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Miotonia de Thomsen: Considerações sobre sua terapêutica

Resumos

Os autores fazem um apanhado geral sobre os conhecimentos atuais relativos ao fenômeno miotônico, abordando a questão patogênica em todo o seu evoluir até aos modernos estudos fisiológicos e farmacológicos, mostrando que hodiernamente esta questão se restringe à fisiopatologia da transmissão do influxo nervoso através da sinapse. A esse respeito debatem-se os neurogenistas apoiados nos eletromiogramas, e os miogenistas apoiados na persistência do fenômeno miotônico após novocainização ou secção de nervos periféricos ou curarização. Entre eles, sobressaem os estudos que mostram ser o fenômeno miotônico complexo, em parte miogênico puro, em parte dependente da ação neurogênica, como ficou provado após as experiências em doentes com moléstia de Steinert, em que o bloqueio dos nervos periféricos não influia sobre a miotonia dos músculos próprios da mão (miotonia periférica pura), mas abolia a miotonia dos músculos flexores dos dedos (miotonia reflexa), assim como em face dos resultados obtidos com a acetilcolina, prostigmina e quinina. É interessante que a quinina, abolindo a miotonia, assim como os fenômenos musculares conseqüentes à lesão dos nervos periféricos (contração lenta ao exame elétrico, fibrilação espontânea, correntes de ação no eletromiograma) e à lesão piramidal (sensibilidade anormal à acetilcolina) vem aproximar, sob o ponto de vista fisiopatológico, estes três tipos de alterações, o que vem trazer conclusões verdadeiramente revolucionárias aos conhecimentos clássicos da neurofisiologia. O mesmo acontece com a demonstração de que o fenômeno miotônico, as miopatias em geral e as conseqüentes à lesão do neurônio motor periférico se traduzem por cronaxias anormalmente elevadas (40 a 80s.). Baseados nesses resultados dos estudos da patogenia, abordam a questão da terapêutica, chegando finalmente ao estudo da ação terapêutica dos sais de quinina, conhecida desde 1936 com os trabalhos de Wölf, e que tem sido muito pouco discutida na literatura. Apresentam um caso de miotonia de Thomsen, em rapaz de 21 anos, 5.° entre 8 irmãos sadios, brasileiro descendente de italianos, que não tem qualquer outro antecedente mórbido pessoal ou familial. Sua miotonia é isolada, estacionária e evidente desde os primeiros anos de idade. Não tem qualquer moléstia para o lado dos aparelhos da vida vegetativa. Não há fenômenos miotônicos na musculatura cardíaca ou ocular. Não há distúrbios outros neurológicos, neurovegetativos ou psíquicos. A ação benéfica da quinina se fêz sempre com 1,0 gr. de sulfato de quinina dado por via oral. A miotonia desaparecia sempre, progressivamente, de 15 a 45 minutos após ingestão, e só voltava a reaparecer depois de 10 a 12 horas. A tolerância à quinina foi perfeita. Só foi possível se fazer provas dessa espécie dez dias seguidos, devido à dificuldade em obter quinina na época atual. A miotonia, e a ação antimiotônica da quinina, foram abundantemente documentadas com miogramas, ergogramas, eletromiogramas e filme cinematográfico. Concluem, indicando que o problema atual do tratamento da miotonia está somente em encontrar a dose mínima do sal de quinina que seja suficiente para eliminar o fenômeno miotônico e tolerável pelo paciente em administração prolongada. Aventa a hipótese de se fazer o tratamento com transfusão do sôro de doentes com miastenia grave e, por fim, relata já estar empregando os sais de quinina na terapêutica da cãibra dos esportistas.


The authors present a case of Thomsen's myotonia, in a man 21 years old, the fifth of eight brothers, born in Brazil, of Italian ascendency, without any other personal or familial antecendent. The disease was stationary and manifest since the early years. There were no myotonic signs in the ocular or cardiac muscles, and no other neuropsychiatric or neurovegetative manifestations. Quinine sulphate, in the dose of 1 gram per os, was always effective, disappearing the myotonia 15 to 45 minutes after the ingestion of the agent, and returning after 10 to 12 hours. The tolerance to quinine was complete during ten days of successive administration. The myotonia and the antimyotonic action of quinine were tested by means of myograms, ergograms, electromyograms and moving pictures. After making general considerations about pathogenesis and the-the treatment of myotonia consists in the finding of the minimal efrapeutics of myotonia, the authors conclude that the only difficulty in fective and well tolerated dose of quinine salt. The authors suggest the treatment with serum of patients with myasthenia gravis, and finally refer are using quinine salts in the treatment of sportmen's cramps.


Miotonia de Thomsen. Considerações sobre sua terapêutica

Paulo Pinto PupoI; José Olavo Meira; Jaime Nasser

IAssistente e chefe de clínica de Neurologia na Escola Paulista de Medicina

RESUMO

Os autores fazem um apanhado geral sobre os conhecimentos atuais relativos ao fenômeno miotônico, abordando a questão patogênica em todo o seu evoluir até aos modernos estudos fisiológicos e farmacológicos, mostrando que hodiernamente esta questão se restringe à fisiopatologia da transmissão do influxo nervoso através da sinapse. A esse respeito debatem-se os neurogenistas apoiados nos eletromiogramas, e os miogenistas apoiados na persistência do fenômeno miotônico após novocainização ou secção de nervos periféricos ou curarização. Entre eles, sobressaem os estudos que mostram ser o fenômeno miotônico complexo, em parte miogênico puro, em parte dependente da ação neurogênica, como ficou provado após as experiências em doentes com moléstia de Steinert, em que o bloqueio dos nervos periféricos não influia sobre a miotonia dos músculos próprios da mão (miotonia periférica pura), mas abolia a miotonia dos músculos flexores dos dedos (miotonia reflexa), assim como em face dos resultados obtidos com a acetilcolina, prostigmina e quinina. É interessante que a quinina, abolindo a miotonia, assim como os fenômenos musculares conseqüentes à lesão dos nervos periféricos (contração lenta ao exame elétrico, fibrilação espontânea, correntes de ação no eletromiograma) e à lesão piramidal (sensibilidade anormal à acetilcolina) vem aproximar, sob o ponto de vista fisiopatológico, estes três tipos de alterações, o que vem trazer conclusões verdadeiramente revolucionárias aos conhecimentos clássicos da neurofisiologia. O mesmo acontece com a demonstração de que o fenômeno miotônico, as miopatias em geral e as conseqüentes à lesão do neurônio motor periférico se traduzem por cronaxias anormalmente elevadas (40 a 80s.). Baseados nesses resultados dos estudos da patogenia, abordam a questão da terapêutica, chegando finalmente ao estudo da ação terapêutica dos sais de quinina, conhecida desde 1936 com os trabalhos de Wölf, e que tem sido muito pouco discutida na literatura.

Apresentam um caso de miotonia de Thomsen, em rapaz de 21 anos, 5.° entre 8 irmãos sadios, brasileiro descendente de italianos, que não tem qualquer outro antecedente mórbido pessoal ou familial. Sua miotonia é isolada, estacionária e evidente desde os primeiros anos de idade. Não tem qualquer moléstia para o lado dos aparelhos da vida vegetativa. Não há fenômenos miotônicos na musculatura cardíaca ou ocular. Não há distúrbios outros neurológicos, neurovegetativos ou psíquicos. A ação benéfica da quinina se fêz sempre com 1,0 gr. de sulfato de quinina dado por via oral. A miotonia desaparecia sempre, progressivamente, de 15 a 45 minutos após ingestão, e só voltava a reaparecer depois de 10 a 12 horas. A tolerância à quinina foi perfeita. Só foi possível se fazer provas dessa espécie dez dias seguidos, devido à dificuldade em obter quinina na época atual. A miotonia, e a ação antimiotônica da quinina, foram abundantemente documentadas com miogramas, ergogramas, eletromiogramas e filme cinematográfico.

