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Seleções para resistência e suscetibilidade, detecção e monitoramento da resistência de Tetranychus urticae ao acaricida clorfenapir

Selections for resistance and susceptibility, detection and monitoring of resistance to the acaricide chlorfenapyr in Tetranychus urticae koch (Acari: Tetranychidae)

Resumos

Problemas com resistência de ácaro-rajado, Tetranychus urticae Koch (Acari: Tetranychidae), a acaricidas têm sido registrados em diversos países, inclusive no Brasil. O estudo teve como objetivo caracterizar a resistência de T. urticae ao acaricida clorfenapir e avaliar a freqüência de resistência a esse composto em áreas comerciais de seis culturas no Estado de São Paulo. Seleções para resistência e suscetibilidade a clorfenapir foram realizadas em laboratório, utilizando-se uma população de T. urticae coletada em 2002 de um cultivo comercial de crisântemo em Holambra (SP). Após seis seleções para resistência e cinco seleções para suscetibilidade, foram obtidas as linhagens suscetível (S) e resistente (R) de T. urticae a clorfenapir. A razão de resistência (CL50 R/ CL50 S) obtida alcançou valores de 571 vezes. Estabeleceu-se uma concentração discriminatória de 37,4 mg L-1 de ingrediente ativo (i.a.) para o monitoramento da resistência de T. urticae a clorfenapir. O monitoramento foi realizado coletando-se 21 populações de ácaros em áreas comerciais de diferentes culturas (mamão, morango, feijão, tomate, crisântemo, rosa), em vários municípios do Estado de São Paulo. Arenas confeccionadas com folha de feijão foram infestadas com ácaros T. urticae e pulverizadas com clorfenapir, na sua concentração discriminatória, em torre de Potter. Os resultados indicaram grande variabilidade entre as populações com relação à suscetibilidade a clorfenapir. Foram observadas populações com freqüências de resistência entre 0,0 e 65,4%. As maiores freqüências de resistência foram observadas para populações coletadas de crisântemo em Holambra (SP).

ácaro-rajado; resistência a acaricida; controle químico


Problems associated with acaricide resistance in Tetranychus urticae Koch have been recorded in several countries including Brazil. The objective of this study was to characterize the resistance of T. urticae to the acaricide chlorfenapyr and to evaluate the resistance frequency in commercial fields of six crops in the State of São Paulo (SP). Selections for resistance and susceptibility to chlorfenapyr were performed in a population of T. urticae collected in 2002 from a commercial chrysanthemum field in Holambra county, SP. After six selections for resistance and five selections for susceptibility, susceptible (S) and resistant (R) strains of T. urticae to chlorfenapyr were obtained. The resistance ratio (R/S) at the LC50 reached values of 571-fold. A discriminating concentration of 37.4 mg L-1 of active ingredient (A.I.) was established for monitoring chorfenapyr resistance in T. urticae. Twenty one mite populations were collected from different crops (papaya, strawberry, bean, tomato, chrysanthemum, rose), in various counties in the State of São Paulo. Bean-leaf-disc arenas were infested with T. urticae mites and submitted to chlorfenapyr spraying at the discriminating concentration, using a Potter tower. The results showed significant differences among populations in their responses to chlorfenapyr. Populations with frequencies of resistance from 0,0 to 65.4% were detected. The highest frequencies of resistance were observed in populations obtained from chrysanthemum in Holambra.

Two-spotted spider mite; acaricide resistance; chemical control


FITOSSANIDADE

Seleções para resistência e suscetibilidade, detecção e monitoramento da resistência de Tetranychus urticae ao acaricida clorfenapir

Selections for resistance and susceptibility, detection and monitoring of resistance to the acaricide chlorfenapyr in Tetranychus urticae koch (Acari: Tetranychidae)

Mário Eidi SatoI; Marcos Zatti da SilvaI, II; Katia Gigliola CanganiI; Adalton RagaI

IInstituto Biológico, APTA, Caixa Postal 70, 13001-970 Campinas (SP) E-mail: mesato@biologico.sp.gov.br

