Acessibilidade / Reportar erro

Traumatismo craniencefálico em crianças e adolescentes na cidade do Salvador - Bahia

Traumatic brain injury in children and adolescents at Salvador City, Bahia, Brazil

Resumos

OBJETIVO: Verificar a freqüência de trauma craniencefálico (TCE) nos indivíduos entre 0 e 19 anos, de acordo com o gênero, idade e etiologia. MÉTODO: Estudo descritivo realizado por meio da pesquisa em prontuário e relato das vítimas de trauma craniencefálico com idade até 19 anos, admitidas em hospital de referência para o atendimento a politraumatizados no Estado da Bahia, por um período de 1 ano. RESULTADOS: Amostra constituída de 390 pacientes, dentre os quais 280 (71,8%) eram do sexo masculino. A faixa etária mais acometida foi a de adolescentes (10 a 19 anos) com 177 pacientes (45,4%). A causa mais comum foi a queda de altura (34,4%). Segundo a pontuação na Escala de Coma de Glasgow, 89% dos pacientes sofreram TCE leve. CONCLUSÃO: O grupo de adolescentes foi o mais atingido, sendo a queda de altura a principal causa de TCE, com predomínio do gênero masculino, havendo preponderância do trauma leve.

traumatismo craniencefálico; crianças; adolescentes; epidemiologia


OBJECTIVE: To verify the frequency of traumatic brain injury (TBI) in the people between 0 and 19 years of age, in accordance to gender, age and cause of trauma. METHOD: Descriptive study made through a period of a year, in all TBI victims, aged until 19 years admitted in a reference trauma center. RESULTS: The sample had a total of 390 patients; 280 (71.8%) were boys. The main age of the victims was between 10 to 19 years (adolescents) with 177 patients (45.4%). The most common cause of trauma was height falls (34.4%). According to the Glasgow Coma Scale, 89% had suffered mild TBI. CONCLUSION: The main group of victims was the adolescents; the most important cause of TBI was height fall, with masculine predominance and mild trauma.

traumatic brain injury; children; adolescents; epidemiology


a20v64n4

Traumatismo craniencefálico em crianças e adolescentes na cidade do Salvador - Bahia

Traumatic brain injury in children and adolescents at Salvador City, Bahia, Brazil

José Roberto Tude MeloI; Diana Lara Pinto de SantanaII; Júlio Leonardo Barbosa PereiraII; Tiago Freire RibeiroII

Hospital Universitário Professor Edgard Santos (HUPES) - Universidade Federal da Bahia e Hospital Geral do Estado da Bahia, Salvador BA, Brasil:

INeurocirurgião do Complexo Hospitalar Universitário Professor Edgard Santos - Universidade Federal da Bahia, Salvador BA, Brasil (UFBA), Mestre em Medicina pela UFBA

IIAcadêmico de Medicina da UFBA

RESUMO

OBJETIVO: Verificar a freqüência de trauma craniencefálico (TCE) nos indivíduos entre 0 e 19 anos, de acordo com o gênero, idade e etiologia.

MÉTODO: Estudo descritivo realizado por meio da pesquisa em prontuário e relato das vítimas de trauma craniencefálico com idade até 19 anos, admitidas em hospital de referência para o atendimento a politraumatizados no Estado da Bahia, por um período de 1 ano.

RESULTADOS: Amostra constituída de 390 pacientes, dentre os quais 280 (71,8%) eram do sexo masculino. A faixa etária mais acometida foi a de adolescentes (10 a 19 anos) com 177 pacientes (45,4%). A causa mais comum foi a queda de altura (34,4%). Segundo a pontuação na Escala de Coma de Glasgow, 89% dos pacientes sofreram TCE leve.

CONCLUSÃO: O grupo de adolescentes foi o mais atingido, sendo a queda de altura a principal causa de TCE, com predomínio do gênero masculino, havendo preponderância do trauma leve.

