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Laminoplastia expansiva: uma alternativa no tratamento da mielopatia espondilótica cervical

Expansive laminoplasty: an alternative for the treatment of cervical espondiloarthrosis

Resumos

Descreve-se a técnica de laminoplastia expansiva cervical e analisam-se os resultados cirúrgicos obtidos em 28 pacientes portadores de mielopatia espondilótica cervical tratados através desse método e com seguimento mínimo de seis meses. Vinte e quatro pacientes (86%) apresentaram melhora clínica, segundo a escala de Nurick, três (10%) permaneceram estáveis e uma paciente faleceu no pós-operatório imediato. Os bons resultados alcançados indicam que essa técnica é simples, eficaz e tem baixo índice de complicações no tratamento da mielopatia espondilótica.

laminoplastia; vértebras cervicais; espondiloartropatia; mielopatia; descompressão cirúrgica


We describe the surgical technique of expansive cervical laminoplasty and analyse the results in 28 patients treated by this method for cervical spondylotic myelopathy with a minimum follow-up of six months. Twenty-four patients (86%) had clinical improvement according to the Nurick scale while three (10%) had no improvement and one patient died on the first days post-operatively. The good results achieved demonstrate that this technique is simple, effective and has few complications on the treatment of spondylotic myelopathy.

laminoplasty; cervical vertebrae; spondylosis; myelopathy; surgical decompression


Laminoplastia expansiva: uma alternativa no tratamento da mielopatia espondilótica cervical

Expansive laminoplasty: an alternative for the treatment of cervical espondiloarthrosis

Gustavo Cardoso de AndradeI; Roberto Leal da SilveiraII; Aluízio Augusto Arantes JrIII; Nilson Pinheiro JrI; Eckstânio Marcos Melo RochaIV

Serviço de Neurocirurgia do Hospital Madre Teresa, Belo Horizonte MG, Brasil

INeurocirurgião

IIChefe do Serviço de Neurocirurgia, Mestre e Doutor em Neurocirurgia

IIIMestre em Neurocirurgia

IVMédico Assistente

RESUMO

Descreve-se a técnica de laminoplastia expansiva cervical e analisam-se os resultados cirúrgicos obtidos em 28 pacientes portadores de mielopatia espondilótica cervical tratados através desse método e com seguimento mínimo de seis meses. Vinte e quatro pacientes (86%) apresentaram melhora clínica, segundo a escala de Nurick, três (10%) permaneceram estáveis e uma paciente faleceu no pós-operatório imediato. Os bons resultados alcançados indicam que essa técnica é simples, eficaz e tem baixo índice de complicações no tratamento da mielopatia espondilótica.

Palavras-chave: laminoplastia, vértebras cervicais, espondiloartropatia/cirurgia, mielopatia, descompressão cirúrgica.

ABSTRACT

We describe the surgical technique of expansive cervical laminoplasty and analyse the results in 28 patients treated by this method for cervical spondylotic myelopathy with a minimum follow-up of six months. Twenty-four patients (86%) had clinical improvement according to the Nurick scale while three (10%) had no improvement and one patient died on the first days post-operatively. The good results achieved demonstrate that this technique is simple, effective and has few complications on the treatment of spondylotic myelopathy.

Key words: laminoplasty, cervical vertebrae, spondylosis/surgery, myelopathy, surgical decompression.

Mielopatia espondilótica cervical é definida como lesão medular decorrente das alterações degenerativas da coluna cervical, sendo a principal causa de disfunção medular em pacientes idosos1,2. Ainda que exista controvérsia sobre sua história natural, seu tratamento é eminentemente cirúrgico, podendo-se utilizar a via anterior ou posterior1-14. A via anterior consiste em descompressão medular por corpectomia associada a artrodese, sendo exeqüível e segura na abordagem de até três segmentos, ainda que possa haver alterações degenerativas precoces nos segmentos adjacentes à fusão1,3-6,11,14. Quando utilizada em mais de três segmentos é acompanhada de importante índice de pseudoartrose e deslocamento do enxerto ósseo, além de apresentar maiores dificuldades técnicas na exposição cirúrgica, uso de enxerto e eventual uso de prótese4,6. A abordagem posterior clássica é a laminectomia que, apesar de promover descompressão adequada, está associada a instabilidade pós-operatória, deformidade em cifose e formação de cicatriz pós-laminectomia1-6,10,14,15, sendo comum a ocorrência de piora clínica secundária.

