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Achados histopatológicos em retinoblastoma

Histopathologic findings in retinoblastoma

Resumos

OBJETIVO: Descrever e analisar os principais achados histopatológicos no retinoblastoma com ênfase na invasão de nervo óptico e túnicas oculares, correlacionando-os ao tratamento realizado. MÉTODOS: Vinte e oito olhos com diagnóstico de retinoblastoma tratados por enucleação na Universidade Federal de São Paulo entre dezembro de 2000 e outubro de 2002 foram submetidos à revisão histopatológica. Os dados clínicos incluiram idade, sexo, raça, lateralidade e tratamento realizado. Na revisão histopatológica foram avaliados neovascularização da íris e seio camerular, grau de diferenciação do tumor e invasão do nervo óptico e coróide de acordo com a classificação de Khelfaoui. RESULTADOS: De 27 pacientes, 13 (48,1%) eram do sexo masculino e 14 (51,9%) eram do sexo feminino, 16 (59,3%) eram da raça branca, 5 (18,5%) eram da raça amarela, 4 (14,8%) eram pardos e 2 (7,4%) eram negros. A média da idade dos pacientes foi de 22,7 meses, sendo 13 casos bilaterais e 14 casos unilaterais. Com relação ao tratamento utilizado, 13 (46,4%) olhos foram submetidos a enucleação primária e 15 (53,6%) tiveram tratamento prévio. Na avaliação histopatológica, 15 (53,6%) tumores eram bem diferenciados. Neovascularização da íris e/ou seio camerular foram observados em 60,6% e necrose e calcificação em 89,2% dos casos. O envolvimento da coróide foi observado em 18 (64,2%) dos casos (grau II e III) e a invasão de nervo óptico em 8 (28,5%) (graus II, III e IV). Dos casos submetidos ao tratamento prévio 40% tinham algum grau de invasão das túnicas oculares e apenas 6,67% apresentavam simultaneamente invasão do nervo óptico e das túnicas oculares. Entretanto nos olhos que foram submetidos à enucleação primária 30,7% apresentavam invasão das túnicas oculares e 53,8% apresentavam simultaneamente invasão do nervo óptico e das túnicas oculares. CONCLUSÃO: Neovascularização, necrose e calcificação foram achados mais comumente observados. A invasão do nervo óptico e coróide foram os dois fatores prognósticos mais importantes, encontrados em 28,5% e 64,2% dos casos respectivamente. Os casos tratados com enucleação primária apresentavam maior comprometimento ocular.

Retinoblastoma; Neoplasias da coróide; Neoplasias do nervo óptico; Invasividade neoplásica; Fatores de risco


OBJETIVO: To study histopathological findings of enucleated eyes with retinoblastoma. METHODS: Twenty-eight cases of retinoblastoma treated by enucleation at the Federal University of São Paulo from December 2000 to October 2002 were histopathologically reviewed. Clinical data included age, gender, race, unilateral or bilateral involvement and previous treatment. The histopathological review evaluated the presence of iris and/or angle neovascularization, tumor differentiation and optic nerve and choroidal invasion according to Khelfaoui's classification. RESULTS: Of 27 patients, 13 (48.5%) were boys and 14 (59.3%) were girls, 16 were white, 6 were black and 5 were asiatic, age ranging from 2 to 96 months (mean, 22.7 months). 13 cases were bilateral and 14 cases were unilateral. All tumors were histologically characterized by a proliferation of small cells with high nuclear-to-cytoplasmic ratios and 20 (71.4%) of them were well differentiated. Choroidal involvement was observed in 18 (64.2%) cases (degree II, III) and optic nerve invasion in 8 (28.5%) cases (degree III, IV, V). CONCLUSION: Neovascularization, necrosis and calcification were the most commonly observed feature. The invasion into the optic nerve and choroid, which are the two most important predictors of patient outcome were found in 28.5% and 64.2% of the cases, respectively.