IIBiólogo. Bolsista de Doutorado da CAPES

RESUMO

Problemas com resistência de ácaro-rajado, Tetranychus urticae Koch (Acari: Tetranychidae), a acaricidas têm sido registrados em diversos países, inclusive no Brasil. O estudo teve como objetivo caracterizar a resistência de T. urticae ao acaricida clorfenapir e avaliar a freqüência de resistência a esse composto em áreas comerciais de seis culturas no Estado de São Paulo. Seleções para resistência e suscetibilidade a clorfenapir foram realizadas em laboratório, utilizando-se uma população de T. urticae coletada em 2002 de um cultivo comercial de crisântemo em Holambra (SP). Após seis seleções para resistência e cinco seleções para suscetibilidade, foram obtidas as linhagens suscetível (S) e resistente (R) de T. urticae a clorfenapir. A razão de resistência (CL50 R/ CL50 S) obtida alcançou valores de 571 vezes. Estabeleceu-se uma concentração discriminatória de 37,4 mg L-1 de ingrediente ativo (i.a.) para o monitoramento da resistência de T. urticae a clorfenapir. O monitoramento foi realizado coletando-se 21 populações de ácaros em áreas comerciais de diferentes culturas (mamão, morango, feijão, tomate, crisântemo, rosa), em vários municípios do Estado de São Paulo. Arenas confeccionadas com folha de feijão foram infestadas com ácaros T. urticae e pulverizadas com clorfenapir, na sua concentração discriminatória, em torre de Potter. Os resultados indicaram grande variabilidade entre as populações com relação à suscetibilidade a clorfenapir. Foram observadas populações com freqüências de resistência entre 0,0 e 65,4%. As maiores freqüências de resistência foram observadas para populações coletadas de crisântemo em Holambra (SP).

Palavras-Chave: ácaro-rajado, resistência a acaricida, controle químico.

ABSTRACT

Problems associated with acaricide resistance in Tetranychus urticae Koch have been recorded in several countries including Brazil. The objective of this study was to characterize the resistance of T. urticae to the acaricide chlorfenapyr and to evaluate the resistance frequency in commercial fields of six crops in the State of São Paulo (SP). Selections for resistance and susceptibility to chlorfenapyr were performed in a population of T. urticae collected in 2002 from a commercial chrysanthemum field in Holambra county, SP. After six selections for resistance and five selections for susceptibility, susceptible (S) and resistant (R) strains of T. urticae to chlorfenapyr were obtained. The resistance ratio (R/S) at the LC50 reached values of 571-fold. A discriminating concentration of 37.4 mg L-1 of active ingredient (A.I.) was established for monitoring chorfenapyr resistance in T. urticae. Twenty one mite populations were collected from different crops (papaya, strawberry, bean, tomato, chrysanthemum, rose), in various counties in the State of São Paulo. Bean-leaf-disc arenas were infested with T. urticae mites and submitted to chlorfenapyr spraying at the discriminating concentration, using a Potter tower. The results showed significant differences among populations in their responses to chlorfenapyr. Populations with frequencies of resistance from 0,0 to 65.4% were detected. The highest frequencies of resistance were observed in populations obtained from chrysanthemum in Holambra.

Key words: Two-spotted spider mite, acaricide resistance, chemical control.

1. INTRODUÇÃO

O ácaro-rajado, Tetranychus urticae Koch (Acari: Tetranychidae), considerado um dos ácaros de maior importância econômica em todo o mundo, tem causado consideráveis prejuízos em diversas culturas no Brasil. O controle químico ainda é o principal método de controle desta praga. Mesmo quando aplicações regulares de acaricidas são realizadas, existem muitos casos em que o controle de T. urticae mostra-se ineficiente. Uma das razões desta ineficiência pode estar associada ao desenvolvimento de resistência do ácaro aos acaricidas (EDGE e JAMES, 1982). Além disso, o uso inadequado de pesticidas provoca problemas de ressurgência da praga, devido à eliminação dos inimigos naturais (VAN DE VRIE et al., 1972).

