Acessibilidade / Reportar erro

O líqüido cefalorraqueano iso diagnóstico dos tumores intracranianos

Resumos

Foi feito um estudo do líqüido cefalorraqueano num material de 180 casos de tumores intracranianos, histològicamente verificados, apreciando-se a possibilidade de sugestões diagnósticas, em relação à sede, natureza e aspectos cirúrgico e clínico. Foi utilizada a via cisternal para a obtenção do líquor, sendo que a punção negativa da cisterna constituiu um elemento de suspeita diagnostica nos tumores da fossa posterior e de indicação de cautela ao médico que a pratica. As vantagens da via cisternal para colheita do liquor foram assinaladas. A pressão inicial foi normal em 35% dos casos, diminuída em 7% e aumentada em 58%. A hipotensão apareceu em 5 hematomas, num total de 14 casos considerados. Não houve grande diferença de freqüência de hipertensão entre tumores infra e supratentoriais. Em relação à natureza do tumor, o glioblastoma e o abscesso - processos de crescimento rápido - tiveram maior tendência a apresentar hipertensão, em relativa oposição àqueles de crescimento lento (astrocitoma e meningeoma). Houve concordância absoluta entre os sinais clínicos de hipertensão - tríade hipertensiva completa - e a hipertensão do líquor. Entretanto, nos casos com tríade incompleta, foram verificadas, freqüentes vêzes, valores normais da pressão e mesmo hipotensão. O quociente raqueano de Ayala, nos casos de líquor hipertenso, evidenciou em grande maioria o tipo tumoral (menor que 5). 0 valor da fórmula QR menor que 5 e QRD maior que 3, não foi comprovado em nosso material. A xantocromia foi dominante nos casos de hematoma. O crescimento rápido pareceu influir mais que a natureza específica no aparecimento da xantocromia. O retículo fibrinoso foi notado em 20 casos, dos quais 2 sem taxa elevada de proteínas, aparecendo com maior freqüência nos casos de abscesso e glioblastoma. O líquor hemorrágico sòmente foi observado nos casos de hematoma. A citologia quantitativa não forneceu dados que permitissem indicação de sede. Quanto à natureza, observamos maior freqüência de pleocitose, de modo nítido, no abscesso, e de modo relativo, no glioblastoma. Os tumores localizados apresentaram hipercitose com mais freqüência que os difusos e, entre aquêles, os intra-encefálicos (presença do abscesso). Não verificamos a possibilidade de correlação entre a citología quantitativa e a clínica. O fator sede não pareceu influir na citologia qualitativa. Em relação à natureza, o abscesso e o hematoma acompanharam-se de alterações evidentes, sendo que a presença de eosinófilos, verificada nos casos de cisticercose. foi o fato mais constante. A correlação entre a citologia específica e os caracteres cirúrgicos e clínicos dos tumores não permitiu deduções dignas de menção. A taxa de proteínas esteve aumentada em 57% dos casos. Não houve diferença de distribuição dos valores da taxa protêica entre os grupos de sede infra ou supratentorial. O aumento da taxa protêica foi evidente nos abscessos e glioblastomas (processos de rápida evolução), em oposição aos astrocitomas (tumores de crescimento lento), nos quais houve tendência a taxas normais; entretanto, o neurinoma do acústico sempre se caracterizou por altas taxas proteicas. Os valores das proteínas distribuíram-se de modo aproximadamente uniforme entre os tumores difusos e localizados. Não foi verificada relação entre a taxa protêica e a sintomatologia clínica. A dissociação albumino-citológica apareceu de preferência nas lesões de crescimento lento (meningeoma e astrocitoma), enquanto que a associação albumiho-citológica predominou nas lesões de crescimento rápido (abscesso e glioblastoma). As reações das globulinas acompanharam de perto, nos seus resultados, as variações das taxas protêicas, comportando-se a reação de Pandy como a mais sensível, enquanto que a reação de Weichbrodt apresentou grande número de resultados negativos. As taxas de cloretos e de glicose não permitiram estabelecer relação evidente com os diversos aspectos estudados. A reação do benjoim coloidal foi normal em 57% dos casos estudados, predominando, entre os resultados anormais, a curva de 2ª e 3ª zonas. A reação de Takata-Ara apresentou 58% de resultados negativos, dominando, entre os resultados positivos, o tipo floculante. Entre as reações sorológicas, apenas a de fixação de complemento para cisticercos apresentou dados interessantes, pois que foi positiva especificamente em 3 casos. O líqüido ventricular, estudado em apenas 16 casos, apresentou aumento da taxa de proteínas sòmente em parte dos casos de lesão supratentorial. A apreciação global do exame de líquor mostrou que êle foi normal ou apenas apresentou um elemento no limite superior de normalidade em 44 casos (24%). Os autores concluem: 1) A hipertensão, a pleocitose e o aumento da taxa das proteínas apresentam-se com maior freqüência e intensidade nos processos tumorais intracranianos de crescimento rápido; 2) A hipotensão é freqüente nos casos de hematoma subdural; 3) A hipertensão do liquor corresponde aos sinais clínicos de hipertensão intracraniana, porém, não de modo obrigatório; 4) Taxas elevadas de proteínas acompanham comumente o neurinoma do acústico; 5) A presença de eosinófilos, acima de 2%, tem valor diagnóstico em casos de cisticercose encefálica, sendo elemento mais constante que a reação de fixação de complemento.


