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Um Referente Fora de Foco: Sobre a Representatividade do Sindicalismo no Brasil

Resumo

In the academic debate, Brazilian unionism has been characterized both as representative and as non-representative – with defenders of both positions grounding their arguments in the same basic facts. Taking issue with these interpretations, the article questions whether or not union membership is a suitable measure of representation. If, given Brazil’s corporative union structure, unions do not need to recruit members, to what extent can membership serve as an adequate measurement of union representation? Precisely what do union membership rates measure, and precisely what does it mean to "represent workers" in Brazil? The article first offers a conceptual discussion of the relationship between union membership and representation. The thesis is that in Brazil the former does not suffice as a measurement of the latter. But if the union membership rate is high, what is it measuring in any case? The second part of the text explores the empirical side of the question, through analysis of a 1994 survey conducted within four occupational categories. It becomes clear that membership rates are indicative of the degree to which the union makes its presence felt in the life of those it represents. But it also becomes clear that in and of itself this rate does not account for the complexity of the relations between the rank-and-file and union leaders. In short, the referent is blurry – but it is there. The text seeks to lend it greater conceptual and empirical clarity.

representation theory; union representation; corporative union structure; Brazil


representation theory; union representation; corporative union structure; Brazil

Um Referente Fora de Foco: Sobre a Representatividade do Sindicalismo no Brasil * * Este trabalho é uma reelaboração do segundo capítulo de minha tese de doutorado (Cardoso, 1995a), que preserva do original apenas a intenção de perscrutar os meandros da representatividade sindical em sua relação com a taxa de filiação. Agradeço os comentários de Alvaro Comin, Carlos Novaes e Francisco de Oliveira a versões anteriores do artigo, eximindo-os, obviamente, dos equívocos que permaneçam. Parte substancial da pesquisa que embasa este texto foi financiada pela FAPESP, e uma pequena parte contou com recursos do CNPq e da Finep. A análise dos dados de survey fez-se por meio do pacote de análise de dados SPSS, doado pela SPSS Inc. a quem agradeço. Agradeço também a Tema Pechman e Beth Cobra pela cuidadosa revisão do original.

Adalberto Moreira Cardoso

INTRODUÇÃO

É longa a polêmica em torno da representatividade dos sindicatos brasileiros. Críticos de nosso "sindicalismo de Estado" argumentam que a estrutura sindical corporativa inibiu a organização de base, reduzindo os estímulos para que os trabalhadores se associassem aos seus órgãos de classe e também para que estes procurassem filiar sua constituency. Se o sindicato representa, de forma compulsória, toda uma categoria em uma dada base territorial e se o imposto sindical garante sua sobrevivência, então não haveria razão para a filiação de adeptos. E se os sindicatos apresentam baixas taxas de filiação, não poderiam ser tidos como representativos (ver, p. ex., Boito Jr., 1991; Rodrigues, 1989; 1990).

Por outro lado, há quem argumente que, sem os mecanismos de financiamento e de garantia legal de representatividade, o movimento sindical não se teria conseguido reerguer de forma tão expressiva, a ponto de criar um partido político e duas centrais sindicais em cinco anos (1979-1983), tornando-se um dos atores mais importantes na luta contra o regime autoritário. Tampouco se teria instituído, nos anos 80, em centro importante de construção de identidades coletivas. Logo, o sindicalismo não pode ser destituído de representatividade1 1. Ver, p. ex., entrevista de Joaquim dos Santos Andrade, o "Joaquinzão", em O Estado de S. Paulo, 4/8/1987, p. 21. Ver, também, Rodrigues (1992); Almeida (1992); e Comin (1995). .

Tal como formulados, esses argumentos parecem irredutíveis um ao outro: ou o sindicalismo é representativo, ou ele não o é. Entretanto, um exame mais atento revelará que o termo "representatividade", em um argumento e no outro, refere-se a realidades diversas, isto é, estamos falando de coisas diferentes. No primeiro caso, a representatividade dos sindicatos remete a números, medindo-se pelo clássico" contar cabeças", havendo uma associação estreita entre taxa de filiação e representatividade ou capacidade de penetração dos sindicatos na organização social. Esse é o mecanismo costumeiro de mensuração nas sociedades onde impera a liberdade de associação e os sindicatos contratam apenas pelos que são filiados a eles (ver Spyropoulos, 1991; Ferner e Hyman, 1992; Visser, 1993; Hyman e Ferner, 1994). No outro, a representatividade se mede pela capacidade do sindicalismo criar nos trabalhadores a vontade de agir coletivamente que está na base do poder sindical. Essa perspectiva encontra nas estatísticas de greve o instrumento mais comum de mensuração da representatividade não tanto dos sindicatos individuais, mas do movimento sindical como um todo (ver Korpi e Shalev, 1980; Noronha, 1992; Sandoval, 1994). Nos dois casos, estamos falando da relação entre o sindicato e uma base social específica, seus representados, mas essa relação se estabelece de maneiras diversas (embora não incompatíveis entre si) em um e no outro caso. Estamos falando, pois, de conceitos diferentes, e a diversidade dos argumentos esconde também divergências quanto aos mecanismos de mensuração da representatividade do sindicalismo.

Meu objetivo aqui é argüir essa diferença para o caso brasileiro, enfatizando a filiação sindical como medida de representatividade. Na interrogativa: se, como mostrarei com mais detalhes em seguida, os sindicatos em nosso país não têm de filiar adeptos para agir como representantes dos trabalhadores, isto é, se a filiação é desnecessária, até que ponto ela é medida adequada da representatividade dos sindicatos? O que, exatamente, a filiação sindical mede, e o que exatamente significa "representar os trabalhadores" no país? Responderei a estas perguntas em dois tempos. Primeiro, apresento uma discussão conceitual sobre a relação entre filiação sindical e representatividade. Argumentarei que a filiação não é medida suficiente desta última no Brasil. Mas se, como veremos, é alta a taxa de filiação sindical, o que ela mede? Na segunda parte dou destino empírico à indagação, analisando um survey realizado em 1994 junto a quatro categorias de trabalhadores. Mostrarei que a filiação mede, antes de tudo, a qualidade da presença sindical na vida daqueles que representa. Em suma, argumentarei que o referente da representação sindical está fora de foco, mas está lá. Minha intenção aqui é dar-lhe alguma nitidez conceitual e empírica.

FORA DE FOCO (I): CONTAR CABEÇAS

Nos países onde impera a democracia sindical (liberdade de criar sindicatos e liberdade de filiação, em geral nos termos" ninguém está obrigado a se filiar"), contar cabeças significa exatamente isso: saber para quantas pessoas um contrato coletivo negociado entre sindicato e patrão terá vigência. Quando uma dirigente sindical atua como representante, pois, está tomando o lugar (para falar e atuar em nome) daqueles para quem terá vigência o acordado com o empregador, e apenas para eles (e, eventualmente, para os que adiram ao acordo depois de celebrado, mesmo não sendo filiados). Logo, saber o número de filiados significa ter acesso ao montante de pessoas que serão abrangidas pelos acordos coletivos, forma mais comum, no Ocidente, de regulação dessa relação social central no capitalismo, que é a compra e venda de força de trabalho. Desse ponto de vista, os sindicatos são tanto mais representativos quanto maior for seu contingente de filiados, pois maior será a abrangência do acordo negociado. Sindicatos "fortes" são os sindicatos com muitos filiados e a filiação, sendo em geral voluntária, indica também adesão dos trabalhadores a esta ou aquela linha de ação concorrente no "mercado sindical". É esse o caso de Itália, França, Japão, Estados Unidos, Espanha, e é esse, em parte, o caso de Inglaterra e Alemanha (ver Ferner e Hyman, 1992).

