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O judiciário e as políticas públicas no Brasil

The judiciary and public policies in Brazil

Le pouvoir judiciaire et les politiques publiques au Brésil

Resumos

This article discusses the role of the Judiciary in public policymaking. The first part of the text summarizes the importance of integrating the courts better into our analyses of public policymaking and policy implementation in the Brazilian political system. The second part discusses the main factors influencing the degree and depth of the Judiciary's impact on public policies.

Judiciary; public policies


Dans cet article, on discute le rôle du pouvoir judiciaire dans la formulation de politiques publiques. Dans sa première partie, on montre l'importance de mettre en place une meilleure intégration des tribunaux à nos analyses du processus de formulation et d'implantation de politiques publiques dans le système politique brésilien. Dans la seconde, on juge les principaux facteurs qui influent sur le degré et la profondeur de l'impact du pouvoir judiciaire dans les politiques publiques.

pouvoir judiciaire; politiques publiques


Judiciary; public policies

pouvoir judiciaire; politiques publiques

O judiciário e as políticas públicas no Brasil* * Gostaria de agradecer os comentários e críticas oferecidas por dois pareceristas anônimos da Dados; por Luciana Gross Cunha, Vitor Ferraz e Andrei Koerner; e pelos participantes do grupo que este último organizou para discutir assuntos relacionados à justiça no 3 º Congresso Latinoamericano de Ciência Política, realizado na Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, em setembro de 2006. O artigo também se beneficiou de uma valiosa assessoria editorial de Simone Costa, Josué Nóbrega, Elisabeth Lissovsky e Mônica Farias. Os erros remanescentes são de total responsabilidade do autor.

The judiciary and public policies in Brazil

Le pouvoir judiciaire et les politiques publiques au Brésil

Matthew M. Taylor

ABSTRACT

This article discusses the role of the Judiciary in public policymaking. The first part of the text summarizes the importance of integrating the courts better into our analyses of public policymaking and policy implementation in the Brazilian political system. The second part discusses the main factors influencing the degree and depth of the Judiciary's impact on public policies.

Key words: Judiciary; public policies

RÉSUMÉ

Dans cet article, on discute le rôle du pouvoir judiciaire dans la formulation de politiques publiques. Dans sa première partie, on montre l'importance de mettre en place une meilleure intégration des tribunaux à nos analyses du processus de formulation et d'implantation de politiques publiques dans le système politique brésilien. Dans la seconde, on juge les principaux facteurs qui influent sur le degré et la profondeur de l'impact du pouvoir judiciaire dans les politiques publiques.

Mots-clé: pouvoir judiciaire; politiques publiques

O Poder Judiciário possui um impacto significativo na elaboração das políticas públicas: os tribunais influenciam o que Schattschneider (1960) chamava de "definição das alternativas" pelo sistema político. No entanto, essa afirmação simples é mais complicada do que parece, especialmente no contexto latino-americano, em que especialistas levaram muitos anos após as transições dos regimes militares para direcionar sua atenção para o papel dos tribunais nas políticas públicas e na governabilidade. Cada vez mais, a visão clássica dos tribunais como instâncias estritamente legais tem sido contestada pelas crescentes evidências de seu papel político e de seu impacto diário nas políticas públicas. Mas a despeito desses desenvolvimentos, o papel do Judiciário na arena das políticas públicas permanece nebuloso tanto no Brasil quanto no resto da América Latina1 1 . Este artigo faz parte da corrente de análise positiva sobre a função política dos tribunais, distinguindo-se assim da literatura normativa produzida por juristas e professores de Direito. Na visão normativa, procura-se definir como os juízes devem decidir processos ou se relacionar com as outras instituições no sistema político diante das regras legais vigentes. Na teoria positiva, procura-se entender não como os juízes devem agir, mas por que eles agem da forma que de fato agem, o que motiva os juízes a decidir da forma que decidem e que forças podem influenciar essa atuação. Uma das melhores discussões dessa distinção e de sua importância tanto para a ciência política quanto para estudiosos de Direito é de Friedman (2005). .

O propósito deste artigo é pensar sistematicamente o papel do Judiciário no sistema político brasileiro e, em particular, na formulação de políticas públicas. Com isso, não quero sugerir que os trabalhos que o antecedem não sejam de grande valia nesse sentido. Uma crescente onda de importantes estudos trata do Judiciário e da judicialização da política no Brasil, analisando como e sob que condições os tribunais influenciam as decisões tomadas no âmbito dos poderes Executivo e Legislativo. Apesar desses estudos sobre o papel político do Judiciário, a ciência política tem demorado a incorporar o Judiciário à análise da tomada de decisões governamentais pelo sistema político como um todo. Fora um núcleo restrito de cientistas políticos, poucos integrantes do mainstream da ciência política brasileira incorporam o Judiciário às suas análises com a mesma profundidade com que consideram o sistema partidário, o Legislativo e o Executivo ou, até mesmo, os movimentos sociais, as burocracias públicas ou as instituições econômicas.

Os tribunais agem em três dimensões de relevância para a ciência política, que podem ser descritas como as dimensões hobbesiana, smithiana e madisoniana. Estas dimensões têm impactos importantes, respectivamente, no monopólio da violência pelo Estado, nas regras de funcionamento da economia e na relação entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário2 2 . Para uma discussão mais ampla da dimensão hobbesiana e madisoniana, ver Magaloni (2003). Adiciono aqui o que chamo da dimensão smithiana por achar que o impacto do Judiciário na economia é uma terceira dimensão de suma importância ao se pensar o impacto do Judiciário na governabilidade. . Enfocarei aqui principalmente a dimensão madisoniana da relação entre os três poderes e, em particular, os impactos que os tribunais podem ter na formulação de políticas públicas pelo Executivo e pelo Legislativo, na deliberação e na implementação dessas políticas no plano federal. Não se trata de uma pesquisa empírica, mas, sim, de uma tentativa de descrever o estado da literatura existente e propor novas direções para pesquisas futuras, tendo como base as já existentes.

O texto está dividido em duas partes. Na primeira, procuro sumarizar rapidamente a importância para a ciência política de integrar melhor a intervenção judicial às nossas análises do processo de formação e adoção de políticas públicas. Na segunda, procuro avaliar os principais fatores que influenciam o impacto do Judiciário na formulação das políticas públicas.

