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Mineralização do nitrogênio proveniente da aplicação do resíduo da indústria processadora de goiabas em Argissolo

Nitrogen mineralization from the application of the residue of guava processing industry in Ultisol

Resumos

Informações sobre a mineralização de subprodutos são importantes para o correto manejo desses materiais em áreas agrícolas. Assim, objetivou-se avaliar a mineralização do nitrogênio proveniente do resíduo da indústria processadora de goiabas, aplicado em Argissolo cultivado com goiabeiras. Amostras do solo mais o subproduto foram acondicionados em frascos de polietileno com capacidade de 0,25 dm³. Foram pesados 100 g de solo mais o resíduo referente a cada tratamento (doses do subproduto: 0; 9; 18 e 36 t ha-1), sendo tal procedimento realizado em triplicata. O período máximo de incubação foi de 11 semanas, analisando-se as amostras nos seguintes tempos: 0; 7; 14; 28; 42; 56; 70; 84; 98; 112 e 126 dias. A umidade foi corrigida para 70% da capacidade de retenção de água do solo, sendo monitorada diariamente através de pesagens dos potes. Nos tempos estabelecidos realizou-se a desmontagem de três frascos correspondentes a cada tratamento, determinando-se o nitrogênio inorgânico. Pode-se afirmar que a mineralização do N ou a liberação é lenta, ou seja, não há rápida disponibilização de nitrogênio. No período avaliado, 126 dias, a fração média de mineralização foi de 23% e, a meia vida média de 73 dias.

Psidium guajava; agroindústria; adubação orgânica; subproduto; sementes de goiaba


Information on the mineralization of residues are important for proper management of these materials in agricultural areas. The objective was to evaluate the mineralization of nitrogen from the residue of guava processing industry, applied in a Ultisol cultivated with guava trees. Soil samples and the residue were placed in polyethylene pots with a capacity of 0.25 dm³. Around 100 g of soil plus waste were weighed in each treatment (doses of residue: 0, 9, 18 and 36 t ha-1), with such a procedure being performed in triplicate. The maximum incubation period was 11 weeks, with analyses at 0, 7, 14, 28, 42, 56, 70, 84, 98, 112 and 126 days of treatment. The soil+residue humidity was adjusted to 70% of the soil water retention capacity and monitored daily by weighing the pots. The inorganic nitrogen was measured in each evaluation time. It can be stated that the N mineralization or release is slow and there is not rapid availability of nitrogen. Over the period of 126 days, the mean fraction of mineralization was 23% with the half-life of 73 days.

Psidium guajava; industry of food; organic fertilizer; by-product; seeds of guava


SOLOS E NUTRIÇÃO DE PLANTAS

Mineralização do nitrogênio proveniente da aplicação do resíduo da indústria processadora de goiabas em Argissolo

Nitrogen mineralization from the application of the residue of guava processing industry in Ultisol

Henrique Antunes de SouzaI, **) Autor correspondente: henrique@cnpc.embrapa.br; William NataleII; Viviane Cristina ModestoII; Danilo Eduardo RozaneIII

IEmbrapa Caprinos e Ovinos, Caixa Postal 145, 62010-970 Sobral (CE), Brasil

IIUNESP, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Departamento Solos e Adubos, Via de Acesso Prof. Paulo Donato Castellane, s/n, 14884-900 Jaboticabal (SP), Brasil

IIIUNESP, Campus Experimental de Registro, Rua Nelson Brihi Badur, 430, 11900-000 Registro (SP), Brasil