Palavras-chave: traumatismo craniencefálico, crianças, adolescentes, epidemiologia.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To verify the frequency of traumatic brain injury (TBI) in the people between 0 and 19 years of age, in accordance to gender, age and cause of trauma.

METHOD: Descriptive study made through a period of a year, in all TBI victims, aged until 19 years admitted in a reference trauma center.

RESULTS: The sample had a total of 390 patients; 280 (71.8%) were boys. The main age of the victims was between 10 to 19 years (adolescents) with 177 patients (45.4%). The most common cause of trauma was height falls (34.4%). According to the Glasgow Coma Scale, 89% had suffered mild TBI.

CONCLUSION: The main group of victims was the adolescents; the most important cause of TBI was height fall, with masculine predominance and mild trauma.

Key words: traumatic brain injury, children, adolescents, epidemiology.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a faixa etária pediátrica abrange indivíduos entre 0 e 19 anos de idade, podendo-se dividir em lactentes (menores de 2 anos de idade), pré-escolares (entre 2 e 6 anos), escolares (entre 7 e 9 anos) e adolescentes (entre 10 e 19 anos)1. Este grupo apresenta certas peculiaridades por representar uma população em fase de mudanças físicas e psíquicas, sendo no Brasil o grupo etário com maior número de pessoas, representando aproximadamente 40,2% da população2. O trauma mecânico destaca-se como determinante de óbito e seqüelas em crianças e adolescentes, e segundo dados do DataSus2 foram internados no ano de 2004, no Estado da Bahia, cerca de 40500 indivíduos por trauma mecânico sendo que 11800 apresentavam entre 0 e 19 anos.

Na cidade do Salvador, cerca de 30% das vítimas de TCE possuem até 20 anos de idade, correspondendo ao segundo grupo etário mais acometido por este tipo de trauma, antecedido pelos pacientes entre 21 e 40 anos, que abrangeram aproximadamente 41% do grupo estudado3. Quanto às principais causas de trauma, estas variam de acordo com o local assim como os costumes de uma população. Referentes às principais causas de trauma em crianças e adolescentes, destacam-se as quedas e os atropelamentos3-7.

Haja vista as elevadas taxas de letalidade e morbidade em vítimas de TCE na faixa etária pediátrica e a possibilidade de serem revisados os métodos preventivos, este estudo tem o objetivo de verificar a freqüência deste tipo de trauma na Cidade do Salvador, analisando o gênero, idade e tipo de trauma.

MÉTODO

Estudo descritivo corte transversal, realizado por um período de 1 ano, no Hospital Geral do Estado da Bahia (HGE), hospital de referência para o atendimento a politraumatizados (dados da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia).

Na intenção de diminuir possíveis vieses de observação, foram realizados estudo piloto e calibração de todo o grupo de pesquisa. Posteriormente, os dados foram coletados por meio de questionário preenchido pelo examinador com as descrições contidas em prontuário, referidos pela vítima ou acompanhante no momento da admissão na unidade de emergência, assim como informações dos responsáveis pelo atendimento extra-hospitalar do acidentado. O questionário era composto dos seguintes itens: número de registro, idade, gênero, procedência (capital ou interior), causa do trauma, achados tomográficos, associação com outros traumas, presença ou não de óbito, e pontuação na escala de coma de Glasgow no momento da admissão.

Foram incluídas todas as vítimas de TCE com idade até 19 anos atendidas no período supra citado (2003), que tiveram a necessidade de avaliação ou internação neurocirúrgica. Aqueles pacientes acima desta faixa etária, os que não foram avaliados pelo especialista ou que não aceitaram participar do estudo, foram atendidos normalmente porém não fizeram parte da amostra.

Os dados foram compilados em software pré-estabelecido (Statistical Package for the Social Sciences - SPSS Chicago - IL, USA, versão 9.0, 1998) com o objetivo principal de proferir uma análise descritiva das características das vítimas de TCE abaixo de 19 anos de idade na cidade do Salvador.

A pesquisa foi aprovada pela direção do HGE e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal da Bahia, parecer final número 25/2003.