O JUDICIÁRIO NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

No Brasil, não existe o "persistent neglect of courts" (desprezo persistente dos tribunais), que é motivo de fortes críticas em outras regiões do mundo (Epstein, Knight e Shvetsova, 2001). Diversos livros, artigos e teses publicados recentemente sobre o papel político do Judiciário enfatizam a influência desse Poder no processo político e seu impacto na realidade política resultante3 3 . Entre muitos trabalhos nesse sentido, alguns servem de exemplo: livros como os de Arantes (1997); Favetti (2003); Sadek (1995; 1999; 2000); Werneck Vianna et alii (1999); e Werneck Vianna (2002); artigos e capítulos como os de Cunha (2001); Faro de Castro (1997a; 1997b); Koerner (2005; 2006); Oliveira (2005); Werneck Vianna e Burgos (2005); e recentes teses de doutorado como Carvalho Neto (2005); Oliveira (2006); e Pacheco (2006). . No entanto, apesar do vasto conjunto de trabalhos que tratam especificamente dos tribunais, a maior parte dos estudos sobre o sistema político brasileiro ignora o papel político deles na hora de descrever o processo decisório no sistema político como um todo. Como conseqüência, no sofisticado debate sobre instituições políticas brasileiras – e, em especial, sobre o presidencialismo de coalizão –, os tribunais mal aparecem e raras vezes são usados para explicar os resultados da política. As conseqüências da não consideração do Poder Judiciário para o entendimento do processo de formação de políticas públicas podem ser graves, como mostro a seguir.

É lugar-comum o argumento de que um Judiciário que funciona bem serve de contrapeso aos outros poderes governamentais, provendo garantias para a separação entre os poderes e para a proteção das minorias (Madison, Hamilton e Jay, 1961; Montesquieu, 1990). No entanto, o Judiciário é inerentemente passivo e precisa ser acionado por atores externos para que tenha qualquer efeito. Por isso, o grau com que o Judiciário é invocado para servir como árbitro nos conflitos entre as forças ou instituições políticas depende não apenas da força dos tribunais, mas também, de forma mais abrangente, dos padrões da disputa política.

A análise da política brasileira tende a variar entre dois extremos4 4 . A natureza dicotômica do debate sobre as instituições políticas brasileiras é explicitada em Palermo (2000) e Pereira e Mueller (2003). . De um lado, há uma tendência que vê o sistema político como excessivamente consensual, repleto de jogadores de veto, o que tornaria o processo decisório intrinsecamente problemático. Em tal cenário, somente propostas que têm o apoio de uma ampla maioria podem ser aprovadas. Nesse sistema político atomizado, muitos fatores restringem o processo decisório: 1) um Congresso fraco, em que a representação desproporcional fortalece os Estados pequenos, enquanto os frágeis mecanismos de accountability eleitoral – resultado do sistema de representação proporcional com lista aberta – favorecem grupos de interesse organizados e facilitam a constante troca partidária; 2) um sistema partidário fraco, que permite a existência de um grande número de partidos fragmentados, instáveis e regionalizados; 3) a fraqueza do gabinete presidencial cujos ministérios são utilizados em parte como um instrumento para assegurar a manutenção das coalizões legislativas; 4) a natureza do Estado e, especialmente, dos servidores públicos, que tendem a lutar veementemente pela preservação de seus privilégios dentro da burocracia estatal; 5) um Senado com poderes sem paralelo para interferir em muitas questões políticas; e 6) o federalismo e, em particular, os poderosos governadores, especialmente o impacto deles nas discussões sobre assuntos fiscais da federação5 5 . Por exemplo: Abrucio (1998); Ames (2001); Kinzo (1997; 1999); Mainwaring (1995); Stepan (2000). . Sob essa ótica, potenciais entraves institucionais existem em abundância: como nota Kinzo (2001:11), a representação política no Brasil "reproduz à enésima potência o sistema de contrapesos do modelo madisoniano".

Do outro lado do debate, outra corrente de cientistas políticos sugere que o sistema político pode ser mais majoritário do que se pensa (no sentido da palavra majoritarismo pretendido por Lijphart, 1999) e que o processo decisório e a mudança das políticas públicas não é tão difícil e custosa quanto os primeiros apontam. Dentre os fatores citados por esse grupo estão: 1) o forte controle do presidente sobre a agenda política, facilitado pela concentração dos poderes orçamentários no Executivo, e os fortes poderes legislativos exercidos pelo presidente; 2) mecanismos robustos de controle partidário na arena legislativa (mas não na eleitoral); e 3) o poder do colégio de líderes na Câmara dos Deputados, que permite um forte controle sobre a agenda legislativa, geralmente por parte de aliados com estreita relação com o Poder Executivo6 6 . Por exemplo: Figueiredo (2001); Figueiredo e Limongi (1999; 2002). . Como notam Figueiredo e Limongi (1999:24), apenas 0,026% das propostas do Executivo votadas pelo Congresso foram rejeitadas no período posterior à Constituição de 1988. Enfim, existe uma abundância de regras internas que facilitam o controle do Congresso por aliados do governo e aumentam os incentivos para a cooperação dos congressistas com o Poder Executivo.

Como em todo debate acadêmico bipolar, essas duas visões são menos dicotômicas e mutuamente excludentes do que a perspectiva rígida e unidimensional oferecida pelos mais ferrenhos defensores de cada lado. De fato, há um meio-termo considerável, se não por outra razão, pelo fato de que a experiência política pós-autoritária tem sido marcada por uma evolução constante tanto das regras institucionais quanto dos atores envolvidos, o que sugere que ambos os lados podem ter tido razão em distintos momentos. Pereira e Mueller (2003:737-738) argumentam, por exemplo, que, de um lado, o processo decisório é descentralizado pelas regras eleitorais (particularmente a representação proporcional com lista aberta), pelo sistema multipartidário e pelo federalismo, mas, por outro lado, eles notam que o processo decisório é centralizado pelas regras internas do processo decisório dentro do Congresso e pelos fortes poderes legislativos e orçamentários do Executivo. O resultado é um delicado equilíbrio entre a centralização e a descentralização do processo decisório. O sucesso deste depende da capacidade do presidente e do colégio de líderes de prover os benefícios eleitorais e orçamentários para aglutinar aliados em potencial. Sob uma liderança habilidosa, é possível criar o que Amorim Neto, Cox e McCubbins (2003) denominam de "parliamentary agenda cartel" (cartel de controle de agenda parlamentar), em que a agenda legislativa e as propostas de lei podem ser negociadas entre o Poder Executivo e os líderes dos partidos políticos aliados antes que qualquer proposta seja levada para votação. Tal arranjo permite que potenciais jogadores de veto sejam barrados da deliberação política, evitando-se a perda do controle da agenda. O cartel limita a participação a um pequeno grupo de líderes partidários interessados em atingir seus objetivos dentro da maioria e sem custosas negociações com a oposição7 7 . No entanto, a troca de votos por cargos ou receitas ( pork) continua, só que melhor administrado por um grupo menor, com menos " free agents", parlamentares agindo individualmente, fora do âmbito das negociações partidárias. .