RESUMO

Informações sobre a mineralização de subprodutos são importantes para o correto manejo desses materiais em áreas agrícolas. Assim, objetivou-se avaliar a mineralização do nitrogênio proveniente do resíduo da indústria processadora de goiabas, aplicado em Argissolo cultivado com goiabeiras. Amostras do solo mais o subproduto foram acondicionados em frascos de polietileno com capacidade de 0,25 dm3. Foram pesados 100 g de solo mais o resíduo referente a cada tratamento (doses do subproduto: 0; 9; 18 e 36 t ha-1), sendo tal procedimento realizado em triplicata. O período máximo de incubação foi de 11 semanas, analisando-se as amostras nos seguintes tempos: 0; 7; 14; 28; 42; 56; 70; 84; 98; 112 e 126 dias. A umidade foi corrigida para 70% da capacidade de retenção de água do solo, sendo monitorada diariamente através de pesagens dos potes. Nos tempos estabelecidos realizou-se a desmontagem de três frascos correspondentes a cada tratamento, determinando-se o nitrogênio inorgânico. Pode-se afirmar que a mineralização do N ou a liberação é lenta, ou seja, não há rápida disponibilização de nitrogênio. No período avaliado, 126 dias, a fração média de mineralização foi de 23% e, a meia vida média de 73 dias.

Palavras-chave: Psidium guajava, agroindústria, adubação orgânica, subproduto, sementes de goiaba.

ABSTRACT

Information on the mineralization of residues are important for proper management of these materials in agricultural areas. The objective was to evaluate the mineralization of nitrogen from the residue of guava processing industry, applied in a Ultisol cultivated with guava trees. Soil samples and the residue were placed in polyethylene pots with a capacity of 0.25 dm3. Around 100 g of soil plus waste were weighed in each treatment (doses of residue: 0, 9, 18 and 36 t ha-1), with such a procedure being performed in triplicate. The maximum incubation period was 11 weeks, with analyses at 0, 7, 14, 28, 42, 56, 70, 84, 98, 112 and 126 days of treatment. The soil+residue humidity was adjusted to 70% of the soil water retention capacity and monitored daily by weighing the pots. The inorganic nitrogen was measured in each evaluation time. It can be stated that the N mineralization or release is slow and there is not rapid availability of nitrogen. Over the period of 126 days, the mean fraction of mineralization was 23% with the half-life of 73 days.

Key words:Psidium guajava, industry of food, organic fertilizer, by-product, seeds of guava.

1. INTRODUÇÃO

A utilização de resíduos orgânicos, urbanos ou industriais, em áreas agrícolas pode ser justificada pela necessidade de um destino apropriado para esses materiais visando à sua reciclagem, visto que a geração desses resíduos tem aumentado rapidamente com o tempo.

Em todo o mundo as preocupações e as pesquisas com adubação orgânica têm voltado ao centro das discussões. É crescente o interesse dos governos, das instituições agronômicas e dos produtores rurais, por informações sobre o tema. Entretanto, ainda que a reciclagem de materiais orgânicos seja cada vez mais importante, os conhecimentos sobre seu valor fertilizante para a agricultura permanecem rudimentares.

Uma alternativa interessante é procurar utilizar corretamente os resíduos na propriedade, buscando novas fontes de insumos e materiais não convencionais, o que pode ser uma real oportunidade para a diversificação da propriedade agrícola.

O mercado de frutas frescas e de matéria-prima para a industrialização é altamente promissor. Além disso, o Brasil possui bom potencial edafoclimático, com aptidão para a maioria das frutíferas de interesse comercial. Com a industrialização das frutas há a geração de resíduos, os quais, se bem manejados, podem retornar ao pomar reduzindo a utilização de adubos minerais, e, diminuindo os impactos ambientais negativos de um descarte inadequado.

Do ponto de vista da nutrição nitrogenada das plantas, não importa qual a fonte escolhida para a adubação (orgânica ou química), desde que usada adequadamente e seja capaz de disponibilizar N às plantas em formas minerais. Durante a mineralização de resíduos orgânicos no solo, um dos produtos é o amônio (NH4+), que pode ser retido pelo solo, absorvido pelas plantas ou convertido em nitrato (NO3-). O nitrato, por sua vez, pode ser absorvido pelas plantas, lixiviado para fora da zona de absorção das raízes ou ser convertido em nitrogênio gasoso, sendo perdido para a atmosfera (BOEIRA, 2004).

A fração de mineralização de nitrogênio dos materiais orgânicos pode ser usada como um dos critérios para a definição de doses máximas a aplicar em determinada situação de solo, de clima e cultura, quando não houver outros critérios mais restritivos ao uso do resíduo como elevadas concentrações de fósforo, de metais pesados, de patógenos, ou de outras substâncias prejudiciais (BOEIRA, 2004).

