Acessibilidade / Reportar erro

Idiotia amaurótica familiar: Estudo de um caso pessoal e revisão da casuística brasileira

Resumos

1. Realizando pormenorizado estudo do assunto, o A. define a Idiotia Amaurótica Familiar como condição mórbida caracterizada, do sentido patológico, por degeneração lipóide das células ganglionares do sistema nervoso e, clinicamente, por deterioração mental progressiva, amaurose e desordens do tipo paralítico. 2. Recapitula os aspectos semiológicos do processo, e mostra, de acordo com a idade em que ocorre o mal, poderem ser individualizados quatro tipos clínicos: 1) Idiotia amaurótica infantil, iniciada abaixo de 1 ano, forma Tay-Sachs; 2) Idiotia amaurótica infantil tardia, começada acima de 1 ano, forma Bielschowski; 3) Idiotia amaurótica juvenil, de princípio entre os 6 e 14 anos, forma Spielmeyer-Vogt; 4) Idiotia amaurótica tardia, que aparece na idade média da vida ou mais tarde, forma Kufs. 3. Valendo-se de fundamentos objetivos encontrados, tanto na casuística estrangeira, quanto na nacional, mostra não ser compulsória a necessidade do elemento étnico judaico para o diagnóstico da enfermidade. 4. Ainda, a propósito da semiologia da Idiotia Amaurótica Familiar, insiste no fato, da mancha vermelho-cereja da mácula, ou sinal de Tay, não constituir manifestação ocular imprescindível para o diagnóstico: se a forma infantil de Tay-Sachs tem, nesse fenômeno, elemento semiológico obrigatório, as outras modalidades traduzem-se por atrofia do nervo óptico, retinite pigmentar e, às vezes, pelo menos durante algum tempo, fundo de olho normal, conforme consignam os achados de Sjögren e de outros pesquizadores autorizados. 5. Ocupando-se do aspecto patológico, recorda que a natureza essencial da enfermidade, isto é, o processo degenerativo das células ganglionares do sistema nervoso, se mantém, sempre, o mesmo, nos diversos tipos mórbidos por que se evidencia a Idiotia Amaurótica Familiar. 6. Rememora os poucos exemplares clínicos registados na literatura nacional e descreve, com minúcia, o caso que teve oportunidade de estudar na Clínica Neurológica do Hospital Getulio Vargas. 7. Em realizando considerações gerais, trata do aspecto genético da Idiotia Amaurótica Familiar, e mostra, que essa enfermidade configura condição mórbida, interessante por vários aspectos, já de sí capazes de contribuirem para a clarificação dos fatores heredológicos que contexturam numerosas enfermidades do sistema nervoso.


1. After detailed study based on a personal case and on the incidence reported by both brasilian and foreign litterature, the Author defines Familiary Amaurotic Idiocy, in pathological sense, as a lipoid degeneration of the nervous system ganglionary cells and clinically, as a progressive mental deterioration, amaurosis and disturbances of paretic type. 2. Clinical aspects of the process are revised and divided into four groups according to age: Infantile Amaurotic Idiocy (onset under 1 year of age) - Tay-Sachs' form; Late Infantile Amaurotic Idiocy (onset after 1 year) - Bielschowski's form; Juvenile Amaurotic Idiocy (between ages of 6 and 14 years) - Spielmeyer-Vogt's form; Late Amaurotic Idiocy (onset during middle age or after) - Kufs' form. 3. The Jewish ethnical element offers no greater influence in incidence in view of local and foreign statistics. 4. Tay's sign, i. e. cherry-red discoloration of macula does not constitute a necessary feature for diagnosis in cases other than infantile form of Tay-Sachs. In the other forms, optic nerve atrophy or pigmentary retinites may be present; fundi may be normal at least for a reasonable period of time. 5. Pathologically, the degenerative process of the nervous system ganglionary cells, which is the essential feature of the disease, is identical in all morbid types. The Author demonstrates, after general considerations, that the morbid conditions of the disease contribute to the explanation of hereditary factors common to numerous affections of the nervous system


Chefe da Clínica Neurológica do Hospital Getúlio Vargas (Rio de Janeiro) e titular da Academia Nacional de Medicina

SUMÁRIO E CONCLUSÕES

1. Realizando pormenorizado estudo do assunto, o A. define a Idiotia Amaurótica Familiar como condição mórbida caracterizada, do sentido patológico, por degeneração lipóide das células ganglionares do sistema nervoso e, clinicamente, por deterioração mental progressiva, amaurose e desordens do tipo paralítico.