RESULTADOS

Foram admitidas na emergência do HGE, no período do estudo, 390 vítimas de TCE até 19 anos de idade. Entre estes, 177(45,4%) eram adolescentes e 106 (27,2%) pré-escolares (Tabela 1). Houve predomínio do sexo masculino (71,8%), sendo a maioria dos pacientes (78,9%) procedente da cidade do Salvador.

Quanto ao período do ano relacionado à ocorrência do trauma, observou-se preponderância do primeiro trimestre (33,5%), seguido do terceiro trimestre (26%).

A causa mais comum de TCE foi queda de altura, com 134 (34,4%) relatos, seguida de atropelamento em 69 vitimas (17,7%) e da queda da própria altura, com 32 ocorrências (8,2%) (Tabela 2).

Em relação à gravidade do trauma, 51 pacientes (13%) não tinham relato quanto à pontuação na escala de coma de Glasgow; 60 pacientes (15,4%) tiveram TCE grave, 30 (7,7%) moderado e 249 (63,8%) apresentaram TCE leve.

DISCUSSÃO

O predomínio no sexo masculino atinge limites de variação de 2,2: 1 até 7,6:1, conforme evidenciam Boswell et al.8 e Sonneborn et al.9, respectivamente, cujo valor encontrado no presente estudo foi de 2,5:1. A maior prevalência quanto ao sexo masculino é verificada em diversos estudos anteriores3,4,10. O maior número de crianças e adolescentes vítimas de TCE no primeiro trimestre do ano, relacionada ao período de férias escolares, poderia corresponder a uma maior exposição aos agentes agressores, assim como atividades lúdicas nesta ocasião.

Observamos que as quedas de altura em crianças abaixo de 5 anos de idade estavam relacionadas principalmente com o colo da mãe, queda do berço, cama ou escada, enquanto, naqueles entre 6 e 10 anos, predominaram as quedas de escada, laje, cama, muro ou árvore. Na Cidade do Salvador existe grande quantidade de casas populares com lajes de obra contínua em concreto armado, a qual constitui sobrado, teto de um compartimento ou piso, desprovidas de segurança, as quais propiciam quedas.

Os atropelamentos nesta faixa etária devem-se ao fato de que, em alguns casos, as crianças andam sem a companhia dos pais ou responsáveis, aventuram-se em atravessar ruas durante jogos e brincadeiras infantis, sem a noção do perigo, além do descuido dos adultos que eventualmente as acompanham. Os resultados são confirmados por outros autores que destacam a preponderância das quedas e dos acidentes de trânsito, principalmente dos atropelamentos, em crianças e adolescentes3,10-14.

No que concerne à gravidade do trauma, segundo a escala de coma de Glasgow, observamos nos resultados atuais a preponderância do TCE leve (63,8%). O predomínio de vítimas com trauma leve em unidade de emergência é salientado em estudos anteriores, independente da faixa etária analisada, podendo a maioria ser dispensada de um tratamento neurocirúrgico específico10,15,16.

No presente estudo pôde-se observar que apesar do TCE ser importante determinante de óbitos e seqüelas em crianças e adolescentes vítimas de trauma mecânico, este é o primeiro trabalho específico para esta faixa etária realizado na cidade do Salvador. A partir da análise dos resultados pôde-se concluir que o grupo de adolescentes foi o mais atingido, sendo a queda de altura a principal causa de TCE, com predomínio do gênero masculino, havendo preponderância do trauma leve. São necessários outros estudos a fim de confirmar os resultados atuais, além de avaliar o desfecho clínico desses pacientes. Com os dados obtidos poderão ser instituídas ações de prevenção bem como estratégias de atendimento exclusivas para este grupo de pacientes.

Recebido 29 Março 2006, recebido na forma final 11 Julho 2006. Aceito 29 Agosto 2006.

