parece ser freqüente em nosso meio, mas ainda pouco reconhecida e, portanto, subtratada (14).

Fundamentados nisso, os autores estudaram uma população de pacientes residentes na região metropolitana de Belo Horizonte-MG com endocrinopatias variadas, com o objetivo de identificar a prevalência de deficiência de VD, correlacionando concentrações séricas de 25(OH)VD com níveis de PTH, marcadores de remodelação óssea e densitometria óssea da coluna lombar e do fêmur.

PACIENTES E MÉTODOS

Por meio de revisão de prontuários, foram selecionados 180 pacientes acompanhados em ambulatório de endocrinologia, por diferentes motivos, que tivessem tido os níveis séricos de 25(OH)VD mensurados, em um mesmo laboratório, ao longo de todo o ano de 2006. Quando disponíveis, exames de densitometria óssea e dosagens séricas de PTH intacto (PTH), cálcio total corrigido pela albumina e/ou cálcio iônico, C-telopeptídeo (CTX-1) e fosfatase alcalina óssea (FAO) foram utilizados para a análise dos dados. Foram excluídos os pacientes com alteração da função renal ou hepática e aqueles em uso de medicações que, sabidamente, interferem no metabolismo da VD. Os pacientes em uso de suplemento de VD foram incluídos na análise. Todos os pacientes eram provenientes da cidade de Belo Horizonte, MG, que está na latitude de 19ºS.

Para realização da correlação entre os níveis de 25(OH)VD com níveis de PTH, CTX-1, FAO, calcemia e densidade mineral óssea, foram excluídos os pacientes com diagnóstico de hiperparatireoidismo primário, hiper ou hipotireoidismo não tratados e aqueles em uso de bisfosfonatos, terapia de reposição hormonal, modulador seletivo do receptor estrogênico, corticóide, suplementos de cálcio e VD e outros medicamentos capazes de influenciar o metabolismo do cálcio e a remodelação óssea.

A 25(OH)VD foi dosada por HPLC com coeficiente de variação interensaio de 10% e valor de referência de 14 a 80 ng/ml. O PTH foi dosado por quimioluminescência, com coeficiente de variação interensaio de 7% e valor de referência de 7 a 53 pg/ml. O CTX-1 foi dosado no soro por eletroquimioluminescência com limite superior da normalidade, em homens abaixo de 50 anos e em mulheres na pré-menopausa, de até 0,584 e 0,573 nanog/ml, respectivamente. O coeficiente de variação interensaio do CTX-1 varia de 2,10% a 3,56%. A FAO foi dosada pelo método de imunoensaio por captura, com coeficiente de variação interensaio de 5,2% e valores de referência entre 11,6 a 30,6 U/L para mulheres pré-menopausadas e 15 a 41,3 U/L, em homens.

As densitometrias ósseas foram realizadas em dois serviços, acreditados pela Sociedade Brasileira de Densitometria (SBDENS), que utilizam o mesmo recurso tecnológico: densitômetro fan-beam da marca GE/Lunar, modelo Prodigy Advanced Plus, com software versão 9.3, de setembro de 2005. Cada paciente foi submetido a um único exame, com finalidade diagnóstica, dispensando-se, com isso, exames cruzados de phantom, considerados ideais quando exames seriados são realizados. Foram adquiridos exames de coluna e fêmur. Todos os exames atenderam às recomendações técnicas vigentes à época, de acordo com as posições oficiais preconizadas pela International Society for Clinical Densitometry (ICSD).

A análise estatística dos dados foi desenvolvida utilizando técnicas descritivas e exploratórias (média, mediana, desvio-padrão, tabelas de freqüências e gráficos), testes comparativos não-paramétricos (Mann-Whitney e Kruskal-Wallis) e análise de correlação (Spearman). O nível de significância adotado foi de 5% (a = 0,05).