Retinoblastoma; Choroid neoplasms; Optic nerve neoplasms; Neoplasms invasiveness; Risk factors


ARTIGOS ORIGINAIS

Achados histopatológicos em retinoblastoma

Histopathologic findings in retinoblastoma

João Pessoa de Souza FilhoI; Maria Cristina MartinsII; Virgínia Laura TorresIII; Ana Beatriz Toledo DiasIV; Márcia Serva LowenV; Luciana Afonso PiresVI; Clélia Maria ErwenneVII

IMédico Oftalmologista - Pós graduando nível Doutorado - Departamento de Oftalmologia Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). São Paulo (SP)

IIChefe do setor de Anatomia Patológica Ocular - Departamento de Oftalmologia da UNIFESP. São Paulo (SP)

IIIMédica Oftalmologista - Estagiária do setor de Anatomia Patológica Ocular - Departamento de Oftalmologia da UNIFESP. São Paulo (SP)

IVTecnóloga dos setores de Anatomia Patológica e Farmacologia Ocular - Departamento de Oftalmologia da UNIFESP. São Paulo (SP)

VMédica Patologista - Departamento de Anatomia Patológica da UNIFESP. São Paulo (SP)

VIMédica Oftalmologista - Estagiária do setor de Anatomia Patológica Ocular - Departamento de Oftalmologia da UNIFESP. São Paulo (SP)

VIIChefe do setor de Tumores Oculares Departamento de Oftalmologia da UNIFESP. São Paulo (SP)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Maria Cristina Martins R. Joel Jorge de Melo, 236 - apto. 72 São Paulo (SP) CEP 04128-080 E-mail: mcrism@uol.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Descrever e analisar os principais achados histopatológicos no retinoblastoma com ênfase na invasão de nervo óptico e túnicas oculares, correlacionando-os ao tratamento realizado.

MÉTODOS: Vinte e oito olhos com diagnóstico de retinoblastoma tratados por enucleação na Universidade Federal de São Paulo entre dezembro de 2000 e outubro de 2002 foram submetidos à revisão histopatológica. Os dados clínicos incluiram idade, sexo, raça, lateralidade e tratamento realizado. Na revisão histopatológica foram avaliados neovascularização da íris e seio camerular, grau de diferenciação do tumor e invasão do nervo óptico e coróide de acordo com a classificação de Khelfaoui.

RESULTADOS: De 27 pacientes, 13 (48,1%) eram do sexo masculino e 14 (51,9%) eram do sexo feminino, 16 (59,3%) eram da raça branca, 5 (18,5%) eram da raça amarela, 4 (14,8%) eram pardos e 2 (7,4%) eram negros. A média da idade dos pacientes foi de 22,7 meses, sendo 13 casos bilaterais e 14 casos unilaterais. Com relação ao tratamento utilizado, 13 (46,4%) olhos foram submetidos a enucleação primária e 15 (53,6%) tiveram tratamento prévio. Na avaliação histopatológica, 15 (53,6%) tumores eram bem diferenciados. Neovascularização da íris e/ou seio camerular foram observados em 60,6% e necrose e calcificação em 89,2% dos casos. O envolvimento da coróide foi observado em 18 (64,2%) dos casos (grau II e III) e a invasão de nervo óptico em 8 (28,5%) (graus II, III e IV). Dos casos submetidos ao tratamento prévio 40% tinham algum grau de invasão das túnicas oculares e apenas 6,67% apresentavam simultaneamente invasão do nervo óptico e das túnicas oculares. Entretanto nos olhos que foram submetidos à enucleação primária 30,7% apresentavam invasão das túnicas oculares e 53,8% apresentavam simultaneamente invasão do nervo óptico e das túnicas oculares.

CONCLUSÃO: Neovascularização, necrose e calcificação foram achados mais comumente observados. A invasão do nervo óptico e coróide foram os dois fatores prognósticos mais importantes, encontrados em 28,5% e 64,2% dos casos respectivamente. Os casos tratados com enucleação primária apresentavam maior comprometimento ocular.

Descritores: Retinoblastoma/fisiopatologia; Neoplasias da coróide/patologia; Neoplasias do nervo óptico/patologia; Invasividade neoplásica; Fatores de risco

ABSTRACT

OBJETIVO: To study histopathological findings of enucleated eyes with retinoblastoma.