Dada a coexistência, no período pós-constituinte, de fases de significativa reforma e fases caracterizadas pelo rent-seeking caótico e indisciplinado, torna-se clara a presença de um delicado equilíbrio entre processos decisórios centralizados e descentralizados no sistema político brasileiro. Esse equilíbrio depende do assunto em pauta, da popularidade do Executivo, da proximidade das eleições e de inúmeros outros fatores conjunturais.

Mas onde se encaixa o Judiciário diante dessas visões do sistema político brasileiro?

Com exceção de Stepan (2000), que incorpora o Judiciário como um fator "demos-constraining" (antimajoritário), poucos cientistas políticos consideram a atuação do Judiciário ao estudarem a tomada de decisões pelo sistema político brasileiro. Alguns comentam en passant a possível importância dos tribunais. Ames, por exemplo, observa em nota de rodapé que, "embora a discussão sobre jogadores de veto esteja centrada em presidente e partidos, a questão claramente possui implicações para outros atores institucionais. Em sistemas com muitos jogadores de veto, judiciários e burocracias tipicamente possuem amplos papéis legislativos" (2001:17, tradução do autor).

Mesmo quando o Judiciário é incluído em estudos abrangentes sobre o sistema político brasileiro, a análise geralmente restringe-se a enfatizar sua implicação no campo hobbesiano da segurança pública (ver Pereira, 2000) ou no campo smithiano, dando respaldo aos contratos essenciais à economia de mercado moderna (ver Castelar Pinheiro, 2000). Pouca atenção se volta para sua dimensão madisoniana de embate entre os três poderes, especialmente no tocante à elaboração das políticas públicas. Em parte, diga-se de passagem, essa falha se deve à dificuldade de traduzir o impacto do Judiciário em termos claros e objetivos. Regras eleitorais, manobras parlamentares e a estrutura do Executivo são temas de interesse comum entre os cientistas políticos. O Judiciário fica – juntamente com a autoridade monetária e as agências reguladoras – como um tema marginal e tido como acessível somente a especialistas. Um tema cujo possível impacto é reconhecido somente quando ocorre uma atuação inesperada.

Essa postura, no entanto, é um erro que afeta significativamente a relação entre as análises dos cientistas políticos e o real funcionamento do sistema político. Considerando apenas as políticas implementadas pelo governo federal, pode-se observar que a localização do Brasil na dimensão majoritária-consensual da democracia varia de acordo com o estágio do processo político, ou seja: o sistema é altamente majoritário quando se trata do processo de deliberação de políticas públicas, mas tende para a forma consensual durante o processo de implementação das políticas. O Judiciário – juntamente com os governadores, prefeitos e burocracias estatais, que também podem ter um impacto significativo na implementação das políticas públicas – desempenha um papel extremamente relevante para explicar essa dualidade. Os tribunais ampliam o leque de atores que podem influenciar a implementação de políticas públicas, mesmo depois de elas serem aprovadas por amplas maiorias legislativas.

Além dessa ampliação do leque de possíveis atores, existe um outro motivo que torna essencial incorporar o Judiciário de forma mais objetiva: o crescente reconhecimento pelos cientistas políticos de que os grupos de interesse procuram o local institucional mais favorável para contestar as políticas públicas ("venue-seeking"), seja esse local o Judiciário, as agências reguladoras ou as burocracias específicas. O conceito de "venue-seeking" sugere que os atores políticos procuram as instâncias institucionais que mais lhes convêm. Por uma série de razões relacionadas à capacidade do Judiciário de impor suas decisões (discutidas na próxima seção), não é de estranhar que ele venha sendo usado crescentemente como um "venue" importante para a contestação das políticas públicas.

Uma parte do debate sobre a atuação do Poder Judiciário, principalmente a análise da prerrogativa de revisão de constitucionalidade, enfoca o impacto dele sobre as políticas públicas. Por um lado, Arantes (2005:232) argumenta que o Judiciário tem tido um papel significativo na tomada de decisões, "acentuando ainda mais o modelo consensual da democracia brasileira". Do outro, Koerner afirma que o Supremo Tribunal Federal – STF tem agido cautelosamente. Segundo o autor, no período pós-Constituinte, o STF "não funcionou como instituição contra-majoritária, que permitia o veto às reformas políticas, nem foi causador de incerteza e ingovernabilidade" (2005:24).

Adiante, argumentarei que o Judiciário federal – como um todo, não me restringindo tão-somente ao STF8 8 . De acordo com a Constituição (art. 106), o STF e o Superior Tribunal de Justiça – STJ não fazem parte da Justiça Federal, que é composta apenas pelos Tribunais Regionais Federais – TRFs e pelos juízes federais de instâncias inferiores. No entanto, como o STF e o STJ têm jurisdição nacional, como instâncias recursais (art. 92, §2), eles têm controle sobre toda a legislação, inclusive a federal. Quando uso aqui Judiciário ou Judiciário federal, portanto, estou me referindo ao STF, ao STJ, aos TRFs e aos juízes federais de primeira instância. – tem tido, e provavelmente continuará tendo, um impacto nas políticas públicas adotadas pelo governo federal, permitindo que algumas vozes minoritárias sejam incorporadas, ainda que minimamente ou de forma marginal, na elaboração dessas políticas. Mesmo que não tivesse tido nenhum impacto nas primeiras duas décadas da Nova República, a análise apresentada aqui não seria em vão, da mesma forma que analisar um Congresso subserviente ao Executivo não é um exercício meramente acadêmico, já que o estudo dessa relação nos ajuda a entender suas conseqüências práticas e as possíveis repercussões de eventuais mudanças institucionais.

Em relação ao impacto do Judiciário nas políticas públicas federais, as evidências disponíveis sugerem que o Judiciário tem sido acionado constantemente, tanto com base na Constituição quanto na legislação infraconstitucional, para deliberar sobre políticas públicas contenciosas. Estou de acordo com Koerner (2005) quando ele argumenta que o STF, em particular, tem agido de forma muito cautelosa e até conservadora para evitar alargar potenciais conflitos com o Executivo. Esse argumento é comum na literatura mundial sobre os tribunais, já que eles não podem atuar sem correr o risco de perder o seu poder para um Executivo cioso das próprias prerrogativas9 9 . Sobre as experiências de outros países neste sentido, ver, por exemplo, Chavez (2001; 2004); Scribner (2003); Shapiro (2004); e Uprimny (2004). .