RESULTADOS

Foram avaliados 180 pacientes, sendo 165 (91,6%) do sexo feminino. A idade variou entre 14 a 91 anos, com média de 58,87 anos. Os diagnósticos mais freqüentemente encontrados foram hipotireoidismo em 27,3% dos casos, osteoporose em 26,3%, diabetes melito tipo 2 em 13,4%, climatério em 12,9%, hipertensão em 9,1%, dislipidemia em 5,3% e hiperparatireoidismo primário em 2,9%

Entre os pacientes avaliados, independentemente do diagnóstico, incluindo aqueles em uso de suplementos de VD, os valores de 25(OH)VD, em ng/ml, variaram entre 11 e 80,3, com média (± DP) de 39,79 ± 16,76 e mediana de 36,45.

Excluindo-se os pacientes em uso de suplementos de VD, obteve total de 132 pacientes. Neste grupo, os valores de 25(OH)VD, em ng/ml, variaram de 11,0 a 76,3, com média (± DP) de 38,23 ± 15,62 e mediana de 34,30. Considerando níveis deficientes e insuficientes de VD aqueles abaixo de 14 ng/ml e 32 ng/ml, respectivamente, 0,8% destes pacientes tinham deficiência e 42,4% tinham insuficiência de VD.

No grupo que estava em uso de suplementos de VD, representado pelo total de 48 pacientes, não houve casos de deficiência de VD [25(OH)VD abaixo de 14 ng/ml], mas 13 pacientes (27%) tinham níveis insuficientes de VD [25(OH)VD abaixo de 32 ng/ml]. A porcentagem de pacientes com insuficiência de VD foi menor entre o grupo em reposição de VD; esta diferença foi estatisticamente significativa (p = 0,047).

Comparando a VD em relação ao sexo e à faixa etária, em anos, não foi identificada diferença significativa, com valor p > 0,05 para ambas as comparações.

Depois de exclusões pertinentes, correlacionou-se níveis de 25(OH)VD com níveis de PTH (56 pacientes), CTX-1 (51 pacientes), FAO (52 pacientes), DMO (58 pacientes) e calcemia (86 pacientes). Houve correlação significativa e negativa entre os níveis de 25(OH)VD e PTH (r = –0,416 e valor p = 0,001) e entre 25(OH)VD e CTX-1 (r = –0,292 e valor p = 0,038), representadas nas Figuras 1 e 2, respectivamente. Não houve correlação estatisticamente significativa entre 25(OH)VD e densidade mineral óssea ou calcemia. Também não houve correlação significativa entre 25(OH)VD e FAO, apesar de ter sido observada tendência a níveis elevados de FAO entre os pacientes com níveis menores de 25(OH)VD.



Considerando o limite máximo da normalidade para PTH de 53 pg/ml, foram verificados valores de 25(OH)VD significativamente mais baixos entre os pacientes com PTH acima do valor de referência (p = 0,001) (Figura 3). Avaliando possíveis pontos de corte para caracterizar insuficiência de VD na nossa série, a fim de identificar um ponto abaixo do qual começa ocorrer aumento do PTH, obteve-se a melhor correlação com níveis de 25(OH)VD de 32 ng/ml (p = 0,000) (Figura 1). Com níveis de 25(OH)VD acima de 32 ng/ml, o PTH atinge platô, com concentrações aproximadas de 40 pg/ml.


DISCUSSÃO

A insuficiência de VD constitui hoje uma epidemia não reconhecida em várias populações de todo o mundo (2). Sabe-se que níveis séricos de 25(OH)VD, ditos normais, nem sempre refletem concentrações suficientes para manutenção da saúde óssea e muscular, podendo inclusive aumentar o risco de doenças não osteomusculares, como neoplasias ou doenças inflamatórias e cardiovasculares (2-11).

Para a determinação de níveis ótimos de 25(OH)VD, o ideal seria correlacionar sua concentração sérica com eventos hipoteticamente relacionados à sua insuficiência. Um estudo com este desenho, no entanto, é desafiador, uma vez que doenças ligadas à insuficiência de VD são, em sua maioria, crônicas, com longo período de latência e com causas multifatoriais (20).