Concluem, indicando que o problema atual do tratamento da miotonia está somente em encontrar a dose mínima do sal de quinina que seja suficiente para eliminar o fenômeno miotônico e tolerável pelo paciente em administração prolongada. Aventa a hipótese de se fazer o tratamento com transfusão do sôro de doentes com miastenia grave e, por fim, relata já estar empregando os sais de quinina na terapêutica da cãibra dos esportistas.

SUMMARY

The authors present a case of Thomsen's myotonia, in a man 21 years old, the fifth of eight brothers, born in Brazil, of Italian ascendency, without any other personal or familial antecendent. The disease was stationary and manifest since the early years. There were no myotonic signs in the ocular or cardiac muscles, and no other neuropsychiatric or neurovegetative manifestations. Quinine sulphate, in the dose of 1 gram per os, was always effective, disappearing the myotonia 15 to 45 minutes after the ingestion of the agent, and returning after 10 to 12 hours. The tolerance to quinine was complete during ten days of successive administration. The myotonia and the antimyotonic action of quinine were tested by means of myograms, ergograms, electromyograms and moving pictures.

After making general considerations about pathogenesis and the-the treatment of myotonia consists in the finding of the minimal efrapeutics of myotonia, the authors conclude that the only difficulty in fective and well tolerated dose of quinine salt. The authors suggest the treatment with serum of patients with myasthenia gravis, and finally refer are using quinine salts in the treatment of sportmen's cramps.

Miotonia, como a define Marinesco, é desordem da contração muscular voluntária caraterizada pela lentidão e, sobretudo, pela perseveração involuntária dessa contração. Ela aparece em afecções várias do sistema nervoso; salientemos a miotonia congênita ou moléstia de Thomsen, a distrofia miotônica ou moléstia de Steinert e as tão discutidas miotonias adquiridas, entre as quais a que acompanha certos estados de hipotireoidismo. Acrescentemos certos distúrbios musculares de forma miotônica - tal como os que se sucedem às lesões do neurônio motor periférico - que estudos recentes autorizam aproximar do fenômeno miotônico verdadeiro.

Sendo essencialmente congênita, a miotonia de Thomsen se mostra já em data muito precoce no crescimento do indivíduo. Frequentemente a anemnese assinala as dificuldades de movimento desde os primeiros anos de vida do paciente. A dificuldade em se vestir pela manhã, a demora para a execução de certos atos da vida diária, mesmo os atos elementares de defesa, a incapacidade dessas crianças em acompanhar as outras nos folguedos infantis, são elementos que desde logo chamam atenção dos pais, dos mestres ou dos colegas. Tais embaraços decorrem exclusivamente do fato que a contração muscular se faz lentamente e a descontração é muito penosa e demorada nos primeiros movimentos de qualquer atividade muscular. Depois de algumas contrações e descontrações difíceis, as demais vão-se sucedendo cada vez mais facilmente para, após 10 a 15 movimentos sucessivos, as contrações musculares se tornarem normais e sem qualquer impecilho. Cessando, porém, o movimento e entrando a musculatura em repouso, novas dificuldades têm que ser vencidas para ser conseguida outra vez a movimentação livre. Estas perturbações persistem imutáveis durante toda a vida do paciente. Tais desordens musculares, presentes de modo universal, são, entretanto, mais sensíveis na musculatura da mímica, voluntária, na do pescoço, na flexão e pronação dos membros superiores, na das raízes dos membros inferiores. Disso decorre que os movimentos de início da marcha, de apanhar e manejar objetos, de movimentação livre da cabeça ou da mímica voluntária ao tentar manter contacto com o meio ambiente, são os mais difíceis e mais comprometidos. Em consequência dessa hipertonia quase constante, exigindo para todo movimento um esforço muscular exagerado, resulta uma hipertrofia muscular que dá ao paciente um aspecto hercúleo evidente; tal aspecto não raro contrasta com a extrema dificuldade e mesmo fraqueza muscular com que ele se movimenta.

Próprios desse distúrbio são, ainda, a miotonia que se segue à percussão muscular, a miotonia persistente após excitação farádica ou galvânica de curta duração (reação miotônica de Erb) e a persistência da contração muscular a uma excitação demorada com corrente galvânica (reação galvanotônica). A excitação do nervo, em geral, não oferece particularidades.

A tríade - início dos sintomas nos primeiros anos de vida, aparecimento isolado do fenômeno miotônico, o acometimento universal e a persistência da hipertonia, imutável, por toda a vida do paciente - constitui a caraterística clínica essencial da miotonia da Thomsen.

Foi Thomsen (1875) o primeiro a descrever o quadro clínico que, com justa razão, leva seu nome; aliás dupla razão, pois que o autor era portador desta afecção. Descreveu-a em 20 membros de sua família, em 4 gerações, para defender um seu filho acusado como desertor do serviço militar. Logo a seguir, os magníficos estudos de Erb (1886) completaram a descrição clínica e lhe acrescentaram o quadro dos distúrbios elétricos, que até hoje se mantém intacto. Depois disso, apesar de relativamente rara, a afecção foi descrita por numerosos neurologistas; entretanto, pouco foi acrescentado ao que fôra assinalado anteriormente. Mencionemos Dejerine e Sottas na França, Curschmann na Alemanha, Markow na Rússia, Mingazzini na Itália, e, mais recentemente, Adie e Greenfield na Inglaterra e Jellife e Ziegler nos Estados Unidos.

Entre nós, também, a literatura sobre a miotonia de Thomsen não é pobre. Em busca, a mais minuciosa que nos foi possível, encontramos os seguintes trabalhos: Miguel Couto1 1 . Couto, Miguel - A doença de Thomsen. in Clínica Médica, 2º vol., Tip. América, Rio de Janeiro, 1923, págs. 31-38. descreveu casos pessoais dos e Couto e Silva2 2 . Pires, W. e Couto e Silva, O. B. - Doença de Thomsen. Arch. Brasil. Neuriat. e Psychiat. (Rio de Janeiro) 9: 12-27, 1927. apresentaram um caso; Pires e Londres3 3 . Pires W., Londres, G. - Contribuição ao estudo da doença de Thomsen. Arch, da Fundação Gafrée Guinle (Rio de Janeiro), 1928, págs. 117-128. relataram um caso pessoal e referem outro de Juliano Moreira; Aloysio de Castro4 4 . Castro, Aloysio de - Myotonia, in Semiótica Nervosa. Briguiet Edit., Rio de Janeiro, 935, pág. 254. referiu um caso; Caio Libano Soares5 5 . Soares, C. L. - Doença de Thomsen. Arq. Neurol. Psiq. Belo Horizonte, 1: 43-52 (setembro) 1938. apresentou um caso próprio e referiu outro de Fernandes Figueira; Ulisses Pernambucano6 6 . Pernambucano, U. - Seis casos de miotonia congênita. Neurobiologia (Recife) 2: 137-154 (junho) 1939. apresentou 6 casos, dos quais 4 em uma mesma família e 2 em outra. Somam-se ao todo, pois, 14 casos na literatura nacional, estudados sob ponto de vista clínico e, alguns, em relação com o problema da genética. É interessante assinalar que, em S. Paulo, ao que nos conste, o nosso é o primeiro caso observado. Recentemente, tivemos conhecimento, por comunicação verbal, de um caso de Olavo Nery, do Rio de Janeiro.