O desenvolvimento de resistência de T. urticae a acaricidas tem sido documentado para diferentes culturas em vários países (FLEXNER et al., 1988; TIAN et al., 1992; BEERS et al., 1998; STUMPF e NAUEN, 2001, HERRON e ROPHAIL, 2003; VAN LEEUWEN et al., 2004). Em trabalhos recentes desenvolvidos no Brasil, observou-se que algumas populações de T. urticae eram resistentes ou tolerantes a acaricidas como organofosforados (SUPLICY FILHO et al., 1994; SATO et al., 2000), fenpyroximate (SATO et al., 2004) e abamectin (SATO et al., 2005).

Clorfenapir é um pró-inseticida/acaricida e portanto não tem ação tóxica em sua forma inicial. Após entrar nas células de artrópodes, é convertido num potente inseticida/acaricida por ação de enzimas monooxigenases dependentes de citocromo P450 (HUNT e TREACY, 1998). Clorfenapir em sua forma ativa se deposita entre as membranas interna e externa da mitocôndria, promovendo a extrusão de H+ da mesma (BLACK et al., 1994). Esse processo não permite que se acumulem prótons suficientes na mitocôndria, o que leva a uma paralisação da fosforilização oxidativa, pela qual o difosfato de adenosina (ADP) deve ser convertido em trifosfato de adenosina (ATP). Sem a geração de ATP, as células param de funcionar, o que leva insetos e ácaros à morte. A absorção de clorfenapir pelas pragas ocorre principalmente por ingestão, havendo também alguma absorção por contato. Clorfenapir possui ação ovicida limitada. Nas plantas, essa molécula não tem ação sistêmica, mas sim ótima ação translaminar (DEKEYSER, 2005).

Clorfenapir é registrado e comumente utilizado no Brasil para o controle de ácaros, tais como T. urticae, Polyphagotarsonemus latus (Banks) e Aculops lycopersici (Massee) e de insetos, como Diabrotica speciosa (Germar), Liriomyza huidobrensis (Blanchard), Bemisia tabaci (Gennadius), Tuta absoluta (Meyrick), Thrips palmi Karny e Spodoptera frugiperda (JE Smith), em culturas como algodão, batata, cebola, citros, crisântemo, feijão, mamão, milho, rosa e tomate (AGROFIT, 2005).

Recentemente, alguns produtores de plantas ornamentais do Estado de São Paulo passaram a observar uma redução na eficiência de clorfenapir para o controle de ácaro-rajado, indicando um possível desenvolvimento de resistência de T. urticae ao acaricida. Essa pesquisa teve como objetivo caracterizar a resistência de T. urticae a clorfenapir e avaliar a freqüência de ácaros resistentes ao produto, oriundos de áreas comerciais no Estado de São Paulo.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1 População de ácaros e manutenção da criação

A população utilizada para as seleções artificiais foi obtida em área comercial de crisântemo, em Holambra (SP), em 2002. Após a coleta, os ácaros T. urticae foram mantidos e multiplicados em plantas de feijão-de-porco, Canavalia ensiformes L., cultivadas em vasos e mantidas em laboratório, em salas climatizadas (25 ± 1ºC, 70 ± 5% de UR e fotofase de 14h).

2.2 Procedimentos de bioensaio

Os testes com o acaricida foram realizados baseando-se no método descrito por KNIGHT et al. (1990). Foram colocadas 20 fêmeas adultas de T. urticae sobre um disco de folha de feijão (4 cm de diâmetro), colocado sobre uma camada de algodão hidrófilo, em uma placa de Petri (9 cm de diâmetro), formando uma arena. A camada de algodão foi mantida sempre saturada com água destilada. A pulverização foi realizada diretamente sobre os ácaros, utilizando-se Torre de Potter (Burkard Manufacturing, Rickmansworth, Herts, UK), calibrada a 68,9 kPa. Utilizou-se um volume de 2 mL da suspensão acaricida, em cada pulverização, obtendo-se uma deposição média de resíduo úmido de 1,6 mg cm-2 da arena.

