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Complicações em ceratoplastia endotelial com desnudamento da Descemet (DSEK)

Complications after Descemet's stripping endothelial keratoplasty

Resumos

OBJETIVO: Descrever a taxa de complicações e os tipos de complicações intraoperatórias e pós-operatórias da ceratoplastia endotelial com desnudamento da Descemet (DSEK). MÉTODOS: Revisão retrospectiva de prontuários de pacientes submetidos à DSEK de 2008 a 2010 no Hospital Oftalmológico de Sorocaba. O estudo teve caráter descritivo, com abordagem quantitativa. RESULTADOS: Cento e dezenove olhos de 118 pacientes foram avaliados. Segundo a doença ocular de base, a maior parte dos pacientes eram portadores da distrofia de Fuchs (60 olhos, 50,4%), seguidos dos portadores de ceratopatia bolhosa do pseudofácico com 55 olhos (46,2%). A cirurgia mais comumente realizada foi o transplante endotelial isoladamente (DSEK), realizado em 65 olhos (54,6%), seguida do DSEK associado à facoemulsificação de cristalino (PHACO-DSEK) em 47 olhos (39,5%) e DSEK associado a outras cirurgias (7 olhos, 5,9%). Oito pacientes foram excluídos do trabalho devido informações cirúrgicas insuficientes em prontuário médico. Em relação às complicações cirúrgicas transoperatórias, foram observados casos isolados de bloqueio pupilar, dissecção irregular do botão, implante reverso do botão, "button-holing" e ruptura de cápsula posterior. Entre as complicações precoces, observou-se descolamento de botão em 21,5% dos olhos no grupo do DSEK, 34,0% no grupo PHACO-DSEK e 57,1% no grupo DSEK associado a outras técnicas cirúrgicas. No que se refere às complicações tardias, observou-se "haze" (opacidade) em interface em 16,9%, 8,5% e 14,2% e glaucoma foi observado em 4,6%, 2,1% e 14,2% dos olhos nos grupos DSEK, PHACO-DSEK e DSEK associado a outras técnicas, respectivamente. Falência pós-rejeição foi observada em 15,3% e 12,7% dos grupos DSEK e PHACO-DSEK, respectivamente. CONCLUSÃO: O transplante endotelial de córnea realizado nesta amostra teve uma taxa de complicações considerada alta se comparado aos transplantes penetrantes convencionais. As complicações mais frequentes foram aquelas relacionadas ao descolamento de botão e à falência pós-rejeição.

Complicações pós-operatórias; Ceratoplastia endotelial com remoção da membrana de Descemet; Membrana de Descemet; Transplante de córnea; Doenças da córnea


PURPOSE: To describe the complication rate and type of intraoperative and postoperative complications of Descemet stripping endothelial keratoplasty (DSEK). METHODS: Retrospective medical records review of patients who underwent DSEK between 2008 and 2010 at the Sorocaba Ophthalmological Hospital. The study was descriptive, using a quantitative approach. RESULTS: One hundred nineteen eyes of 118 patients were evaluated. According to the diagnoses, most patients were diagnosed with Fuchs' dystrophy (60 eyes, 50.4%), followed by patients with pseudophakic bullous keratopathy in 55 eyes (46.2%). The most common procedure performed was DSEK alone, performed in 65 eyes (54.6%), followed by the DSEK associated to phacoemulsification (PHACO-DSEK) in 47 eyes (39.5%) and DSEK associated to other surgeries (7 eyes, 5.9%). Eight patients were excluded from the study due to insufficient information in the surgical record. In relation to the intra-operative complications, isolated cases of pupillary block, irregular manual dissection of button, inverted implantation of the button, button-holing and posterior capsule rupture were noticed. Among the documented early postoperative complications, button detachment was observed in 21.5% of the DSEK alone group; 34.0% in PHACO-DSEK group and 57.1% when DSEK was held jointly with other surgical techniques. Regarding to late complications, interface haze was observed in 16.9%, 8.5% and 14.2%, and glaucoma was observed in 4.6%, 2.1% and 14.2% in DSEK, PHACO-DSEK and DSEK associated to other techniques, respectively. Post rejection graft failure was observed in 15.3% and 12.7% of the eyes after DSEK and. PHACO-DSEK, respectively. CONCLUSION: Endothelial corneal transplant accomplished in this sample showed a high rate of complications when compared to the conventional penetrating keratoplasty. The most frequent complications were related to detachment of the button and graft failure.