É fácil mostrar que tal equivalência entre filiação sindical e representatividade dos sindicatos está, ao menos em termos formais, fora de lugar como instrumento analítico da ação sindical no Brasil, e a razão é conhecida: os sindicatos brasileiros, para sobreviver, não necessitam agir para filiar adeptos. O imposto sindical lhes assegura sobrevivência financeira e a unicidade sindical impede que emerja competição de outro sindicato pela mesma base2 2. Embora não impeça que chapas concorrentes disputem eleições nem que se definam novas bases territoriais. Tem sido comum no sindicalismo pós-1988 o desmembramento de bases territoriais (sindicatos intermunicipais "rachados" em sindicatos municipais) ou a criação de" sub-bases" em bases territoriais existentes (criação do sindicato de funileiros em uma base metalúrgica, por exemplo). Essa é uma das razões para a extrema fragmentação da estrutura sindical pós-1992 (ver Cardoso, 1997). . Ainda que a investidura sindical (que garantia, até 1988, monopólio legal da representação na base territorial oficialmente delimitada) tenha desaparecido, a Justiça do Trabalho ¾ JT continua atuando como se ela existisse: um sindicato criado hoje e registrado segundo a lei pode reivindicar o direito de contratação coletiva por aqueles que definiu como sua base de referência. Problemas de jurisdição são resolvidos pela JT em nome de um único sindicato contra qualquer outro, atual ou futuro, a quem se outorga aquele direito e também o de cobrar o imposto sindical. O empregador, diante de dirigentes desse sindicato, sabe que eles podem, a qualquer momento, recorrer à JT para forçar uma solução do conflito trabalhista. Uma vez que a sentença judicial é obrigatória para as partes, o empregador não tem por que questionar a representatividade dos sindicalistas diante de si.

Se isto é verdade, se o sindicato não tem por que filiar adeptos para sobreviver, seja financeiramente, seja enquanto instituição representativa; e se os trabalhadores não têm de se filiar ao sindicato para se beneficiar das sentenças normativas da Justiça do Trabalho ou dos resultados não judiciais das negociações coletivas, então não deveríamos esperar encontrar filiados a sindicatos no país. Aqui começam os problemas para o analista da representatividade desse sindicalismo: a taxa de filiação sindical é bastante alta, apesar do que suspeita o senso comum e do que assevera a maioria dos analistas de relações industriais.

De fato, segundo a PNAD-1995, a taxa de filiação sindical da População Ocupada ¾ PO era de 16%. Mas a PO inclui empregadores rurais e urbanos, agentes autônomos, trabalhadores com e sem carteira etc. Essa taxa não nos serve, se do que se trata é mensurar a representatividade dos sindicatos de trabalhadores, por oposição a empregadores qualificáveis. É preciso excluir, pois, todos os agentes autônomos, exceto os(as) empregados(as) domésticos(as) com carteira assinada, e também todos os empregadores. É preciso excluir, ainda, os trabalhadores sem carteira assinada que, por definição, não podem ser representados por sindicatos oficiais3 3. Este ponto não tem nada de controverso. Para a legalidade corporativa, o trabalhador sem carteira não existe. A carteira de trabalho é o passaporte para a entrada no mundo da "cidadania regulada" (Santos, 1979), o que inclui o direito de ser representado por um sindicato qualquer. , além dos militares. Com isso, tem-se um universo de trabalhadores com empregadores qualificáveis no campo ou na cidade e com carteira assinada, e também os funcionários públicos que, depois da Constituição de 1988, podem se sindicalizar. Pois bem: a taxa de sindicalização desses trabalhadores (os únicos que, pela legislação vigente, podiam se sindicalizar) era de 30,01% em 1995; esta taxa era a mesma em 1993, em 1992 e em 1988, segundo a mesma PNAD4 4. Para 1992, 1993 e 1995 fiz os cálculos a partir do banco original de dados adquirido junto ao IBGE. Esses cálculos foram realizados com o pacote estatístico SPSS para Windows. Para 1988, foi necessário algum malabarismo com os dados oficiais publicados, como pode ser visto em Cardoso (1995a). Repetidos esses malabarismos para os anos em que a PNAD está disponível em microdados, a diferença entre o cálculo aproximado e o valor real encontrado via base de dados foi de 0,7%, ou seja, quase nenhuma. É por isso que se pode confiar no cálculo para 1988 e afirmar, sem sombra de dúvida, que a taxa de sindicalização se mantém quase constante no país desde então até 1995. . Por outras palavras, malgrado a propalada crise mundial do sindicalismo (Visser, 1993; Bibes e Mouriaux, 1990; Hyman e Ferner, 1994), a taxa de sindicalização dos trabalhadores que podem se sindicalizar se mantém constante e alta desde 1988 no Brasil.

Para que se tenha uma idéia da importância disso, essa taxa é equivalente àquela encontrada na Alemanha, na Itália e no Canadá; superior à verificada nos Estados Unidos, Japão, França, Países Baixos e Suíça; e inferior apenas à dos países com forte tradição social-democrata, onde o movimento sindical, associado a partidos, permaneceu por longo período de tempo no poder (por vezes desde pelo menos o entreguerras), como é o caso de Noruega, Bélgica e dos países escandinavos. Esses dados se referem a 1989, antes, portanto, da enorme crise sindical dos anos 90, que reduziu ainda mais as taxas de sindicalização nesses países5 5. Para esses dados comparativos, ver Visser (1993). .

Temos, portanto, um problema. Embora a filiação sindical seja "inconsistente" com a forma como se dá a ação representativa dos sindicatos brasileiros, a taxa de sindicalizados é bastante alta em termos comparativos. Voltando ao início da discussão, cabe argüir a relação mesma de representação no sindicalismo brasileiro. A pergunta parece capciosa, mas é inescapável: se há muitos filiados, e se os sindicatos não necessitam deles para agir como representantes, o que a filiação sindical mede? Formulando em outros termos: qual a relação entre representatividade dos sindicatos e filiação sindical?

Para responder a esta pergunta, convém examinar, rapidamente, a estrutura da interlocução de uma sindicalista e um empregador durante uma negociação coletiva, locus privilegiado da ação representativa sindical. Indo direto ao ponto que interessa aqui, a negociação coletiva se dá em uma situação de assimetria de poder entre sindicalista e empregador, assimetria que decorre do fato de o empregador, por deter os meios de produção, dispor de meios individuais de retaliação, enquanto os trabalhadores, para retaliar, precisam fazer coalizões. Isso é quase um truísmo sociológico, mas resulta em algo raramente atentado pela literatura: em razão da referida assimetria de poder, a representatividade dos sindicatos é estruturalmente "suspeita", por assim dizer.

De fato, uma sindicalista eleita pela maioria dos filiados, ou dos que diz representar, pode esperar, formalmente, seu reconhecimento como representante por parte do empregador (e também pelo Estado, pelos derrotados na eleição sindical etc.). Pela regra da maioria, socialmente sancionada como mecanismo de constituição de representação, a sindicalista é representante legítima, pelo menos, dos filiados. O que importa, contudo, é que esta legitimidade formal, ou horizontal (porque a representante diante de um interlocutor pode evocar as normas socialmente sancionadas de constituição de representação política, para legitimá-la), não é suficiente para garantir ao empregador que a sindicalista diante de si, de fato, representa quem ela diz representar. Vejamos isto mais de perto.

Em nosso exercício, o patrão está diante da sindicalista como ele mesmo. Ele não representa ninguém. Por ele ter autonomia de ação, firmado o acordo coletivo, dele se espera uma ação "positiva": pagar o salário acordado, promover tais ou quais melhorias nas condições de trabalho, demitir este ou aquele grupo para a introdução de novas tecnologias etc. Já a sindicalista não está ali como ela mesma, mas sim como alguém que toma o lugar de outros para falar e, eventualmente, decidir em nome deles. Por isso, firmado o acordo coletivo, dela se espera que seja portadora de uma ação" negativa", isto é, o patrão age na expectativa de que a sindicalista será capaz de impedir que ações contrárias ao acordado emerjam no seio da categoria representada.

Mas enquanto negociam o acordo, a retaliação possível a cada parte, conquanto assimétrica, não está ausente da interlocução: o empregador tem à sua disposição mecanismos individuais de retaliação, como demissões, estratégias de investimento, realocação da planta da empresa etc., enquanto a sindicalista tem como recurso último a greve. Por outros termos, se a interlocução se encaminha para um impasse, é de se esperar que cada parte lance mão de seus recursos de poder para forçar a outra a conceder em seu pleito. Baliza a interlocução, pois, uma expectativa quanto à capacidade de retaliação do interlocutor. O que importa aqui é o fato de esta expectativa ser bastante distinta para trabalhadores e empregador. Os trabalhadores jogam com a probabilidade de que o empresário retaliará segundo seus recursos de poder ou aguardará a retaliação dos trabalhadores para testar a efetividade dos recursos de poder que a sindicalista diz possuir. O empregador joga com a possibilidade dos trabalhadores interromperem o fluxo de produção, mas pode retaliar imediatamente, independentemente da ação da outra parte.