Após o tratamento, os ácaros foram mantidos a 25 ± 1ºC, 70 ± 5% de UR e fotofase de 14 horas. As avaliações do número de ácaros vivos e mortos foram feitas 72 horas após o tratamento. Ácaros que não conseguiram se mover sobre a superfície da arena, ao serem tocados levemente com um pincel de pêlo macio, foram considerados mortos. Foram utilizadas 5 a 7 concentrações do acaricida clorfenapir (Suspensão Concentrada, 240 g L-1 de i.a.) para a obtenção das curvas de concentração-resposta. Os experimentos foram repetidos pelo menos três vezes.

2.3 Seleções artificiais com clorfenapir

Foram realizadas seleções artificiais para aumento da resistência a clorfenapir e concomitantemente, para o aumento da suscetibilidade ao produto. Tais seleções possibilitam a observação do potencial de evolução da resistência de T. urticae ao acaricida (magnitude da resistência) e a definição de uma concentração discriminatória para estudos de monitoramento de resistência.

2.3.1 Seleção para resistência

A seleção foi feita em laboratório, realizando-se a aplicação com torre de Potter, diretamente sobre os ácaros colocados em arenas de folha de feijão, como descrito anteriormente. Foram colocadas em média 50 fêmeas adultas de T. urticae por arena. Foram realizadas diversas seleções, utilizando-se concentrações crescentes do acaricida a cada ciclo de seleção, procurando-se obter mortalidades entre 60% a 80%. Foram utilizados pelo menos 1.500 ácaros em cada seleção, tendo sido realizados seis ciclos de seleção para resistência. O intervalo entre uma seleção e outra foi de 20 a 26 dias. Os sobreviventes após 72 horas do tratamento foram utilizados para a formação de novas colônias. A criação destes ácaros foi desenvolvida como descrita anteriormente.

2.3.2 Seleção para suscetibilidade

A seleção para suscetibilidade foi baseada no método descrito por Fournier et al. (1988). Fêmeas de T. urticae previamente expostas ao acasalamento foram isoladas em arenas constituídas de círculos de folha de feijão-de-porco (2,5 cm de diâmetro) colocados sobre um disco de papel de filtro, mantido sempre umedecido, no interior de uma placa de Petri. As fêmeas foram mantidas nestas arenas por 48 horas, período em que houve a oviposição média de 11,4 ovos por fêmea. Após este período, cada fêmea de ácaro-rajado foi transferida para outra arena, semelhante à anterior, onde foi submetida à aplicação de uma suspensão do acaricida em torre de pulverização. Os ovos e as formas jovens correspondentes às fêmeas que morreram em 72 horas após o tratamento foram utilizados para a formação das novas gerações.

Foram realizadas cinco seleções para suscetibilidade, utilizando-se concentrações decrescentes do acaricida estudado, para cada ciclo de seleção, que causaram mortalidades entre 30% e 45% nas fêmeas de T. urticae. O intervalo entre as seleções variou de 24 a 33 dias.

Após seis seleções para resistência e cinco seleções para suscetibilidade, foram obtidas as linhagens suscetível (S) e resistente (R) de T. urticae a clorfenapir.

Os dados de mortalidade para as linhagens S e R foram submetidos à analise de Probit (FINNEY, 1971), utilizando-se o programa POLO-PC (LeOra SOFTWARE, 1987). A razão de resistência foi obtida através da divisão da CL50 (concentração letal média) da linhagem R pela CL50 da linhagem S.

2.4. Estimativa de concentração discriminatória

A concentração discriminatória é aquela que elimina os indivíduos suscetíveis sem afetar os resistentes. Para clorfenapir, a concentração discriminatória foi estabelecida como aquela correspondente à CL99 do produto, obtida para a população suscetível, após as seleções para suscetibilidade.

A partir do estabelecimento da concentração discriminatória foi possível monitorar a resistência, baseando-se apenas na mortalidade dos ácaros para uma única concentração do acaricida. De acordo com HALLIDAY e BURNHAM (1990), esse método é mais eficiente que o monitoramento da resistência feito com base na estimativa da CL50, podendo-se detectar a resistência em populações em que a freqüência de indivíduos resistentes ainda seja baixa.