Postoperative complications; Descemet stripping endothelial keratoplasty; Descemet membrane; Corneal transplantation; Corneal diseases


ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Complicações em ceratoplastia endotelial com desnudamento da Descemet (DSEK)

Complications after Descemet's stripping endothelial keratoplasty

Gustavo Souza Moura; Grazielly Martins Peixoto de Oliveira; Taise Tognon; Nicolas Cesário Pereira; Luciene Barbosa de Sousa

Médico, Hospital Oftalmológico de Sorocaba - Sorocaba, SP, Brasil

Endereço de correspondência Endereço para correspondência: Gustavo Souza Moura. Rua Nabeck Shiroma, 210 Sorocaba (SP) - 18031-060 E-mail: medufs@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Descrever a taxa de complicações e os tipos de complicações intraoperatórias e pós-operatórias da ceratoplastia endotelial com desnudamento da Descemet (DSEK).

MÉTODOS: Revisão retrospectiva de prontuários de pacientes submetidos à DSEK de 2008 a 2010 no Hospital Oftalmológico de Sorocaba. O estudo teve caráter descritivo, com abordagem quantitativa.

RESULTADOS: Cento e dezenove olhos de 118 pacientes foram avaliados. Segundo a doença ocular de base, a maior parte dos pacientes eram portadores da distrofia de Fuchs (60 olhos, 50,4%), seguidos dos portadores de ceratopatia bolhosa do pseudofácico com 55 olhos (46,2%). A cirurgia mais comumente realizada foi o transplante endotelial isoladamente (DSEK), realizado em 65 olhos (54,6%), seguida do DSEK associado à facoemulsificação de cristalino (PHACO-DSEK) em 47 olhos (39,5%) e DSEK associado a outras cirurgias (7 olhos, 5,9%). Oito pacientes foram excluídos do trabalho devido informações cirúrgicas insuficientes em prontuário médico. Em relação às complicações cirúrgicas transoperatórias, foram observados casos isolados de bloqueio pupilar, dissecção irregular do botão, implante reverso do botão, "button-holing" e ruptura de cápsula posterior. Entre as complicações precoces, observou-se descolamento de botão em 21,5% dos olhos no grupo do DSEK, 34,0% no grupo PHACO-DSEK e 57,1% no grupo DSEK associado a outras técnicas cirúrgicas. No que se refere às complicações tardias, observou-se "haze" (opacidade) em interface em 16,9%, 8,5% e 14,2% e glaucoma foi observado em 4,6%, 2,1% e 14,2% dos olhos nos grupos DSEK, PHACO-DSEK e DSEK associado a outras técnicas, respectivamente. Falência pós-rejeição foi observada em 15,3% e 12,7% dos grupos DSEK e PHACO-DSEK, respectivamente.

CONCLUSÃO: O transplante endotelial de córnea realizado nesta amostra teve uma taxa de complicações considerada alta se comparado aos transplantes penetrantes convencionais. As complicações mais frequentes foram aquelas relacionadas ao descolamento de botão e à falência pós-rejeição.

Descritores: Complicações pós-operatórias; Ceratoplastia endotelial com remoção da membrana de Descemet; Membrana de Descemet; Transplante de córnea; Doenças da córnea/cirurgia

ABSTRACT

PURPOSE: To describe the complication rate and type of intraoperative and postoperative complications of Descemet stripping endothelial keratoplasty (DSEK).

METHODS: Retrospective medical records review of patients who underwent DSEK between 2008 and 2010 at the Sorocaba Ophthalmological Hospital. The study was descriptive, using a quantitative approach.