Merece especial referência a monografia de Lanari7 7 . Lanari, A. - Miotonias (monografia). El Ateneo, Buenos Aires, 1942. , na qual o autor argentino reúne trabalhos de muitos anos de profícuo labor no estudo das miotonias. Entre os tratados modernos, foi no de Wilson8 8 . Wilson, S. A. K. e Bruce, A. N. - Neurology. Williams & Wilkins Co. Baltimore, 1940, págs. 1043-1049. que encontramos a melhor síntese da afecção. Entretanto, nestes últimos dez anos, os conhecimentos relativos ao fenômeno miotônico e, com eles os pontos de vista a respeito da situação da miotonia de Thomsen na patologia, vêm sofrendo radical revisão e tendem a proporcionar panoramas inéditos no setor da patologia neuromuscular.

QUESTÃO PATOGÊNICA

É interessante, de início, dizer que os estudos sobre a anatomia patológica da miotonia, se bem que raros, não trouxeram qualquer esclarecimeto a esta questão. Os trabalhos de Guillain, Bertrand e Rouqués9 9 . Guillain, Bertrand, e Rouqués - Les lésions de la myotonie atrophique. Ann. de Méd., 1932, pág. 180. , de Adie e Greenfield10 10 . Adie, W. J. e Greenfield, J. G. - Dystrophia myotonica (Myotonia atrophica). Brain, 46: 73-127, 1923. , de Lanari7 7 . Lanari, A. - Miotonias (monografia). El Ateneo, Buenos Aires, 1942. e a recente neuropatologia de Weil11 11 . Weil, A. - Textbook of Neuropathology, ed. 2. Grune e Stratton, New York, 1945. , evidenciam nada existir de positivo, quanto ao quadro neuropatológico, em relação à miotonia, nem para o lado do sistema nervoso, nem no próprio tecido muscular.

Por outro lado, entretanto, a questão patogênica existe implícita em todas tentativas terapêuticas visando o distúrbio miotônico. De início, predominou a idéia de que esta "hipertonia muscular pudesse ser consequente a alterações no sistema nervoso central particularmente nos sistemas extrapiramidais e, assim, os autores a aproximavam das hipertonias do tipo parkinsoniano, tendo ido, memo, preconizado o tratamento pela atropina e hioscina. A esse propósito, cumpre lembrar que W. Pires e G. Londres12 12 . Londres, G. e Pires, W. - loc. cit. 3. , com a prova da hioscina, trouxeram argumentos contra esta opinião. Mais tarde, na época em que prevaleciam as teorias da dupla inervação muscular, somática e vegetativa, esta responsável pelo tono sarcoplasmático, foi admitido que a miotonia era devida a desordens do sistema nervoso vegetativo. Nesta base, foram tentados inúmeros métodos terapêuticos com resultados díspares; autores da responsabilidade de Marinesco, Jonesco, Sager e Kreindler13 13 . Marinesco, Jonesco, Sager e Kreindler - Les tonus des muscles striés. Masson Cie., Paris, 1937, pág. 341. terminaram o capítulo correspondente às miopatias afirmando que a miotonia depende de "uma perturbação no metabolismo muscular, comandada pelo sistema nervoso vegetativo". Weiss e Kennedy14 14 . Weiss, W. e Kennedy, F. - Clinical experiments in myotonia congenita (Thomsen) with especial refrence to the parasympathetic nervous system. Arch. Neurol, a. Psychiat., 11: 543 (maio) 1924. pretenderam filiar a miotonia de Thomsen a um estado de permanente hiperparassimpaticotonia, tendo em vista a bradicardia, a constipação intestinal e o aumento do reflexo óculo-cardíaco, que seriam constantes nestes pacientes; segundo estes autores, a atropina intravenosa seria capaz de corrigir tais sintomas e mesmo normalizar o tono muscular. Correlatamente a estes pontos de vista, ainda encontramos Salmon15 15 . Salmon, A. - Sul significato dei miglioramenti ottenuti con la prostigmina nela miastenia bulbare; il loro valore per la patogenesi dell'affecione. Il Cervello (Napoles) 17: 145-159 (janeiro, 15) 1939. , defendendo a opinião de que a prostigmina age sobre a miastenia por aumentar o tono vagal, normalmente débil nestes casos.

As modernas idéias sobre a patogenia dos distúrbios do tono na miotonia congênita e na miastenia grave, entretanto, nasceram quando Walker, em 1935, evidenciou a ação antimiastênica da prostigmina, e se apoiaram firmemente nos conhecimentos da transmissão química do estímulo nervoso. A propósito, cumpre citar Butt16 16 . Butt, H. - Chemical mediation of nerve impulses. Arch. Neurol, a. Psychiat., 37: 142-153 (janeiro) 1937. que, recentemente, relatou como nasceu e como se impôs nos meios científicos mundiais esta teoria tão revolucionária e tão cheia de promissoras possibilidades para a neurofisiologia. Não comentaremos esta questão, limitando-nos a referir que a transmissão neuro-humoral foi demonstrada para o músculo estriado por Dale17 17 . Dale, H. - Chemical transmission of the effects of nerve impulses. Brit. Med. J., 1: 835, 1934. . Posteriormente, Russel e Stadmann18 18 . Russel, W. R. e Stadmann, E. - Observations on myotonia. Lancet, 2: 742, 1936. mostraram que a prostigmina tem sobre a miotonia, uma ação inversa daquela que tem para com a miastenia, reforçando-a. Isto constituiu mais um argumento de valor para as modernas teorias patogênicas. Tais conceitos patogênicos baseiam-se em pretensos distúrbios ao nível da junção mioneural; porém, existem ainda grandes divergências entre os que consideram esta perturbação como dependente de modificações do sistema nervoso e os que afirmam estar o distúrbio causal no próprio músculo, isto é, entre os neurogenistas e os miogenistas.

A teoria neurogênica baseia-se no estudo eletromiográfico, o qual mostra, em miotônicos, a existência de nítidas correntes de ação no período da descontração muscular. Lindsley e Curnen19 19 . Lindsley, D. e Curnen, E. - Electromyographic study of myotonia. Arch. Neurol. a. Psychiat., 35: 253-269 (fevereiro) 1935. provando a existência de tais correntes de ação no período da descontração muscular, em divergência com muitos outros pesquisadores que os antecederam, concluíram que tal fato é suficiente para provar a passagem de impulsos do nervo ao músculo, ainda nesse período. A miotonia seria, portanto, um fenômeno puramente neurogênico. A duração prolongada dessas correntes de ação e o fato de elas apresentarem períodos de exacerbação, ao invés de curva regular de diminuição de potencial, são interpretados como devidos ao caráter de ação reflexa da miotonia. Esta seria inteiramente dependente de descargas persistentes nas terminações neuromusculares hiperexcitáveis. Lindsley20 20 . Lindsley, D. - Myographic and electromyographic studies of myasthenia gravis. Brain, 58: 470-481 (dezembro) 1935. e, mais recentemente, Brazier21 21 . Brazier, M. A. B. - Electromyographic and ergographic studies in myasthenia gravis. J. Nerv. a. Ment. Dis., 100: 615-616 (dezembro) 1944. , demonstraram também a presença de correntes de ação no período de descontração muscular na miastenia grave.