Pois bem, esse ponto é fundamental para a dinâmica da representação sindical porque implica que as expectativas do empregador estão balizadas pela suspeita de que a sindicalista diante de si não tem representatividade ¾ ou porque talvez não seja capaz de levar adiante a ameaça de retaliação, qualquer que seja ela; ou porque talvez não seja capaz de impedir que os representados contestem o que foi negociado, retaliando contra a vontade da representante. Nesses termos, a capacidade de coordenar ações coletivas (iniciar, interromper ou impedir que ocorram) comparece como medida da representatividade da sindicalista. A conseqüência disso para o argumento aqui desenvolvido é que, antes da ação coletiva, o empregador não tem meios de saber até que ponto aquilo que a sindicalista exige na negociação tem de fato ressonância entre os representados enquanto seu interesse coletivo. Até a ação coletiva, a sindicalista tem sua representatividade contestada. Em outras palavras, a característica central da representação sindical é justamente o fato de que o poder da representante está, sempre, em suspenso e, eventualmente, tem de ser demonstrado6 6. Não podendo me deter neste ponto, remeto o leitor interessado a Cardoso (1995a, cap. II). . Até essa demonstração, o empregador pode, legitimamente, suspeitar que o referente da representação não existe.

À relação entre a sindicalista e sua base, que se expressa na capacidade daquela de mobilizar efetivamente recursos coletivos para retaliar o empregador, eu chamarei legitimidade vertical.

Dito isso, será conveniente levar a situação de interlocução ao seu ponto limite, pois isto ajuda a explicitar os problemas em jogo. Supondo, em primeiro lugar, que a única possibilidade de o empregador aceitar a representante diante de si como legítima mandatária de um coletivo qualquer seja sua capacidade de coordenar ações coletivas, então mais do que filiar adeptos, o que essa sindicalista precisa é mostrar-se capaz de mobilizar suas bases de referência quando isto for necessário. Nesse caso, para o empregador, o sindicato representa, independentemente do número de filiados; e se o poder de pressão sobre o empregador na negociação depende da capacidade da representante de coordenar ações coletivas, então o que importa ao sindicato é criar nos trabalhadores, filiados ou não, disposição para a ação coletiva. É fácil perceber que, mesmo sem irmos ao limite, a capacidade de arregimentar adeptos para interromper a produção atua como medida importante, se não suficiente, da representatividade do sindicato, ao menos para o empregador.

Mas suponhamos, em segundo lugar, que o empregador seja um democrata "procedimental" radical, para quem basta a operação das regras formais de constituição de representação para que aceite como legítima a representante sindical diante de si. Ora, democrata que é, esse empregador sabe que eleições livres e democráticas o são sob condições. O demos jamais é a totalidade dos indivíduos de uma sociedade. Podem estar excluídos os analfabetos, os criminosos, os mentalmente incapazes, os menores. Mesmo um sistema político inclusivo como o brasileiro exclui, no mínimo, os estrangeiros e os menores de dezesseis anos, além dos mentalmente incapazes. Logo, o democrata" procedimental" sabe que o demos de um sindicato compõe-se, de maneira geral, dos trabalhadores filiados a ele. Todos os demais trabalhadores na base de atuação do sindicato estão excluídos da possibilidade de eleger a representação sindical. E mesmo para os membros do demos certas regras devem ser seguidas para que possam votar; em geral, exige-se que o trabalhador esteja em dia com a contribuição associativa.

Disso resulta que um sindicato com baixo número de filiados poderá ter a legitimidade da sua direção contestada pelo empregador, e isto tanto de um ponto de vista horizontal quanto vertical. No limite, nosso democrata "procedimental" pode imaginar que, fosse maior a proporção de filiados, o representante diante de si seria outro que não a sindicalista de nosso exercício. Com esse outro, talvez o que se vocalizaria como interesse coletivo tivesse também outros conteúdos. Portanto, pode-se questionar tanto o representante quanto o referente da representação, e também o interesse desse referente.

Como nossa sindicalista contornaria essa suspeição? Filiando a maioria dos representados e vencendo eleições por maioria. Isto seria suficiente para nosso democrata" procedimental". Mas seria necessário? Nos termos em que venho discutindo, o número de filiados é um problema (ora, redundâncias) quantitativo que não muda em nada o fato essencial de que a representatividade da sindicalista está, de antemão, sob suspeita, sempre, ante democratas" procedimentais" ou não. Mesmo acreditando ser representativa a sindicalista diante de si, eleita, por exemplo, pela maioria absoluta dos trabalhadores na base, o democrata pode discordar de suas reivindicações e preferir pagar os custos de uma greve. Com mais ou menos filiados, a sindicalista ainda terá de mostrar-se capaz de mobilizar sua base sindical. Disso resulta que poucos filiados apenas aumentam a indeterminação da representatividade da sindicalista (desde logo indeterminada do ponto de vista do empregador), enquanto muitos filiados podem indicar que a representatividade da sindicalista é verticalmente legítima, mas essa é uma possibilidade a ser verificada tanto pelo empregador quanto pela sindicalista.

Isso quer dizer que a filiação sindical é insuficiente como medida da representatividade dos sindicatos, e talvez sequer seja medida necessária. Nesta discussão, pois, associo estreitamente representatividade dos sindicatos e capacidade de coordenar ações coletivas. Não fosse isso bastante, a filiação sindical é desnecessária no Brasil porque os sindicatos representam sua base territorial independentemente do número de filiados. Se há tantos filiados no país, o que exatamente a taxa de filiação está medindo?

FORA DE FOCO (II): ASSISTENCIALISMO

Uma resposta está sempre na ponta da língua dos analistas de relações industriais: os sindicatos brasileiros não são apenas entidades representativas; eles também oferecem serviços assistenciais aos quais apenas os filiados têm acesso. Os raros dados disponíveis contribuem para tal leitura. Segundo a PNAD-1988, suplemento "Participação Política e Social", cerca de 50% dos filiados a sindicatos no país disseram tê-lo feito para usufruir dos serviços médicos e jurídicos; 40% disseram ter-se filiado pelas atividades esportivas; e módicos 13% o fizeram para participar das "atividades políticas" do sindicato (IBGE, 1990:12-13). São dados desconcertantes, que merecem ser esmiuçados.

Supondo, para exercitar, que todos os trabalhadores brasileiros que se filiaram a sindicatos o fizeram pelos serviços, parece fora de dúvidas que dizer que há filiados" porque os sindicatos oferecem serviços" responde à pergunta: por que os trabalhadores se filiam a sindicatos? Mas temos de conceder que aquela proposição não responde à pergunta: por que os sindicatos filiam adeptos? Assumindo os serviços como única motivação do trabalhador, em que condições isso explicaria também a motivação dos sindicatos? Se estamos falando em "compra e venda" de serviços assistenciais, podemos desenvolver o argumento em termos puramente econômicos. Para tanto, é plausível admitir que o interesse dos sindicalistas é manter-se no tempo, reproduzindo as condições de financiamento de sua instituição de suporte e de si mesmos como sindicalistas. Nesses termos, a prestação de serviços explicaria a motivação sindical apenas numa situação em que o imposto sindical e outras formas de financiamento não fossem suficientes para a sustentação financeira da entidade. Se o imposto basta, a filiação sindical torna-se irracional, no mínimo, porque os filiados que se utilizam dos serviços sindicais consomem recursos que poderiam estar servindo a investimentos ou ao bem-estar dos dirigentes.

Com o imposto insuficiente, o sindicato ofereceria serviços em troca de mensalidade. Para cumprir seu objetivo (sanear as finanças do sindicato) tais serviços deveriam consumir menos recursos que a receita gerada pelos associados. O interesse do sindicato, nesse caso, passaria a ser atrair o maior número possível de filiados, oferecendo-lhes a menor contrapartida possível em serviços, maximizando a renda e, com ela, garantindo sua permanência no tempo.