RESULTS: One hundred nineteen eyes of 118 patients were evaluated. According to the diagnoses, most patients were diagnosed with Fuchs' dystrophy (60 eyes, 50.4%), followed by patients with pseudophakic bullous keratopathy in 55 eyes (46.2%). The most common procedure performed was DSEK alone, performed in 65 eyes (54.6%), followed by the DSEK associated to phacoemulsification (PHACO-DSEK) in 47 eyes (39.5%) and DSEK associated to other surgeries (7 eyes, 5.9%). Eight patients were excluded from the study due to insufficient information in the surgical record. In relation to the intra-operative complications, isolated cases of pupillary block, irregular manual dissection of button, inverted implantation of the button, button-holing and posterior capsule rupture were noticed. Among the documented early postoperative complications, button detachment was observed in 21.5% of the DSEK alone group; 34.0% in PHACO-DSEK group and 57.1% when DSEK was held jointly with other surgical techniques. Regarding to late complications, interface haze was observed in 16.9%, 8.5% and 14.2%, and glaucoma was observed in 4.6%, 2.1% and 14.2% in DSEK, PHACO-DSEK and DSEK associated to other techniques, respectively. Post rejection graft failure was observed in 15.3% and 12.7% of the eyes after DSEK and. PHACO-DSEK, respectively.

CONCLUSION: Endothelial corneal transplant accomplished in this sample showed a high rate of complications when compared to the conventional penetrating keratoplasty. The most frequent complications were related to detachment of the button and graft failure.

Keywords: Postoperative complications; Descemet stripping endothelial keratoplasty; Descemet membrane; Corneal transplantation; Corneal diseases/surgery

INTRODUÇÃO

O transplante endotelial foi descrito inicialmente em modelo animal em 1993 por Ko et al.(1) e mais tarde, em 1998, Melles et al.(2) publicaram o primeiro transplante endotelial em humanos. Em 1999, iniciaram-se os estudos com a ceratoplastia endotelial lamelar profunda (DLEK, do inglês, "deep lamellar endothelial keratoplasty"), que consiste na retirada de lamela posterior do receptor, com a inserção do botão doador e colocação na bolsa criada anteriormente(3).

A técnica de ceratoplastia endotelial por desnudamento endotelial (DSEK, do inglês, "Descemet stripping endothelial keratoplasty") foi concebida em 2005(4), Nessa técnica é realizada a retirada da membrana de Descemet do receptor, com subsequente inserção do botão corneano. A preparação do botão doador pode ser feita manualmente (DSEK) ou com utilização de microcerátomo (DSAEK, do inglês, "Descemet stripping automated keratoplasty") ou laser de femtosegundo (FLEK, do inglês, "femtosecond laser assisted endothelial keratoplasty"). Em 2006 foi introduzida a técnica de ceratoplastia endotelial da membrana de Descemet (DMEK, do inglês, "Descemet membrane endothelial keratoplasty"), ou seja, a troca da membrana de Descemet e endotélio, sem estroma corneano(5).

O DSEK, DSAEK e DMEK são atualmente cirurgias de escolha no tratamento de disfunções endoteliais, produzindo excelentes resultados visuais com alteração mínima no topografia corneana ou refração. Vale lembrar que a escolha da técnica cirúrgica para realização do procedimento está relacionada com a habilidade e experiência do cirurgião. Doenças de eleição para estes procedimentos são a distrofia de Fuchs, ceratopatias bolhosas, síndrome endotelial iridocorneal ou falência de transplante penetrante(6). Nos últimos anos, complicações relacionadas ao procedimento foram descritas na literatura(7-13). DSEK fornece mais rápida reabilitação visual e um perfil de segurança aprimorada em comparação com o padrão da ceratoplastia penetrante, principalmente no que diz respeito à ferida operatória e complicações relacionadas à sutura, além do risco menor de hemorragia transoperatória(7). A evolução contínua desta técnica, relativamente nova, está ajudando a reduzir as complicações e melhorar ainda mais os resultados(3).

O objetivo do estudo é descrever os tipos e a frequência de complicações transoperatórias e pós-operatórias em pacientes submetidos ao transplante endotelial no Hospital Oftalmológico de Sorocaba (HOS) no período de 2008 a 2010.

MÉTODOS

Foi realizada revisão retrospectiva de prontuários de todos os pacientes submetidos à cirurgia endotelial de janeiro de 2008 até dezembro de 2010. Foram excluídos do trabalho pacientes com prontuários de preenchimento incompleto ou inadequado. O estudo teve caráter descritivo, com abordagem quantitativa e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição sob parecer número 11352.