A agroindústria de processamento de goiabas gera um resíduo constituído basicamente de sementes, rico em nitrogênio. Desse modo, objetivou-se avaliar a mineralização do nitrogênio desse subproduto, em condições aeróbicas e sem lixiviação.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Para a determinação da fração de mineralização do nitrogênio (FMN) do resíduo da indústria processadora de goiabas seguiu-se os procedimentos de COSCIONE e ANDRADE (2006). As avaliações foram realizadas em Jaboticabal (SP).

O solo utilizado foi coletado em pomar de goiabeiras adulto com oito anos de idade, cultivar Paluma, em Vista Alegre do Alto (SP). A amostra do Argissolo Vermelho-Amarelo (EMBRAPA, 1999) foi coletada na camada superficial de 0-20 cm, sendo caracterizada em termos químicos segundo RAIJ et al. (2001), cujos resultados são: 5,6; 16; 47; 2,9; 34; 22; 18; 58,5; 76,9 e 77 para pH (CaCl2); M.O. (g dm-3); P (mg dm-3); K; Ca; Mg; SB; H+Al; T (mmolc dm-3) e V(%) respectivamente.

De acordo com os dados apresentados para a análise de solo, verifica-se que as condições de saturação por bases e fertilidade do solo estão adequadas para a cultura da goiaba, segundo NATALE et al. (1996; 2007).

As características químicas do resíduo utilizado no estudo são as seguintes: 4,6; 11,6; 1.749; 18,7; 290; 2,1; 2,3; 0,8; 0,9; 1,3; 10; 10; 150; 12; 28 e 25 para pH (CaCl2); N total (g kg-1); N-NH4+; N-NO-3 (mg kg-1); C org; P; K; Ca; Mg; S (g kg-1); B; Cu; Fe; Mn; Zn (mg kg-1) e C/N respectivamente, determinadas de acordo com ABREU et al. (2009). O resíduo é um material orgânico considerado "limpo", visto ser formado basicamente de sementes da fruta e alguma mucilagem, com teores dos elementos essenciais próximos ao das sementes frescas, conforme determinação de CÔRREA et al. (2005). O material foi obtido na Indústria de Polpas e Conservas Val Ltda., localizada no município de Vista Alegre do Alto (SP). Ainda na indústria, em pátio aberto, o resíduo foi exposto ao sol para secar e, em seguida, moído. Conforme a Instrução Normativa 25 (BRASIL, 2009), fez-se a caracterização física do resíduo moído, determinando-se as granulometrias: retido 0,044% na peneira ABNT 10; 25,51% na peneira ABNT 20; 61,25% na peneira ABNT 50 e, 13,20% passante na peneira ABNT 50. Determinou-se, também, a umidade gravimétrica do subproduto, após secagem a 65-70 ºC, em estufa de circulação forçada de ar. O material continha 6,45% de teor de água. Segundo a legislação vigente (BRASIL, 2009), que regulamenta as especificações de compostos e biofertilizantes, o resíduo pode ser classificado como fertilizante orgânico simples, classe "A", cujas características são: a produção utiliza matéria-prima de origem vegetal ou de processamento da agroindústria, não empregando no processo metais pesados tóxicos, elementos ou compostos orgânicos sintéticos potencialmente tóxicos, resultando em produto de utilização segura na agricultura.

Foram incubadas quatro doses do subproduto com o Argissolo, equivalentes a zero; 9; 18 e 36 t ha-1 de resíduo adicionado ao solo, sem lixiviação. Vale ressaltar que a dose de 18 t ha-1 corresponde à recomendação de N para goiabeiras adultas, para uma produção esperada de 60 t ha-1 de frutos (NATALE et al.,1996).

As amostras do solo mais o resíduo foram acondicionados em frascos de polietileno com capacidade de 0,25 dm3. Foram pesados 100 g de solo, mais o resíduo referente a cada tratamento, sendo tal procedimento realizado em triplicata.