Aqui começam os problemas, pois o associado que usufrui os serviços somente compartilha com seu sindicato inteiramente assistencialista o interesse pela permanência da prestação de serviços, mas não o interesse por maximizar renda. Ao contrário, ele quer contribuir com o mínimo possível em troca do máximo de contrapartida por parte do sindicato. Como os trabalhadores encontram outros ofertantes de saúde e de lazer no mercado de serviços (inclusive públicos), o interesse sindical pela maximização da renda encontra seu limite na prestação de serviços competitivos, no mínimo, em relação a seu equivalente mais conspícuo: os serviços públicos de saúde e/ou lazer. Se o trabalhador achar que o que o sindicato oferece pode ser melhor adquirido de outro ofertante a menor preço (ou mesmo de graça), a filiação sindical não faz sentido. Do mesmo modo, se o que o trabalhador está disposto a pagar estiver aquém do que o sindicato necessita para seu saneamento financeiro, a filiação sindical tampouco faz sentido.

Nesses termos, a filiação sindical só pode ser explicada inteiramente pela prestação de serviços se as seguintes condições tiverem vigência: os trabalhadores que se filiam são motivados apenas pelos serviços; o sindicato não pode manter-se apenas com o imposto sindical e demais fontes compulsórias de financiamento; os serviços que oferece para auferir mais recursos são competitivos no mercado.

Indo adiante com isso, a mesma lógica econômica que admite o argumento anterior permite afirmar que, ainda que os filiados contribuam com um plus além do imposto sindical, há um limite de usuários possíveis dada uma estrutura inelástica de recursos logísticos do sindicato. A contribuição marginal de cada novo associado (em termos monetários para a manutenção dos serviços), a partir desse limite, está aquém da demanda potencial que ele representa. Em um sindicato que só presta serviços, a ampliação do número de associados além desse marco significa a redução da possibilidade (em termos de elasticidade) de acesso àqueles mesmos serviços para todos os associados. Se isso ocorre, a conseqüência é a queda na qualidade dos serviços prestados, o que resultará na desfiliação de descontentes7 7. Suponho, obviamente, que existem alternativas aos serviços prestados pelo sindicato (por exemplo, sistemas públicos de saúde mais eficazes do que os sindicais em crise de superlotação). . No longo prazo, a tendência será a volta, por defecção, ao número ótimo de filiados, compatível com a infra-estrutura de serviços8 8. Desse ponto de vista, o acesso aos serviços prestados pelo sindicato torna-se um privilégio e, quanto maior a base representada, maiores os controles institucionais para limitação do número de privilegiados e maiores as possibilidades de que a relação entre sindicato e associado se estabeleça em bases clientelistas. Sindicatos sem tradição de mobilização de suas categorias, e essencialmente assistencialistas, não têm interesse em filiar trabalhadores para além daquele limite e, por isso, não realizam campanhas de filiação. Essa característica fundamental do sindicalismo assistencialista e paternalista representou, finalmente, um limite estrutural à ampliação do número de filiados a associações sindicais no país, desde que foi instituída a estrutura sindical corporativa, cujo desenho completo data de 1942. Neste ponto, concordo com Boito Jr. (1991) (ver Cardoso, 1995a). .

Por esse ângulo, o argumento de que há filiados pelo fato de os sindicatos prestarem serviços, mesmo se levado ao seu extremo, estará correto apenas pela metade. Isto é, mesmo se fosse a atividade exclusiva dos sindicatos (o limite), a prestação de serviços explicaria por que alguns se filiam e por que os sindicatos não filiam mais adeptos. Os serviços prestados, portanto, justificam uma parte da filiação, aquela resultante do entrecruzamento do limite estrutural (físico) do sindicato com o desejo de alguns trabalhadores terem acesso aos serviços sindicais. Logo, mais do que explicar por que há filiados, a prestação de serviços levada ao limite explicaria por que muitos são excluídos da possibilidade de filiação. Os serviços "explicam" pela negativa: se fossem a atividade exclusiva dos sindicatos, a taxa de filiação deveria ser muito pequena ou nula9 9. Além do ponto levantado na nota anterior, é bom lembrar que sindicatos como os de Metalúrgicos de São Paulo, Têxteis do Rio de Janeiro e Têxteis de São Paulo mantiveram elevada a taxa de aposentados entre os filiados como mecanismo para garantir a reprodução no poder dos grupos ali instalados durante o regime militar (Cardoso, 1995b; 1996). Como os aposentados dependiam dos serviços assistenciais do sindicato, tendiam a votar a favor da chapa da situação. Essa é uma razão forte para a limitação do número de filiados, como argumenta Boito Jr. (1991). . Não é o que ocorre no Brasil. As altas taxas de sindicalização sugerem que os sindicatos não são, prioritariamente, prestadores de serviços.

AJUSTANDO AS LENTES

Vimos que a prestação de serviços explica por que muitos trabalhadores são excluídos do sindicato, mais do que por que há filiados. E vimos que, mesmo com muitos filiados, os sindicatos têm de demonstrar capacidade de mobilizar recursos coletivos de retaliação. Se o sindicalismo brasileiro apresenta altas taxas de filiação, parece lógico supor que está em operação uma relação de representação não assentada exclusivamente na prestação de serviços assistenciais. Até que ponto, então, a filiação serve como medida de sua representatividade? Esta pergunta desdobra-se em duas:

(a) Até que ponto a filiação sindical indica vontade de agir por parte dos trabalhadores?

(b) Até que ponto a filiação sindical indica disposição para o estabelecimento de relações de representação por identificação com o sindicato?

Na resposta a essas perguntas, lanço mão de dados de um survey realizado junto a trabalhadores metalúrgicos, bancários e em indústrias alimentícias da capital paulista, e a metalúrgicos do ABC10 10. O survey analisado daqui por diante é resultado da pesquisa "Padrões de Representação Sindical e Democracia no Brasil: Um Survey entre Trabalhadores", financiada pela FAPESP, que foi longamente fermentada em uma série de reuniões no Grupo de Estudos Políticos, núcleo que se constituiu no Cebrap, sob a coordenação de Guillermo O’Donnell e Vilmar Faria, entre 1987 e 1994. Daquelas reuniões tomaram parte, além dos coordenadores, os professores Fábio Wanderley Reis e Antônio Augusto Prates, da UFMG, que montaram e aplicaram questionário análogo junto a públicos diversos dos analisados aqui. Participou também José Ramón Montero, então professor da Universidad Complutense de Madrid, na qualidade de especialista em surveys em transições do autoritarismo. Nas reuniões do grupo estiveram presentes ainda, com maior ou menor intensidade, Sebastião Velasco e Cruz, da Universidade de Campinas, Jorge Avelino Filho, e Carlos A. M. Novaes, Alvaro A. Comin, e eu próprio, do Cebrap. Os três últimos pesquisadores fomos os responsáveis pela forma final assumida pelo questionário, aplicado entre maio e agosto de 1994 e já sob a coordenação de Francisco de Oliveira (Cebrap) e Reginaldo Prandi (LAB/USP). O Datafolha foi o responsável pelo trabalho de campo, supervisionado por mim e por Alvaro Comin. A metodologia global de pesquisa pode ser encontrada em Cardoso e Comin (1996). . Trata-se de duas categorias filiadas à Força Sindical (alimentação e metalúrgicos de São Paulo) e de duas filiadas à CUT, junto às quais foram traçadas amostras representativas por cotas, tendo na filiação sindical uma das variáveis de controle na construção das cotas (a outra foi o porte da empresa). A distribuição da filiação sindical e a composição da amostra por categorias é a seguinte:

Quadro 1

Distribuição da Filiação Sindical nas Categorias Pesquisadas

Categorias de trabalhadores É sindicalizado? N Não Sim Metalúrgicos de São Paulo 62,5 37,5 400 Metalúrgicos do ABC 40,2 59,8 393 Alimentação 75,0 25,0 400 Bancários 25,0 75,0 400 N 808 785 1593 Total 50,7 49,3 100,0