A cirurgia endotelial realizada no serviço segue os principais passos adotados pela literatura(2,14). O preparo do enxerto endotélio do doador é realizado com a córnea doadora montada em uma câmara anterior artificial (Barron Artificial Anterior Chamber; Katena Products, Inc. Nova Jersey, EUA). Realiza-se marcação da trepanação central, variando de 8,0 a 8,25 mm e em seguida incisão límbica de cerca de 5,0 mm com bisturi de diamante. A dissecção lamelar manual procede com auxílio de uma lâmina crescente e espátula, em aproximadamente dois terços de profundidade da espessura total da córnea. Após a completa delaminação da córnea, o tecido doador, com o endotélio voltado para cima e com uma pequena quantidade de viscoelástico dispersivo na sua superfície é transferido para o meio Optisol GS até o preparo do leito receptor. Utiliza-se uma sutura de reparo no botão doador com prolene 10.0 antes de colocá-lo na câmara anterior receptora.

Na córnea receptora é feito um túnel corneoescleral superior (às 12:00h) de cerca de 5,0 mm. São utilizadas duas paracenteses corneanas de aproximadamente 1,0 mm cada: uma para colocação de viscoelástico e sonda de irrigação/aspiração e outra para "Descemetorrexis". Coloca-se o botão doador na câmara anterior com auxílio da alça de Snellen serrilhada. A ferida escleral é suturada com dois a três pontos de nylon 10.0 e as paracenteses são suturadas, quando necessário. O enxerto é reposicionado deslizando repetidamente a espátula de íris sobre a córnea. Injeta-se ar na câmara anterior após o melhor posicionamento do enxerto. A compressão do ar é mantida por pelo menos 10 minutos. Finalmente, BSS é injetado e um pouco de ar removido para deixar uma bolha de ar de tamanho semelhante ao botão doador. O procedimento é concluído com injeção subconjuntival de corticoide e antibiótico e com a colocação de uma lente de contato terapêutica, quando realizada desepitelização prévia.

A maioria dos transplantes realizados neste serviço nesta época foi realizada por cirurgiões do setor de doenças oculares externas e córnea, com experiência mínima de 100 transplantes penetrantes de córnea e em curva de aprendizado do transplante endotelial de córnea.

Para a formulação de dados, foram avaliados dados demográficos, indicações para transplante endotelial de córnea, técnicas cirúrgicas programadas, complicações transoperatórias, além de pós-operatórias precoces e tardias.

Falência primária foi definida como uma função endotelial inadequada do botão doador associada ou não ao trauma cirúrgico. Neste caso, clinicamente observa-se edema irreversível do tecido doador em qualquer período pós-operatório (precoce). Quando reconhecida falência após nova técnica cirúrgica (como exemplo, reposicionamento de botão), chamou-se de falência secundária. Rejeição, neste estudo, foi classificada como um evento em que se observa a opacificação do tecido corneano após algum período de transparência, associado principalmente a fatores inflamatórios. Deu-se o nome de falência pós-rejeição àqueles olhos em que se observou falência do botão corneano após episódio de rejeição ao transplante, dentro dos eventos de complicação tardia.

RESULTADOS

Foram avaliados prontuários referentes a 127 olhos, 8 olhos foram excluídos devido a preenchimento incompleto do prontuário. Foram avaliados 119 olhos de 118 pacientes, sendo 37 (31,1%) do sexo masculino e 82 (68,9%) do sexo feminino. O seguimento pós-operatório observado nos prontuários foi, em média, de oito meses (variação de três a doze meses). Oito pacientes foram excluídos do trabalho devido informações cirúrgicas insuficientes em prontuário médico.

A média de idade dos participantes deste estudo foi de 65,55 ± 8,28 anos (variação de 23 a 85 anos). Quanto à procedência dos pacientes estudados, 56 (47,4%) foram provenientes do estado de São Paulo, 36 (30,5%) do Rio de Janeiro, 6 (5,0%) da Bahia, 5 (4,2%) do Espírito Santo, 1 (0,8%) do Distrito Federal e 2 participantes de cada um dos seguintes estados: Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Piauí, Rio Grande do Sul e Roraima.

Dos 119 olhos avaliados, 60 (50,4%) eram portadores da distrofia de Fuchs, 55 (46,2%) de ceratopatia bolhosa do pseudofácico e 4 casos (3,3%) de cada uma das seguintes doenças: ceratopatia bolhosa do afácico, ceratocone associado à distrofia de Fuchs, distrofia corneana associada à síndrome de Marfan e falência secundária à rejeição após ceratoplastia penetrante.