O período de incubação máximo foi de 11 semanas, analisando-se as amostras nos seguintes tempos: 0; 7; 14; 28; 42; 56; 70; 84; 98; 112 e 126 dias. A umidade foi corrigida para 70% da capacidade de retenção de água do solo (CRAS), segundo COSCIONE e ANDRADE (2006), sendo monitorada diariamente através da pesagem dos potes.

Nas datas predeterminadas realizou-se a desmontagem de três frascos, correspondentes a cada tratamento, determinando-se o nitrogênio inorgânico, segundo método proposto por CANTARELLA e TRIVELIN (2001), que consiste na destilação de extratos do solo em KCl 1 mol L-1, em microdestilador Kjeldahl e, subsequente titulação do destilado. A umidade do solo foi determinada e os resultados foram corrigidos para solo seco.

Paralelamente à avaliação do nitrogênio inorgânico, realizou-se a determinação do pH, nos mesmos tempos de incubação, segundo a metodologia de RAIJ et al. (2001).

Os dados foram ajustados à equação de regressão exponencial de cinética de primeira ordem (COSCIONE E ANDRADE, 2006):

em que:

Nm = N-inorgânico mineralizado (mg kg-1) no tempo t (dias);

N0 = N-potencialmente mineralizável (mg kg-1); e

k = constante de mineralização (dia-1).

Foi calculado o valor de T½, que é o tempo necessário para que metade do N0 seja mineralizado: T½ = ln 2/k.

A fração de mineralização (FM), que é a porcentagem de N orgânico aplicado e mineralizado no período de incubação, foi calculada de acordo com CETESB (1999) e COSCIONE e ANDRADE (2006):

em que:

Nm: N-mineralizado no tratamento com resíduo, em mg kg-1;

Nm0: N-mineralizado no tratamento sem resíduo, em mg kg-1; e

Nadicionado: quantidade de N adicionado, em mg kg-1.

O nitrogênio disponível foi determinado da seguinte maneira, também de acordo com CETESB (1999), para a aplicação do resíduo na superfície:

em que:

FM = Fração de mineralização (%);

Nkj = Nitrogênio total (Kjedahl) (mg kg-1);

Na = Nitrogênio amoniacal (mg kg-1);

Nn = Nitrogênio nitrato (mg kg-1); e

Ni = Nitrogênio nitrito (mg kg-1).

Com os resultados de FM e N disponível foi calculada a taxa de aplicação (TA), seguindo a mesma fórmula utilizada para lodos de esgoto (CETESB, 1999; ABREU et al., 2009):

Para os cálculos do nitrogênio recomendado, considerou-se a sugestão de NATALE et al. (1996), de 800 g de N por planta, para uma produtividade de 60 t ha-1 de frutos, em goiabeiras adultas, cultivar Paluma, no espaçamento de 7 x 5 m (padrão para a cultivar).

Os valores resultantes foram tabelados segundo recomendação de COSCIONE E ANDRADE (2006).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os valores médios de nitrogênio inorgânico (NH4+ + NO3-), para cada dose do subproduto e tempo de incubação estão apresentados na tabela 1.

Analisando os valores de nitrogênio líquido verificam-se valores negativos, em alguns tempos, os quais podem ser devidos a uma possível imobilização do N (Tabela 2). Tal comportamento também foi constatado em outro trabalho com incubação de resíduos, ou seja, uma imobilização inicial do N (BOEIRA et al., 2002).

Alguns estudos já foram realizados com o resíduo da indústria processadora de goiabas, com o objetivo de retornar este material aos pomares de goiabeiras, minimizando o uso de adubos químicos, como CORRÊA et al. (2005) e MANTOVANI et al. (2004), indicando o potencial de uso deste subproduto como fonte de nutrientes para as plantas.

Na tabela 3 são apresentados os dados da fração de mineralização do nitrogênio (FMN), para cada dose utilizada, após a incubação por 126 dias. De acordo com os resultados, pode-se observar que a FMN média das três doses foi de 23%. A relação C/N (25:1) indica que o resíduo possui boas quantidades de material energético e proteico, possibilitando adequada mineralização do nitrogênio. Pode, porém, haver variação na fração de mineralização do N, como em estudos com lodo de esgoto (BOEIRA et al., 2002). Assim, a avaliação da fração de mineralização observada no presente estudo, torna-se importante para o conhecimento da liberação de N para as culturas.