Vanberg (2001), utilizando um modelo baseado na teoria dos jogos para modelar as relações entre Legislativo e Judiciário, demonstra que – sob condições de transparência – quanto maior o apoio público dado à atuação do tribunal, menor será a deferência dele ao Legislativo. Caso a legislação questionada seja de suma importância para o Legislativo, no entanto, os tribunais serão menos hostis a ela. As duas grandes dúvidas que surgem desse modelo são: por que o Judiciário brasileiro não reage da mesma forma que os tribunais hipotéticos de Vanberg à falta de apoio majoritário?; por que o Judiciário não aparenta se preocupar em vetar projetos de grande importância para o Legislativo? Não tentarei responder definitivamente essas duas perguntas neste espaço, mas elas sugerem que a troca de informações entre os estudiosos do Judiciário e o mainstream da ciência política brasileira é um caminho de duas mãos, e que nós, estudiosos do Judiciário, temos muito a aprender com os estudiosos da relação entre Legislativo e Executivo.

Na análise do caso brasileiro, o modelo Vanberg parece estar fadado ao fracasso. A combinação da fraqueza do Legislativo – em termos de sua capacidade de ação coletiva (independente do Executivo) – e a dificuldade que a população tem de cobrar ação de seus representantes – fruto do sistema eleitoral – fazem com que o Judiciário tenha uma alta probabilidade de evitar punições do Legislativo quando toma decisões que contrariam a maioria legislativa. Não é tão fácil evitar punições oriundas do Executivo, e talvez seja por isso que o Judiciário aja conservadoramente quando possível. Mas, como veremos a seguir, o Judiciário nem sempre é submisso, mesmo quando tem a oportunidade de agir mais timidamente. Como o jogo é interativo, e os atores podem aprender com os turnos anteriores, em algum momento se espera que o Executivo reaja a essas provocações ou que o Judiciário capitule. Talvez estejamos mais próximos da segunda situação. No entanto, o conservadorismo do STF não se reflete em uma timidez exagerada, o que deixa em aberto o questionamento sobre estes dois fenômenos empíricos: a assertividade da Justiça e a aceitação (mesmo acompanhada de altas reclamações) disso pelo Executivo e seus aliados no Congresso.

Em termos comparados, a atuação do Judiciário brasileiro é significativa. Nos 15 anos entre 1988 e 2002, o STF – somente através do instrumento da Ação Direta de Inconstitucionalidade – Adin – concedeu decisões liminares ou de mérito invalidando parcialmente mais de 200 leis federais. Em comparação, entre 1994 e 2002, a Suprema Corte mexicana julgou a constitucionalidade de um pouco mais de 600 leis naquele país usando dois instrumentos parecidos com a Adin, mas invalidou somente 21 leis federais; em toda sua história, a Suprema Corte americana invalidou em torno de 135 leis federais apenas (Taylor, no prelo). Mesmo no governo de Fernando Henrique Cardoso – um presidente apoiado (pelo menos inicialmente) por uma ampla coalizão reformista –, o Judiciário federal como um todo foi convocado por atores externos para julgar todas as principais políticas públicas adotadas pelo Executivo e seus aliados no Congresso. O governo Fernando Henrique barganhou duramente para produzir maiorias legislativas que o permitissem superar as rígidas regras para a aprovação de emendas constitucionais ou leis complementares no Senado e na Câmara. Mas ao final desse imenso esforço político, a contestação judicial da reforma foi um acontecimento crônico, usado recorrentemente por grupos deixados de fora das negociações entre membros do parliamentary agenda cartel. As mais significativas e reais ameaças às reformas surgiram no Judiciário e não no Legislativo: das 10 principais iniciativas políticas aprovadas durante o governo Fernando Henrique, todas foram contestadas de alguma forma pelo Judiciário, e sete das 10 foram alteradas ou atrasadas de alguma maneira no STF10 10 . As 10 políticas mencionadas são o Fundo Social de Emergência, o Plano Real, as reformas da ordem econômica, o Plano Nacional de Desestatização, o Fundo de Estabilização Fiscal, a Contribuição Provisória sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – CPMF, a reforma administrativa, a reforma previdenciária, a tributação da aposentadoria de servidores públicos e o racionamento de energia elétrica (Taylor, 2006a). . Em outras palavras, nem toda proposta do governo foi contestada judicialmente, mas as mais importantes e contenciosas certamente o foram, e com algum sucesso.

No decorrer da última década, o Judiciário Federal revelou-se um importante ator político: tribunais federais repetidamente interromperam imensos leilões de privatização; a realização de uma delicada reforma no sistema de previdência social foi subvertida; e o Judiciário anulou ou mudou a legislação referente à reforma agrária, às reformas tributárias e a outras políticas públicas significativas. O Judiciário continua exercendo uma influência importante hoje. Durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, tribunais também participaram da formulação de políticas governamentais de várias maneiras. Entre as mais recentes ilustrações: em 2005, o Judiciário federal aprovou uma grande aquisição empresarial pela Nestlé, revertendo decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade, que havia rejeitado a operação; o STF interrompeu as investigações de corrupção dentro do Congresso durante 2006; juízes federais têm forçado governos estaduais a honrarem precatórios cujos valores são estimados em até US$ 20 bilhões por ano; o STF negou, retroativamente, um aumento do Programa de Integração Social – PIS/Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins em uma decisão cujo custo, em tese, poderia chegar a quase 11% do total de tributos federais arrecadados; e assim por diante.

À luz desse papel manifesto e tão recorrente, torna-se claro que o Judiciário precisa ser melhor incorporado às nossas análises do sistema político. De outra maneira, o processo de decisão política será incorretamente compreendido e a importância de atores relevantes para o debate das políticas públicas poderá ser mal-entendido ou até mesmo ignorado. Em particular, os perdedores na negociação entre Executivo e Legislativo – precisamente os grupos mais propensos a utilizar o Judiciário – serão negligenciados ou ignorados em nosso entendimento da negociação e da possibilidade de mudança nas políticas públicas.

Para ilustrar as conseqüências de deixar o Judiciário fora da análise da tomada de decisões pelo sistema político brasileiro, ofereço uma visão heurística e simplificada da reforma agrária de 1999-2000. Nesse caso, o governo Fernando Henrique tentou, com algum sucesso, achar um espaço de comum acordo entre os donos de terra e o Movimento dos Sem-Terra – MST. A legislação proposta pelo governo federal estabelecia limites para compensações excessivas em expropriações de terra, mas também criou importantes restrições às invasões empreendidas pelos sem-terra. Para descrevê-lo em um gráfico de duas dimensões euclidianas, reduzirei a uma única distribuição de preferências: 1) os donos de terra preferiam um maior grau de restrição às invasões e um menor grau de restrição às compensações; 2) os sem-terra preferiam o exato oposto; e 3) o governo preferia um maior grau de restrições tanto às invasões quanto às compensações que seriam pagas pelo erário (Figura 1). Em outras palavras, era possível mudar a política pública existente para qualquer lugar dentro da região escura entre o status quo 1 (SQ1) e o status quo 2 (SQ2), e, em particular, era possível mudar do SQ1 para uma posição mais próxima do SQ2. Na sua essência, essa foi a proposta do governo, que tentava mudar do SQ1 para o SQ2 por meio de medida provisória.