METHODS: Twenty-eight cases of retinoblastoma treated by enucleation at the Federal University of São Paulo from December 2000 to October 2002 were histopathologically reviewed. Clinical data included age, gender, race, unilateral or bilateral involvement and previous treatment. The histopathological review evaluated the presence of iris and/or angle neovascularization, tumor differentiation and optic nerve and choroidal invasion according to Khelfaoui's classification.

RESULTS: Of 27 patients, 13 (48.5%) were boys and 14 (59.3%) were girls, 16 were white, 6 were black and 5 were asiatic, age ranging from 2 to 96 months (mean, 22.7 months). 13 cases were bilateral and 14 cases were unilateral. All tumors were histologically characterized by a proliferation of small cells with high nuclear-to-cytoplasmic ratios and 20 (71.4%) of them were well differentiated. Choroidal involvement was observed in 18 (64.2%) cases (degree II, III) and optic nerve invasion in 8 (28.5%) cases (degree III, IV, V).

CONCLUSION: Neovascularization, necrosis and calcification were the most commonly observed feature. The invasion into the optic nerve and choroid, which are the two most important predictors of patient outcome were found in 28.5% and 64.2% of the cases, respectively.

Keywords: Retinoblastoma/physiopathology; Choroid neoplasms/pathology; Optic nerve neoplasms/pathology; Neoplasms invasiveness; Risk factors

INTRODUÇÃO

O retinoblastoma é o tumor intra-ocular mais freqüente na infância, em torno de 1 para 25.000 nascidos vivos(1-6). Esse tumor representa de 2,5 a 4% de todos os tumores da infância (3), não apresentando predileção sexual(4,6).

O diagnóstico é geralmente feito antes dos 3 anos de idade(3-4,6). Os casos bilaterais são diagnosticados nos dois primeiros anos de vida, ocorrendo em 20 a 35% dos casos. O quadro clínico depende do estágio da doença, tamanho e localização do tumor(3).

A forma de crescimento da neoplasia pode ser: exofítica, endofítica, mista e difusa. O retinoblastoma é composto por células de origem neuroblástica com núcleo grande e basofílico, formato e tamanho variável e numerosas figuras de mitose podem ser observadas(3,6).

A formação de rosetas descritas separadamente por Flexner e Wintersteiner, e de "floretes" podem ser consideradas formas de diferenciação das células tumorais em fotorreceptores(3,6).

Um aspecto característico deste tumor é a sua capacidade de crescer mais rapidamente que o aporte sangüíneo disponível, sendo freqüente o achado de tufos de células viáveis com um vaso sanguíneo central ("pseudoroseta") e necrose e calcificação a partir de 90 a 110 micrômetros do lúmen vascular(3,6). Essa calcificação distrófica é comumente identificada nos estudos de imagens (ultra-sonografia e tomografia computadorizada) para o diagnóstico do tumor.

A invasão do nervo óptico e das túnicas oculares são considerados importantes achados histopatológicos relacionados ao prognóstico(7).

Khelfaoui et al, com base no exame histopatológico e evolução clínica de 172 pacientes, propuseram a divisão em 5 grupos para invasão de túnicas oculares e 4 para a invasão de nervo óptico (Quadro I). Segundo esses autores, a invasão de nervo óptico além da lâmina crivosa e/ou invasão maciça de coróide estariam associados a uma maior freqüência de desenvolvimento de doença disseminada após enucleação(8).


O tratamento depende do estadiamento da lesão, sendo que a enucleação permanece como a forma mais comum de tratamento(4). Entretanto os recentes avanços no entendimento do retinoblastoma tem proporcionado novas modalidades de tratamento como quimioterapia e tratamento local (placa radioativa, fotocoagulação a LASER, termoterapia transpupilar {TTT} e crioterapia)(9-10), com o intuito de diminuir a morbidade, manter a função visual e permitir a excelente sobrevida(11).