The spinal fluid examination was performed in 180 cases of histologically verified intracranial tumors. Cisternal puncture was done in all cases. The authors conclude: 1) Hypertension, increased cell count and increased protein value are found with more frequency and intensity in intracranial lesions of rapid growth; 2) Hypotension is frequent in cases of subdural hematomas; 3) Spinal fluid hypertension corresponds to the clinical symptoms of intracranial hypertension, although this is not always the case; 4) High protein value is commonly found in cases of acoustic neurinoma; 5) The presence of eosinophils above 2 per cent has diagnostic value in cases of cerebral cysticercosis, being a more constant element than complement fixation test; 6) The absence of spinal fluid during the cisternal tap was considered as suggestive of posterior fossa tumor.


RESUMO E CONCLUSÕES

Foi feito um estudo do líqüido cefalorraqueano num material de 180 casos de tumores intracranianos, histològicamente verificados, apreciando-se a possibilidade de sugestões diagnósticas, em relação à sede, natureza e aspectos cirúrgico e clínico.

Foi utilizada a via cisternal para a obtenção do líquor, sendo que a punção negativa da cisterna constituiu um elemento de suspeita diagnostica nos tumores da fossa posterior e de indicação de cautela ao médico que a pratica. As vantagens da via cisternal para colheita do liquor foram assinaladas.

A pressão inicial foi normal em 35% dos casos, diminuída em 7% e aumentada em 58%. A hipotensão apareceu em 5 hematomas, num total de 14 casos considerados. Não houve grande diferença de freqüência de hipertensão entre tumores infra e supratentoriais. Em relação à natureza do tumor, o glioblastoma e o abscesso - processos de crescimento rápido - tiveram maior tendência a apresentar hipertensão, em relativa oposição àqueles de crescimento lento (astrocitoma e meningeoma). Houve concordância absoluta entre os sinais clínicos de hipertensão - tríade hipertensiva completa - e a hipertensão do líquor. Entretanto, nos casos com tríade incompleta, foram verificadas, freqüentes vêzes, valores normais da pressão e mesmo hipotensão.

O quociente raqueano de Ayala, nos casos de líquor hipertenso, evidenciou em grande maioria o tipo tumoral (menor que 5). 0 valor da fórmula QR menor que 5 e QRD maior que 3, não foi comprovado em nosso material.

A xantocromia foi dominante nos casos de hematoma. O crescimento rápido pareceu influir mais que a natureza específica no aparecimento da xantocromia. O retículo fibrinoso foi notado em 20 casos, dos quais 2 sem taxa elevada de proteínas, aparecendo com maior freqüência nos casos de abscesso e glioblastoma. O líquor hemorrágico sòmente foi observado nos casos de hematoma.

A citologia quantitativa não forneceu dados que permitissem indicação de sede. Quanto à natureza, observamos maior freqüência de pleocitose, de modo nítido, no abscesso, e de modo relativo, no glioblastoma. Os tumores localizados apresentaram hipercitose com mais freqüência que os difusos e, entre aquêles, os intra-encefálicos (presença do abscesso). Não verificamos a possibilidade de correlação entre a citología quantitativa e a clínica. O fator sede não pareceu influir na citologia qualitativa. Em relação à natureza, o abscesso e o hematoma acompanharam-se de alterações evidentes, sendo que a presença de eosinófilos, verificada nos casos de cisticercose. foi o fato mais constante. A correlação entre a citologia específica e os caracteres cirúrgicos e clínicos dos tumores não permitiu deduções dignas de menção.