Hoje, entretanto, as conclusões dos neurogenistas puros não podem mais ser sustentadas. Lanari discutiu esses problemas com muita clareza em sua monografia22 22 . Lanari - loc. cit. 7. , e Brown e Harvey23 23 . Brown, G. L. e Harvey, A. M. - Congenital myotonia in the goat. Brain, 62: 341-63, 1939. , assim como Denny Brown e Nevin24 24 . Denny-Brown, D. e Nevin, S. - The phenomenon of myotonia. Brain, 64: 1-16, 1941. , apresentaram aspectos inteiramente novos deste problema. Estes últimos, estudando em detathe o fenômeno miotônico com registro eletromiográfico em doentes com miotonia de Thomsen e com distrofia miotônica, chegaram a resultados verdadeiramente, revolucionários em relação a tudo que se conhecia anteriormente. De início, provaram a existência do fenômeno miotônico puramente periférico, após novocainização dos respectivos nervos: em doentes com distrofia miotônica, após novocainização do cubital e do mediano até produzir anestesia nos territórios correspondentes e incapacidade de movimentos voluntários, puderam ainda obter a miotonia pela percussão dos músculos e pela excitação elétrica dos pontos motores; o eletromiograma evidenciou, nestas circunstâncias, correntes de ação idênticas às da miotonia clássica. Mas, além desta miotonia, provocada pela percussão direta ou excitação elétrica, existe outra, que sucede aos movimentos voluntários e é de muito maior intensidade, mais difusa e duradora. Sua natureza é complexa. Denny-Brown e Nevin mostraram que o eletromiograma as identifica por correntes de ação muito mais intensas, e que, clinicamente, estendem-se a outros músculos que não haviam tomado parte no movimento voluntário inicial. Tais foram, por exemplo, os resultados obtidos nos traçados eletromiográficos, durante os movimentos voluntários de fechar e abrir a mão sucessivamente: as correntes de ação são nítidas para os músculos flexores, para os extensores seus antagonistas e para outros músculos do antebraço, em particular os palmares, não comprometidos na ação voluntária. Entra aqui em consideração, além do fenômeno miotônico, puramente muscular, um outro, que foi chamado "after spasm", inteiramente diverso, neurogênico. A natureza reflexa deste último foi provada por artifícios experimentais bastante engenosos. Em doentes com distrofia miotônica, cuja miotonia se cingia aos músculos próprios da mão (miotonia diretamente provocada por excitação elétrica ou mecânica), foi feito o bloqueio novocaínico do cubital e do mediano ao nível do punho. Efetivado este, a miotonia dos músculos próprios da mão ainda podia ser obtida, enquanto que os movimentos voluntários de flexão forçada dos dedos (os músculos flexores estavam fora do bloqueio) se sucediam com facilidade, pois que não mais provocavam a reflexo miotônico generalizado (after spasm) dos músculos do antebraço. A miotonia nos músculos do antebraço, que impedia a descontração rápida dos músculos flexores longos, era, sem dúvida, um fenômeno reflexo, cujas excitações proprioceptivas originais nasciam dos músculos próprios da mão, miotônicos. Com tal resultado puderam aqueles autores concluir que o mecanismo que retarda a descontração normal dos músculos em pacientes com distrofia miotônica ou com miotonia de Thomsen é um fenômeno complexo que abrange uma "miotonia periférica" e um "espasmo secundário", reflexo, envolvendo outros músculos que não aqueles inicialmente empenhados no movimento voluntário.

Brown e Harvey vão mais longe ainda na contraposição ao modo de ver dos neurogenistas puros: estudando preparações neuromusculares de cabras miotônicas (miotonia congênita de cabras, idêntica à miotonia de Thomsen) e comparando-as fisio e farmacologicamente com preparações semelhantes de cabras normais - conseguindo, assim, condições verdadeiramente excepcionais de experimentação - demonstraram, entre outros fatos, que tais músculos são extremamente sensíveis as excitações elétricas e mecânicas e que a miotonia não desaparece após secção do nervo e subsequente degeneração, ou após curarização. Com esses resultados, concluíram que a miotonia é fenômeno puramente muscular. Aliás, o fato da miotonia não ser modificada pela exclusão de inervação (secção do nervo ou curarização) já havia sido posto em evidência por Schaefer (citado por Harvey) e também por Kennedy e Wolf, que obtiveram o mesmo efeito com anestesia espinal.

Grande messe de novos argumentos foi trazida a estas discussões pelos resultados dos estudos com a acetilcolina, com a prostigmina e, particularmente, com os sais de quinina.

A acetilcolina é a mediadora normal do impulso nervoso. Se injetada por via arterial, tendo-se o cuidado de dificultar a circulação de retorno, provoca contração súbita do músculo normal, como demonstrou Dale25 25 . Dale - loc. cit. 17. . Lanari26 26 . Lanari - loc. cit. 7. mostrou que a injeção intra-arterial de acetilcolina, sem o cuidado prévio de se prender a circulação de retôrno, provoca contração dos músculos miotônicos e não de músculos normais. Brown e Harvey27 27 . Brown e Harvey - loc. cit. 23. , por seu turno, demonstraram que a resposta do músculo miotônico, nestas condições, não é mais intensa (não há modificação no limiar de excitabilidade) e sim muito mais demorada que a do músculo normal. É interessante lembrar que também os músculos normais, denervados, sofrem sensivelmente a influência da acetilcolina em experiências deste tipo.

A prostigmina tem ação antimiastênica, bem conhecida desde 1935 (Walker), e agrava a miotonia (Russel e Stadmann28 28 . Russel e Stadmann - loc. cit. 18. ).

A quinina age sobre o músculo normal produzindo um efeito depressivo na ação tetanizante, isto é, prolongando o intervalo mínimo necessário à somação dos estímulos; além disso, é antagônica da ação potencializadora da fisostigmina, impede a ação descurarizante da acetilcolina e produz bloqueio da ação da acetilcolina sobre os músculos denervados. Tem, pois, em síntese, ação sobre a tetanização muscular e ação antagônica à acetilcolina. como demonstraram Oester e Maaske29 29 . Oester, Y. T. e Maaske, C. A. - Quinine: effects on normal and denervated skeletal muscle and on the acetylcholine and physostigmine actions on skeletal muscle. J. Pharmacol. Exp. Therap., 66: 133-145, 1939. , o que foi confirmado por Ravin30 30 . Ravin, A. - Effects of quinine on mammalian skeletal muscle. Am. J. Physiol., 131: 228-239, 1940. . Este último demonstrou também que ela inibe a fibrilação espontâneo dos músculos denervados, assim como a resposta prolongada destes às excitações elétricas. A ação antimiotônica deste alcalóide fôra demonstrada por Wolf31 31 . Wolf, A. - Quinine: an effective form of treatment for myotonia. Arch. Neurol, a. Psychiat., 36: 382-383 (agosto) 1936. e Wolf e Kennedy32 32 . Kennedy, F. e Wolf, A. - Experiments with quinine and prostigmin in treatment of myotonia and myasthenia. Arch. Neurol, a. Psychiat., 37: 68-74 (janeiro) 1937. , os quais baseados na ação antiparassimpaticotônica da quinina, aventada por Stravaky em experiências sobre a corda do tímpano, acreditaram ser esta ação dependente de um bloqueio do parassimpático e, portanto, do antagonismo à acetilcolina. Harvey33 33 . Harvey, A. M. - The mechanism of action of quinine in myotonia and myasthenia. J. A. M. A., 112: 1562 (abril, 22) 1939. , entretanto, após pesquisas muito interessantes, concluiu que esta ação se faz, quer por via curarizante, que por ação direta sobre a excitabilidade muscular elevada dos miotônicos. Brown e Harvey34 34 . Brown e Harvey - loc. cit. 23. demonstraram, eletromiograficamente, que a quinina é capaz de fazer desaparecer a miotonia persistente em músculos previamente curarizados. Acheson35 35 . Acheson, G. - Physiological and pharmacological aspects of neuromuscular diseases. J. Nerv. a. Ment. Dis., 100: 616-617 (dezembro) 1944. , discutindo esses resultados em face das teorias sobre a fisiopatologia da miotonia, evidencia que a miotonia não é pura antítese da miastenia: esta é melhorada pela prostigmina e agravada pelo curare e pela quinina, aquela é agravada pela prostigmina, mas não melhorada pelo curare e sim pela quinina. Briscoe36 36 . Briscoe, G. - Quinine in myotonia congenita; its antagonism to prostigmine. Lancet, 1: 1151, 1939. , igualmente, admite que a quinina combate a miotonia ação curarizante e também pela ação direta sobre a excitabilidade muscular. Estes dados experimentais provam, de modo insofismável, que a ação antimiotônica da quinina se faz, quer modificando a condução neuromuscular, quer agindo diretamente sobre a excitabilidade da fibra muscular.