2.5 Monitoramento da resistência

Foram coletadas populações de T. urticae em culturas comerciais de mamão, morango, feijão, tomate, crisântemo e rosa, oriundas dos municípios paulistas de Araras, Atibaia, Campinas, Cordeirópolis, Leme, Monte Alegre do Sul, Pereiras, Piedade, Regente Feijó e Serra Negra, totalizando 21 populações.

Após a coleta, os ácaros foram transferidos para plantas de feijão-de-porco, onde foram mantidos por um período de 14 a 26 dias, em condições de laboratório (25 ± 1ºC, 70 ± 5% de UR e fotofase de 14 horas). Os testes toxicológicos foram realizados seguindo-se o mesmo método descrito anteriormente (pulverização direta sobre os ácaros), porém utilizando-se apenas uma única concentração de clorfenapir, equivalente à sua concentração discriminatória. Foram utilizados pelo menos 240 ácaros (quatro repetições de 60 ácaros/arena), para a obtenção da freqüência de resistência de T. urticae, para cada população avaliada.

As porcentagens de mortalidade para cada população de ácaro-rajado foram corrigidas através da fórmula de Abbott (ABBOTT, 1925), transformados para arc sen . As médias de sobrevivência foram comparadas pelo teste de Tukey. O nível de significância dos testes foi de a = 0,05.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Seleções artificiais com clorfenapir

Após seis seleções para resistência, a CL50 de clorfenapir passou de 107 para 2.254 mg L-1 de i.a., representado um aumento de 21 vezes. As seleções para suscetibilidade também possibilitaram alterações na sensibilidade dos ácaros ao clorfenapir, havendo reduções da CL50 de 107 para 3,95 mg L-1, em cinco seleções. A intensidade de resistência observada após as seleções foi de 571 vezes (Tabela 1).

Na população de T. urticae coletada de crisântemo, em 2002, no município de Holambra (SP), já se observava resistência moderada a clorfenapir, antes do início das seleções em laboratório. A CL50 de 107 mg L-1 de i.a. observada para a população não selecionada era 27,1 vezes maior do que a da linhagem S, selecionada cinco vezes para suscetibilidade a clorfenapir.

A maior CL50 de clorfenapir obtida para a linhagem R após o processo de seleção para resistência (2254 mg L-1 de i.a.) foi correspondente a aproximadamente 23,5 vezes a sua concentração recomendada (72 a 120 mg L-1 de i.a.) para o controle de ácaro-rajado em crisântemo no Brasil (Agrofit, 2005). Pelo resultado, observa-se que devido à elevada intensidade de resistência obtida com um número pequeno de seleções, a resistência de T. urticae a clorfenapir pode vir a se tornar um problema relevante em um período curto de tempo, em áreas onde são realizadas aplicações freqüentes desse produto.

Estudos anteriores sobre seleções artificiais de T. urticae com fempiroximate, realizados no Instituto Biológico, também mostraram rápida evolução de resistência do ácaro-rajado a esse acaricida. Para fempiroximate, a razão de resistência (CL50 R / CL50 S) alcançou 2.910 vezes, após cinco seleções para resistência e três seleções para suscetibilidade (SATO et al., 2004). Altas intensidades de resistência de T. urticae a acaricidas também têm sido registradas por diversos autores (CAMPOS et al., 1996; STUMPF e NAUEN, 2001; KIM et al., 2004).