Vontade de Agir

Para não transcrever tabelas desnecessárias, peço ao leitor que confie nos seguintes dados: tomando o total de respostas como base, entre os trabalhadores em alimentação e os metalúrgicos da capital paulista (filiados à Força Sindical) a motivação principal para a filiação ao sindicato foi a prestação de serviços (65% e 68%, respectivamente), em especial serviços jurídicos e médico-odontológicos. Entre os bancários da capital e os metalúrgicos do ABC (filiados à CUT), ao contrário, a principal motivação foi o desejo de participar da vida sindical, a consciência de sua necessidade ou a identificação com a ação do sindicato (55% e 57%, respectivamente para o agrupamento dessas respostas)11 11. As tabulações completas estão em Oliveira e Prandi (1995). A pergunta era aberta, tendo sido formulada da seguinte maneira: "Por que você se filiou ao sindicato?". . O que importa marcar aqui é que, nos sindicatos da Força Sindical, pouco mais de 30% dos filiados fizeram-no por identificação ou por vontade de agir, e entre os sindicatos da CUT, pouco mais de 40% fizeram-no para ter acesso aos serviços dos sindicatos (também, e principalmente, serviços jurídicos e médicos). Ao que parece, mesmo nos grandes sindicatos da CUT e a despeito da intensidade de sua ação mobilizadora, os serviços oferecidos são importantes como motivo de filiação. O contrário é verdadeiro para pelo menos um sindicato" assistencialista", o dos trabalhadores em alimentação.

Migremos das motivações para as ações efetivas dos indivíduos filiados ou não, isto é, vejamos a relação entre filiação sindical e "vontade de agir". Até que ponto é possível supor que os filiados estão mais dispostos a tomar parte na ação coletiva sindical do que os não-filiados, isto é, até que ponto a filiação sindical pode ser apropriada como uma medida da legitimidade vertical da representação sindical apesar e (talvez) mesmo contra a motivação inicial que levou o trabalhador a se filiar? Analisemos a Tabela 1, que traz dados pertinentes a esse problema.

Tabela 1

Modalidades de Participação na Vida Sindical segundo a Filiação Sindical

Tomando as greves, em primeiro lugar, a probabilidade de um metalúrgico paulista participar delas é de 40% para os não-filiados e de 48,6% para os filiados12 12. Para chegar a esses valores, basta subtrair de 100 os percentuais da primeira linha da variável "intensidade de participação nas greves". Com isso, obtém-se os que participam de greves, independentemente da intensidade da participação. . Entre os trabalhadores em indústrias de alimentação, de 33,6% e 26,1%, respectivamente. Ou seja, no caso dessas duas categorias, as diferenças são muito pequenas entre filiados e não-filiados e, saber apenas se o trabalhador é ou não filiado ao sindicato não dará pistas sobre sua participação na ação grevista. Já entre os metalúrgicos do ABC, essa probabilidade é de 45% e 79%, uma diferença mais sólida. Sabendo se um grupo de metalúrgicos do ABC é filiado ao sindicato, o analista pode afirmar, com razoável margem de segurança, que oito em cada dez serão ativistas em greves, contra menos de cinco em cada dez entre os não-filiados. Finalmente, entre os bancários, a probabilidade é de 15,6% e 36,5%13 13. Essas diferenças só são significativas em termos estatísticos entre os bancários e os metalúrgicos do ABC. Uma análise de variância da diferença de médias gerou o seguinte resultado (teste de F): Metalúrgicos SP = 2,5, sig. 0,11; Metalúrgicos ABC = 55,1, sig. 0,000; Alimentação = 1,7, sig. 0,20; Bancários = 14,3, sig. 0,001. , isto é, a filiação sindical aumenta bastante a chance de o trabalhador participar de greves, mas ainda assim apenas pouco mais de 1/3 dos filiados participa. Em suma, a filiação sindical é um elemento de previsão da probabilidade de adesão às greves, mas não para todas as categorias e nem com a mesma intensidade. Entre metalúrgicos de São Paulo e trabalhadores em alimentação a filiação sindical não tem nada a dizer sobre aquela participação (ver nota 13 13. Essas diferenças só são significativas em termos estatísticos entre os bancários e os metalúrgicos do ABC. Uma análise de variância da diferença de médias gerou o seguinte resultado (teste de F): Metalúrgicos SP = 2,5, sig. 0,11; Metalúrgicos ABC = 55,1, sig. 0,000; Alimentação = 1,7, sig. 0,20; Bancários = 14,3, sig. 0,001. ).

Em segundo lugar, a participação em assembléias é, em geral, baixa, com exceção dos metalúrgicos do ABC e de São Paulo, onde 1/3 ou mais dos trabalhadores filiados disse participar às vezes ou freqüentemente. Fica claro, também, que a proporção de filiados que participa é muito superior à proporção de não-filiados que participa, e a diferença entre proporções gira em torno de vinte pontos percentuais, chegando a quarenta no ABC14 14. Para a obtenção desses valores, basta subtrair o percentual de "Sim" do percentual de "Não" na linha "Freqüentemente/Às vezes" da variável que mede freqüência em assembléias. . A filiação sindical, pois, tem poder discriminante sobre a participação em assembléias, mas num sentido preciso: a imensa maioria dos não-filiados não participa de assembléias, em todos os sindicatos. Mas entre os filiados, exceto no ABC e, em parte, entre os metalúrgicos de São Paulo, a participação também é muito pequena.

Essa constatação permite o seguinte comentário: os trabalhadores estão, com algumas exceções, pouco dispostos a participar de mobilizações preparatórias de movimentos coletivos, ou de participar de discussões coletivas sobre seu destino associativo ou empregatício. Estas são duas das razões principais pelas quais sindicatos convocam assembléias, por sua vez medida inconteste da intensidade da participação dos trabalhadores na vida de sua entidade. Entretanto, uma vez sinalizada a greve por parte do sindicato, os trabalhadores estão dispostos a acompanhá-lo de forma muito intensa entre os metalúrgicos do ABC, um pouco menos entre os metalúrgicos de São Paulo, menos ainda entre os bancários e muito pouco entre os trabalhadores em alimentação. Mas o que importa destacar é: (a) que essa disposição é significativamente diferente entre sindicalizados e não-sindicalizados apenas entre os bancários e no ABC; (b) que, no caso destes últimos, a filiação sindical é quase sinônimo de participação em greves; (c) que nos outros casos a filiação sindical não terá impacto sobre a probabilidade do trabalhador participar de greves.

A filiação sindical, pois, tem poder limitado de predição da participação na ação coletiva sindical, ou melhor, esse poder não está igualmente distribuído entre categorias profissionais. Por outras palavras, nem sempre o trabalhador filiado será também um trabalhador participante. E tampouco pode-se dizer que um trabalhador não-filiado seja um trabalhador alheio à ação coletiva. Supondo que o sindicato desempenhasse apenas tarefas representativas, aumentar o número de filiados não daria garantias a todos os sindicalistas de que suas categorias participariam de ações coletivas, e diante do empregador evocar o percentual de sindicalizados não seria medida suficiente de sua representatividade. Eles ainda teriam de se mostrar capazes de mobilizar suas bases, a menos que seus representados fossem os metalúrgicos do ABC. Mesmo aqui, a sindicalista saberia que quase metade dos não-filiados também participaria da greve convocada. Logo, aparentemente, a filiação não pode ser tomada como medida universal da legitimidade vertical da representação do sindicalismo, seja porque parte dos não-filiados também participa da ação coletiva, seja porque muitos filiados não participam.