Em síntese, os resultados destas pesquisas formacológicas estão de acôrdo com os dados eletrofisiológicos de Denny-Brown e Nevin, evidenciando que o fenômeno miotonia depende de múltiplos fatores, seja concernentes ao mecanismo da transmissão neuro-humoral, seja concernentes à excitabilidade da própria fibra muscular.

Os estudos sobre a cronaxia em miotônicos, feitos por Bourguigon e confirmados por Marinesco e sua escola37 37 . Marinesco - loc. cit. 13. , evidenciando a presença de valores extremamente elevados, constituem argumento de grande valia para os partidários da teoria neuromuscular do fenômeno miotonia. É o que conclui incisivamente Mollaret38 38 . Mollaret, P. - Interprétation du fonctionnement du système nerveux par la notion de subordination. Masson Cie.. Paris, 1937, pág. 252. , quando diz: "Or, de même qu'on considérait comme independentes, de même on y trouve la même chronaxie de 40 à 80s. Cette chronaxie élimine d'ailleurs par sa grandeur toute idée d'origine centrale des myopathies émise par certains auteurs".

Isto, que serviu de base para a aproximação de várias entidades mórbidas como fazendo parte de um único agrupamento, e que mostra serem as miotonias, de variada origem, um fenômeno fisiopatológico único, torna-se muitíssimo mais interessante ao compararmos com outros estudos recentemente aparecidos na literatura neurológica e que trazem novos elementos à compreensão da natureza íntima do fenômeno miotônico. Referimo-nos à demonstração de que os músculos denervados apresentam, após excitação mecânica, correntes de ação em muito semelhantes às da miotonia (Denny Brown e Pennybacker39 39 . Denny-Brown, D. e Pennybacker, J. - Fibrillation and fasciculation in voluntary muscle. Brain, 61: 311-334, 1938. ); que, após lesões piramidais, os músculos se tornam sensíveis às injeções arteriais de acetilcolina em condições em que os músculos normais não o são (Lanari40 40 . Lanari - loc. cit. 7. ); demonstração idêntica em gatos, evidenciando, farmacologicamente, esta degeneração transneuronal que o exame elétrico normal não evidencia (Canon e Haimovici41 41 . Cannon, W. B. e Haimovici, H. - The sensitization on motor neurones by "partial denervation". Am. J. Physiol., 126: 731, 1939. ); finalmente, que a quinina é capaz de inibir a fibrilação espontânea dos músculos denervados, fazendo desaparecer, no eletromiograma, os desvios de potencial que lhe são caraterísticos, e, o que é mais interessante ainda, a quinina faz desaparecer a contração lenta destes músculos à excitação elétrica (Ravin42 42 . Ravin, A. - loc. cit. 30. ).

Tais elementos vêm, indubitavelmente, aproximar fenômenos miotônicos e fenômenos neuromusculares reconhecidamente devidos a lesões do sistema nervoso, central ou periférico. Cronáxica, elétrica e farmacológicamente, as alterações musculares conseqüentes às lesões piramidais, às lesões dos nervos periféricos e às miopatias, muito se assemelham.

A patogenia da contração miotônica está, sem dúvida, ligada à fisiopatologia neuromuscular; é possível, porém, que os fatores etiológicos venham a ser demonstrados no próprio sistema nervoso. Provavelmente, coexistem fatores que perturbam a transmissão do influxo nervoso ao nível da sinapse e fatores que modificam a própria excitabilidade da fibra muscular. Discutindo a natureza íntima do distúrbio miotônico no que concerne à transmissão do influxo nervoso ao nível da sinapse, alguns autores inculpam a hipersensibilidade do músculo miotônico à acetilcolina como fator principal, enquanto outros querem explicar este fato por um pretenso retardo na destruição normal da acetilcolina pela colinesterase. Seria um processo inverso ao que muitos admitem para a miastenia grave. Este último ponto de vista, entretanto, não encontrou apoio nas dosagens biológicas da colinesterase no sangue. Stadmann43 43 . Stadmann, E. - The choline esterase content of blood in myasthenia gravis. J. Physiol., 84: 56, 1935. , Russel e Stadmann44 44 . Russel, W. R. e Stadmann, E. - loc. cit. 18. , e mais recentemente, Wilson e Stoner45 45 . Wilson e Stoner - Quart. J. Med. N. S., 12: 1, 1944. Citado in Russel Brain, W. e Strauss, E. B. - Recent advances in Neurology and Neuropsychiatry. J. A. Churchill Ltd., London, 1945. , evidenciaram ser normal a taxa de colinesterase no sangue de miotônicos e de miastênicos, e não, respectivamente, baixa ou elevada, como seria de se esperar segundo aqueles conceitos teóricos.

Podemos concluir, sem querer penetrar intimamente no fenômeno, que a miotonia resulta de um retardo na função normal de preparação do isocronismo neuromuscular para que a contração e a descontração voluntárias se façam a tempo e adequadamente aos movimentos precisos. Ela traduz uma dificuldade em ser conseguido o isocronismo entre nervo e músculo (cronaxia de constituição e cronaxia de subordinação). É isso que vemos cotidianamente nos esportistas, por exemplo, que, antes de iniciar uma competição, procuram, por meio de pequenos exercícios, pôr o seu aparêlho muscular em estado ótimo de rendimento funcional. Entretanto, o que se faz com facilidade no indivíduo normal, é extremamente difícil no miotônico e acarreta todo aquele quadro clínico tão característico. Porém, uma vez conseguido esse isocronismo neuromuscular, o miotônico se desempenha como um indivíduo normal, até que novo período de descanso venha quebrar este sincronismo e obrigar a novo processo de adaptação.

Continua, pois, a aberta à discussão a fisiopatologia da processo, mas já se pode ter uma compreensão do mecanismo global das alterações miotônicas.

PROBLEMA TERAPÊUTICO

Do que vimos até agora, depreende-se que a terapêutica na miotonia de Thomsen tem que se cingir ao fenômeno miotônico, uma vez que nada se sabe sobre os fatores etiopatogênicos, e nem mesmo se são múltiplos ou não. Thomsen e o autores antigos, num raciocínio perfeitamente lógico e que está inteiramente concorde com o que se sabe hoje sobre a patogênese da miotonia, preconizavam os exercícios físicos sob as mais variadas formas.

Na revisão dos conhecimentos sobre essa patogenia, vimos que múltiplas teorias foram baseadas em pesquisas terapêuticas, quer com agentes químicos, quer com hormônios em geral, particularmente aqueles do sistema nervoso vegetativo. Os extratos tireóideo, do lobo posterior da hipófise, das gônadas, o cloreto e o gluconato de cálcio, o ácido acetilsalicítico, os mais variados estimulantes ou depressores do sistema nervoso, têm sido usados sem resultados satisfatórios. O sulfato de magnésio tem sido igualmente usado e Lanari lhe atribui ação antimiotônica nítida quando injetado por via endovenosa (15 a 20cc, sol. a 25%), ação esta que dura mais de 36 horas: apresenta, porém, o grande inconveniente de possibilitar reações graves e até mortais, exigindo a pesquisa cuidadosa da dose mínima necessária, devendo o tratamento ser iniciado com injeções de 5cc. A atropina, usada primeiramente por Weiss e Kennedy, baseados nunca pretensa hiperparassimpaticotonia de todo miotônico, tem dado resultados díspares. A adrenalina, também muito experimentada, deu maus resultados na mão de Kennedy e Wolf46 46 . Kennedy, F. e Wolf, A. - loc. cit. 32. que explicam do mesmo modo a agravação da miotonia em consequência das emoções e do medo (descargas de epinefrina), enquanto que Lanari47 47 . Lanari - loc. cit. 7. a preconiza como dos melhores tratamentos, por modificar rapidamente o fenômeno miotônico, fazendo-o desaparecer 15 minutos após a injeção de 1 mgr. da droga. Resta, porém, sem parecer difinitivo, a duração de seu efeito. O timo, sobre o qual os estudos modernos da miastenia grave fazem recair a responsabilidade deste distúrbio muscular, já foi, também, lembrado na terapêutica da miotonia; Frink48 48 . Frink, H. W. - Myotonia congenita. J. Nerv. a. Ment. Dis., 45: 349, 1917. e, mais recentemente, Kenneda e Wolf46 46 . Kennedy, F. e Wolf, A. - loc. cit. 32. dizem ter tido bons resultados com o seu emprego.

