Acessibilidade / Reportar erro

Androgênios séricos e densidade mineral óssea em mulheres ooforectomizadas e não ooforectomizadas na pós-menopausa

Serum androgen concentrations and bone mineral density in postmenopausal ovariectomized and non-ovariectomized women

Resumos

OBJETIVO: Comparar os níveis de androgênios e densidade mineral óssea (DMO) em mulheres ooforectomizadas (OOF) e não ooforectomizadas (NOOF) na pós-menopausa. Quarenta mulheres (53,9 ± 4 anos), 20 OOF e 20 NOOF foram selecionadas. MÉTODOS: Testosterona total (TT), testosterona livre (TL), androstenediona (AN), deidroepiandrosterona (DHEA) e sulfato de deidroepiandrosterona (DHEA-S) foram dosados. DMO foi avaliada em 16 NOOF e 14 OOF. RESULTADOS: Não houve diferença entre os grupos com relação à idade, ao índice de massa corporal (IMC) e ao tempo de menopausa. Concentração média de TT e TL foi duas vezes maior em mulheres NOOF (60,91 versus 30,17 ng/dL, p = 0,0001; 1,00 versus 0,48 pg/mL, p = 0,003). Não houve diferença na DMO. Houve correlação inversamente significativa entre IMC e TT, r = -0,3; p = 0,05, e do tempo de menopausa com AN (r = -0,35; p = 0,02), DHEA, (r = 0,3; p = 0,01). CONCLUSÃO: Ooforectomia bilateral resultou em deficiência androgênica mais severa que a menopausa natural, sem comprometimento da massa óssea.

Androgênios; menopausa; massa óssea; ooforectomia


OBJECTIVE: Compare levels of androgens and bone mineral density (BMD) of ovariectomized (OVX) and non-ovariectomized (NOVX) postmenopausal women. Forty women, 20 OVX and 20 NOVX, (53.9 ± 4 years) were selected. METHODS: Total testosterone (TT), free testosterone (FT), androstenedione (AN), dehidroepiandrostenedione (DHEA) and its sulfate (DHEA-S) were measured. BMD was measured in 14 OVX and 16 NOVX. RESULTS: No differences between groups with regard to age, body mass index (BMI) and time since menopause were found. Mean levels of TT and FT were two-fold higher in NOVX group (60.91 versus 30.17 ng/dL, p = 0.0001; 1.00 versus 0.48 pg/mL, p = 0.003). BMD was not different between groups. Inverse correlations were found between BMI and TT (r = -0.3; p = 0.05); time since menopause and AN (r = -0.35; p = 0.02) and time since menopause and DHEA (r = -0.3; p = 0.01). CONCLUSION: Bilateral ovariectomy leads to a more severe androgen deficiency than natural menopause in postmenopausal women and did not compromise bone mass.

Androgens; menopause; bone mass; ovariectomy


ARTIGO ORIGINAL

Androgênios séricos e densidade mineral óssea em mulheres ooforectomizadas e não ooforectomizadas na pós-menopausa

Serum androgen concentrations and bone mineral density in postmenopausal ovariectomized and non-ovariectomized women

Jaime Kulak JúniorI; Almir Antônio UrbanetzI; Carolina Aguiar Moreira KulakII; Victória Zegbi Cochenski BorbaII; César Luiz BoguszewskiII

IServiço de Tocoginecologia, Hospital de Clínicas, Universidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba, PR, Brasil

IIServiço de Endocrinologia e Metabologia, Hospital de Clínicas, UFPR, Curitiba, PR, Brasil

Correspondência para Correspondência para: Jaime Kulak Júnior Av. Agostinho Leão Junior, 285 - Alto da Glória 80030-110 - Curitiba, PR, Brasil jkulak@ufpr.br

RESUMO

OBJETIVO: Comparar os níveis de androgênios e densidade mineral óssea (DMO) em mulheres ooforectomizadas (OOF) e não ooforectomizadas (NOOF) na pós-menopausa. Quarenta mulheres (53,9 ± 4 anos), 20 OOF e 20 NOOF foram selecionadas.

MÉTODOS: Testosterona total (TT), testosterona livre (TL), androstenediona (AN), deidroepiandrosterona (DHEA) e sulfato de deidroepiandrosterona (DHEA-S) foram dosados. DMO foi avaliada em 16 NOOF e 14 OOF.