Cabe aqui um primeiro comentário vinculando essa análise empírica à discussão feita na primeira seção deste artigo: esses dados sugerem que a filiação sindical e a capacidade de arregimentação por parte dos sindicatos são momentos ou dimensões diferentes de sua representatividade, de modo algum redutíveis um ao outro. Nos termos das legitimidades vertical e horizontal, a filiação sindical parece gravitar na órbita desta última, porque é a medida a partir da qual o empregador, seja ou não um democrata "procedimental" radical, pode questionar ou não o referente da representação em bases puramente formais. A capacidade de arregimentação parece gravitar na órbita da primeira (legitimidade vertical), porque é a medida a partir da qual o empregador pode duvidar ou não da capacidade do representante demonstrar o poder que diz ter. Como no Brasil a filiação sindical é desnecessária, "contar cabeças" só seria medida exaustiva da representatividade dos sindicatos se pudéssemos demonstrar que os filiados são sempre e substancialmente mais participativos do que os não-filiados. Os dados disponíveis não permitem sustentar essa afirmação. Se os sindicatos filiam adeptos na esperança de que eles serão mais ativos do que os não-filiados, estão certos apenas em parte e apenas em algumas categorias15 15. Alguém poderia argumentar que, a partir de um determinado número de filiados, a filiação poderia estar expressando efetivamente vontade de agir, na medida em que exprimiria ação contundente do sindicato no sentido de incluir seus representados. Isso seria sugerido pelo sindicato dos metalúrgicos do ABC. Mas o caso do sindicato dos bancários, com taxa igualmente alta de filiação, mas baixa taxa de participação em greves, indica que nem essa hipótese pode ser generalizada. .

Representar por Identificação

Em outro artigo (Cardoso, 1992) afirmei que as centrais sindicais atuaram no Brasil dos anos 80 como espécies de partidos políticos, uma vez que não podiam contratar pelo trabalho (legalmente prerrogativa dos sindicatos) nem representar parte substancial da força de trabalho lotada no mercado informal. Elas se instituíram em centros de constituição de identidade política, orientando escolhas substantivas, isto é, aquelas relativas aos fins (e não aos meios) da ação de seus adeptos ou simpatizantes16 16. Esse insight foi amplamente comprovado pelo survey em análise. O texto onde essa comprovação aparece de forma sistemática é Cardoso e Comin (1996). . O fato de que os sindicatos no Brasil, para representar perante patrões ou o Estado, independem de filiados, permite ajustar esse argumento para aplicá-lo à compreensão da forma como representam sua base de referência em nosso país. Para dizer desde logo, os trabalhadores, filiados ou não, participantes ou não na ação coletiva, podem se sentir representados na ação daqueles que dizem representá-los e que de fato negociam acordos coletivos em seu nome. Podem estabelecer com seus sindicatos uma relação de representação por identificação de tal sorte que a não participação não necessariamente indicaria apatia, alheamento ou desinteresse pela vida associativa sindical, mas apenas disposição ou não para delegar a representação e reconhecer, seja a eficácia, seja a adequação, seja ainda a justiça da ação da direção sindical. Se o trabalhador é representado pelo simples fato de trabalhar em uma base territorial qualquer, a não-filiação pode, inclusive, indicar atitude bem informada de quem não está disposto a arcar com os custos da ação sindical, mas apenas usufruir de seus benefícios.

A investigação empírica desse fenômeno não é tarefa de somenos, posto que estou falando de uma disposição subjetiva em que o que está em pauta é a possibilidade dos trabalhadores se identificarem com a ação representativa da direção sindical. Na pesquisa que analiso aqui há três perguntas diretamente relacionadas a esse problema. Todas envolvem, em maior ou menor escala, uma avaliação da atuação do sindicato. Uma pergunta procura medir se este contribui ou atrapalha na solução dos problemas da categoria. Outra, se a estratégia de negociação com os patrões, não importa se confrontacionista ou conciliadora, é eficiente ou não. Finalmente, os trabalhadores foram chamados a dar uma nota para a atuação de seu sindicato.

Por essas medidas, a avaliação negativa da atuação da entidade seria indicador de que os trabalhadores não se sentiriam representados por sua prática sindical. Há diferenças relevantes entre filiados e não-filiados? A filiação sindical pode ser tomada como medida da disposição para a representação por identificação? Pelos dados da Tabela 2, pode-se dizer que sim, mas apenas em parte. Entre os metalúrgicos de São Paulo e os bancários da capital, categorias muito diversas e que são base de sindicatos filiados às duas centrais concorrentes, Força Sindical e CUT, respectivamente, as diferenças encontradas entre filiados e não-filiados são inexistentes ou muito pequenas, e apenas no caso da nota para o sindicato são estatisticamente significativas. Os bancários e os metalúrgicos não-filiados são mais severos do que os filiados no julgamento de seu sindicato, embora em geral concordem com a estratégia de ação adotada e achem que o sindicato contribui para a solução dos problemas da categoria. Mas, tomando esses indicadores em conjunto, se considerássemos apenas essas categorias, diríamos que a filiação sindical não indica nem maior nem menor disposição do trabalhador se sentir representado pelo sindicato.

Entretanto, os trabalhadores em alimentação e os metalúrgicos do ABC são casos em que a filiação tem, sim, impacto sobre a referida disposição. No setor alimentício, se o trabalhador é filiado, a probabilidade de que tenha boa imagem e julgue eficiente seu sindicato é de 50%. Já para os não-filiados essa probabilidade é igual ou menor do que 1/3. Os metalúrgicos do ABC, por sua vez, são consistentemente favoráveis a seu sindicato, mas os não-filiados dão nota pior para sua atuação do que os filiados, bem mais dispostos a avaliá-lo positivamente.

Tabela 2

Disposição para Sentir-se Representado pelo Sindicato, segundo a Filiação Sindical

A filiação, pois, nem sempre indica capacidade de ação, e nem sempre indica disposição para a representação por identificação; mas ela indica uma coisa e outra, em parte, para categorias distintas. Insatisfeito com esse resultado, proponho um exercício metodológico baseado no fato de que parece plausível imaginar que os dois momentos da legitimidade vertical da representação dos sindicatos operam em conexão um com o outro como aspectos da resposta dos trabalhadores às investidas do sindicato na direção de sua base de sustentação. Segundo essa suspeita, quanto mais intensa a presença sindical na vida cotidiana de seus representados, maior a resposta destes últimos às demandas sindicais por participação e legitimidade. Isso tornaria metodologicamente plausível tratar como escalonáveis essas dimensões, encaradas como medidas de um substrato comum: a presença sindical no cotidiano das pessoas, ou a capacidade de o sindicato nuclear as escolhas cotidianas de seus representados, inclusive a ação coletiva e a legitimação da ação sindical.

Além das questões analisadas até aqui, no questionário de origem do survey a intensidade da presença sindical junto à sua base foi medida por meio de outras perguntas, que também serão incluídas no exercício. Uma bateria refere-se a vários mecanismos de acesso à informação sobre o sindicato (jornais e boletins, visita ao sindicato, conversa com colegas, murais na empresa, representantes ou delegados sindicais e matérias pagas na imprensa, num total de seis mecanismos de informação). Conexa a esta está a pergunta sobre a existência ou não de representantes sindicais no local de trabalho. Finalmente, há dois indicadores de informação: o fato de o trabalhador conhecer pelo menos um dirigente sindical e o de conhecer a Central a que seu sindicato está filiado.

Juntando essas questões com as anteriores (participação em greves, em assembléias, nota para o sindicato, opiniões em relação à ação e à estratégia do sindicato), chego a um "índice de proximidade com o sindicato" que varia de 0 a 14. Para atingir o índice 14, o trabalhador tem de dar nota igual ou maior que 7 ao sindicato, achar que ele contribui para a solução dos problemas da categoria, julgar eficiente sua estratégia de ação, ter acesso a todos os seis mecanismos de informação sobre o sindicato à sua disposição, ter representante sindical no local de trabalho, conhecer pelo menos um dirigente sindical, saber a que Central seu sindicato está filiado, participar de greves e de assembléias. Nesses termos, um trabalhador com índice zero deve ser considerado como intensamente arredio à atividade representativa sindical, porque não se mostrou disposto a qualquer relação com sua entidade. Um trabalhador com índice 14 deve ser considerado como intensamente permeável à mesma atividade representativa, tendo na relação com o sindicato, talvez, o momento mais importante de sua biografia17 17. O Alpha de Crombach, que é uma medida de aditividade das variáveis em uma escala, é de 0,80 para toda a amostra, variando de 0,76 entre os trabalhadores em alimentação e 0,82 entre os metalúrgicos do ABC. Segundo os manuais de estatística, para ser confiável ( reliable) e válido, o Alpha deve ser igual ou maior que 0,90. Isto permitiria, por exemplo, que médicos classificassem a probabilidade do câncer com alguma segurança, dados alguns indicadores identificados como escalonáveis. Nas ciências sociais essa precisão é raramente necessária ou mesmo possível. Meu objetivo aqui é apontar a direção, mais do que a intensidade precisa da associação entre a proximidade com o sindicato e a filiação sindical. Para meus propósitos, muito distantes da indução probabilística, o Alpha de 0,80 é alto o bastante para permitir análise estatística robusta. . A Tabela 3 traz os dados pertinentes18 18. Na construção da tabela, não foi possível classificar o índice em quartis, como seria desejável. Na primeira coluna apresento a distribuição para a amostra global. Além da distribuição percentual, apresento também a média e sua dispersão em cada estrato amostral, além da correlação do índice com a filiação sindical. .