Faltou, no entanto, incorporar à proposta os interesses de um jogador de veto em potencial, a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. Embora não tivesse representação direta no Congresso – e se tivesse, mal poderia usá-la por se tratar de uma medida provisória –, a OAB teve acesso ao ponto de veto oferecido por ser um ator com legitimação ativa para apresentar Adins. Isso permitiu que a OAB se inserisse no debate sobre a reforma através do STF. Quando a medida provisória foi decretada, a OAB imediatamente contestou vários elementos da nova política por meio de Adin. A OAB teve sucesso em um ponto de especial interesse a seus membros: o STF deferiu em parte o pedido de liminar contra os limites decretados pelo governo para os honorários advocatícios em casos de expropriação11 11 . Como em muitos outros casos, nessa Adin, a liminar foi deferida, mas até hoje o STF não se pronunciou sobre o mérito da Adin, já que a liminar criou um fato novo. .

Como resultado, a OAB conseguiu mudar a política pública do SQ2 para o status quo 3 (SQ3) (Figura 2), transferindo o resultado de um ponto próximo às preferências centrais do governo para um ponto mais próximo das preferências dela, eliminando as novas limitações propostas pelo governo no tocante às restrições aos honorários advocatícios. Sem o acesso ao STF e ao mecanismo da Adin ou sem um Judiciário capaz de tomar decisões e tê-las respeitadas e cumpridas pelo Executivo, esse resultado não teria sido possível. Do ponto de vista analítico, o ponto de veto oferecido pelo Judiciário a um grupo profissional oposto à redução dos próprios rendimentos teve um impacto muito grande na capacidade do governo de ver suas primeiras preferências implementadas. Não seria – e de fato não foi – diferente em outras ocasiões, nas quais as propostas do governo foram implementadas não através de medida provisória, mas após longo debate entre Executivo e Legislativo.


Com esse potencial impacto do Judiciário em mente, volto na próxima seção para uma tentativa de sistematizar um pouco mais o papel do Judiciário nas políticas públicas a fim de facilitar a inserção do Judiciário no mainstream da ciência política brasileira e, talvez mais importante, ajudar futuros pesquisadores a explicar os resultados práticos dessa inserção em termos das políticas públicas que são efetivamente implementadas.

PENSANDO A ATUAÇÃO DO JUDICIÁRIO NA FORMAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

Naturalmente é impossível criar um modelo preditivo incorporando todos os fatores que possam influenciar a atuação do Judiciário nas políticas públicas, da mesma forma que não existe um modelo preditivo para a atuação do Legislativo. No entanto, podemos apontar quatro dimensões centrais que ajudam a analisar o efeito do Judiciário sobre as políticas públicas e a incorporá-lo ao estudo mais amplo sobre policymaking:

1. Em que momento e de que maneira o Judiciário pode influenciar as políticas públicas?

2. Quais as motivações do Judiciário na hora de tentar resolver disputas sobre políticas públicas?

3. Como os atores externos ao Judiciário usam-no para atingir seus objetivos políticos?

4. Quais as conseqüências da intervenção do Judiciário nas políticas públicas?

Discuto essas quatro dimensões a seguir.

1. Em relação à primeira dimensão – o timing da intervenção do Judiciário no processo de formação de políticas públicas –, é comum supor que o Judiciário somente atuará nas políticas públicas depois de elas serem aprovadas pelo Legislativo (ver, por exemplo, Epstein, Knight e Shvetsova, 2001:123-124). Mas tanto os juízes de tribunais inferiores quanto os ministros do STF podem ter um impacto significativo e muito anterior na elaboração de políticas públicas. Embora não tenham legitimidade para iniciar contestações judiciais sobre ações do Legislativo e do Executivo, os integrantes do Judiciário brasileiro têm capacidade de influenciar a discussão das políticas públicas antes de elas serem aprovadas, sinalizando suas preferências e as fronteiras que as mudanças provocadas por essas políticas podem atingir.

Os juízes sinalizam suas preferências publicamente muito antes da aprovação final dos projetos, seja por meio de pronunciamentos públicos (caso do ministro Carlos Velloso na segunda tentativa de reforma da Previdência durante o governo Fernando Henrique) ou através de reuniões a portas fechadas entre Executivo e Judiciário (caso das medidas contra o apagão, que foram discutidas de antemão entre um representante do Executivo, Pedro Parente, e integrantes do STF). Esse tipo de sinalização calculada tem efeitos que antecipam o resultado final, inserindo os juízes no jogo e alterando a política pública resultante, muitas vezes sem o Judiciário precisar utilizar seus poderes formais. Como Lax e McCubbins (2006) observam sobre o caso norte-americano, o reconhecimento do papel dos tribunais nesse momento de deliberação anterior à aprovação das políticas públicas ajuda a derrubar o argumento de Rosenberg (1991) de que os tribunais são inefetivos na construção de políticas públicas. Isto é, mesmo sem usar seus poderes formais, como os de revisão constitucional, o Judiciário pode ter um impacto no momento da deliberação, eliminando algumas alternativas e constrangendo a liberdade de ação de outros atores políticos.

A isso somaríamos os instrumentos formais que o Judiciário pode utilizar para influenciar as políticas públicas ainda em formação. O STF não tem os mesmos poderes de revisão constitucional anteriores à implementação de lei que a Suprema Corte chilena ou os tribunais superiores alemães ou italianos têm, que lhes permite suspender uma lei antes de a mesma entrar em vigor. No entanto, o STF tem mostrado uma crescente (e controvertida) tendência à interferência nos trabalhos legislativos por meio de instrumentos legais. Um caso é o da liminar proferida pelo ministro Marco Aurélio de Mello, que paralisou a votação da primeira reforma da Previdência durante o governo Fernando Henrique. A votação só foi retomada quando a liminar foi derrubada pelo colegiado do STF (em uma votação de 10 a 1).

A possibilidade de o Judiciário agir na hora da implementação para mudar as regras ou os resultados das políticas públicas é amplamente mais reconhecida. Vários fatores podem ser considerados quanto à interferência das decisões dos juízes na implementação das políticas públicas. O primeiro diz respeito ao impacto das regras institucionais na possibilidade de grupos opostos à política em questão recorrerem aos tribunais: o tipo de revisão constitucional (abstrato, concreto ou, como no caso brasileiro, híbrido); quem tem legitimidade ativa (standing) e em quais situações; o grau de independência dos juízes tanto em relação ao Poder Executivo quanto em relação aos próprios colegas; a celeridade do sistema legal; e assim por diante (Ríos-Figueroa e Taylor, 2006). No entanto, como esses fatores são razoavelmente fixos no tempo e bem estabelecidos no caso brasileiro, é melhor enfocar duas características que dão alguma margem de manobra aos juízes: os instrumentos de decisão e o timing do uso deles.