RESULTADOS: Não houve diferença entre os grupos com relação à idade, ao índice de massa corporal (IMC) e ao tempo de menopausa. Concentração média de TT e TL foi duas vezes maior em mulheres NOOF (60,91 versus 30,17 ng/dL, p = 0,0001; 1,00 versus 0,48 pg/mL, p = 0,003). Não houve diferença na DMO. Houve correlação inversamente significativa entre IMC e TT, r = -0,3; p = 0,05, e do tempo de menopausa com AN (r = -0,35; p = 0,02), DHEA, (r = 0,3; p = 0,01).

CONCLUSÃO: Ooforectomia bilateral resultou em deficiência androgênica mais severa que a menopausa natural, sem comprometimento da massa óssea.

Descritores: Androgênios; menopausa; massa óssea; ooforectomia

ABSTRACT

OBJECTIVE: Compare levels of androgens and bone mineral density (BMD) of ovariectomized (OVX) and non-ovariectomized (NOVX) postmenopausal women. Forty women, 20 OVX and 20 NOVX, (53.9 ± 4 years) were selected.

METHODS: Total testosterone (TT), free testosterone (FT), androstenedione (AN), dehidroepiandrostenedione (DHEA) and its sulfate (DHEA-S) were measured. BMD was measured in 14 OVX and 16 NOVX.

RESULTS: No differences between groups with regard to age, body mass index (BMI) and time since menopause were found. Mean levels of TT and FT were two-fold higher in NOVX group (60.91 versus 30.17 ng/dL, p = 0.0001; 1.00 versus 0.48 pg/mL, p = 0.003). BMD was not different between groups. Inverse correlations were found between BMI and TT (r = -0.3; p = 0.05); time since menopause and AN (r = -0.35; p = 0.02) and time since menopause and DHEA (r = -0.3; p = 0.01).

CONCLUSION: Bilateral ovariectomy leads to a more severe androgen deficiency than natural menopause in postmenopausal women and did not compromise bone mass.

Keywords: Androgens; menopause; bone mass; ovariectomy

INTRODUÇÃO

Atualmente, muitas mulheres têm a possibilidade de viver 20 ou 30 anos após atingirem a menopausa, tornando-se fundamental uma melhor compreensão dos mecanismos de ação dos esteroides sexuais e dos efeitos de sua ausência no organismo feminino. Os efeitos da terapia hormonal (TH) no tratamento dos sintomas da síndrome climatérica, principalmente com relação às ondas de calor (fogachos) e atrofia genital, têm sido bem estudados (1,2). Muitos estudos têm correlacionado a TH a prevenção de fraturas, doenças cardiovasculares, câncer de mama, endométrio e cólon, assim como seus efeitos sobre a função cognitiva e a doença de Alzheimer (3-8). Mais recentemente, alguns estudos têm procurado investigar a função dos esteroides sexuais no comportamento sexual da mulher menopausada (9,10). Em particular, a função dos androgênios na fisiologia feminina e os efeitos da insuficiência androgênica e da terapia androgênica nas mulheres na pós-menopausa têm despertado grande interesse nos últimos anos (9-12).

A biossíntese dos androgênios ocorre nas adrenais e nos ovários, envolvendo uma série de reações enzimáticas que se iniciam com a estimulação das adrenais pelo hormônio ACTH (13) e dos ovários pelo LH, culminando em ação da 5α-redutase que transforma testosterona total (TT) em diidrotestosterona (DHT), e da enzima aromatase que converte TT em estradiol (E). Na mulher, a TT é transportada no sangue ligada à globulina transportadora dos hormônios sexuais (SHBG) ou através da albumina, e somente 1% da TT circula na forma livre (TL) no sangue periférico.

Os principais androgênios circulantes em mulheres incluem a TT, a androstenediona (AN), a deidroepiandrosterona (DHEA) e sua forma sulfatada (DHEA-S). Os três últimos são considerados pró-hormônios, uma vez que são convertidos em TT para exercer seus efeitos androgênicos. Está bem estabelecida a importância dos androgênios como motivadores do desejo, da excitação e das fantasias sexuais nas mulheres (12). Mulheres com menopausa cirúrgica podem apresentar alterações na libido provavelmente devido à diminuição dos níveis séricos de androgênios, além da diminuição abrupta dos níveis de estradiol (13,14).