Em relação à técnica utilizada durante o período da amostra, a cirurgia mais comumente realizada foi o transplante endotelial isoladamente (DSEK), realizado em 65 olhos (51,1%), seguida do DSEK associado à facoemulsificação de cristalino (PHACO-DSEK) em 47 olhos (37%) e DSEK associado a outros procedimentos (DSEK Associado) em 7 olhos (5,5%), os quais são listados a seguir: fixação escleral secundária de lente intraocular, reposicionamento de LIO, pupiloplastia, lensectomia e vitrectomia anterior.

Complicações transoperatórias

A incidência de complicações pode ser avaliada na tabela 1. Em relação às complicações cirúrgicas transoperatórias, foram observados, nos olhos de DSEK, um caso de bloqueio pupilar resolvido com manipulação ocular, um caso de dissecção irregular do botão, complicada com bloqueio pupilar no pós-operatório imediato e um caso de implante reverso do botão, realizando manipulação e correto posicionamento do mesmo.

No grupo PHACO-DSEK foi observado 1 caso de "button-holing", que evoluiu para descolamento do botão no pós-operatório precoce e 1 caso de ruptura de cápsula posterior, realizando-se vitrectomia e implante de LIO no sulco. Dos 5 olhos elencados acima, 3 (60%) evoluíram para falência secundária (olhos de "button-holing", dissecção irregular do botão e implante reverso do botão, todos ocorridos durante a realização do DSEK).

Complicações precoces

As complicações precoces foram àquelas apresentadas até 30 dias após a cirurgia. Em relação a estas complicações relacionadas ao DSEK isoladamente, observamos 14 olhos (21,5%) com descolamento de botão, sendo que destes, 6 (9,2%) descolamentos foram observados no primeiro dia após cirurgia, 4 (6,1%) foram observados no sétimo dia de avaliação, 2 (1,5%) com duas semanas de pós-operatório e 2 (1,5%) com um mês de seguimento (Tabela 2). Ainda dentro do grupo DSEK, 5 olhos (7,6%) apresentaram bloqueio pupilar, 2 olhos (3,0%) falência primária e 1 olho (1,5%) úlcera de córnea.

Quanto ao grupo PHACO-DSEK, observamos 16 olhos (34,0%) com descolamento de botão, dos quais 7 (14,8%) foram observados no primeiro dia após cirurgia, 8 (17,0%) foram observados no sétimo dia de avaliação e 1 (2,1%) com duas semanas de pós-operatório. Encontramos ainda 6 olhos (12,7%) com falência primária e 4 olhos (8,5%) com bloqueio pupilar.

No grupo DSEK associado, evidenciamos 4 olhos (57,1%) com descolamento de botão, sendo 3 (42,8%) no primeiro dia pós-operatório e um outro (14,2%) diagnosticado ao trigésimo dia pós-cirúrgico. Observou-se ainda 1 caso (14,2%) de bloqueio pupilar neste grupo cirúrgico.

Avaliando-se todos os pacientes do estudo, foi observada uma taxa de descolamento de 26,6 % (34 olhos), dos quais, 19 olhos (55,9%) sofreram falência primária precoce ou tardia durante o seguimento. Para o tratamento do descolamento de botão, optou-se, na maioria das vezes, por injeção intracameral do gás C3F8 com diluição a 10%, associado ou não a reposicionamento de botão. Não se evidenciou ausência de aderência do botão após aplicação do gás nos pacientes deste estudo.

Dentre os 14 olhos do grupo DSEK que apresentaram descolamento de botão, foram observados um ou mais dos seguintes eventos associados que se seguiram ao descolamento: 4 olhos (28,6%) com falência secundária, 3 olhos (21,4%) com falência pós-rejeição, 2 olhos (14,3%) com rejeição ao enxerto, 2 olhos (14,3%) com "haze" em interface e 2 olhos (14,3%) com falência primária precoce. No grupo PHACO-DSEK, dos 16 olhos que apresentaram descolamento de botão, 6 (37,5%) apresentaram falência pós-rejeição, 4 (25%) falência secundária e 1 caso (6,2%) glaucoma secundário. Dentre os 4 olhos que apresentaram descolamento de botão no grupo de DSEK associado, observou-se 1 olho (25%) com haze em interface outro (25%) com glaucoma secundário (Tabela 3).

