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Envolvimento orbitário difuso por displasia fibrosa na síndrome de McCune Albright: relato de caso

McCune Albright syndrome - diffuse orbital involvement due to fibrous dysplasia: a case report

Resumos

A displasia fibrosa é considerada uma desordem óssea benigna, de progressão lenta na qual há substituição de osso normal por tecido fibroso Quando associada a hiperpigmentação de pele e distúrbios endocrinológicos denomina-se síndrome de McCune Albright. Relatamos um caso raro de síndrome de McCune Albright em uma criança do sexo masculino que apesar de apresentar mínimas distorções crânio-facial externas, mostrou um envolvimento difuso e bilateral das órbitas.

Displasia fibrosa poliostótica; Doenças orbitárias; Anormalidades craniofaciais; Ossos faciais


Fibrous dysplasia is a benign, slowly progressive bone disorder, in which normal bone is replaced by fibrous tissue. It is called McCune Albright syndrome when associated with skin hyperpigmentation and endocrinological disorders. We report a rare case of McCune Albright syndrome in a boy, who presented bilateral and diffuse involvement of orbits but few external craniofacial distortions.

Fibrous dysplasia, polyostotic; Orbital diseases; Craniofacial abnormalities; Facial bones


RELATOS DE CASOS

Envolvimento orbitário difuso por displasia fibrosa na síndrome de McCune Albright: relato de caso

McCune Albright syndrome - diffuse orbital involvement due to fibrous dysplasia: a case report

Márcio Alberto CostanziI; Antonio Augusto Velasco e CruzII

IPós-graduando do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP) - Brasil

IIProfessor Titular do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da USP - Ribeirão Preto (SP) - Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Feijó Júnior, 975/403 Caxias do Sul (RS) CEP 95064-160 E-mail: marciocostanzi@bol.com.br

RESUMO

A displasia fibrosa é considerada uma desordem óssea benigna, de progressão lenta na qual há substituição de osso normal por tecido fibroso Quando associada a hiperpigmentação de pele e distúrbios endocrinológicos denomina-se síndrome de McCune Albright. Relatamos um caso raro de síndrome de McCune Albright em uma criança do sexo masculino que apesar de apresentar mínimas distorções crânio-facial externas, mostrou um envolvimento difuso e bilateral das órbitas.

Descritores: Displasia fibrosa poliostótica/diagnóstico; Doenças orbitárias; Anormalidades craniofaciais; Ossos faciais/anormalidades

ABSTRACT

Fibrous dysplasia is a benign, slowly progressive bone disorder, in which normal bone is replaced by fibrous tissue. It is called McCune Albright syndrome when associated with skin hyperpigmentation and endocrinological disorders. We report a rare case of McCune Albright syndrome in a boy, who presented bilateral and diffuse involvement of orbits but few external craniofacial distortions.

Keywords: Fibrous dysplasia, polyostotic/diagnosis; Orbital diseases; Craniofacial abnormalities; Facial bones/abnormalities

INTRODUÇÃO

Em 1891, von Recklinghausen descreveu pacientes com condições patológicas ósseas caracterizadas pela presença de deformidades e alterações fibrosas, denominando essa condição de " osteites fibrosa generalisata" . Só quatro décadas depois é que Liechtenstein e Jaffe reconheceram, em 1938, a condição descrita por von Recklinghausen como uma entidade nosológica bem delineada e a nomearam displasia fibrosa (DF)(1).

A DF é uma desordem displásica do osso, caracterizada por proliferações de fibroblastos fusiformes entremeados por trabéculas de tecido ósseo imaturo não rodeados por osteoblastos(2).

A doença é considerada uma desordem óssea benigna, de progressão lenta, na qual há substituição de osso normal por tecido fibroso. Em geral afeta 1 em cada 4.000 a 10.000 indivíduos. Trata-se de um distúrbio não familiar, congênito, que produz cerca de 2,5% de todos os tumores ósseos e mais de 7% de todos os tumores não malignos do osso(3).

A displasia fibrosa pode se apresentar de forma isolada ou associada às manifestações extra-esqueléticas. Dessas, a mais comum é a presença de manchas hiperpigmentadas do tipo " café-com-leite" . Quando além dessas manchas, a DF é também acompanhada de distúrbios endócrinos, a tríade é denominada de síndrome de McCune Albright. Essa doença, descrita pela primeira vez em 1937, é bem mais rara que a forma isolada da DF e, usualmente ocorre em crianças do sexo feminino(1,3).