A taxa de proteínas esteve aumentada em 57% dos casos. Não houve diferença de distribuição dos valores da taxa protêica entre os grupos de sede infra ou supratentorial.

O aumento da taxa protêica foi evidente nos abscessos e glioblastomas (processos de rápida evolução), em oposição aos astrocitomas (tumores de crescimento lento), nos quais houve tendência a taxas normais; entretanto, o neurinoma do acústico sempre se caracterizou por altas taxas proteicas. Os valores das proteínas distribuíram-se de modo aproximadamente uniforme entre os tumores difusos e localizados. Não foi verificada relação entre a taxa protêica e a sintomatologia clínica.

A dissociação albumino-citológica apareceu de preferência nas lesões de crescimento lento (meningeoma e astrocitoma), enquanto que a associação albumiho-citológica predominou nas lesões de crescimento rápido (abscesso e glioblastoma).

As reações das globulinas acompanharam de perto, nos seus resultados, as variações das taxas protêicas, comportando-se a reação de Pandy como a mais sensível, enquanto que a reação de Weichbrodt apresentou grande número de resultados negativos.

As taxas de cloretos e de glicose não permitiram estabelecer relação evidente com os diversos aspectos estudados.

A reação do benjoim coloidal foi normal em 57% dos casos estudados, predominando, entre os resultados anormais, a curva de 2ª e 3ª zonas. A reação de Takata-Ara apresentou 58% de resultados negativos, dominando, entre os resultados positivos, o tipo floculante.

Entre as reações sorológicas, apenas a de fixação de complemento para cisticercos apresentou dados interessantes, pois que foi positiva especificamente em 3 casos.

O líqüido ventricular, estudado em apenas 16 casos, apresentou aumento da taxa de proteínas sòmente em parte dos casos de lesão supratentorial.

A apreciação global do exame de líquor mostrou que êle foi normal ou apenas apresentou um elemento no limite superior de normalidade em 44 casos (24%).

Os autores concluem: 1) A hipertensão, a pleocitose e o aumento da taxa das proteínas apresentam-se com maior freqüência e intensidade nos processos tumorais intracranianos de crescimento rápido; 2) A hipotensão é freqüente nos casos de hematoma subdural; 3) A hipertensão do liquor corresponde aos sinais clínicos de hipertensão intracraniana, porém, não de modo obrigatório; 4) Taxas elevadas de proteínas acompanham comumente o neurinoma do acústico; 5) A presença de eosinófilos, acima de 2%, tem valor diagnóstico em casos de cisticercose encefálica, sendo elemento mais constante que a reação de fixação de complemento.

SUMMARY AND CONCLUSIONS

The spinal fluid examination was performed in 180 cases of histologically verified intracranial tumors. Cisternal puncture was done in all cases.

The authors conclude: 1) Hypertension, increased cell count and increased protein value are found with more frequency and intensity in intracranial lesions of rapid growth; 2) Hypotension is frequent in cases of subdural hematomas; 3) Spinal fluid hypertension corresponds to the clinical symptoms of intracranial hypertension, although this is not always the case; 4) High protein value is commonly found in cases of acoustic neurinoma; 5) The presence of eosinophils above 2 per cent has diagnostic value in cases of cerebral cysticercosis, being a more constant element than complement fixation test; 6) The absence of spinal fluid during the cisternal tap was considered as suggestive of posterior fossa tumor.

Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

Bibliografia

  • 1. Mestrezat, W. - Le Liquide Céphalo-rachidien. Maloine Cie., Paris, 1912.
  • 2. Eskuchen, K. - La Punción Lombar. Trad, espanhola. Espasa Calpe Edit., Madrid, 1921.
  • 3. Ayala, G. - Über den diagnostischen Wert des Liquor-Druckes und einen Apparat zu seiner Messung. Ztschr. f. d. ges. Neurol, u. Psychiat., 84: 42, 1923.
  • 4. Balduzzi, O. - Évaluation de la pression du liquide céphalo-rachidien. Encéphale, 1:83-90, 1924.
  • 5. Greenfield; Carmichael - The Cerebrospinal Fluid in Clinical Diagnosis. MacMillan Co., London, 1925.
  • 6. Spurling, R. G.; Maddock, C. L. - The Study of the Cerebrospinal Fluid in Cases of Brain Tumor. The Human, Cerebrospinal Fluid. Paul Hoeber, New York, 1926.
  • 7. Downan, C. E.; Smith, W. A. - Intracranial tumors. Arch. Neurol, a. Psychiat., 20:1312, 1928.
  • 8. Kubitschek, P. E. - The symptomatology of tumors of the frontal lobe. Arch. Neurol, a. Psychiat., 20:568, 1928.
  • 9. Fremont-Smith, F. - Cerebrospinal fluid in differential diagnosis of brain tumor. Arch. Neurol, a. Psychiat., 27:691, 1932.
  • 10. Kulcsar, F. - Über die diagnostische Bedeutung der Liquor-Untersu-chungen im Anschluss an 80 Gehirntumorfalle. In Hughings Jackson Memorial, L. Benedek, 1935.
  • 11. Oeane, J. S. - Increased cerebrospinal fluid protein in brain tumors. J. Nerv. a. Ment. Dis., 84:312, 1936.
  • 12. Merritt, H. H.; Fremont-Smith, F. - The Cerebrospinal Fluid. W. B. Saunders Co., Philadelphia, 1938.
  • 13. Sorgo, W. - Die Liquorveränderungen beim raumverengenden Prozess des Gehirns mit besonderer Berücksichtigung der Liquorpassagestörung. Zentralbl. f. Neuro-Chir., 5:135, 1940.
  • 14. Bligaard, K. - The value of the cerebrospinal fluid examination in diagnosis of intracranial tumors. Acta Psychiat. et Neurol. Scandinav., 16:111, 1941.
  • 15. Phillips, G.; Gosweli, G. - Cerebrospinal fluid protein and intracranial tumors. M. J. Australia, 1:390, 1944.
  • 16. Schroeder, A. H. e col. - El estudio citológico del líquido cefalo-raquideo en el diagnóstico de los tumores cerebrales y meníngeos. An. Fac. Med. de Montevideo, 30:1, 1945.
  • 17. Nayrac, P. e col. - Diagnostic d'un epithelioma secondaire du cerveau par la presence de cellules néoplasiques dans le liquide céphalo-rachidien. Resumo in Rev. Neurol., 82:38, 1950.
  • 18. Lange, O. - O Liqüido Céfalo-raquidiano em Clínica. Cia. Melhoramentos, São Paulo, 1937.
  • 19. Fremont-Smith, F.; Putman, T. J - The value of lumbar puncture in the diagnosis of suspected brain tumor. Resumo in J. Ment. a. Nerv. Dis., 76:260, 1932.
  • 20. Mouriz, J. - El líquido céfalo-raquidiano en las neoplasias del sistema nervioso central. Arch. Neurobiol. (Madrid), 4:193, 1924.
  • 21. Reis, J. B.; Lemmi, O. - Sobre as causas de insucesso na obtenção do liqüido cefalorraqueano cisternal e lombar. Arq. Neuro-Psiquiat., 8:182, 1950.
  • 22. Tönnis, W. - Die Chirurgie des Gehirns und seiner Haute. Urban & Schwartzenberg, Wien, 1948.
  • 23. Botelho, A. - Pressão do Liquor nas Doenças Mentais. Tese, Rio de Janeiro, 1925.
  • 24. Stary, Z.; Kral, A.; Winternitz, R. - Zur Chemie der Liquor-Reaktion nach Pandy. Ztschr. f. ges. Neurol, u. Psychiat., 157:91, 1937
  • 25. Fremont-Smith, F.; Hodgson - Combined ventricular and lumbar puncture in the diagnosis of brain tumors. J. Nerv. a. Ment. Dis., 65:286, 1925.
  • O líqüido cefalorraqueano iso diagnóstico dos tumores intracranianos

    Aloysio Mattos Pimenta; Octavio Lemmi; João Baptista dos Reis
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Abr 2014
    • Data do Fascículo
      Set 1954
    Academia Brasileira de Neurologia - ABNEURO R. Vergueiro, 1353 sl.1404 - Ed. Top Towers Offices Torre Norte, 04101-000 São Paulo SP Brazil, Tel.: +55 11 5084-9463 | +55 11 5083-3876 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista.arquivos@abneuro.org