Dr. José Roberto Tude Melo - Alameda dos Jasmins 200 / 702 B - 40290-200 Salvador BA - Brasil. E-mail: jmelo@hupes.ufba.br. Site: http://www.neurocirurgiahupes.ufba.br

  • 1. World Health Organization. Disponível em: http://www.who.int/child-adolescent-health. Acesso em 15 de dezembro de 2005.
  • 2. Ministério da Saúde/DataSUS. Informações demográficas e socioeconômicas. População residente. Disponível em: http://www.datasus.gov.br. Acesso em 20 de novembro de 2005.
  • 3. Melo JRT, Silva RA, Moreira JR, Duarte E. Característica dos pacientes com trauma craniencefálico na Cidade do Salvador, Bahia, Brasil. Arq. Neuropsiquiatr 2004;62:711-715.
  • 4. Koizume MS, Lebrão ML, Mello-Jorge MHP, Primerano V. Morbimortalidade por traumatismo crânio-encefálico no município de São Paulo, 1997. Arq Neuropsiquiatr 2000;58:1-13.
  • 5. Dantas VP Filho, Falcão ALE, Sardinha LAC, Facure JJ, Araújo S, Terzi RGG. Fatores que influenciaram a evolução de 206 pacientes com traumatismo craniencefálico grave. Arq Neuropsiquiatr 2004;62:313-318.
  • 6. Maldaun MVC, Zambelli HJL, Dantas VP, et al. Análise de 52 pacientes com traumatismo de crânio atendidos em UTI pediátrica: considerações sobre o uso da monitorização da pressão intra craniana. Arq Neuropsiquiatr 2002;60:967-970.
  • 7. Farage L, Colares VS, Capp M Neto, Moraes MC, Barbosa MC, Branco Jr JA. As medidas de segurança no trânsito e a morbimortalidade intrahospitalar por traumatismo craniencefálico do Destrito Federal. Rev Assoc Med Bras 2002;48:133-136.
  • 8. Boswell JE, McErlean M, Verdile VP. Prevalence of traumatic brain injury in an ED population. Am J Emerg Med 2002;20:177-180.
  • 9. Sonneborn R, Espinoza R, Geni R, Rodríguez A, Power E, Los Reys MP. Resultados del tratamiento de 588 pacientes con trauma múltiple. Rev Méd Chile 1998;126:1478-1482.
  • 10. Hawley CA, Ward AB, Long J, Owen DW, Magnay AR. Prevalence of traumatic brain injury amongst children admitted to hospital in one health district: a population-based study. Int J Care Injured 2003;34: 256-260.
  • 11. Andersson EH, Björklund R, Emanuelson I, Stalhammar D. Epidemiology of traumatic brain injury: a population based study in western Sweden. Acta Neurol Scand 2003;107:256-259.
  • 12. Thurman DJ, Alverson C, Dunn KA, Guerrero J, Sniezek JE. Traumatic brain injury in the United States: a public health perspectiva. J Head Trauma Rehabil 1999;14:602-615.
  • 13. Keenan HT, Runyan DK, Marshall SW, Nocera MA, Merten DF, Sianl SH. A population-based study of inflicted traumatic brain injury in young children. JAMA 2003;290:621-626.
  • 14. Kraus JF, Fife D, Cox P, Ramstein K, Conroy C. Incidence, severity, and external causes of pediatric brain injury. Am J Dis Child 1986;140: 687-93.
  • 15. Schutzman S A, Greenes DS. Pediatric minor head trauma. Ann Emerg Med 2001;37:65-74.
  • 16. Krauss JF, McArthur DL. Epidemiology of brain injury. In: Evans RW (ed). Neurology and trauma. Houston: Saunders, 1996:3-17.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Dez 2006
  • Data do Fascículo
    Dez 2006

Histórico

  • Recebido
    29 Mar 2006
  • Revisado
    11 Jul 2006
  • Aceito
    29 Ago 2006
Academia Brasileira de Neurologia - ABNEURO R. Vergueiro, 1353 sl.1404 - Ed. Top Towers Offices Torre Norte, 04101-000 São Paulo SP Brazil, Tel.: +55 11 5084-9463 | +55 11 5083-3876 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista.arquivos@abneuro.org