2. Recapitula os aspectos semiológicos do processo, e mostra, de acordo com a idade em que ocorre o mal, poderem ser individualizados quatro tipos clínicos: 1) Idiotia amaurótica infantil, iniciada abaixo de 1 ano, forma Tay-Sachs; 2) Idiotia amaurótica infantil tardia, começada acima de 1 ano, forma Bielschowski; 3) Idiotia amaurótica juvenil, de princípio entre os 6 e 14 anos, forma Spielmeyer-Vogt; 4) Idiotia amaurótica tardia, que aparece na idade média da vida ou mais tarde, forma Kufs.

3. Valendo-se de fundamentos objetivos encontrados, tanto na casuística estrangeira, quanto na nacional, mostra não ser compulsória a necessidade do elemento étnico judaico para o diagnóstico da enfermidade.

4. Ainda, a propósito da semiologia da Idiotia Amaurótica Familiar, insiste no fato, da mancha vermelho-cereja da mácula, ou sinal de Tay, não constituir manifestação ocular imprescindível para o diagnóstico: se a forma infantil de Tay-Sachs tem, nesse fenômeno, elemento semiológico obrigatório, as outras modalidades traduzem-se por atrofia do nervo óptico, retinite pigmentar e, às vezes, pelo menos durante algum tempo, fundo de olho normal, conforme consignam os achados de Sjögren e de outros pesquizadores autorizados.

5. Ocupando-se do aspecto patológico, recorda que a natureza essencial da enfermidade, isto é, o processo degenerativo das células ganglionares do sistema nervoso, se mantém, sempre, o mesmo, nos diversos tipos mórbidos por que se evidencia a Idiotia Amaurótica Familiar.

6. Rememora os poucos exemplares clínicos registados na literatura nacional e descreve, com minúcia, o caso que teve oportunidade de estudar na Clínica Neurológica do Hospital Getulio Vargas.

7. Em realizando considerações gerais, trata do aspecto genético da Idiotia Amaurótica Familiar, e mostra, que essa enfermidade configura condição mórbida, interessante por vários aspectos, já de sí capazes de contribuirem para a clarificação dos fatores heredológicos que contexturam numerosas enfermidades do sistema nervoso.

SUMMARY

1. After detailed study based on a personal case and on the incidence reported by both brasilian and foreign litterature, the Author defines Familiary Amaurotic Idiocy, in pathological sense, as a lipoid degeneration of the nervous system ganglionary cells and clinically, as a progressive mental deterioration, amaurosis and disturbances of paretic type.

2. Clinical aspects of the process are revised and divided into four groups according to age: Infantile Amaurotic Idiocy (onset under 1 year of age) - Tay-Sachs' form; Late Infantile Amaurotic Idiocy (onset after 1 year) - Bielschowski's form; Juvenile Amaurotic Idiocy (between ages of 6 and 14 years) - Spielmeyer-Vogt's form; Late Amaurotic Idiocy (onset during middle age or after) - Kufs' form.

3. The Jewish ethnical element offers no greater influence in incidence in view of local and foreign statistics.

4. Tay's sign, i. e. cherry-red discoloration of macula does not constitute a necessary feature for diagnosis in cases other than infantile form of Tay-Sachs. In the other forms, optic nerve atrophy or pigmentary retinites may be present; fundi may be normal at least for a reasonable period of time.

5. Pathologically, the degenerative process of the nervous system ganglionary cells, which is the essential feature of the disease, is identical in all morbid types.

The Author demonstrates, after general considerations, that the morbid conditions of the disease contribute to the explanation of hereditary factors common to numerous affections of the nervous system.

Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

Comunicado à Academia Nacional de Medicina na sessão de 8 de Outubro de 1942.