A fração de mineralização de N representa a quantidade de nitrogênio presente em compostos orgânicos que será liberada no solo. No processo de mineralização, o N se torna disponível para absorção pelas plantas nas formas de nitrato, nitrito e compostos amoniacais (BOEIRA et al., 2009).

A rápida mineralização inicial, seguida de diminuição e tendência à estabilização após algumas semanas, é comum em estudos de mineralização de resíduos aplicados em solos (MANTOVANI et al., 2006).

MANTOVANI et al. (2006) estimaram a fração de mineralização de 12% para composto de lixo urbano incubado por 126 dias em Argissolo. Verificaram, ainda, que com a aplicação das maiores doses de composto de lixo, houve menores frações de mineralização. Os autores justificaram esse resultado como decorrente de perdas de N por desnitrificação, em função do aumento das doses de adubo orgânico aplicado.

Por outro lado, a rápida mineralização inicial de grandes quantidades de N poderá ocorrer bem antes do que as plantas, como as anuais, tenham desenvolvido um sistema radicular capaz de absorver todo o amônio ou o nitrato que é gerado; esse N poderá, então, ser perdido por volatilização, ou lixiviado no perfil do solo, diminuindo o efeito benéfico para a nutrição das culturas, podendo incorrer impacto ambiental indesejado (BOEIRA, 2004). Porém, no presente estudo, a planta que se beneficiará da aplicação do resíduo é uma frutífera perene adulta (goiabeira), ou seja, tal fato, de um rápido aporte de N ser perdido por lixiviação, pela não formação de um extenso sistema radicular, possivelmente é minimizado, haja vista que a goiabeira tem um sistema radicular profundo e abrangente (FRACARO e PEREIRA, 2004).

Na tabela 4 são apresentados os dados referentes ao ajuste do modelo de cinética de primeira ordem, correspondendo ao nitrogênio potencialmente mineralizável em todo o período (126 dias), além da constante de velocidade de reação de mineralização e, da meia vida de mineralização. Com esses resultados, pode-se estimar o potencial de mineralização de N do solo tratado com o resíduo, ou seja, a quantidade máxima esperada do nutriente (em formas inorgânicas) que será liberado no solo tratado com o subproduto, na dose correspondente àquela aplicada (BOEIRA, 2004).

O N potencialmente mineralizável (N0) aumentou com a aplicação das doses de resíduo, sendo a variação entre 69,04 e 292,88 mg kg-1 (Tabela 4). Assim, verifica-se grande elevação, mais de 400%, com a aplicação do resíduo em sua maior dose, ou seja, houve ganhos na disponibilidade de nitrogênio. As constantes de mineralização (k), ao contrário, diminuíram com o aumento das doses de subproduto aplicadas ao solo (Tabela 4), muito provavelmente devido à recalcitrância do material empregado, dificultando a ação dos microrganismos. Resultados semelhantes foram obtidos em ensaio de mineralização de nitrogênio com lodo de esgoto (BOEIRA et al., 2002) e com água residuária da suinocultura (BARROS et al., 2010). O T½ (meia vida do nitrogênio do resíduo), tempo necessário para a degradação de 50% do N orgânico, aumentou com as doses aplicadas, e a meia vida variou entre 29 e 84 dias. O valor da meia vida correlaciona-se com a constante de mineralização, e com a aplicação de doses maiores do resíduo, há tendência de fornecimento de N mais lentamente. Pode-se afirmar que a mineralização do N, ou sua liberação, é mais lenta, tendo comportamento semelhante ao do lodo de esgoto, o qual é o resíduo mais estudado e utilizado como referência. BOEIRA et al. (2002), trabalhando com o lodo de esgoto de Barueri, verificaram que houve mineralização lenta desse material orgânico.