Foi, entretanto, com a descoberta da ação antimiotônica dos sais de quinino, feita por Wolf, que a terapêutica da miotonia tomou impulso definitivo. Esta descoberta tem valor igual, se não maior, que a de Walker quando evidenciou a ação antimiastênica da prostigmina. Não só o uso da quinina nos laboratórios de fisiologia possibilitou, como vimos, algum progresso no conhecimento do fenômeno miotônico, como o seu emprego na clínica vem demonstrando, cada vez mais, a exeqüibilidade do tratamento eficaz dêste distúrbio de tão graves conseqüências. Wolf49 49 . Wolf, A. - loc. cit. 46. , depois de múltiplas pesquisas, encontrou, nos sais de quinino, o efeito tão desejado, tratando, com êxito, 4 pacientes de miotonia familiar. Logo se lhe seguiram Wolf e Kennedy, com mais 3 doentes de miotonia de Thomsen e um de distrofia miotônica. Smith50 50 . Smith, W. A. - Quinine treatment of myotonia congenita. J. A. M. A., 108: 43 (janeiro, 2) 1937. , tendo usado a quinina por via endovenosa, obteve cessação de miotonia em 30 minutos; com a administração de 0,50 grs. de cloridrato de quinina por via oral, duas vezes ao dia, conseguiu manter os pacientes livres da miotonia. Infelizmente, este autor não informou durante quanto tempo seus pacientes suportaram a quinina sem apresentarem fenômenos secundários. Dereux e Baudu51 51 . Dereux, J. e Baudu, L. - Maladie de Thomsen. Maladie de Steinert. Action de la quinine. Rev. Neurol., 70: 43-49 (julho) 1938. apresentaram ótimos resultados em um caso de moléstia de Thomsen e um de distrofia miotônica. Briscoe52 52 . Briscoe - loc. cit. 36. e Harvey53 53 . Harvey - loc. cit. 33. utilizaram os sais de quinina em magníficas experiências de fisiologia: não só demonstraram cabalmente a ação antimiotônica, como contribuíram para o estudo de questões patogênicas, ao que já nos referimos anteriormente. Igualmente com os estudos de Ravin e de Oester e Maaske, já citados em capítulo anterior, ficou esclarecida por completo a ação antimiotônica da quinina. Lanari também a empregou na terapêutica da miotonia; utilizando-a tanto por via oral como intramuscular seus resultados foram satisfatórios, levando-o a concluir "Aunque la adrenalin o el sulfato de magnesia son más eficaces, la via oral y la falta de efectos secundarios, hacen de la quinina el medio prático más utilizable en los miotónicos".

São essas as referências que encontramos na literatura sobre esta terapêutica. Interessante notar que, apesar de usada primeiramente há 9 anos, seja tão reduzido o número de doentes tratados, até hoje, pelos sais de quinina. Pelo que pudemos apreciar nos casos relatados, aliás a maioria deles sem as necessárias minúcias, o problema reside somente em encontrar uma dose mínima eficaz na exclusão da miotonia, libertando os movimentos do paciente, e insuficiente para acarretar fenômenos secundários de intolerância, bem conhecidos na terapêutica quinínica.

Recentemente, Wilson e Stoner54 54 . Wilson e Storner - loc. cit. 45. mostraram, em experiências muito interessantes, que o soro de miastênicos produz bloqueio em preparações nervo-músculo: tal bloqueio é imediatamente combatido pela prostigmina. Daí se deduz que, no soro do miastênico, há uma substância, curarizante ou depressora da excitabilidade muscular, que inibe o fenômeno miotônico. Aliás, isto está perfeitamente de acordo com o que se conhece já de há muito, que o exercício de um grupo muscular isolado em doentes de miastenia grave, produz fenômenos de miastenia em outros territórios musculares quando a circulação está livre (substância miastenizante circulante no sangue), o mesmo não se dando quando é impedida momentaneamente a circulação de retorno. Tais resultados abrem, a nosso ver, mais uma pista na terapêutica da miotonia. Pensamos não haver contra-indicação na transfusão de sangue ou de plasma, de miastênicos a miotônicos, pois que a substância miastenizante é destruída no organismo em breve espaço de tempo; além disso, possuímos à mão seu antídoto imediato, a prostigmina.

OBSERVAÇÃO

E. S., branco, brasileiro, solteiro, com 21 anos de idade, operário, observado inicialmente pelo Dr. J. O. Meira, que o enviou ao Serviço de Neurologia da Escola Paulista de Medicina para estudos pais detalhados.

Veio à consulta devido a dificuldade nos movimentos voluntários, a qual data desde a infância.

Antecedentes pessoais e familiais: É o quinto de 8 irmãos sadios, com exceção do segundo, que sofre de crises convulsivas há 2 anos. Pai vivo, sadio, com 56 anos de idade. Mãe falecida, não sabe dar informes a respeito. Diz não haver outro membro da família com moléstias semelhantes à sua, informação esta confirmada por um de nós (J. O. Meira), que examinou os membros da família.

Moléstia atual: Notou a dificuldade que tem de executar os movimentos voluntários, já na idade de 7 para 8 anos, quando percebeu que não era capaz de acompanhar as outras crianças nos folguedos próprios de sua idade, pois que "a perna ficava presa ao solo" ou "a mão não obedecia". Não conseguia subir escada correndo. Sempre procurou ocultar esta dificuldade, mesmo para seu pai, pois que se sentia envergonhado. Só há um ano se viu na contingência de revelar suas perturbações e com isso adquiriu ânimo para procurar médicos.

Esta dificuldade na movimentação voluntária se carateriza pela impossibilidade de executar os primeiros movimentos, devido a hipertonia duradoura que impede a descontração dos músculos. Quando fecha a mão, não pode mais distender os dedos; quando inicia a marcha, as pernas ficam rígidas em extensão por alguns segundos, antes que consiga realizar cada um dos movimentos. Devido a isso, nunca foi capaz de tomar um bonde em movimento; é fato diário, por ocasião da saída da fábrica em que trabalha, que, estando em grupo de companheiros, estes podem correr imediatamente à aproximação do bonde e tomá-lo, enquanto que ele permanece parado procurando vencer a hipertonia. A dificuldade dos movimentos iniciais é maior no segundo movimento e vai cedendo progressivamente, para, dentro de alguns segundos, desaparecer por completo e libertar inteiramente sua atividade. Exerce na fábrica a função de passar pixe nos cabos condutores de eletricidade, que vão passando à sua frente com velocidade pequena, compatível com sua movimentação. Faz êsse trabalho há vários anos, com integral sucesso. A hipertonia reaparece assim que o paciente faça pequeno descanso; com isso, nova fase de readaptação, por meio de exercícios musculares, se faz necessária.

Estes distúrbios se instalaram, como dissemos, na primeira infância e acompanham o paciente, de modo imutável, sem progressão e sem regressão sensíveis, até a data de início de seu tratamento em nosso Serviço.