No que diz respeito aos instrumentos, sabemos que alguns são mais robustos, por assim dizer, que outros, do ponto de vista de seu impacto nas políticas públicas. Uma Adin ou uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF, por exemplo, têm muito mais impacto e sobrevida do que uma decisão recorrível de juiz federal de primeira instância. No entanto, mesmo no caso da Adin, existe uma grande margem para mudar o timing do impacto judicial na implementação, seja acelerando uma decisão através de liminar, seja protelando o processo por meio de pedidos de vista. Também existem inúmeras possibilidades para arquivar ações por motivos processuais, evitando assim uma decisão do mérito (Koerner, 2005; Pacheco, 2006). Há, portanto, uma capacidade considerável dos ministros do STF de controlar o timing e as conseqüências de seu impacto, seja sustentando políticas públicas que apóiam ou atrasando a derrota daqueles que eles acreditam ser de constitucionalidade duvidosa, porém preferíveis. O controle por juízes de instâncias inferiores é menos decisivo, já que seus pareceres são passíveis de recurso. No entanto, a elaboração de teses convincentes e o consenso entre juízes de instâncias inferiores podem ter uma influência importante, bloqueando ex post a implementação de políticas públicas ou tirando certas alternativas do leque de opções consideradas como plausíveis ex ante pelos formadores de políticas públicas.

Em suma, o Judiciário pode influenciar os resultados das políticas públicas tanto no momento da deliberação quanto na hora da implementação com uma variedade de possíveis estratégias: sinalizando as fronteiras permitidas para a alteração da política pública, sustentando-a e legitimando-a diante da possível oposição, atrasando uma decisão sobre uma determinada política e, assim, controlando a agenda de deliberação da política pública ou, até mesmo, alterando ou rejeitando a proposta após sua implementação.

2. A segunda dimensão diz respeito às motivações do Judiciário. Existe já uma boa literatura sobre a cultura legal dos juízes, tanto no Brasil (Bonelli, 2002; Castelar Pinheiro, 2003; Nalini, 2000; Rosenn, 1984; Werneck Vianna et alii, 1997) quanto no mundo afora (ver Pérez-Perdomo e Friedman, 2003). À cultura interna atribui-se o fato de os juízes brasileiros, sob os preceitos dos códigos civil e criminal, agirem de maneira formalista, focando mais em princípios do que em conseqüências, muitas vezes com bastante ênfase na proteção de direitos individuais, sejam quais forem as suas implicações mais amplas. Na literatura legal e até nos jornais diários, é muito comum ver uma defesa da neutralidade dos juízes, o que se reflete em um senso comum entre juristas: o juiz correto não se desvincula da lei, quaisquer que sejam suas preferências pessoais12 12 . Uma reflexão não muito incomum de um ministro do STF nesse sentido foi auferida pelo ministro Moreira Alves na Adin n º 896: "Como é sabido, não só a Corte está restrita a examinar os dispositivos ou expressões dele cuja inconstitucionalidade for argüida, mas também não pode ela declarar inconstitucionalidade parcial que mude o sentido e o alcance da norma impugnada (quando isso ocorre, a declaração de inconstitucionalidade tem de alcançar todo o dispositivo), porquanto, se assim não fosse, a Corte se transformaria em 'legislador positivo', uma vez que, com a supressão da expressão atacada, estaria modificando o sentido e o alcance da norma impugnada. E o controle de constitucionalidade dos atos normativos pelo Poder Judiciário só lhe permitem agir como 'legislador negativo'." – uma visão bonita e certamente imbuída de certa dose de verdade, já que o juiz dificilmente pode tomar decisões que fujam muito da lei vigente. Mas nem por isso é uma visão cem por cento precisa no que concerne às políticas públicas, especialmente tendo em vista o grau de flexibilidade mencionado anteriormente que permite ao juiz intervir de diversas formas e em diversos momentos nas políticas públicas.

Nesse sentido, concordo com a conclusão de Gibson (1983) de que as decisões dos juízes são uma função do que eles preferem fazer, moderadas pelo que acham que devem fazer, mas constrangidas pelo que percebem que é viável fazer. Como já foi dito, às vezes nem é preciso uma decisão formal para que o juiz tenha um impacto no caminho da deliberação e, portanto, a adesão à lei nem sempre é o principal fator determinante da atuação do juiz. Afinal, os juízes – como outros atores políticos – podem agir estrategicamente, blefando ou criando empecilhos legais que correspondam às suas preferências pessoais (vide a quantidade de processos recentes contra as regras antinepotismo impostas pelo Conselho Nacional de Justiça).

Diante dessa visão mais cética sobre as motivações dos juízes, a literatura da ciência política internacional sobre os juízes e os constrangimentos à sua atuação inclui três correntes principais: a institucional (ver Clayton e Gillman, 1999; Smith, 1988); a estratégica (ver Baum, 1997; Vanberg, 2001); e a atitudinal (ver Segal e Spaeth, 1993). No Brasil, somente a primeira parece ter vingado. A corrente atitudinal é de difícil aplicação devido à complexidade de se estudar as atitudes dos juízes ou ministros em um sistema multipartidário em que as dimensões da disputa política dificilmente podem ser analisadas em um espectro binário. A corrente estratégica refere-se à tentativa dos tribunais de conquistar e de manter seu poder diante da força dos poderes eleitos. Essa corrente já foi amplamente aplicada aos casos mexicano (ver Finkel, 2007) e argentino (ver Helmke, 2002), por exemplo, suscitando a dúvida de por que não teve a mesma popularidade entre os estudiosos do Judiciário brasileiro. Em parte, a resposta se dá pela inversão do caminho comum no caso brasileiro: em vez de ter tido que conquistar seu poder, os tribunais receberam uma abundância de poderes na Constituição e somente depois tiveram que decidir como melhor os utilizar sem provocar reações dos poderes eleitos. Com isso não pretendo afirmar que as motivações estratégicas ou atitudinais inexistam no caso brasileiro ou que essas abordagens não deveriam ser aplicadas a ele, mas simplesmente enfatizar que a abordagem institucionalista parece ter sido a mais útil e produtiva nesse primeiro momento dos estudos do Judiciário pós-1988 por uma série de motivos tanto metodológicos quanto conjunturais.