Em amplo estudo sobre a mineralização potencial e líquida de nitrogênio orgânico em solos, correlacionando-o com a disponibilidade de N para as plantas, YAGI et al. (2009) concluíram que as quantidades de N potencialmente mineralizável, obtidas com incubação aeróbia, refletiram na mineralização e na disponibilidade de N em longo prazo. Observaram, porém, que nem todo o N mineralizável se torna disponível às plantas devido à dinâmica do elemento, como lixiviação, imobilização microbiana e, possivelmente, às perdas de N por desnitrificação.

Logo, a realização de experimentos no campo empregando resíduos pode elucidar melhor os resultados observados em condições controladas, sendo pois recomendável sua condução.

Na figura 1 é apresentado o nitrogênio mineralizado acumulado (NH4+ + NO3-), ajustado à equação de regressão exponencial de cinética de primeira ordem. No presente ensaio, a variação do N potencialmente mineralizável na camada de 0-20 cm de solo, representaria, em média: 138 (testemunha); 334 (dose de 9 t ha-1); 533 (dose de 18 t ha-1) e 586 (dose de 36 t ha-1) kg de N ha-1. De acordo com a sugestão de NATALE et al. (1996), para produções superiores a 100 t de frutos de goiabeira por hectare deve-se aplicar 400 kg de N ha-1. Desta maneira, verifica-se que a utilização do resíduo da indústria processadora de goiabas supriria a demanda de N da cultura.


BARRETO et al. (2010) notaram como nitrogênio potencialmente mineralizável, em trabalho avaliando a serapilheira de solos cultivados com eucalipto, valores de 58 a 87 mg kg-1, em ensaio de mineralização desenvolvido por 19 semanas de incubação, o que representa, segundo os autores, 70 a 104 kg ha-1 na camada de 0-10 cm.

Observa-se, ainda, que com a aplicação do resíduo, o potencial de mineralização de N aumentou 2,4 vezes com a dose de 9 t ha-1; 3,8 vezes com a dose de 18 t ha-1 e, 4,3 vezes com a maior dose (36 t ha-1), em relação à testemunha. BARROS et al. (2010) observaram que o valor de concentração de nitrogênio potencialmente mineralizável em solo com a aplicação de água residuária de suinocultura foi 2,5 vezes superior, em relação à concentração obtida sem a aplicação.

A taxa de aplicação do subproduto, calculada segundo a CETESB (1999) e ABREU et al. (2009), pode ser estimada em 72 t ha-1 de resíduo da indústria processadora de goiabas, considerando a aplicação de 800 g de N por goiabeira, em pomar adulto (7 x 5 m).

BOEIRA e MAXIMILIANO (2009) citam que como a determinação da taxa agronômica de aplicação de resíduos é crítica na prevenção da lixiviação de nitrato, é importante o estudo da dinâmica de N em condições tropicais, considerando o ajuste real das doses às necessidades das plantas cultivadas. Para isso, a maior dificuldade é a predição das taxas de mineralização de N.

Na tabela 5 são apresentados os valores referentes ao comportamento do pH, no período de estudo. Verifica-se que, para as doses de subproduto empregadas, há diminuição do valor pH com o tempo de incubação. CORRÊA et al. (2005) observaram resultados com o mesmo comportamento para o pH em solo incubado com o subproduto da indústria processadora de goiabas. BOEIRA et al. (2002) citam que há correlação significativa entre o valor pH e o nitrogênio determinado em estudos de incubação de resíduos.

Portanto, a aplicação do resíduo da indústria processadora de goiabas tende a acidificar o solo, principalmente com o uso de doses elevadas do subproduto.

4. CONCLUSÃO

A fração de mineralização do N orgânico, aplicado ao Argissolo via resíduo da indústria processadora de goiabas, é estimada em 23% e, a meia vida média é de 73 dias. A velocidade de mineralização é reduzida com o incremento das doses do resíduo.

Há potencial de uso do subproduto como fonte de nitrogênio para as plantas.

Recebido: 30/out./2010

Aceito: 13/abr./2011

(

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    ) Autor correspondente:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      2011

    Histórico

    • Recebido
      30 Out 2010
    • Aceito
      13 Abr 2011
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