Alternativamente, alguns autores fundamentam-se nos níveis de PTH para estabelecer níveis satisfatórios de VD. Os limites de concentração sérica de 25(OH)VD, que separam a suficiência da insuficiência desta vitamina, poderiam ser definidos por seus efeitos biológicos conhecidos no metabolismo ósseo e mineral, refletidos, particularmente, no aumento do PTH (19). Assim, valores de VD abaixo dos quais ocorre elevação dos níveis de PTH, caracterizando uma alteração na homeostase do cálcio e hiperparatireoidismo secundário, seriam indicativos de insuficiência de VD.

Neste trabalho, os autores encontraram aumento do PTH quando os níveis de 25(OH)VD estão abaixo de 32 ng/ml. Considerando como insuficientes os níveis de 25(OH)VD abaixo deste valor, demonstrou-se a prevalência de insuficiência de VD de 42,4% entre os pacientes que não faziam uso de suplementos de VD. No grupo de usuários destes suplementos, com apresentações e doses variadas, 27% dos pacientes ainda tinham níveis insuficientes desta vitamina. Comparando os dois grupos, constatou-se que esta diferença é estatisticamente significativa. Além disso, houve correlação inversa e significativa entre PTH e 25(OH)VD (r = –0,416 e p = 0,001), nos dois grupos analisados.

Binkley e cols. (18) encontraram valores discordantes de 25(OH)VD obtidos de diferentes laboratórios, e Bandeira e cols. (14) sugerem que níveis normais de 25(OH)VD devem ser estabelecidos em cada região. De acordo com o conhecimento dos autores, este é o primeiro estudo em Belo Horizonte que avaliou níveis de VD e sua correlação com PTH, marcadores de remodelação e densidade mineral óssea. Todos os pacientes incluídos tiveram 25(OH)VD mensurada por HPLC, método padrão-ouro, em um mesmo laboratório. Os níveis de VD considerados suficientes nesta série foram semelhantes aos encontrados na literatura (14,19,21-23). Da mesma forma, a alta prevalência de insuficiência de VD demonstrada, foi verificada em outros trabalhos envolvendo crianças, adolescentes, adultos e idosos, saudáveis ou com doenças osteomusculares, institucionalizados ou não (2,12,14,19,23-27). Apesar deste estudo ter sido conduzido em uma cidade ensolarada, situada a baixa latitude (19ºS), isso não foi o bastante para prevenir a alta prevalência de insuficiência de VD demonstrada. Outros autores também encontraram baixos níveis de 25(OH)VD em indivíduos sadios e ativos vivendo em regiões com ampla disponibilidade de luz solar (28,29).

As causas para a grande prevalência de insuficiência de VD, mesmo em regiões de baixa latitude, são várias. A síntese de VD é proporcional à área exposta à luz solar e sofre influência de fatores ambientais, como latitude, estação do ano, hora do dia, quantidade de nuvens ou camada de ozônio, e de fatores relacionados ao próprio indivíduo e aos seus hábitos e costumes (17,30). Tipo de pele (quanto mais melanina, menor a quantidade de VD sintetizada para uma mesma dose de UV-B), uso de protetor solar (uso correto de protetor solar com FPS 8 ou 15 reduz a capacidade de síntese de VD em 95% e 99,9%, respectivamente), idade (idosos têm quantidade reduzida de 7-dehidrocolesterol, reduzindo a capacidade de síntese de VD) e uso de roupas que cubram grande parte do corpo são fatores que influenciam a síntese cutânea de VD (30,31). Atualmente, grande parte dos habitantes de centros urbanos desenvolvidos não mais se expõe à quantidade suficiente de luz solar para satisfazer as necessidades biológicas de VD (4).