OBJETIVOS

Descrever e analisar os principais achados histopatológicos no retinoblastoma com ênfase na invasão de nervo óptico e túnicas oculares correlacionando esses achados com o tratamento realizado.

MÉTODOS

Foram estudados, após aprovação pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de São Paulo, 28 olhos de 27 pacientes, consecutivamente, com diagnóstico de retinoblastoma que foram submetidos a enucleação entre dezembro de 2000 a outubro de 2002, no setor de tumores, do Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo.

Foram avaliados a idade dos pacientes em meses no momento da enucleação, sexo, raça (branca, negra, amarela ou parda), a lateralidade (uni ou bilateral) e o tratamento (enucleação primária ou tratamento prévio a enucleação) instituído em todos os casos.

Os olhos foram fixados em formol a 10%, por no mínimo 24 horas e, depois em álcool etílico a 70%, por 24 horas e seccionados horizontalmente em um corte sagital no sentido pupila- nervo óptico, passando pelo centro do tumor, quando possível. Foram realizadas a observação macroscópica com lupa esterioscópica (Leica MZ8) e documentação fotográfica do espécime.

Os espécimes (anel e coto distal do nervo óptico), foram processados separadamente para o estudo histopatológico, seguindo as técnicas rotineiras de inclusão em parafina. Foram realizados cortes de aproximadamente 5 mm e as lâminas coradas com hematoxilina-eosina (HE) e ácido periódico de Schiff (PAS).

Na avaliação histopatológica realizado por um experiente patologista ocular (MCM) o grau de diferenciação foi classificado baseada na porcentagem de rosetas de Flexner-Wintersteiner presentes, sendo considerado um tumor bem diferenciado quando mais de 80% da área total do tumor apresentasse rosetas e pouco diferenciado quando estas fossem ausentes. O restante dos tumores foram classificados como moderadamente diferenciados(8,12). O grau de invasão da coróide e esclera e o envolvimento do nervo óptico, foram classificados de acordo com a classificação de Khelfaoui et al(8) (Quadro I). Foram observados ainda: neovascularização de íris e/ou seio camerular, necrose e calcificação.

RESULTADOS

Dos 28 olhos estudados de 27 pacientes, 13 (48,1%) eram do sexo masculino e 14 (51,9%) do feminino, 16 (59,3%) eram da raça branca, 5 (18,5%) eram da raça amarela, 4 (14,8%) eram pardos e 2 (7,4%) eram negros. A idade média dos pacientes no momento da enucleação era de 22,7 meses, variando de 2 meses a 96 meses.

O tumor era bilateral em 13 (48,1%) casos e unilateral em 14 (51,9%) casos. Com relação ao tratamento utilizado, 13 (46,4%) olhos foram submetidos à enucleação primária e 15 (53,6%) olhos tiveram tratamento prévio à enucleação. A quimioterapia isolada foi utilizada em 7 casos (46,6%), quimioterapia associada com LASER (TTT) em 4 (26,6%), quimioterapia associada a radioterapia externa em 2 (13,4%), quimioterapia associada a LASER (TTT) e braquiterapia, em 1 paciente (6,7%) e 1 caso (6,7%) submetido inicialmente à vitrectomia seguido de quimioterapia. Dos 14 pacientes (15 olhos) que receberam tratamento prévio 10 (71,4%) eram casos bilaterais e 3 (20%) olhos evoluíram para atrofia bulbar.

Na avaliação histopatológica, o tumor apresentava-se caracterizado pela proliferação de pequenas células com alta relação núcleo/citoplasma, sendo bem diferenciado em 15 (53,6%) olhos e moderamente diferenciado em 10 (35,7%) olhos. Três olhos apresentavam-se com regressão do tumor sem células malignas viáveis. Necrose e calcificação foram observadas em 25 (89.2%) e 17 (60.7%) dos olhos apresentavam neovascularização de ângulo e/ou íris.