Complicações tardias

No que se refere às complicações tardias apresentadas pelo grupo de DSEK, observou-se 11 olhos (16,9%) com "haze" em interface, 10 olhos (15,3%) com falência pós-rejeição, 8 olhos (12,3%) com rejeição ao enxerto, 8 olhos (12,3%) com falência secundária e 3 olhos (4,6%) com glaucoma secundário.

No grupo PHACO-DSEK, observaram-se 4 olhos (8,5%) com "haze" em interface, 6 olhos (12,7%) com falência pós-rejeição, 7 olhos (14,8%) com rejeição ao enxerto, 7 olhos (14,8%) com falência secundária e 1 caso (2,1%) de glaucoma secundário.

No grupo DSEK associado, observou-se 1 caso (14,2%) de "haze" em interface e 1 outro caso (14,2%) de glaucoma secundário.

DISCUSSÃO

Em nossa casuística, obtivemos 60 olhos (50,4%) de olhos com distrofia de Fuchs, achado comparado com boa parte da literatura vigente no que diz respeito às indicações de transplante endotelial(15).

Dos cinco olhos em que foram observadas complicações intraoperatórias, 3 (60%) evoluíram para falência do enxerto (olhos com "button-holing", dissecção irregular do botão e implante reverso do botão, todos ocorridos durante a realização do DSEK), o que pode sugerir a necessidade de maior experiência cirúrgica para obtenção de melhores resultados com a técnica empregada.

Das complicações pós-operatórias, observa-se a perda endotelial durante o manuseio do botão para câmara anterior e o descolamento do botão como possíveis causas de falência primária referidas neste estudo. A técnica de inserção do botão endotelial, em todos os olhos estudados, foi realizada através do uso de fio prolene 10-0. Sabemos que existem disponíveis diferentes métodos de inserção que talvez sejam menos traumáticos [ex.: EndoGlide (Angiotech/Network Medical Products), Busin glide (Moria USA)] e que em alguns estudos demonstraram menor perda de células endoteliais(16). As taxas de falência primária variam de 0%-29%(4), sendo que neste estudo foi obtida uma taxa que variou de 12,3 a 14,8% de falência primária de acordo com o grupo estudado.

Rejeição imunológica ao enxerto é uma complicação pós-operatória importante após DSEK. A gama de achados clínicos indicativos de rejeição difere em alguns aspectos entre DSEK e ceratoplastia penetrante, sendo que a maior parte dos olhos de rejeição no DSEK tende a ser assintomático e muitas vezes relacionado à interrupção do uso de corticoides tópicos(8,9). Na nossa amostra foi observada a taxa de 12,3% e 14,8% no grupo DSEK e PHACO-DSEK, respectivamente, valor dentro da média quando comparada às publicadas mundialmente (0%-45%)(4).

Várias técnicas são descritas para diminuir a possibilidade de descolamento de botão endotelial doador durante e após o transplante. Citam-se "scraping" do estroma posterior, na qual são realizadas escarificações posteriores e periféricas no estroma corneano receptor, no intuito de gerar uma superfície rugosa e aderente ao botão vindouro. Uma técnica adequada de dissecção do botão doador é importante para evitar descolamento do botão(3). É descrita na literatura uma técnica de infusão ar-fluido e controle da direção do fluxo no intuito de manter pressão intracameral e tamponar o botão doador em contato com estroma(17). Sabe-se que a integridade do diafragma de íris/lente no pré-operatório está relacionada a uma menor taxa de descolamento do botão doador. Uma maior taxa de descolamento do botão, por sua vez, leva a uma maior falência do botão(18). No presente estudo, foi observada uma taxa de 26,7% de descolamento de botão. Na literatura existem relatos de falência após persistência de membrana de Descemet observada por OCT de câmara anterior, no entanto esse achado não foi observado na nossa amostra(19). Neste estudo, dos 34 olhos que apresentaram descolamento de botão, 19 (55,8%) sofreram falência primária precoce ou tardia durante o seguimento, corroborando com os dados publicados. São variadas as taxas de descolamento de botão publicadas na literatura, variando de 0%-82%(4). Um estudo publicado em 2008(10) mostrou uma taxa de 23% de descolamento. A incidência de descolamento do botão doador acontece geralmente nas primeiras semanas após o transplante, sendo que existem relatos de descolamento após os 6 meses de cirurgia(11). Na nossa amostra, os deslocamentos de botões doadores foram observados na primeira semana de pós-operatório em 28 dos 34 olhos. e em 21,5%, 34,0% e 57,1% nos grupos DSEK, PHACO-DSEK e DSEK Associado, respectivamente (Tabela 2). Esses dados ilustram que a maior incidência do descolamento de botão é precoce bem como que uma maior taxa de descolamento é observada quando se associa o transplante endotelial a outras técnicas cirúrgicas.