R. Marquês de S. Vicente, 316 - Rio de Janeiro.

  • Baur, F. e Lenz - Erbpathologie. J. F. Lehmanns Verlag. München, 1940.
  • Bielschowski, M. - Ueber spät infantile familiäre amaurotische Idiotie mit Kleinhirnsymptomen. Deutsche Zeitschrift f. Nervenh. 50: 7, 1914.
  • Bielschowski, M. - Zur histopathologic und Pathogenese der amaurotischen Idiotie mith besonderer Berücksichtigung der zerebellaren veraenderungen. Zeits. f. Psychol, u. Neurol. 26: 123, 1921.
  • Bielschowski, M. - Amaurotischs Idiotie und lipoidzellige Spleno-Hepatomegalic Zeits. f. Psychol, u. Neurol. 36: 103, 1928.
  • Capriglione, L. - Tesaurismoses Lipoidicas. Rio de Janeiro, 1941.
  • Dide, M., Guira, D. e Michel, R. - Lesions nerveuses dans un cas de Maladie de Tay-Sachs juvenile. Encéphale 15: 303, 1920.
  • Ford, F. R. - Diseases of the Nervous System in Infancy, Childhood and Adolescency. Springfield, E. Thomas, 1937.
  • Goldstein, L. e Wesler, D. N. - Pick disease with cherry-red spot in the macula. Arch, of Ophtalmol. 5: 705, 1931.
  • Greenfield, J. G. e Holmes, G. - The histology of juvenile amaurotic idiocy. Brain 48: 183, 1925.
  • Hagedoorn, A. - Amaurotic Idiocy and related conditions - Pathology of the retina in infantile amaurotic idiocy. Amer. J. of Ophtalmol. 23: 7, 1940.
  • Hassin, G. B. - Amaurotic family idiocy, clinical and pathological studies. Amer. J. of Psych. 8: 869, 1929.
  • Hassin, G. B. - Study of the histopathology of amaurotic family idiocy. Arch, of Neurol, a. Psych. 12: 640, 1924.
  • Hassin, G. B. - A case of amaurotic family idiocy. Late infantile type (Bielschowski) with clinical picture of decerebrate rididity. Arch, of Neurol, a.. Psych. 16: 708, 1926.
  • Josephy - in Handbuch der Neurologic Bumke-Foerster, V. 16. Julieus Springer, Berlin.
  • Jervis, G. A. - Familial Mental Deficiency Akin to Amaurotic Idiocy and Gargo- lism. Arch, of Neurol, a. Psych. 47: 6, 1942.
  • Kufs, H. - Ueber eine Spätform der amaurotischen Idiotie und ihre heredo-familiaren Grundlagen. Zeitsc. f. d. ges. Neurol, und Psychiat. 95: 169, 1925.
  • Leiner, J. H. e Goodhart S. P. - The infantile type of family amaurotic idiocy. Arch, of Neurol, a. Psych. 17: 616, 1927.
  • Leve, S. e Little, O. A. C. - Juvenile Familial Amaurotic Idiocy (Vogt-Spielmeyer Disease). Arch, of Neurol, a Psych. 44: 6, 1940.
  • Marinescu, G. - Sur l'Idiotie Amaurotique Juvenile. R. Neurologique 69: 5 (Maio) 1938.
  • Marinescu, G. - Sur un cas d'idiotie amaurotique tardive du type Spielmeyer-Vogt, avec retinite pigmentaire et ses relations avec la maladie de Niemann-Pick Revue d'oto-neuro-opht. 12: 39, 1934.
  • Marinescu, G. - Nouvelles contributions a l'etude de la forme tardive de l'idiotie amaurotique (type Bielschowski) et à son mechanisme biochimique. J. für Psychol, und Neurol. 16: 1, 1930.
  • Palamone, L. - Idiotia Amaurotica Familiar. Tese, Rio de Janeiro, 1926.
  • Poynton, P. e Holmes - A contribution to the Study of Amaurotic Family Idiocy. Brain 29: 180, 1906.
  • Richter, R. e Parmelee, A. H. - Late infantile Amaurotic Idiocy with marked Cerebellar Atrophy. American J. of Child. Diseases. 1: 111, 1935.
  • Ritter, F. H. - Klinischer Beitrag zum Formenkreis der familiären amaurotischen Idiotien. Abgrenzung gegen das Laurence-Bieldlsche Syndrom. Zeitschr. f. d. ges. Neurol, und Psychiat. 14: 402, 1932.
  • Russetzki, J. - Sur une forme atypique de l'idiotie amaurotique, type Vogt-Spielmeyer. Encéphale 22: 642, 1927.
  • Schaffer, K. - Ueber die Bedeutung der optischen Komponente fur die familiare Idiotie. Moratschr. für Psychiat. u. Neurol. 67: 1, 1928.
  • Sachs. B. e Jonesco Sisesti - Les affections heredo-familiales, specialemente au point de vue de la genetique. R. Neurologique 72: 4, 1939-40.
  • Spiller, W. - A pathological study of amaurotic family idiocy. Amer. J. of Med. Sciences 129: 40, 1905.
  • Sades, B. - Amaurotic family idiocy and general lipoid degeneration. Arch, of Neurol, a. Psych. 21: 247, 1929.
  • Schaffer, C. - General significance of Tay-Sachs disease. Arch, of Neurol. a. Psych. 14: 732, 1925.
  • Schaffer, C. - Pathogenesis of amaurotic idiocy. Arch. of Neurol. a. Psych. 24: 765, 1930.
  • Idiotia amaurótica familiar. Estudo de um caso pessoal e revisão da casuística brasileira

    Aluizio Marques
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Mar 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 1943
    Academia Brasileira de Neurologia - ABNEURO R. Vergueiro, 1353 sl.1404 - Ed. Top Towers Offices Torre Norte, 04101-000 São Paulo SP Brazil, Tel.: +55 11 5084-9463 | +55 11 5083-3876 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista.arquivos@abneuro.org