Exame clínico - Nada de particular em relação aos diversos aparelhos da vida vegetativa, quer a respeito de distúrbios subjetivos, quer resultante do exame objetivo. Pressão arterial: 11 mx. e 7,1 mn. O exame clínico no aparelho circulatório e eletrocardiograma foram normais (Dr. H. Kneese Mello - Serv. Prof. Jairo Ramos).

Exame psíquico - Calmo, consciente, até vivo. Inteligente, loquaz, de bom humor, relatando com precisão os detalhes de sua doença.

Exame neurológico - À inspeção geral nota-se, desde logo, o aspecto hercúleo, com saliência nítida de toda a musculatura, principalmente na cintura escapular, se bem que seja rapaz franzino de constituição. Estática e equilíbrio perfeitamente normais. Marcha difícil quando se inicia, permanecendo com cada perna rígida em extensão e atrazada ao mudar o passo. Tal dificuldade dura alguns segundos no primeiro e segundo movimentos, para ir cedendo paulatinamente e desaparecer nos 3 a 4 primeiros passos; desde aí a marcha se faz normalmente. Os movimentos ativos de todos os segmentos, e particularmente os de girar a cabeça para um ou para outro lado (fig1C), de flexão ou pronação para os segmentos dos membros superiores (fig1A), translação em torno das articulações coxofemurais para os membros inferiores, apresentam o mesmo tipo de distúrbio já assinalado - persistência da contração muscular e dificuldade na descontração - e que torna os movimentos, inicialmente, bastante difíceis. É nítida a saliência apresentada pelos músculos esternoclidomastóideos, flexores dos dedos e pronadores, ou os da face anterior da coxa, quando evidenciam a hipertonia de ação, persistente e duradoura. A percussão dos músculos determina contração tônica de grupos isolados de fibras (miotonia mecânica). Os reflexos superficiais apresentam-se normais. Os reflexos profundos em geral são fracos mas simétricos. Não há distúrbios na coordenação dos movimentos. Pares cranianos íntegros. O exame neuroftalmológico (Dr. J. Cândido Silva) demonstrou não haver qualquer distúrbio miotônico, particularmente em relação às pupilas. Não há qualquer distúrbio de sensibilidade.


Exames paraclínicos - Exame do líquido cefalorraqueano: Punção suboccipital; pressão inicial 16, final 4; volume 15 cc.; líquido límpido e incolor; citologia 0,8 céls. por mm3; hemácias 10,0 por mm3; exame morfológico prejudicado pelas hemácias; proteínas totais 0,13 grs. por lt.; r. Pandy, Weichbrodt e Nonne, negativas; cloretos 7,14 grs%; glicose 0,65 grs%; r. benjoim coloidal 00000.01100. 0000.0; r. Takata-Ara negativa; r. Wassermann e r. Steinfeld, r. para cisticercose, negativas com 1 cc; r. Eagle negativa (Dr. J. B. Reis). Exame de sangue: R. Wassermann, r. Eagle e Kahn, negativas. Semiologia neurovegetativa: (Dr. J. Landulfo - Serv. Cardiologia da Escola Paulista de Medicina - Prof. J. Barbosa Correa). Reflexo oculocardíaco de Dagnini e Aschner - antes da compressão, 76; durante, 76; depois da compressão, 74. Reflexo carotídeo - antes da compressão, 72; depois da compressão durante 10 segundos, 70. Reflexo solar - antes, 72; durante (30 segundos), 72; depois da compressão, 64. Conclusão: os reflexos oculocardíaco, carotídeo e solar não revelam distonia neurovegetativa. Exame elétrico: O exame feito e repetido com alguns dias de intervalo, mostrou haver reação miotônica e contração galvanotônica nos seguintes músculos: bíceps, tríceps, flexor comum dos dedos, flexor próprio do índex, grande palmar, quadriceps crural, gêmeos, em ausência de qualquer alteração do limiar elétrico e também sem qualquer alteração da excitabilidade dos nervos musculocutâneo, mediano, cubital, radial, crural e ciático-poplíteos interno e externo. Ergograma e Miograma: O traçado dos movimentos voluntários sucessivos dos dedos, assim como o traçado da contração muscular subseqüente à excitação galvânica do ponto motor (músculo flexor comum dos dedos), mostra o quadro caraterístico da miotonia. Para evitar repetições, deixemos sua descrição para o capítulo sobre a terapêutica, pois com ele evidenciamos cabalmente a ação antimiotônica da quinina. Eletromiograma: Também com este método semiológico encontramos indicações perfeitamente concordes com aquelas de Lindsley e Curnen, caraterizando os traçados da miotonia. As correntes de ação dos movimentos isolados são mais intensas e mais duradouras que nos indivíduos sãos, persistindo ainda em parte durante o período de descontração muscular. Vê-las-emos com detalhes mais adiante.

O caso apresentado refere-se, pois, a um rapaz de 21 anos que, desde a idade de 7 para 8 anos, tem seus movimentos voluntários bastante prejudicados de início por uma miotonia que cede progressivamente, assim que as primeiras contrações musculares se fazem. O diagnóstico de miotonia de Thomsen se impõe, quer pelo fato dos fenômenos terem surgído nos primeiros anos da vida do paciente, isolados, praticamente evidentes em toda musculatura estriada, quer por não apresentarem caracteres evolutivos ou, se existem, são pouco evidentes a ponto de não serem perceptíveis ao paciente. Não se trata, no caso, de afecção familial; na literatura abundam casos deste tipo e, particularmente, na literatura nacional, só os casos de Ulisses Pernambucano apresentavam caráter familial. A evidenciação da miotonia voluntária, da miotonia por percussão dos músculos e, particularmente, os detalhes revelados pelo exame elétrico, e pelos exames miográficos e eletromiográficos confirmam o diagnóstico. O exame neuroftalmológico não evidenciou caracteres miotônicos nas pupilas, conforme tem sido descrito (pupilas miotônicas de Saenger); igualmente, o exame cardiológico não mostrou qualquer distúrbio da musculatura cardíaca. A semiologia do sistema nervoso vegetativo, preconizada por vários autores que nela encontraram base até para hipóteses patogênicas, no caso presente forneceu resultados dentro dos limites da normalidade. Não há qualquer indício de existência de um fator ou cofator etiológico exógeno, assim como o exame neurológico detalhado e os exames paraclínicos não deixam perceber qualquer sinal de lesão do sistema nervoso. Ficamos, pois, no diagnóstico de miotonia de Thomsen tal como ele é hoje aceito na literatura neurológica.

Tratamento - Nosso maior empenho foi o de procurar meios de combater o fenômeno miotonia. Lançamos mão de início, do sulfato de quinina por via oral. Se bem que conhecêssemos nas referências bibliográficas, sua ação antimiotônica, ficamos verdadeiramente surpresos pela rapidez e pelos caracteres verdadeiramente teatrais com que esta se apresenta. É difícil descrever o contraste entre a dificuldade penosa do indivíduo em realizar qualquer movimento em sua atividade diária, e a facilidade com que o faz 40 minutos após a ingestão de 1 gr. de sulfato de quinina. Nosso paciente, que já se acostumara durante toda existência ao sofrimento de ter cada movimento inicial tolhido pela hipertonia muscular, assim que se viu livre dela, pôs-se a andar, quase a correr, ao redor do Hospital S. Paulo, rindo sozinho, incapaz de se conter ao menos para explicar sua satisfação; tal era sua euforia, que dava a impressão de ter perdido a razão: talvez não menor foi nosso espanto, e a de todos os companheiros presentes no Ambulatório de Neurologia, tal a teatralidade da mudança radical no aspecto físico e mental do paciente. Ainda com finalidade terapêutica, usamos, em experiências subseqüentes, a adrenalina em soluções aquosa e oleosa, a ergotamina e a atropina. Explanemos as experiências com cada uma dessas drogas:

Adrotatina - Injeção intramuscular de 1 cc. sol. cloridrato de adrenalina (Parke Davis). Pulso 62, pressão arterial 11,5 mx. e 6,5 mn. Depois de 5 minutos: Pressão arterial 12.5 e 6,5; pulso 70. Depois de 20 minutos: Pressão arterial 13,5 e 7; pulso 72; cedeu inteiramente a miotonia em todos os segmentos, exceto parcialmente nos músculos da mão esquerda. Depois de 30 minutos: Pressão arterial 12,4 e 6; pulso 66; cedeu tôda miotonia. Depois de 45 minutos, começaram a reaparecer sinais de miotonia em ambas as mãos, particularmente na esquerda. Esta prova foi repetida depois de 30 dias. com resultado praticamente idêntico. Procurando ter a ação antimiotônica da adrenalina de modo mais duradouro, lançamos mão da solução oleosa (Parke Davis); a injeção intramuscular desta solução, diàriamente, durante 6 dias consecutivos, não teve qualquer efeito sobre a miotonia. Este fato é naturalmente explicável pela concentração insuficiente da adrenalina absorvida em determinado espaço de tempo.