O objetivo do presente trabalho é relatar um caso raro de síndrome de McCune Albright em uma criança do sexo masculino que, apesar de apresentar mínimas distorções craniofaciais externas, mostrou um envolvimento difuso e bilateral das órbitas.

RELATO DE CASO

Criança do sexo masculino, 7 anos de idade foi atendida no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto aos 2 anos de idade apresentando fratura no membro inferior. O exame radiológico evidenciou áreas de displasia fibrosa e clinicamente observou-se manchas café-com-leite em face. Três anos após a fratura desenvolveu puberdade precoce, sendo então feito o diagnóstico de síndrome de McCune Albright. Encaminhado ao serviço de Oftalmologia para avaliação o paciente. Ao exame notou-se retração palpebral inferior (distância da margem palpebral inferior ao centro pupilar de 7,0 mm em ambos os olhos), fenda palpebral com orientação anti-mongolóide e presença de discreto abaulamento da região frontal (Figura 1). A acuidade visual era 1,0 em ambos os olhos, o campo visual era normal, a exoftalmometria era de 13 mm (OD) e 14 mm (OE), fundoscopia e oculomotricidade sem alterações.


Apesar da relativa normalidade do exame oftalmológico, uma tomografia computadorizada de crânio e face foi solicitada, cujo resultado revelou importante comprometimento orbitário circunferencial bilateral englobando todas as paredes orbitárias, inclusive as regiões apicais (Figura 2).


COMENTÁRIOS

A DF não é tratável medicamente. Na área craniofacial, o único tratamento possível é a correção cirúrgica das distorções ósseas que induzem problemas do tipo distopias oculares, abaulamentos e proptose. Quando há comprometimento do ápice orbitário existe a possibilidade de envolvimento do forame óptico e fissura orbitária superior e conseqüente compressão das estruturas neurovasculares que transitam por essas aberturas ósseas (nervo óptico, artéria oftálmica, nervos cranianos III, IV, V, VI, veia oftálmica superior e ramos simpáticos). Essa compressão pode levar à perda de campo visual e mesmo amaurose.

Nesse contexto, poder-se-ia propor procedimentos cirúrgicos descompressivos que prevenissem eventuais compressões ópticas. O problema é que as cirurgias de descompressão do canal óptico na DF são extremamente perigosas e há relatos de caso de amaurose após esse tipo de procedimento(4). Por outro lado é comum, como no caso em questão, haver uma grande dissociação entre o quadro radiológico e o clínico.

Os oftalmologistas que tratam pacientes com DF precisam entender que o tecido anormal, evidenciado radiologicamente com aspecto de " vidro fosco" não é, necessariamente, pétreo, mas sim fibroso, o que explica a manutenção das funções visuais por longos períodos de tempo, ou mesmo, toda a vida, apesar da gravidade do quadro radiológico. No caso em questão optamos por uma conduta expectante com avaliações seriadas da função visual.

A tomografia computadorizada de crânio e face, de preferência com janela óssea, é sempre necessária para a avaliação de pacientes com DF, mesmo nos casos que aparentemente não apresentam grandes acometimentos orbitários.

Recebido para publicação em 26.09.2005

Última versão revisada recebida em 14.03.2007

Aprovação em 26.03.2007

Trabalho realizado no Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP) - Brasil.

Nota Editorial: Depois de concluída a análise do artigo sob sigilo editorial e com a anuência do Dr. José Vital Filho sobre a divulgação de seu nome como revisor, agradecemos sua participação neste processo.

  • 1. Ricalde P, Horswell BB. Craniofacial fibrous dysplasia of the fronto-orbital region: a case series and literature review. J Oral Maxillofac Surg. 2001; 59(2):157-67; discussion 167-8.
  • 2. Selva D, White VA, O'Connell JX, Rootman J. Primary bone tumors of the orbit. Surv Ophthalmol. 2004;49(3):328-42.
  • 3. Edgerton MT, Persing JA, Jane JA. The surgical treatment of fibrous dysplasia. With emphasis on recent contributions from cranio-maxillo-facial surgery. Ann Surg. 1985;202(4):459-79.
  • 4. Edelstein C, Goldberg RA, Rubino G. Unilateral blindness after ipsilateral prophylactic transcranial optic canal decompression for fibrous dysplasia. Am J Ophthalmol. 1998;126(3):469-71.
  • Endereço para correspondência:

    Rua Feijó Júnior, 975/403
    Caxias do Sul (RS) CEP 95064-160
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Jan 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 2007

    Histórico

    • Aceito
      26 Mar 2007
    • Revisado
      14 Mar 2007
    • Recebido
      26 Set 2005
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