Quando analisado o grau de comprometimento do nervo óptico (Gráfico I) foram encontrados 20 olhos (71,4%) com grau I (sem envolvimento de nervo óptico), 3 olhos (10,8%) com grau II (invasão pré-laminar), 4 olhos (14,3%) com grau III (invasão pós lâmina crivosa sem acometer a margem cirúrgica - Figura 1) e 1 olho (3,5%) com grau IV (margem cirúrgica distal do nervo óptico comprometida).



Com relação ao comprometimento das túnicas oculares (Gráfico II) foram observados 7 olhos (25%) com grau I (sem invasão de coróide), 11 olhos (39,2%) com grau II (invasão focal de coróide - Figura 2) e 7 olhos (25%) com grau III (invasão maciça de coróide), em 3 olhos (10,8%) não pode ser avaliado o grau de invasão pois os mesmos apresentavam atrofia bulbar.



Quando analisados separadamente os casos que foram submetidos à enucleação primária e os que receberam tratamento prévio, observou-se nos primeiros comprometimento do nervo óptico: grau I - 46,2% (6), grau II - 15,3% (2), grau III, 30,8% (4) e grau IV - 7,7% (1). Quanto ao comprometimento das túnicas oculares 15,3% (2) eram grau I, 61,6% (8) eram grau II e 23,1% (3) eram grau III. Quando analisados os olhos que foram submetidos ao tratamento prévio, encontrou-se o comprometimento do nervo óptico: 93,3% (14) eram grau I e 6,7% (1) eram grau II. E na avaliação do comprometimento das túnicas oculares, observou-se que 33,3% (5) eram grau I, 26,6% (4) eram grau II e 20% (3) eram grau III (Tabela I). Observou-se que dos 15 olhos submetidos ao tratamento prévio nenhum tinha invasão isolada do nervo óptico, 6 (40%) tinham algum grau de invasão das túnicas oculares e 1 (6,67%) olho apresentava simultaneamente invasão do nervo óptico e das túnicas oculares. Nos 13 olhos que foram submetidos à enucleação primária nenhum tinha invasão isolada do nervo óptico, 4 (30,7%) apresentavam invasão das túnicas oculares e 7 (53,8%) apresentavam simultaneamente invasão do nervo óptico e das túnicas oculares.

DISCUSSÃO

A freqüência de invasão do nervo óptico em olhos enucleados por retinoblastoma varia de acordo com a literatura de 25% a 63,6% (3,13). A invasão do nervo óptico até o plano de secção cirúrgica é considerada como fator de mau prognóstico. Nesses pacientes, a mortalidade varia entre 50% a 81%(3,13).

A utilização da quimioterapia e modalidades de tratamento local, está associada a uma diminuição da morbidade(11). No presente estudo foram incluídos 14 pacientes (51,8%) submetidos à quimioterapia (quimiorredução) prévia, isolada ou associada a tratamento local, seguido de enucleação. Um dos pacientes, foi submetido à inadvertida vitrectomia em outro serviço, sendo tratado com quimioterapia seguido de enucleação. Um outro paciente com doença bilateral, foi submetido ao tratamento prévio e teve ambos os olhos enucleados.

A enucleação, na maioria dos casos onde o estadiamento determina apenas comprometimento intra-ocular é curativa. Em alguns casos, entretanto, há evolução para doença sistêmica mesmo após esse procedimento cirúrgico radical. A ocorrência de disseminação da doença se associa com queda significativa da sobrevida(14).

A invasão pós-laminar do nervo óptico, mesmo com margem cirúrgica livre (coto distal), é considerada pela maioria dos autores como fator de risco para a disseminação da doença. Khelfaoui et al, encontraram doença extra-ocular em 32% dos casos com invasão pós-laminar e margem livre(8). Outros autores relatam nestes casos, mortalidade variando de 13 a 69%(13). No presente estudo foram encontrados 8 olhos (28,5%) com invasão do nervo óptico, sendo 3 olhos com invasão pré-laminar, 4 olhos com invasão laminar e 1 olho com margem cirúrgica comprometida.