Os efeitos dos androgênios sobre o metabolismo ósseo podem ser consequência de uma ação direta ou indireta a partir da transformação em estrogênios. Os osteoblastos humanos possuem receptores para androgênios (15), e tem sido demonstrado que os andrógenos estimulam diretamente a proliferação e a diferenciação das células ósseas in vitro (16).

Com o propósito de compreender melhor a importância dos ovários e de outros fatores que podem interferir na produção de andrógenos na pós-menopausa, assim como a possível implicação da deficiência androgênica na massa óssea, o presente estudo avaliou as concentrações séricas TT, TL, A, DHEA e DHEA-S e a densidade mineral óssea (DMO) em dois grupos de mulheres na pós-menopausa, sendo um grupo com ooforectomia bilateral (OOF) e outro grupo com ovários presentes (NOOF).

MÉTODOS

Entre julho de 2003 e julho de 2005, foram pré-selecionadas 85 mulheres menopausadas no ambulatório de Climatério do Serviço de Ginecologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR) que seriam posteriormente subdivididas em dois grupos: OOF e NOOF. Foram utilizados como critérios de inclusão: idade entre 45 e 60 anos; apresentar amenorreia espontânea de um ano ou mais ou amenorreia de seis meses com estradiol abaixo de 20 pg/mL e FSH acima de 40 U/L ou ter sido ooforectomizada bilateralmente. Foram excluídas pacientes com suspeita de doença maligna ou pré-maligna; doença tireoideana; uso de terapia hormonal na pós-menopausa (oral, transdérmica, implantes, géis, intranasal, intrauterina ou intravaginal) dentro de oito semanas do início do estudo; administração intramuscular dentro de seis meses do início do estudo; presença de qualquer doença que possa comprometer a absorção, o acúmulo, o metabolismo ou a excreção dos hormônios a serem estudados, incluindo hiperplasia adrenal congênita; alterações na história menstrual que poderiam ter envolvimento com o metabolismo dos hormônios estudados; história de uso abusivo de drogas ou álcool nos últimos dois anos, tabagismo e IMC acima de 35. Para cada mulher do Grupo OOF incluída no estudo, identificou-se uma paciente em menopausa fisiológica (Grupo NOOF) pareada por idade, IMC e tempo de menopausa, e que preenchesse os mesmos critérios de inclusão e exclusão. Do total de pacientes avaliadas, o grupo final de estudo foi constituído por 40 mulheres, 20 no grupo OOF e 20 no grupo NOOF, que foram avaliadas por meio de estudo transversal. Na visita ao hospital, as pacientes foram submetidas à anamnese e ao exame físico completo e foi agendada data para que a coleta do sangue fosse feita. Amostras de sangue foram coletadas entre 8 e 9H horas da manhã após jejum de pelo menos oito horas, armazenadas a -20ºC para análise conjunta em mesmo ensaio. Todas as pacientes assinaram previamente o termo de consentimento livre e informado, e o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Hospital de Clínicas da UFPR.

As concentrações séricas de (TT), (TL), (AN), (DHEA) e (DHEA-S) foram determinadas em uma única amostra de sangue.

Foram utilizados ensaios comerciais, com sensibilidade e coeficiente de variabilidade inter e intraensaios, sendo respectivamente: TT (ADVIA Centaur Readypack, Bayer Corporation, 10 ng/dL, 4,7% e 4,7%); TL (Coat-A-Count Free Testosterone, Diagnostic Products Corporation Los Angeles CA, 0,15 pg/mL, 5% e 8%); AN (Active Androstenedione RIA, Diagnostic Systems Laboratories Webster Texas USA, 0,03 ng/mL, 6% e 4,3%; DHEA (Dehidroepiandrosterone RIA, Diagnostic Systems Laboratories Webster Texas USA, 0,009 ng/mL, 8,6% e 3,8%); DHEA-S (IMMULITE 2000 DHEA-SO4 Diagnostic Products Corporation Los Angeles CA, 3 mg/dL, 6,5%).