3.2 Monitoramento da resistência

A coleta de 21 amostras de T. urticae de diversas culturas no Estado de São Paulo revelou que a maioria das populações avaliadas ainda se mostra suscetível ao acaricida clorfenapir. A maioria das populações (66,7%) possuía freqüência de resistência igual ou inferior a 7,5%, não diferindo estatisticamente (p > 0,05) da linhagem suscetível (S) de referência, selecionada para suscetibilidade. Apenas duas populações coletadas em áreas comerciais de crisântemo, em Holambra (SP), tinham freqüências de resistência acima de 30%. Uma dessas populações apresentou aproximadamente 65% de ácaros resistentes (Tabela 2). Pelos resultados observa-se que já existem populações de ácaros com elevada freqüência de resistência, principalmente em ornamentais. Esse é o primeiro registro de populações de T. urticae resistentes a clorfenapir no Brasil. A resistência de ácaro-rajado a clorfenapir já havia sido registrada em outros países. Na Austrália, falhas no controle de T. urticae foram observadas após uma única aplicação do produto em nectarina (Herron e Rophail, 2003). Embora não se tenha registro de uso do acaricida clorfenapir nas áreas de morangueiro de onde foram coletadas as populações testadas de T. urticae, em uma das populações, obtida em Atibaia (SP), verificou-se uma pequena percentagem (7,98%) de ácaros resistentes. Uma das possíveis explicações para esse fato seria uma seleção prévia realizada com outros produtos, aplicados pelo agricultor, com resistência cruzada a clorfenapir.

Alguns organofosforados como dimetoato foram utilizados por muitos anos em morangueiros comerciais da região de Atibaia para o controle de insetos (ex.: pulgões) e ácaros, levando ao desenvolvimento de resistência de T. urticae a esse produto, em várias populações desta praga (SATO et al., 1994). Essa população de ácaro-rajado coletada em Atibaia (Morango - Atibaia III) foi altamente tolerante a dimetoato, com CL50 ao redor de 3300 mg L-1 de i.a., que corresponde a uma concentração 10 vezes acima da recomendada do produto para o controle de T. urticae, em várias culturas (AGROFIT, 2005). Essa seleção prévia feita pelo agricultor com dimetoato poderia ser um dos motivos da detecção de resistência a clorfenapir em morangueiro dessa região. Esta hipótese é baseada em VAN LEEUWEN et al. (2004) que observaram resistência cruzada positiva entre dimetoato e clorfenapir, comparando uma população suscetível de T. urticae com uma resistente selecionada com clorfenapir (12 ciclos de seleção), em condições de laboratório.

Experimentos com os sinergistas S,S,S-tributilfosforotritioato (DEF), butóxido de piperonila (PBO) e dietil maleato (DEM), inibidores de esterases, monooxigenases dependentes de citocromo P450 e glutationa S-transferases, respectivamente, sugeriram o envolvimento de esterases na resistência de T. urticae a clorfenapir (VAN LEEUWEN et al., 2004). Um mecanismo comum de aumento de degradação metabólica para dimetoato e clorfenapir poderia ser uma das explicações da presença de ácaros resistentes a clorfenapir, em áreas de morangueiro livres da aplicação deste acaricida.

Com a confirmação da existência de populações de T. urticae resistentes a clorfenapir em algumas culturas no Estado de São Paulo, torna-se importante a realização de outros estudos como os de estabilidade da resistência, para se conhecer como a resistência se comporta em condições de campo. Caso a resistência seja instável, algumas medidas, como a rotação de acaricidas (DENNEHY et al., 1990), podem ser exploradas de forma efetiva no manejo da resistência de T. urticae a clorfenapir. A concentração discriminatória estabelecida para clorfenapir poderá ser muito útil para o monitoramento da resistência ao acaricida e também para avaliar a eficácia das estratégias de manejo de resistência que sejam adotadas pelo agricultor.

4. CONCLUSÕES

1. Foram registradas pela primeira vez populações de T. urticae resistentes a clorfenapir no Brasil.

2. Há diferenças significativas na suscetibilidade a clorfenapir entre populações de ácaro-rajado coletadas em diferentes culturas e localidades no Estado de São Paulo.

3. A razão de resistência de T. urticae a clorfenapir alcançou 571 vezes.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), pelo suporte financeiro desta pesquisa (Processos: 1999/11926-2 e 2005/04454-0), e ao (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Brasil) pela concessão de bolsa para Marcos Zatti da Silva (PIBIC/CNPq/IB).

Recebido para publicação em 27 de dezembro de 2005 e aceito em 20 de setembro de 2006.

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    Autor correspondente.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Abr 2007
    • Data do Fascículo
      2007

    Histórico

    • Aceito
      20 Set 2006
    • Recebido
      27 Dez 2005
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