A essas análises da atuação dos juízes, adicionaria mais dois fatores relacionados às características das políticas públicas. O primeiro diz respeito mais às políticas públicas sendo contestadas do que ao próprio Judiciário: a importância delas (ou "salience"). A idéia de que a importância de um determinado processo para os juízes motiva a atuação (ou a não-atuação) do Judiciário e, portanto, também afeta os cálculos dos jogadores que acionam o Judiciário, é facilmente comprovada empiricamente e faz parte do consenso geral na literatura (ver Epstein, Knight e Shvetsova, 2001). A esse argumento adiciono um segundo: as características das políticas públicas em si ajudam a determinar sua judicialização, com ou sem a iniciativa dos juízes. Baseando-me na obra de Lowi (1964; 1972) e Wilson (1995) – sumarizada como "policy determines politics" –, é possível afirmar que, da mesma forma que a distribuição de custos e benefícios das políticas públicas (policy) determina os percursos de seu andamento político (politics) no Executivo e no Legislativo, essas características das políticas públicas também influenciam a provável intensidade de utilização do Judiciário. Abusando da famosa frase de Clausewitz sobre a guerra, a judicialização pode ser vista como uma extensão da política por outros meios, tornando-se mais provável quando os custos de uma determinada política são muito concentrados entre um pequeno grupo de perdedores.

3. Assim sendo, o juiz dificilmente é o único ator relevante na deliberação das políticas públicas no Judiciário. Especialmente depois de implementada, a política pública pode ser contestada judicialmente por uma série de atores tanto do mundo político quanto da sociedade civil. O fato de o Judiciário ter, necessariamente, que lidar com essas contestações força-o – mesmo contra sua vontade ou protelando ao máximo – a ouvir e a tratar de opiniões muitas vezes minoritárias e contrárias aos interesses predominantes no eixo Executivo-Legislativo. Na primeira seção, mencionei o conceito de "venue seeking" e o fato de o Judiciário ser um dos "venues" mais poderosos para a ação opositora às políticas públicas já implementadas. As regras institucionais, como constatamos anteriormente, podem dar poder a grupos minoritários que não agem no momento da deliberação entre Executivo e Legislativo, inserindo-os no debate pós-hoc e permitindo que usem os tribunais como um ponto de veto no jogo político.

Em termos gerais, a literatura já revelou mais ou menos quais são os grandes atores que usam cada instrumento legal com maior sucesso: nas Ações Populares, os dois principais grupos são parlamentares e advogados; nas Ações Civis Públicas, é o Ministério Público na grande maioria das vezes (Werneck Viana e Burgos, 2002); no caso das Adins, é o Ministério Público e a OAB (Arantes, 1997; Taylor, 2006b); e assim por diante. No entanto, o impacto dessa atuação no sistema político depende tanto das regras que governam a legitimidade ativa dos atores diante dos tribunais quanto da força dos argumentos legais à sua disposição e também das regras vigentes de abrangência das decisões jurídicas. Em termos simplistas, quanto mais abrangente e vinculante o instrumento jurídico usado, maior o potencial de se criar um ponto de veto dentro do Judiciário, como é o caso da Adin no STF. No entanto, a falta de resultados abrangentes e vinculantes – e o que Arantes (1997:33) descreve como a "atomização da apreciação judicial difusa" – tende a providenciar outro mecanismo tático para os atores políticos: a incerteza gerada pela protelação de uma decisão definitiva através do recorrente uso de diversas instâncias ou recursos no Judiciário (Quadro 1).


Essa segunda tática não requer que os argumentos legais necessariamente estejam a favor do grupo de oposição: na luta contra as privatizações nos anos 1990, por exemplo, muitas vezes a oposição buscou encontrar um juiz que simpatizasse o suficiente com a questão para emitir uma liminar contra os leilões, mesmo sabendo que ela seria derrubada em seguida, diante das leis em vigor. Em outras palavras, não tem sido raro a oposição política usar os tribunais mesmo sabendo que não tem condições legais de vencer a briga: o Judiciário também serve para as oposições mostrarem serviço, protelando a implementação de políticas públicas contrárias aos interesses de seus seguidores e chamando a atenção pública para sua oposição. Nessa linha, Werneck Vianna et alii explicam a tendência dos partidos políticos de entrar com recurso no Judiciário "visando apenas marcar uma posição de contraste com a maioria e demonstrar aos seus aderentes e ao público em geral a sua disposição de esgotar, no terreno institucional, todas as possibilidades abertas à sua intervenção" (1999:127).

4. Finalmente, é importante pensar quais as conseqüências do crescente papel do Judiciário nas políticas públicas. Mesmo se argumentarmos que os tribunais têm tido pouco efeito concreto nas políticas públicas, agindo tímida e conservadoramente, de forma meramente reativa, é importante reconhecer que, mesmo assim, o Judiciário pode ter um impacto significativo (embora meramente reativo) na legitimação de propostas majoritárias. Esse tipo de atuação não é ausente na história recente e pode ter tido um impacto forte, por exemplo, na legitimação de alguns procedimentos questionáveis como o uso exagerado da medida provisória ou de certas políticas públicas como o Plano Collor (Koerner, 2005; Vilhena Vieira, 2002).

Se partirmos – ao contrário – da suposição de que o Judiciário teve, sim, um impacto proativo nas políticas públicas, a pergunta que se levanta é por quê? Por que um Executivo poderoso, aliado a um parliamentary agenda cartel majoritário, cumpriria as decisões de um Judiciário que o contraria proativamente? A questão de por que o Executivo segue as determinações de juízes cujo poder individual é extremamente restrito é pouco estudada (mas vale a pena ver Epstein, Knight e Shvetsova, 2001:126 e Staton, 2002; 2004) e, no caso brasileiro, é um pouco misteriosa. Será que, apesar da sua força, existe no Poder Executivo brasileiro certa preferência por atitudes que fortaleçam a democracia, como seguir fielmente as decisões do Judiciário? Dado o ceticismo profissional dos cientistas políticos, essa explicação – por melhor e mais acurada que seja – provavelmente não terá sobrevida longa. Portanto, como explicar a resolução do Executivo de cumprir decisões judiciais contramajoritárias, mesmo quando elas são extremamente caras em termos de recursos gastos, negociações desperdiçadas e preferências detonadas?

Uma explicação é a alternância no poder, que leva o Executivo de hoje a obedecer ao Judiciário para resguardar o controle judicial para quando estiver fora do poder (ver Ginsburg, 2003; Ramseyer, 1994). Uma outra explicação, sugerida por Whittington (2005), é que mesmo os incumbentes se beneficiam de um Judiciário independente: 1) o Judiciário pode alterar a legislação aprovada por governos anteriores e, assim, mesmo agindo independentemente, melhorar as condições para a implementação das preferências do atual governo. Talvez mais importante, de acordo com Whittington; 2) um Judiciário que contraria o governo em alguns pontos serve para legitimar as decisões desse governo em todas as outras ocasiões nas quais não se manifesta negativamente. De acordo com a análise de Weingast (1997), esse tipo de consideração por parte do Executivo pode contribuir para um sistema "self-enforcing", ou auto-regulador, isto é, sob condições favoráveis, existem incentivos para que o Executivo (e por extensão o Legislativo) obedeça ao Judiciário, mesmo não precisando. Será que essa lógica pode ajudar a explicar a relação entre Executivo e Judiciário no Brasil? Falta uma análise mais profunda da causa desse fenômeno, da negociação estratégica entre os três poderes e dos resultados concretos em termos da negociação e da implementação de políticas públicas.