A DMO foi avaliada por absorciometria de radiografia de dupla energia (DEXA) com equipamento Hologic QDRW 1000 (Hologic, Inc., Waltham, MA) na Unidade de Metabolismo Ósseo do Serviço de Endocrinologia e Metabologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (SEMPR). As regiões analisadas foram: coluna lombar, colo de fêmur e fêmur total. Em relação ao número total de pacientes, 75% delas foram submetidas à densitometria óssea devido à dificuldade em retornarem ao serviço para a realização do exame. Os resultados da DMO foram expressos em g/cm2, e o coeficiente de variação do aparelho é de 0,46% para coluna lombar e de 0,57% para o fêmur.

Análise estatística

As variáveis selecionadas para análise estatística foram inicialmente submetidas à avaliação de sua distribuição por meio de Testes de Normalidade, Coeficiente de Variação e Análise de Histogramas. Para os testes de normalidade de Kolmogorov-Smirnov, foi considerada não normal com valores de p < 0,05. Cada variável foi também inspecionada individualmente mediante visualização de histogramas em relação ao padrão de sua distribuição. Os dados de distribuição normal são apresentados por intermédio de médias e de dois desvios-padrão. Os dados que não apresentaram distribuição normal são apresentados por medianas, valores mínimo e máximo.

Os testes estatísticos aplicados foram selecionados de acordo com a distribuição das variáveis e seu caráter independente. Para todos foram utilizados os testes bicaudais, considerando-se que as diferenças poderiam estar distribuídas para ambos os lados da curva, com nível de significância de 5%.

Para avaliar as diferenças entre as variáveis contínuas de distribuição simétrica constituídas pelas medidas hormonais de acordo com o estado de ooforectomia, de laqueadura, de índice de massa corpórea e de tempo de menopausa, foi utilizado o teste paramétrico t de Student para amostra independente. Para as variáveis contínuas de distribuição não normal, foi utilizado o teste não paramétrico de Mann-Whitney.

Estudos de correlação de Pearson e Spearman foram aplicados para avaliar associação entre a idade, o IMC e o tempo de menopausa e os níveis androgênicos com nível de significância de 5%.

RESULTADOS

O grupo de estudo foi formado por 40 pacientes com idade média de 53,9 ± 4 anos, IMC médio de 25,9 ± 5 kg/m² e tempo médio de menopausa de 5,3 ± 4 anos. Não houve diferença significativa com relação ao peso e à altura entre as mulheres dos dois grupos. Não houve diferenças significativas entre os grupos OOF e NOOF com relação a idade, IMC, tempo de menopausa, concentrações de TSH, FSH e estradiol (Tabela 1).

Foram encontradas diferenças significativas entre as concentrações médias de TT (p = 0,0001) e TL (p = 0,003). Houve também diferença significativa entre os grupos com relação aos níveis de AN (p = 0,008) e DHEA (p = 0,005). Os níveis séricos de DHEA-S foram similares em ambos os grupos (Tabela 2).

Observou-se correlação negativa entre as concentrações de TT e IMC (r = -0,3 p = 0,05), e tempo de menopausa e níveis de AN (r = -0,35; p = 0,02) e DHEA (r = - 0,3; p = 0,01), não havendo correlação significativa entre os outros androgênios estudados. Ao se categorizar o grupo de mulheres com IMC abaixo de 25 (n = 18) e mulheres com sobrepeso ou obesidade, com IMC igual ou superior a 25 (n = 22), observou-se que a concentração média de TT foi maior no grupo de pacientes com IMC mais baixo (p = 0,02). Não houve diferença entre os grupos em relação a TL, AN, DHEA e DHEA-S (Tabela 3).

A DMO média de coluna lombar foi de 0,868 ± 0,138 g/cm2 no grupo NOOF, valor que não foi significativamente diferente de 0,895 ± 0,145 g/cm2 observado no grupo OOF. Similarmente, não houve diferença entre a DMO de fêmur total entre os grupos, nem em colo de fêmur (Tabela 4).

DISCUSSÃO

Com o aumento da expectativa de vida das mulheres e da frequência das ooforectomias bilaterais que são feitas em 50% das pacientes submetidas à histerectomia (17), as pesquisas a respeito da avaliação funcional dos ovários na pós-menopausa tornam-se de fundamental importância.

Encontraram-se concentrações semelhantes de estradiol entre os dois grupos estudados, uma vez que os ovários constituem a principal fonte de produção de estradiol na mulher. Na menopausa, as concentrações de estradiol, mesmo em mulheres com ovários presentes, estão abaixo do nível detectado pelo método utilizado.