A ingestão de VD é baixa, uma vez que sua ocorrência natural nos alimentos é pequena e a suplementação de alimentos com esta vitamina não é feita de modo universal (4,17,32). Para Vieth (17), sem exposição aos raios UV-B, a quantidade de VD obtida de fontes alimentares e suplementos disponíveis nos dias atuais é insuficiente para manter a concentração sérica de 25(OH)VD acima de 30 ng/ml, em adultos.

Uma metanálise publicada recentemente demonstrou que o uso de doses diárias de 700 a 800 UI de colecalciferol diminui o risco de fraturas em idosos (33). A redução do risco de fraturas poderia ser explicada por redução da perda de massa óssea e melhora da força muscular em membros inferiores, reduzindo o número de quedas, sobretudo em idosos (15,34,35). Evidências apontam para uma associação positiva entre os níveis de 25(OH)VD e densidade mineral óssea em fêmur e coluna lombar (36,37). Apesar disso, esta correlação não foi significativa nesta série, talvez por ter sido feita em um número pequeno de casos. Da mesma forma, a correlação entre 25(OH)VD e FAO não foi significativa, apesar da demonstração, por outros autores, de uma correlação negativa entre estas variáveis (16). Por outro lado, houve relação negativa e significativa entre o marcador de reabsorção óssea CTX-1 e 25(OH)VD (r = –0,292 e valor p = 0,038).

Os níveis de VD definidos como suficientes nessa casuística, com base na elevação do PTH sérico, foram aqueles superiores a 32 ng/ml. Este valor deve ser individualizado, pois sabe-se que alguns indivíduos podem desenvolver hiperparatireoidismo secundário com níveis de 25(OH)VD mais altos (22,38). Além disso, autores que avaliaram eventos relacionados à insuficiência de VD constataram a necessidade de níveis mais elevados de 25(OH)VD para a prevenção de outras doenças (Tabela 1).

Não se avaliou quais seriam as doses ideais de reposição de VD para a manutenção de níveis satisfatórios de 25(OH)VD. Em artigo de revisão publicado recentemente (40), Holick sugere que a reposição de VD para adultos ou idosos com exposição solar ou suplementação insuficientes seja feita com ergocalciferol (vitamina D2), na dose de 50.000 UI por semana, por 8 semanas. A dosagem de 25(OH)VD deve ser realizada ao término do tratamento e o mesmo esquema repetido caso seus níveis permaneçam inferiores a 30 ng/ml. Se, por outro lado, este nível for atingido, sugere manter 50.000 UI de D2 a cada 15 ou 30 dias, para prevenção da deficiência. Holick e outros autores sugerem, ainda, como alternativa, doses de 800 a 1.000 UI por dia de colecalciferol (1,15,40), mas não sabemos se esses esquemas terapêuticos são válidos para nossa população. Enquanto isso, acreditamos que o ideal seria a individualização da dose de reposição de VD ajustada por meio da monitorização dos níveis de calcemia, calciúria e 25(OH)VD.

CONCLUSÃO

Existe alta prevalência de insuficiência de VD entre os pacientes avaliados e há uma correlação significativa e inversa entre 25(OH)VD e PTH e 25(OH)VD e CTX-1. Níveis de 25(OH)VD que melhor se correlacionaram com elevação do PTH sérico foram aqueles inferiores a 32 ng/ml, embora níveis desta vitamina em torno de 40 ng/ml pareçam ser necessários para prevenção de outras doenças. Políticas de prevenção de insuficiência de VD, como a fortificação de alimentos com esta vitamina, deveriam ser adotadas, mesmo em países localizados em latitudes mais baixas. A avaliação dos níveis de 25(OH)VD deveria fazer parte da propedêutica médica habitual, uma vez que não há outra forma de mensurarmos os estoques de VD e adequá-los para cada paciente individualmente.

Recebido em 26/06/2007

Aceito em 03/12/2007

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Maio 2008
    • Data do Fascículo
      Abr 2008

    Histórico

    • Aceito
      03 Dez 2007
    • Recebido
      26 Jun 2007
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