A invasão de coróide como fator de risco para disseminação da doença é ainda questionada(3,13). Alguns autores sugerem que o envolvimento da coróide é um fator de risco significante para a disseminação extra-ocular, com mortalidade de 11 a 81% (13). Alguns autores consideram a invasão de coróide um fator aditivo, que só implica em maior risco de doença disseminada, quando associado a outros fatores de risco, como a invasão pós-laminar do nervo óptico(15).

A invasão da coróide foi observada em diferentes estudos variando de 12 a 62% dos olhos enucleados por retinoblastoma(3). Em um estudo de 230 casos de retinoblastoma foram observados o comprometimento da coróide em 82% dos olhos, porém não foi encontrado nestes casos uma relação direta entre o comprometimento da coróide e metástases(16). Foram observados no presente estudo 64,2% dos olhos com envolvimento da coróide.

Ainda observamos que 10 (35,7%) olhos apresentavam algum grau de invasão das túnicas oculares, e em 8 (28.5%) olhos notou-se invasão simultânea das túnicas oculares e do nervo óptico.

Quando se comparou o grau de envolvimento ocular entre os casos que foram submetidos à enucleação primária com os casos submetidos ao tratamento prévio, observou-se que 7 casos (53,8%) que sofreram enucleação primária tiveram comprometimento do nervo óptico e que 11 casos (84,6%) tiveram comprometimento das túnicas oculares. Já nos casos que tiveram tratamento prévio apenas 1 caso (6,6%) apresentava comprometimento do nervo óptico e 7 casos (46,6%) apresentavam comprometimento das túnicas oculares.

Isso provavelmente se deve ao fato de que os olhos submetidos à enucleação primária apresentavam doença clinicamente avançada e que este foi o tratamento de escolha. Entretanto, os olhos submetidos ao tratamento prévio à apresentação inicial, oferecendo a possibilidade de tentativa de um tratamento conservador, tiveram na sua evolução, uma resposta insatisfatória e foram submetidos à enucleação.

Foram encontrados 17 olhos (60,7%) com neovascularização da íris e/ou ângulo. A neovascularização da íris já foi descrita previamente em olhos enucleados por retinoblastoma, sendo descritos em 31 a 80% dos espécimes examinados(17-18), sendo descrito sua associação com fatores histológicos de estágios avançados da doença (invasão de coróide e nervo óptico).

Quando comparamos os olhos que tiveram enucleação primária observamos que 11 (84,6%) apresentavam neovascularização de íris e/ou ângulo, enquanto que nos olhos que tiveram tratamento prévio apenas 6 (40%) apresentavam essa patologia.

Em um estudo sobre achados histopatológicos em retinoblastoma tratados com quimioterapia foram descritos dois casos de regressão tumoral, com substituição do tumor por tecido glial(19). No presente estudo observamos três olhos, um tratado com quimioterapia isolada e dois tratados com quimioterapia e radioterapia, com regressão tumoral.

Os resultados aqui apresentados são um estudo preliminar dentro de uma série de casos enucleados seqüencialmente no setor de tumores oculares da UNIFESP - EPM, onde se tentará estabelecer a relação entre os achados histopatológicos e a evolução dos pacientes ao longo dos anos.

CONCLUSÕES

1 - Nos olhos enucleados, neovascularização de íris e ângulo, necrose e calcificação foram os achados histopatológicos mais comumente observados nos casos de retinoblastoma.

2 - A invasão do nervo óptico e coróide, considerados dois importantes fatores de prognóstico foram observados em 28,5% e 64,2% dos olhos respectivamente.

3 - Os casos tratados com enucleação primária apresentavam maior comprometimento do nervo óptico e das túnicas oculares quando comparados aos olhos submetidos ao tratamento prévio.

Recebido para publicação em 26.06.2003

Versão revisada recebida em 02.12.2004

Aprovação em 04.03.2005

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  • Endereço para correspondência
    Maria Cristina Martins
    R. Joel Jorge de Melo, 236 - apto. 72
    São Paulo (SP) CEP 04128-080
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Set 2005
    • Data do Fascículo
      Jun 2005

    Histórico

    • Recebido
      26 Jun 2003
    • Revisado
      02 Dez 2004
    • Aceito
      04 Mar 2005
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