'Outras complicações são descritas, tais como rejeição ao enxerto, descolamento de retina, edema macular cistoide, crescimento epitelial, hemorragia supracoroidal intraoperatória, endoftalmite e bloqueio pupilar(12,20). Destas citadas, foram descritas as taxas de 7,6% de bloqueio pupilar em pacientes submetidos a DSEK, 8,5% de bloqueio quando se realizava PHACO-DSEK e 14,2% quando do DSEK Associado a outras técnicas cirúrgicas, o que faz presumir que o bloqueio se relaciona mais fortemente à complexidade cirúrgica elaborada. As taxas de bloqueio pupilar descritas na literatura variam de 0%-15%(4).

Em relação à falência tardia do enxerto, observamos 10 olhos (15,3%) com falência pós-rejeição e 8 olhos (12,3%) com falência secundária no grupo DSEK. No grupo PHACO-DSEK observamos 6 olhos (12,7%) de falência pós-rejeição e 7 olhos (14,8%) de falência secundária. A sobrevida dos enxertos após 1 ano varia entre 55% e 100% (com uma média de 94%)(4). No DSEK, a densidade de células endoteliais é diminuída no pós-operatório em comparação com pré-operatório, mas a taxa de perda de células diminui ao longo do tempo, fazendo com que a sobrevivência de enxerto por mais de dois anos seja alta. Preparação manual de tecido fornece enxertos de espessura adequada e o estudo do padrão temporal de densidade de células endoteliais é comparável com a do tecido doador confeccionado através do microcerátomo ou após ceratoplastia penetrante(6).

Nos olhos em que não há suporte capsular, a taxa de descolamento do botão ultrapassa os 50%(13). Em nossa casuística tivemos 3 olhos (2,7%) de DSEK associado à fixação escleral de lente intraocular, dos quais 2 (66,6%) sofreram descolamento de botão.

Muitos cirurgiões de córnea estão fazendo a transição da ceratoplastia penetrante para técnicas endoteliais como o DSEK ou DSAEK no tratamento de patologias endoteliais corneanas(11). A curva de aprendizado para a cirurgia endotelial é considerada mais difícil e requer uma maior habilidade e prática para execução da mesma. Sendo o trauma cirúrgico endotelial o fator mais importante que influencia a perda de células endoteliais(16), é comum encontrar altas taxas de falência primária nos centros que iniciaram a mudança de técnica da cirurgia penetrante para a ceratoplastia endotelial.

Desta forma, o transplante endotelial de córnea oferece uma curva de aprendizado mais difícil em relação aos transplantes penetrantes. Complicações variadas são comuns e necessitam ser detectadas precocemente para uma melhor sobrevida do enxerto.

Submetido para publicação: 10 de maio de 2012

Aceito para publicação: 1 de junho de 2013

Trabalho realizado no Hospital Oftalmológico de Sorocaba - Sorocaba, SP, Brasil

Financiamento: Não houve financiamento para este trabalho.

Divulgação de potenciais conflitos de interesse: G.S.Moura, Nenhum; G.M.P.de Oliveira, Nenhum; T.Tognon, Nenhum; N.C.Pereira, Nenhum; L.B.de Sousa, Nenhum.

Aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Oftalmológico de Sorocaba sob parecer número 11352.

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  • Endereço para correspondência:
    Gustavo Souza Moura.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Nov 2013
    • Data do Fascículo
      Out 2013

    Histórico

    • Recebido
      10 Maio 2012
    • Aceito
      01 Jun 2013
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