Tabela 3

Índice de Proximidade com o Sindicato, segundo a Filiação Sindical

* Todas as diferenças de médias são significativas pelo menos no nível 0,001.

É expressiva a relação entre proximidade com o sindicato e sindicalização apenas entre os metalúrgicos do ABC e os trabalhadores em alimentação, mas nos dois casos apenas em parte. No caso dos trabalhadores em alimentação, a distribuição é linear e inversa apenas para os não-filiados, de tal sorte que a probabilidade de encontrar trabalhadores não-sindicalizados com grau muito alto de proximidade com o sindicato é quase nula nesse setor. Com os metalúrgicos do ABC ocorre o inverso: a distribuição é linear e positiva apenas para os filiados, com probabilidade nula de encontrá-los com baixo grau de proximidade. Já a probabilidade de serem muito próximos do sindicato é de mais de 2/3. De qualquer maneira, em todas as categorias, exceto alimentação, é muito pequena a probabilidade de que um trabalhador sindicalizado apresente um baixo índice de proximidade com seu sindicato, aspecto posto em relevo pela correlação encontrada em todos os estratos amostrais.

Isso sugere que a sindicalização tampouco pode ser tomada como indicador inequívoco da proximidade entre trabalhadores e sindicatos, isto é, da legitimidade vertical da representação sindical. Aqui, como antes, essas dimensões da representação parecem de fato diversas uma da outra, e perguntar apenas pelo número de filiados a sindicatos no país não parece capaz de dar conta da complexidade das relações institucionais que se estabelecem entre representantes e representados.

CONCLUSÃO

A análise empírica ratificou a diferença aludida na introdução: a filiação sindical e a capacidade de arregimentação por parte dos sindicatos são expressão de coisas diferentes. Se o sindicato é capaz de iniciar, interromper ou impedir que uma greve ocorra contra sua vontade, esse sindicato demonstra ter controle sobre sua base e, portanto, só posso concluir que esse sindicato é representativo, verticalmente legítimo, independentemente da taxa de filiação. Na verdade, argumentar em favor da equivalência entre representatividade e filiação é imaginar que apenas os filiados são capazes de atender ao chamado do sindicato para greves, o que demonstrei ser uma suposição destituída de fundamento empírico.

A legitimidade vertical mostrou-se, ademais, assentada sobre dois pilares: a capacidade de o sindicato criar nos seus representados a vontade de agir característica do poder sindical; e de criar nos representados uma disposição para estabelecer relações de representação por identificação com sua entidade, disposição não necessariamente colada à vontade de agir. Essa legitimidade, como vimos, não pode ser adequadamente mensurada pela filiação sindical.

O que, então, a filiação sindical está medindo? A discussão conceitual e empírica permite afirmar que ela mede, em parte, a busca dos trabalhadores pelos serviços dos sindicatos; em parte sua disposição para a ação coletiva; em parte sua disposição de sentir-se representados na ação sindical; e em parte a relação de proximidade ou não que o trabalhador estabelece com sua entidade representativa. Mas a filiação não é capaz de dar conta de nenhuma dessas dimensões adequadamente. Os trabalhadores não-filiados também participam na vida associativa, também se sentem representados na ação sindical, também estabelecem relações de proximidade com o sindicato, apesar de não desfrutarem dos serviços prestados. Em alguns casos, como entre os metalúrgicos de São Paulo e os trabalhadores em alimentação da mesma capital, a filiação não contribui um milímetro para a compreensão da ação coletiva. Entre os bancários e os metalúrgicos da capital, ela tem muito pouco a dizer sobre a disposição para a representação por identificação. Entre os metalúrgicos do ABC e os trabalhadores em alimentação da capital, ela discrimina pela metade a proximidade com o sindicato. Em nenhum desses casos a filiação é capaz de cobrir o espectro das relações possíveis entre sindicatos e representados. Por isso, caso se deseje tomá-la como medida da representatividade dos sindicatos, a discussão precedente obriga-nos a exigir que se o faça com extrema cautela. Os sindicatos no Brasil, porque não necessitam filiar adeptos para representá-los, estabelecem diversos mecanismos de vinculação com aqueles que representam, mecanismos nem sempre relacionados com a formalização de tais laços. Esses mecanismos estão diretamente relacionados com a ação coletiva, seja ela uma greve ou simplesmente uma relação identitária de representação por identificação.

De forma algo heterodoxa, concluirei com dados não apresentados antes para mostrar que, se nos restringimos à filiação como indicador de representatividade, perdemos o mais importante das relações entre sindicatos e bases de sustentação. Farei isso tomando o índice de proximidade como medida de intensidade das referidas relações institucionais, comparando-o com a filiação em termos da capacidade de um ou de outro mediar e discriminar as atitudes e práticas dos trabalhadores representados. A Tabela 4, apresentada à guisa de conclusão, revela, de forma bastante contundente, que o índice de proximidade criado para dar conta das relações do sindicato com sua base tem poder discriminante muito superior do que a filiação sindical em relação a atitudes e práticas tão importantes quanto a opinião sobre a democracia, o interesse por política (expresso na leitura de seções de política em jornais e revistas) e a atitude sobre o caronismo nas greves. A tabela não mostra, mas esse poder discriminante ocorre também para a preferência partidária, para a intensidade da relação com os partidos preferidos, para várias opiniões sobre greve, democracia e direitos civis, e dá-se sempre na mesma direção: o trabalhador mais próximo de seu sindicato apresenta atitudes mais solidárias, mais democráticas (no sentido de reconhecer direitos e valorizar a institucionalidade democrática), maior interesse pela ação pública, maior disposição à ação em geral, tudo isso numa intensidade muito superior à filiação sindical19 19. Ver Cardoso e Comin (1996) para as tabelas completas. . Por outras palavras, as atitudes e práticas dos trabalhadores tornam-se mais previsíveis com recurso à intensidade de sua relação com o sindicato do que por meio da taxa de filiação sindical, que se revela, pois, medida inadequada das relações entre sindicatos e representados (veja que os valores de qui-quadrado são muito mais elevados no primeiro que no último caso).

Tabela 4

Indicadores Selecionados de Atitudes e Práticas Sindicais e Políticas, segundo a Proximidade com o Sindicato e a Condição de Filiação

* Porcentagens de coluna. Todas as diferenças entre proporções são significativas pelo menos no nível 0,01. Os totais variam em cada cruzamento devido a missing values associados a não-respostas ou respostas dúbias, fora das alternativas oferecidas ao entrevistado.