Este estudo também mostrou que as mulheres submetidas à ooforectomia bilateral apresentaram menores concentrações séricas dos principais androgênios quando comparadas a mulheres com ovários preservados. A diferença de cerca de 50% nas concentrações de TT e TL sustentam esse achado. Os resultados estão de acordo com um estudo envolvendo 16 mulheres submetidas à histerectomia total com anexectomia bilateral por carcinoma de endométrio, em que as concentrações de TT medidas seis a oito semanas após a cirurgia foram cerca de 50% menores do que as concentrações pré-operatórias (11). Essas diferenças mostram que os ovários têm um papel significativo na determinação das concentrações de testosterona em mulheres na pós-menopausa.

A associação entre concentrações de androgênios e IMC e tempo de menopausa é controversa na literatura. Neste estudo, encontrou-se uma relação inversa significativa entre IMC e TT, mas não com outros androgênios estudados. Como parte de um estudo com 141 mulheres, 54 foram selecionadas como pós-menopausadas e acompanhadas por 30 dias com coletas de sangue semanais, avaliando-se TT, índice de androgênios livres, AN, LH, FSH, DHEA, DHEA-S, estrona e estradiol. Neste estudo, não foram encontradas diferenças entre as concentrações de androgênios e o IMC das mulheres estudadas (9). Outro estudo que avaliou retrospectivamente as concentrações de androgênios de 646 mulheres na pós-menopausa e as correlacionou com IMC abaixo de 22, 22 a 25, 25 a 30 e acima de 30 encontrou associação significativa somente entre IMC < 22 e > 30 para TL. Não houve diferença entre as concentrações de androgênios quando comparados IMC entre 22 e 25 e 25 e 30 (18), dados condizentes com essa avaliação.

É bem estabelecido que as concentrações de DHEA e DHEA-S diminuem progressivamente com a idade. Esse declínio tem se mostrado linear e aparentemente não apresenta correlação com a função ovariana (19). No presente estudo, não se observou diferença entre as concentrações séricas de DHEA-S nas mulheres menopausadas com ou sem ovários, uma vez que este hormônio é produzido em mais de 95% pelas adrenais (20). Já se sabe que as concentrações de AN e TT tendem a diminuir na menopausa natural imediata em média 50% e 30%, respectivamente (21). Nesses achados, as concentrações de TT se encontraram dentro da faixa de normalidade em mulheres não ooforectomizadas. Esse fato pode ser explicado pelos resultados de estudos longitudinais que mostram que a síntese de testosterona pelos ovários na pós-menopausa apresenta uma tendência à normalização em aproximadamente dois anos, com a volta das concentrações a níveis pré-menopáusicos após diminuição na fase pós-menopausa imediata (22). Como a maior parte dessas pacientes não ooforectomizadas tinha mais de dois anos de menopausa, o achado de níveis séricos de TT dentro dos limites da normalidade era esperado.

Não foi encontrada diferença significativa entre os valores absolutos da DMO na comparação entre mulheres NOOF e OOF, e a diferença entre as concentrações de androgênios manteve-se a mesma relatada quanto ao número total de pacientes. Esses achados estão de acordo com um recente estudo de características similares a este realizado com mulheres gregas (23). Estudos clínicos têm mostrado que os androgênios agem em sinergismo com o estrogênio em mulheres com menopausa cirúrgica ou natural para aliviar os sintomas vasomotores, aumentar a DMO e a libido, e para melhorar a sensação de bem-estar e disposição física (12,24-27). Os androgênios são capazes de inibir a reabsorção e aumentar a formação óssea (28), e baixos níveis séricos de testosterona têm sido correlacionados com fraturas em mulheres mais idosas (29,30). Entretanto, nesse grupo de pacientes não foi possível observar uma influência significativa da insuficiência androgênica sobre a massa óssea. É improvável que o fato de 75% dessas pacientes terem feito o exame de densitometria óssea tenha interferido no resultado final, visto que estudos com número maior de pacientes também encontraram resultados similares a esses (23,31).