A laminoplastia, descrita por Hirabayashi em 197816,17, e suas diversas variações têm como objetivo o aumento do diâmetro do canal vertebral com conseqüente descompressão e a reconstrução do arco posterior sem a retirada das lâminas, evitando-se as complicações encontradas na laminectomia1,3-6,11,13,17.

O objetivo desse estudo é descrever a técnica cirúrgica utilizada na confecção da laminoplastia cervical e relatar o resultado obtido em 28 pacientes, acompanhados por tempo mínimo de seis meses.

MÉTODO

Casuística – No período de março de 2002 a março de 2004 a laminoplastia expansiva foi utilizada no tratamento cirúrgico de 28 pacientes portadores de mielopatia espondilótica cervical. Dezoito pacientes (65%) eram do sexo masculino e 10 (35%) do feminino. A idade dos pacientes variou de 48 a 82 anos, com média de 71 anos. Utilizou-se a escala de Nurick18 na avaliação da mielopatia pré-operatória e durante o seguimento pós-operatório. (Tabela 1).

Seleção dos pacientes – Pacientes portadores de mielopatia ou mielorradiculopatia foram submetidos a avaliação neuroradiológica consistindo em radiografias simples e com estudo funcional, tomografia computadorizada e ressonância magnética. Aqueles portadores de estenose multisegmentar do canal cervical (diâmetro menor que 12 mm) que não apresentaram cifose ou evidências de instabilidade, bem como os pacientes idosos e/ou portadores de comorbidades significativas tiveram indicação de laminoplastia. Consentimento informado foi obtido de todos os pacientes e o presente estudo foi autorizado pela comissão de ética do Hospital Madre Teresa.

Técnica – Os pacientes foram operados sob anestesia geral, evitando-se a mobilização cervical tanto quanto possível durante a intubação orotraqueal. Pressão arterial, eletrocardiograma, oximetria, capnografia e gases sanguíneos são monitorizados; cateter vesical é inserido. A pressão arterial sistólica deve ser mantida acima de 110 mm Hg evitando-se perfusão medular insuficiente.

Os pacientes são posicionados em decúbito prono com a cabeça fixada em suporte de Mayfield mantendo a coluna cervical em posição neutra ou levemente fletida. Utiliza-se suporte especial sob o tórax, permitindo ventilação adequada. A cabeceira da mesa cirúrgica é elevada cerca de 15 graus, reduzindo sangramento venoso epidural e diminuindo a pressão intraocular.

Incisa-se a pele na linha média e em seguida realiza-se dissecação subperiostal da musculatura paraespinhal expondo-se os processos espinhosos e lâminas dos segmentos a serem abordados.

Os ligamentos interespinhosos e interlaminares devem ser removidos na interface entre o bloco a ser abordado e os segmentos imediatamente superior e inferior. A brocagem atinge toda a extensão de um lado da lâmina e apenas a cortical externa contralateral, de maneira que ela pode ser elevada, causando uma fratura em "galho verde" (Fig 1). Elevamos metade das lâminas para um lado e metade para o outro lado, formando dois blocos. Escolhe-se o lado a ser elevado avaliando-se a sintomatologia mais significativa ou maior compressão aos métodos de imagem, permitindo a realização de foraminotomia quando necessário (Figs 1 e 2).



A canaleta criada entre a lâmina elevada e a massa lateral é preenchida com enxerto ósseo retirado dos processos espinhosos de T1 ou T2. Esse enxerto é mantido em posição com o uso de sutura com fio inabsorvível, garantindo o aumento das dimensões do canal medular (Figs 1 e 3)

O fechamento do sítio cirúrgico é realizado da maneira habitual após a inserção de dreno, que permanece aberto por 24 horas.

RESULTADOS

Entre os 28 pacientes, 14 (50%) foram abordados os segmentos C3 a C7, 8 (28%) de C3 a C6, 3 (11%) de C3 a C5, 2 (7%)de C4 a C6 e num paciente (4%) a descompressão envolveu C3 a T1.