** Baixo= 0 a 3; Médio= 4 ou 5; Alto= 6 a 8; Muito alto= 9 a 14.

(Recebido para publicação em abril de 1997)

NOTAS:

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  • *
    Este trabalho é uma reelaboração do segundo capítulo de minha tese de doutorado (Cardoso, 1995a), que preserva do original apenas a intenção de perscrutar os meandros da representatividade sindical em sua relação com a taxa de filiação. Agradeço os comentários de Alvaro Comin, Carlos Novaes e Francisco de Oliveira a versões anteriores do artigo, eximindo-os, obviamente, dos equívocos que permaneçam. Parte substancial da pesquisa que embasa este texto foi financiada pela FAPESP, e uma pequena parte contou com recursos do CNPq e da Finep. A análise dos dados de
    survey fez-se por meio do pacote de análise de dados SPSS, doado pela SPSS Inc. a quem agradeço. Agradeço também a Tema Pechman e Beth Cobra pela cuidadosa revisão do original.
  • 1.
    Ver, p. ex., entrevista de Joaquim dos Santos Andrade, o "Joaquinzão", em
    O Estado de S. Paulo, 4/8/1987, p. 21. Ver, também, Rodrigues (1992); Almeida (1992); e Comin (1995).
  • 2.
    Embora não impeça que chapas concorrentes disputem eleições nem que se definam novas bases territoriais. Tem sido comum no sindicalismo pós-1988 o desmembramento de bases territoriais (sindicatos intermunicipais "rachados" em sindicatos municipais) ou a criação de" sub-bases" em bases territoriais existentes (criação do sindicato de funileiros em uma base metalúrgica, por exemplo). Essa é uma das razões para a extrema fragmentação da estrutura sindical pós-1992 (ver Cardoso, 1997).
  • 3.
    Este ponto não tem nada de controverso. Para a legalidade corporativa, o trabalhador sem carteira não existe. A carteira de trabalho é o passaporte para a entrada no mundo da "cidadania regulada" (Santos, 1979), o que inclui o direito de ser representado por um sindicato qualquer.
  • 4.
    Para 1992, 1993 e 1995 fiz os cálculos a partir do banco original de dados adquirido junto ao IBGE. Esses cálculos foram realizados com o pacote estatístico SPSS para Windows. Para 1988, foi necessário algum malabarismo com os dados oficiais publicados, como pode ser visto em Cardoso (1995a). Repetidos esses malabarismos para os anos em que a PNAD está disponível em microdados, a diferença entre o cálculo aproximado e o valor real encontrado via base de dados foi de 0,7%, ou seja, quase nenhuma. É por isso que se pode confiar no cálculo para 1988 e afirmar, sem sombra de dúvida, que a taxa de sindicalização se mantém quase constante no país desde então até 1995.
  • 5.
    Para esses dados comparativos, ver Visser (1993).
  • 6.
    Não podendo me deter neste ponto, remeto o leitor interessado a Cardoso (1995a, cap. II).
  • 7.
    Suponho, obviamente, que existem alternativas aos serviços prestados pelo sindicato (por exemplo, sistemas públicos de saúde mais eficazes do que os sindicais em crise de superlotação).
  • 8.
    Desse ponto de vista, o acesso aos serviços prestados pelo sindicato torna-se um privilégio e, quanto maior a base representada, maiores os controles institucionais para limitação do número de privilegiados e maiores as possibilidades de que a relação entre sindicato e associado se estabeleça em bases clientelistas. Sindicatos sem tradição de mobilização de suas categorias, e essencialmente assistencialistas, não têm interesse em filiar trabalhadores para além daquele limite e, por isso, não realizam campanhas de filiação. Essa característica fundamental do sindicalismo assistencialista e paternalista representou, finalmente, um limite estrutural à ampliação do número de filiados a associações sindicais no país, desde que foi instituída a estrutura sindical corporativa, cujo desenho completo data de 1942. Neste ponto, concordo com Boito Jr. (1991) (ver Cardoso, 1995a).
  • 9.
    Além do ponto levantado na nota anterior, é bom lembrar que sindicatos como os de Metalúrgicos de São Paulo, Têxteis do Rio de Janeiro e Têxteis de São Paulo mantiveram elevada a taxa de aposentados entre os filiados como mecanismo para garantir a reprodução no poder dos grupos ali instalados durante o regime militar (Cardoso, 1995b; 1996). Como os aposentados dependiam dos serviços assistenciais do sindicato, tendiam a votar a favor da chapa da situação. Essa é uma razão forte para a limitação do número de filiados, como argumenta Boito Jr. (1991).
  • 10.
    O
    survey analisado daqui por diante é resultado da pesquisa "Padrões de Representação Sindical e Democracia no Brasil: Um
    Survey entre Trabalhadores", financiada pela FAPESP, que foi longamente fermentada em uma série de reuniões no Grupo de Estudos Políticos, núcleo que se constituiu no Cebrap, sob a coordenação de Guillermo O’Donnell e Vilmar Faria, entre 1987 e 1994. Daquelas reuniões tomaram parte, além dos coordenadores, os professores Fábio Wanderley Reis e Antônio Augusto Prates, da UFMG, que montaram e aplicaram questionário análogo junto a públicos diversos dos analisados aqui. Participou também José Ramón Montero, então professor da Universidad Complutense de Madrid, na qualidade de especialista em
    surveys em transições do autoritarismo. Nas reuniões do grupo estiveram presentes ainda, com maior ou menor intensidade, Sebastião Velasco e Cruz, da Universidade de Campinas, Jorge Avelino Filho, e Carlos A. M. Novaes, Alvaro A. Comin, e eu próprio, do Cebrap. Os três últimos pesquisadores fomos os responsáveis pela forma final assumida pelo questionário, aplicado entre maio e agosto de 1994 e já sob a coordenação de Francisco de Oliveira (Cebrap) e Reginaldo Prandi (LAB/USP). O
    Datafolha foi o responsável pelo trabalho de campo, supervisionado por mim e por Alvaro Comin. A metodologia global de pesquisa pode ser encontrada em Cardoso e Comin (1996).
  • 11.
    As tabulações completas estão em Oliveira e Prandi (1995). A pergunta era aberta, tendo sido formulada da seguinte maneira: "Por que você se filiou ao sindicato?".
  • 12.
    Para chegar a esses valores, basta subtrair de 100 os percentuais da primeira linha da variável "intensidade de participação nas greves". Com isso, obtém-se os que participam de greves, independentemente da intensidade da participação.
  • 13.
    Essas diferenças só são significativas em termos estatísticos entre os bancários e os metalúrgicos do ABC. Uma análise de variância da diferença de médias gerou o seguinte resultado (teste de F): Metalúrgicos SP = 2,5, sig. 0,11; Metalúrgicos ABC = 55,1, sig. 0,000; Alimentação = 1,7, sig. 0,20; Bancários = 14,3, sig. 0,001.
  • 14.
    Para a obtenção desses valores, basta subtrair o percentual de "Sim" do percentual de "Não" na linha "Freqüentemente/Às vezes" da variável que mede freqüência em assembléias.
  • 15.
    Alguém poderia argumentar que, a partir de um determinado número de filiados, a filiação poderia estar expressando efetivamente vontade de agir, na medida em que exprimiria ação contundente do sindicato no sentido de incluir seus representados. Isso seria sugerido pelo sindicato dos metalúrgicos do ABC. Mas o caso do sindicato dos bancários, com taxa igualmente alta de filiação, mas baixa taxa de participação em greves, indica que nem essa hipótese pode ser generalizada.
  • 16.
    Esse
    insight foi amplamente comprovado pelo
    survey em análise. O texto onde essa comprovação aparece de forma sistemática é Cardoso e Comin (1996).
  • 17.
    O Alpha de Crombach, que é uma medida de aditividade das variáveis em uma escala, é de 0,80 para toda a amostra, variando de 0,76 entre os trabalhadores em alimentação e 0,82 entre os metalúrgicos do ABC. Segundo os manuais de estatística, para ser confiável (
    reliable) e válido, o Alpha deve ser igual ou maior que 0,90. Isto permitiria, por exemplo, que médicos classificassem a probabilidade do câncer com alguma segurança, dados alguns indicadores identificados como escalonáveis. Nas ciências sociais essa precisão é raramente necessária ou mesmo possível. Meu objetivo aqui é apontar a direção, mais do que a intensidade precisa da associação entre a proximidade com o sindicato e a filiação sindical. Para meus propósitos, muito distantes da indução probabilística, o Alpha de 0,80 é alto o bastante para permitir análise estatística robusta.
  • 18.
    Na construção da tabela, não foi possível classificar o índice em quartis, como seria desejável. Na primeira coluna apresento a distribuição para a amostra global. Além da distribuição percentual, apresento também a média e sua dispersão em cada estrato amostral, além da correlação do índice com a filiação sindical.
  • 19.
    Ver Cardoso e Comin (1996) para as tabelas completas.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Out 1998
    • Data do Fascículo
      1997

    Histórico

    • Recebido
      Abr 1997
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