As gônadas femininas são uma importante fonte de androgênios na pós-menopausa. A castração cirúrgica das mulheres promove queda abrupta e permanente das concentrações dos principais androgênios, sem os quais as consequências a curto e longo prazo são desconhecidas. Orientações específicas com relação à prática da ooforectomia bilateral devem ser apresentadas e divulgadas pelas sociedades competentes a fim de impedir que tal procedimento continue sendo feito de forma indiscriminada e desprovida de qualquer critério. Novos estudos prospectivos devem ser direcionados para avaliação das consequências clínicas da deficiência androgênica a curto e longo prazo em mulheres que serão, por algum motivo, submetidas à ooforectomia bilateral.

Declaração: os autores declaram não haver conflitos de interesse científico neste estudo.

Recebido em 6/Mar/2009

Aceito em 14/Ago/2009

  • 1. Coope J, Thomson JM, Poller L. Effects of inatural oestrogen replacement therapy on menopausal simptoms and blood clotting. Br Med J. 1975;4(5989):139-43.
  • 2. Seemens JP, Tsai CC, Curtis Semmens E, Loadholt CB. Effects of estrogen therapy on vaginal physiology during menopause. Obstet Gynecol. 1985;66(1):15-8.
  • 3. Writing Group for The Women's Health Initiative Investigators. Risks and benefits of estrogen plus progestin in healthy postmenopausal women: principal results from the Women's Health Initiative randomized controlled trial. JAMA. 2002;288(3):321-33.
  • 4. Heerrington DM, Reboussin DM, Brosnihan KB, Sharp PC, Shumaker SA, Snyder TE, et al. Effects of estrogen replacement on the progression of coronary artery atherosclerosis. N Engl J Med. 2000;343(8):522-9.
  • 5. Collaborative Group on Hormonal Factors in Breast Cancer. Breast cancer and hormone replacement therapy: collaborative reanalysis of data from 51 epidemiological studies of 52,705 women with breast cancer and 108,411 women without breast cancer. Lancet. 1997;350(9084):1047-59.
  • 6. PEPI Trial Writing Group. Effects of hormone replacement therapy on endometrial histology in postmenopausal women. JAMA. 1986;275(5):370-5.
  • 7. Barret-Connor E, Kritz-Silverstein D. Estrogen replacement therapy and cognitive function in older women. JAMA. 1993;269(20):2637-41.
  • 8. Paganini-Hill A, Henderson VW. Estrogen deficiency and risk of Alzheimer's disease in women. Am J Epidemiol. 1994;140(3):256-61.
  • 9. Bancroft J, Cawood E. Androgens and the menopause: a study of 40-60 year old women. Clin Endocrinol. 1996;45(5):577-87.
  • 10. Davis SR, Van Der Mooren MJ, Van Lunsen RHW, Lopes P, Ribot J, Rees M, et al. Efficacy and safety of a testosterone patch for the treatment of hypoactive sexual desire disorder in surgically menopausal women: a randomized, placebo-controlled trial. Menopause. 2006;13(3):387-96.
  • 11. Judd HL, Lucas WE, Yen SCS. Effect of ooforectomy on circulating testosterone and androstenedione levels in patients with endometrial cancer. Am J Obstet Gynecol. 1974;118(6):793-8.
  • 12. Sherwin BB, McCoud P, Strauss BJ, Burger H. Androgen enhances sexual motivation in females: a prospective, crossover study of sex steroid administration in surgical menopause. Psychosom Med. 1985;47(4):339-51.
  • 13. Labrie F, Belanger A, Cusan L, Gomez JL, Candas B. Marked decline in serum concentrations of adrenal C19 sex steroids precursors and conjugated androgen metabolites during aging. J Clin Endocrinol Metabol. 1997;82(8):2396-402.
  • 14. Labrie F, Bélanger A, Luu-The V, Labrie C, Simard J, et al. DHEA and the intracrine formation of androgens ans estrogens in peripheral target tissues: its role during aging. Steroids. 1998;63(5-6):322-8.
  • 15. Colvard DS, Eriksen EF, Keeting PE, Wilson EM, Lubahn DB, French FS, et al. Identification of androgen receptors in normal human osteoblast-like cells. Proc Natl Acad Sci USA. 1989;86(3):854-7.