Atropina - Injeção endovenosa, lentamente, de 1/4 mgr. de sulfato neutro de atropina em 10 cc. de soro glicosado a 25%. Pulso, 72 por minuto. Pressão arterial 10,5 mx. e 7 mn. Depois de 5 minutos: pressão arterial 11,2 e 7,5; pulso 64. Depois de 10 minutos: pressão 10,2 e 6,5. Pulso 66. Depois de 18 minutos: pressão 10,4 e 7,0; pulso 70. Não houve qualquer sintoma geral desagradável, nem houve qualquer modificação na miotonia.

Ergotamina - A administração, por via oral, de dois comprimidos de Gynergeno (Sandoz), durante 6 dias, não teve efeto sobre a miotonia.

Quinina - A via oral foi a única por nós usada, dado o fato de corresponder plenamente às necessidades de prova e de terapêutica. A administração de 1 gr. de sulfato de quinina foi suficiente para fazer desaparecer completamente toda miotonia depois de 40 a 45 minutos. A diminuição da miotonia já começava a ser notada 25 minutos após a ingestão da droga. Repetimos essa prova em 8 ocasiões diferentes, inclusive quando apresentamos o paciente à Secção de Neuro-Psiquiatria da Associação Paulista de Medicina, e em todas elas o resultado foi idêntico. A ação da quinina em todas as provas perdurou por 10 horas, em média.

As figuras 2 e 3 correspondem aos eletromiogramas de músculos miotônicos sem ou com a ação da quinina. Na figura 2, em A, vemos, num movimento isolado de fechar e abrir a mão, a persistência das correntes de ação além da fase de contração muscular, invadindo o período de descontração. O início da contração voluntária e o da descontração estão indicados com as flechas. No total, a duração do desvio de potencial ultrapassa 4 segundos. Em B, 45 minutos após a administração de 1 gr. de quinina por via oral, o traçado é inteiramente outro. O desvio de potencial é breve (menos de 1/3 de segundo) e se cinge à contração muscular isoladamente. É um quadro bastante semelhante ao de movimento idêntico em pessoa sem miotonia, como vemos em C. Na figura 3, em A, estão inscritos os movimentos sucessivos de fechar e abrir a mão antes de administrar a quinina; note-se o tempo perdido entre o 2.°, 3.° e 4.° movimentos contrastado com o tempo perdido entre os demais e, também, as correntes de ação no período de descontração muscular, fazendo com que, praticamente, não haja repouso elétrico entre um e outro movimento sucessivo. Em B, 45 minutos após ingestão de 1 gr. de quinina, o quadro já é integralmente diferente. Os intervalos entre os movimentos são pràticamente iguais e o repouso elétrico entre eles é bem evidente.



As figuras 4 e 5 mostram o traçado dos movimentos voluntários sucessivos do dedo médio da mão direita, antes e depois da administração da quinina, assim como os traçados da contração do músculo flexor comum dos dedos, em consequência da excitação galvânica de seu ponto motor, antes e sob a ação da quinina. No miotônico, os movimentos sucessivos mostram claramente a dificuldade de descontração nos primeiros movimentos, bem mais evidentes no 2.°, 3.° e 4.°, cedendo posteriormente; é a curva típica do miotônico. Igualmente, a contração muscular, subsequente a uma excitação elétrica do ponto motor, não só é relativamente lenta (em contraste com a subitaneidade da contração do músculo normal), como, e principalmente, a descontração é demorada e o traçado evidencia bem o tempo perdido nesse período. Sob a ação da quinina, entretanto, toda dificuldade tônica desaparece, e os movimentos sucessivos se fazem igualmente com a mesma facilidade desde os iniciais, assim como as contrações e descontrações musculares subsequentes à excitação elétrica se fazem sem dificuldade e o seu traçado em nada difere daquele dos indivíduos normais.



Com tais documentos, podemos concluir pela especificidade da quinina em relação à miotonia, como afirma Wolf. Resta procurar a dose mínima suficiente para abolir a miotonia por um espaço de tempo razoável (com 1 gr. a duração do efeito foi, em média, 10 a 12 horas) e capaz de ser bem suportada pelo paciente; já conseguimos que ele permanecesse o dia todo livre da miotonia com a administração de 0,50 grs. de sulfato de quinina, às 5,50 horas, (quando sai para o trabalho) e às 11,30 horas, durante 10 dias seguidos. Não apresentou, com esta dosagem e durante este tempo, fenômeno algum de intolerância pelo medicamento. Não pudemos ainda fazer a terapêutica por mais tempo, devido à dificuldade em conseguir atualmente o sulfato de quinina em quantidade suficiente. Com isto, cremos que o problema prático da miotonia está satisfatòriamente resolvido.

Em suma, o problema terapêutico da miotonia de Thomsen deve ser cingido, por ora, ao combate ao fenômeno miotônico que tantos prejuízos e tal limitação de vida traz aos pacientes. Outra não pode ser a diretriz, uma vez que não se conhece o fator etiológico e nem se pode determinar a existência da moléstia no sistema nervoso ou no sistema muscular. O distúrbio miotônico, possivelmente secundário a lesões do sistema nervoso em alguns casos, puramente conseqüente a distúrbios dinâmicos de natureza neuromuscular em outros, é ainda o único acessível a uma terapêutica sintomática, uma vez que já se tem em mão um agente antimiotônico tão poderoso como a quinina. O problema está em dosar, para cada caso, o mínimo de medicamento suficiente para ação terapêutica útil e tolerável pelo paciente.

Por outro lado, não há dúvida que o estudo do fenômeno miotônico e a experimentação com as diversas drogas que o aumentam ou diminuem, associado a outras pesquisas da fisiopatologia neuromuscular, trouxeram novas contribuições ao esclarecimento de outros tantos problemas até aqui absolutamente impenetráveis.

Os resultados conhecidos, que trazem o conhecimento da aproximação fisiopatológica entre vários tipos de distúrbios neuromusculares, permitem estender o emprêgo dos sais de quinina a muitos outros estados patológicos a eles atinentes, em particular, às cãibras dos esportista. É o que já tem sido feito pelo Prof. Paulino W. Longo no Serviço de Neurologia da Escola Paulista de Medicina, com resultados bastante satisfatórios, os quais constituirão motivo, de ulterior comunicação.

Rua Itaguaçaba, 135 - São Paulo.

Trabalho do Serviço de Neurologia da Escola Paulista de Medicina (Prof. Paulino W. Longo). Apresentado à Secção de Neuro-Psiquiatria da Associação Paulista de Medicina em 5 outubro 1945, à Sociedade Brasileira de Neurologia, Psiquiatria e Medicina Legal em 7 novembro 1945 e entregue para publicação em 30 novembro 1945.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Fev 2015
    • Data do Fascículo
      Mar 1946
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