Segundo a escala de Nurick, 24 pacientes (86%) apresentaram melhora, 3 pacientes (10%) não apresentaram qualquer melhora após a cirurgia e uma paciente previamente portadora de cardiopatia isquêmica faleceu no pós-operatório imediato em decorrência de infarto agudo do miocárdio. Entre os pacientes que apresentaram melhora, 12 (43%) melhoraram um grau na escala de Nurick, 5 (18%) melhoraram dois graus e 7 (25%) melhoraram três graus (Tabela 2).

Dezoito pacientes (64%) apresentavam Nurick IV ou V no pré-operatório, o que significa que dependiam do cuidado de terceiros para deambulação ou não deambulavam. No período pós-operatório, apenas 2 (7%) se enquadravam nessa faixa, enquanto os demais (89%) conseguiam deambular independentes.

Além do óbito descrito, dois pacientes (8%) apresentaram infecção de ferida operatória; um deles necessitou de nova cirurgia para desbridamento e o outro foi tratado apenas com antibioticoterapia sistêmica. Um paciente (4%) desenvolveu hematoma de ferida operatória, necessitando drenagem cirúrgica. Dois pacientes apresentaram lesão radicular de C5 após a laminoplastia, possivelmente devido a um deslocamento posterior da medula com tracionamento da referida raiz. Ambos apresentaram melhora espontânea completa. Uma paciente de 82 anos que se encontrava inicialmente em Nurick V, não apresentou qualquer melhora após o procedimento, sendo submetida a nova tomografia computadorizada que revelou descompressão inadequada, sendo a paciente submetida a laminectomia e não apresentando melhora até o momento.

DISCUSSÃO

Desde sua descrição por Hirabayashi em 1978, a laminoplastia apresenta-se como opção de tratamento para a espondilose cervical. Atualmente, indica-se esse procedimento em casos de compressão multisegmentar (sobretudo acima de três níveis), compressão posterior ou na presença de calcificação do ligamento longitudinal posterior1,2,6,9,10,13-15,17.

A fusão de segmentos motores não é objetivo da laminoplastia, de forma que a diminuição da mobilidade cervical é pequena, não causando restrições às atividades da vida diária. Não se criando instabilidade e não havendo necessidade de imobilização para fusão, o período de recuperação e uso de órteses é menor1. Essas características, assim como a técnica cirúrgica mais simples e o menor tempo cirúrgico possibilitam seu emprego no tratamento de pacientes idosos e/ou portadores de comorbidades significativas3, conforme demonstrado pelo pequeno índice de complicações obtida no nosso grupo de pacientes com idade média de 71 anos.

Diversos autores relatam resultados clínicos satisfatórios após laminoplastia no tratamento da mielopatia cervical2,4-8,11-15,17. Entre os fatores prognósticos citados incluem-se a idade, tempo de evolução da mielopatia e o grau de compressão medular aos exames de imagem2,6,12,14. Em 86% dos nossos pacientes houve alguma melhora após a cirurgia, índice similar às séries citadas.

Analisando-se outras técnicas, a laminoplastia apresenta como desvantagens a impossibilidade de descompressão foraminal bilateral e a maior incidência de dor axial6,10,12 e atrofia muscular pós-operatória, quando comparada à abordagem via anterior. Laminoplastia não deve ser empregada em pacientes com alteração da curvatura da coluna cervical (cifose), havendo relatos de instabilidade pós-operatória3,6,10.

Em conclusão, a laminoplastia expansiva é procedimento cirúrgico tecnicamente simples e eficaz no tratamento da mielopatia espondilótica cervical. Apresenta alto índice de melhora clínica além de poucas complicações quando utilizado em pacientes selecionados.

Recebido 9 Fevereiro 2005, recebido na forma final 27 Maio 2005. Aceito 9 Julho 2005.

Dr. Gustavo Cardoso de Andrade - Rua Cachoeira de Minas 114/701 - 30440-450 Belo Horizonte MG - Brasil. E-mail: gca@zipmail.com

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2006
  • Data do Fascículo
    Dez 2005

Histórico

  • Aceito
    09 Jul 2005
  • Revisado
    27 Maio 2005
  • Recebido
    09 Fev 2005
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