  • 16. Kasperk CH, Wergedal JE, Farley JR, Linkhart TA, Turner RT, Baylink DJ. Androgens directly stimulate proliferation of bone cells in vitro. Endocrinology. 1989;124(3):1576-8.
  • 17. Wilcox LS, Koonin LM, Pokras R, Strauss LT, Zhisen X, Peterson HB. Histerectomy in the United States, 1988-1990. Obstet Gynecol. 1994;83(4):549-55.
  • 18. Danforth KN, Eliassen AH, Tworoger SS, Missmer SA, Barbieri RL, Rosner BA, et al. The association of plasma androgen levels with breast, ovarian, and endometrial cancer risk factors among postmenopausal women. Int J Cancer 2009. [Epub ahead of print]
  • 19. Orentreich N, Brind JL, Rizer RL, Vogelman JH. Age changes and sex differences in serum dehydroepiandrosterone sulfate concentrations throughout adulthood. J Clin Endocrinol Metab. 1984;59(3):551-5.
  • 20. Endoh A, Kristiansen SB, Casson RP, Buster JE, Hornsby PJ. The zona reticularis is the site of biosynthesis of dehydroepiandrosterone and dehydroepiandrosterone sulfate in the adult human adrenal cortex, resulting from its low expression of 3β-hydroxysteroid dehydrogenase. J Clin Endocrinol Metab. 1996;81(10):3558-65.
  • 21. Adashi EY. The climateric ovary as as a functional gonadotropin-driven androgen-producing gland. Fertil Steril. 1994;62(1):20-7.
  • 22. Laughlin GA, Barret-Connor E, Silverstein DK, Mühlen D. Histerectomy, ooforectomy, and endogenous sex hormone levels in older women: The Rancho Bernardo Study. J Clin Endocrinol Metab. 2000;85(2):645-51.
  • 23. Lambrinoudaki G, Christodoulakos L, Aravantinos A, Antoniou D, Rizos C, Chondros A, et al. Endogenous sex steroids and bone mineral density in healthy Greek postmenopausal women. J Bone Miner Metab. 2006;24(1):65-71.
  • 24. Davis SR, McCloud P, Strauss BJ, Burger H. Testosterone enhances estradiol's effects on postmenopasal bone density and sexuality. Maturitas. 1995;21(3):227-36.
  • 25. Watts NB, Notelovitz M, Timmons MC, Addison WA, Wiita B, Downey LJ. Comparison of oral estrogens plus androgen on bone mineral density, menopausal symptoms and lipid-lipoprotein profile in surgical menopause. Obstet Gynecol. 1995;85(4):529-37.
  • 26. Sarrel P, Dobay B, Wiita B. Estrogen and estrogen-androgen replacement in postmenopausal women dissatisfied with estrogen only therapy. Sexual behavior and neuroendocrine responses. J Reprod Med. 1998;43(10):847-56.
  • 27. Barret-Connor E, Young R, Notelovitz M, Sullivan J. A two year double-blind comparison of estrogen-androgen and conjugated estrogens in surgically menopausal women. J Reprod Med. 1999;44(12):1012-20.
  • 28. Raisz LG, Wiita B, Artis A, Bowen A, Schwartz S, Trahiotis M, et al. Comparison of the effects of estrogen alone and estrogen plus androgen on biochemical markers of bone formation and resorption in postmenopausal women. J Clin Endocrinol Metab. 1996;81(1):37-43.
  • 29. Davidson BJ, Ross RK, Paganini-Hill A, Hamond GD, Siiteri PK, Judd HL. Total and free estrogens and androgens in postmenopausal women with hip fractures. J Clin Endocrinol Metab. 1982;54(1):115-20.
  • 30. Longcope C, Baker RS, Hui SL, Johnston CC. Androgen and estrogen dynamics in women with vertebral crush fractures. Maturitas. 1984;6(4):309-18.
  • 31. Sowers MR, Jannausch M, McConnell D, Little R, Greendale GA, Finkelstein JS, et al. Hormone predictors of bone mineral density changes during the menopausal transition. J Clin Endocrinol Metab. 2006;91(4):1261-7.
  • Correspondência para:

    Jaime Kulak Júnior
    Av. Agostinho Leão Junior, 285 - Alto da Glória
    80030-110 - Curitiba, PR, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jan 2010
    • Data do Fascículo
      Nov 2009

    Histórico

    • Aceito
      14 Ago 2009
    • Recebido
      06 Mar 2009
    Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Rua Botucatu, 572 - conjunto 83, 04023-062 São Paulo, SP, Tel./Fax: (011) 5575-0311 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: abem-editoria@endocrino.org.br