CONCLUSÃO

É amplamente reconhecido que, embora o Judiciário não possua "nem a bolsa nem a espada"13 13 . "O Judiciário [...] não tem influência sobre a espada nem sobre a bolsa; não pode dirigir nem a força nem a riqueza da sociedade; e não pode tomar nenhuma iniciativa ativa [...]" (Hamilton, 1961, tradução do autor). –, ou seja, nem os poderes orçamentários do Legislativo nem os poderes coercitivos do Executivo –, ele tem um considerável poder político como depositário da fé pública nas regras do jogo. O Judiciário desempenha um papel central na determinação e aplicação de princípios tanto constitucionais quanto ideais, tais como o Rechstaat ou état de droit. Ele decide quais regras são legítimas e estão em concordância com as leis locais ou a Constituição, assim como quais ações (ou omissões) representam aberrações ou infrações. Como resultado, os tribunais influenciam o curso das políticas públicas: tribunais e juízes influenciam o tipo de políticas que são implementadas e julgam a legalidade dessas políticas dentro da sua visão das regras legais existentes e das normas e tradições vigentes.

A ciência política reconhece, há pelo menos meio século, que o Judiciário preenche um papel político como uma instituição "para a tomada das decisões sobre questões controversas da política nacional" (Dahl, 1957:279). É sabido que muitas vezes os requerentes usam o Judiciário como mais uma oportunidade ou instância política – um "venue" – e não como fonte de verdades constitucionais e legais. E se reconhece que os juízes freqüentemente operam com base em critérios outros que os unicamente legais quando julgam processos importantes. Mesmo quando eles se mantêm constrangidos por critérios totalmente legais, pela própria natureza da revisão judicial, eles acabam tomando decisões que influenciam ou até criam políticas públicas (ver Ferejohn, 2002).

No entanto, freqüentemente existe uma percepção pública de que há algo errado nessa atuação política dos tribunais no processo de formulação de políticas públicas. Pode até ser que o Judiciário prefira ocultar sua atuação atrás de um muro legalista, para tentar preservar sua legitimidade como o único poder não escolhido através de procedimentos abertamente democráticos. Certamente, a crescente judicialização e o conseqüente crescimento do impacto judicial em quase todo o mundo trouxeram consigo uma mudança no discurso sobre a influência judicial na política e, em especial, uma crítica muito forte, por parte dos poderes eleitos, aos "legisladores não-eleitos". Mas é preciso reconhecer a importância dessa função política judicial e mais, sua inevitabilidade. Embora o conceito da separação dos poderes conduza a três instituições claramente distintas, as funções judiciais, legislativas e executivas dessas instituições não são caprichosamente separadas em nítidas caixas institucionais como às vezes supomos. Existe uma sobreposição das funções das três instituições, como o Quadro 2 ilustra, diante da qual não é de surpreender que o Judiciário tenha algum efeito no processo de formação de políticas públicas. Afinal, como disse Ehrmann: "A autoridade do Judiciário para declarar leis e atos oficiais inconstitucionais é [...] um ato judicial que dá aos juízes uma participação óbvia no processo político, [deixando pouco espaço] para a proposição de que os juízes apenas apliquem a lei" (1976:138).


Analiticamente, então, é simples concluir que o Judiciário pode ser melhor incorporado às nossas análises do sistema político brasileiro. Normativamente, as coisas estão menos resolvidas e há uma certa ambigüidade que sempre cercará a atuação do Judiciário na política, tanto em termos da teoria democrática quanto na questão da formulação efetiva e eficaz das políticas públicas. É muito comum em todo o mundo reclamar da interferência de juízes na política. Mas é importante reconhecer, como o fazem Werneck Vianna e Burgos (2005:781-782), o papel democratizante do Judiciário, agindo tanto como um "muro de lamentações" quanto como "uma efetiva arena para o exercício da democracia", em uma democracia na qual a relação entre Executivo e Legislativo foge do ideal. Da mesma forma, quando pensamos o Judiciário do ponto de vista da formulação de políticas públicas, existe certa tensão normativa. Há um reconhecimento de que um Judiciário que pode contrariar o governo pode ser melhor tanto em termos econômicos (ver Castelar Pinheiro, 2003:185) quanto em relação à durabilidade dos resultados das políticas públicas. O Judiciário é fundamental para atingir o equilíbrio entre duas características: decisiveness, a eficiência na tomada de decisões pelo sistema político, e resoluteness, a capacidade do país de seguir um percurso estável e pouco errático em termos da adoção e implementação das políticas públicas14 14 . Os conceitos de decisiveness e resoluteness em relação à formulação de políticas públicas originam-se no trabalho de Haggard e McCubbins (2001). No entanto, os autores não discutem o papel do Judiciário no processo. . Em um país onde o Judiciário não cria empecilhos à atuação do Executivo, o sistema político pode ser muito eficiente na tomada de decisões, mas pode sofrer fortes oscilações de políticas públicas entre governos (vide Argentina na última década).

Este artigo enumerou alguns dos fatores que podem influenciar o impacto do Judiciário no processo de formação de políticas públicas no Brasil e as formas pelas quais o Judiciário pode ser incorporado a um modelo que não é preditivo, mas que pelo menos tem pretensões causais. Talvez tenha conseguido mostrar melhor o erro da exclusão analítica do Judiciário do que os caminhos para sua inclusão futura na literatura mais abrangente sobre a tomada de decisões. Esse desequilíbrio deve-se não à falta de interesse sobre o assunto na literatura, em que existe uma riqueza de estudos sobre o papel do Judiciário. No entanto, ainda é muito pouco desenvolvido o diálogo entre o estudo da relação Executivo-Legislativo, o estudo do Judiciário e a análise das políticas públicas. Espero ter dado um passo para a maior integração desses campos de pesquisa.

NOTAS

(Recebido para publicação em novembro de 2006)

(Versão definitiva em maio de 2007)

Matthew M. Taylor é professor doutor no Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo. É autor de Judging Policy: Courts and Public Policy Reform in Democratic Brazil (a ser publicado pela Stanford University Press) (E-mail: taylormm@uol.com.br).

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  • WILSON, James Q. (1995), Political Organizations Princeton, Princeton University Press.
  • 1
    . Este artigo faz parte da corrente de análise positiva sobre a função política dos tribunais, distinguindo-se assim da literatura normativa produzida por juristas e professores de Direito. Na visão normativa, procura-se definir como os juízes devem decidir processos ou se relacionar com as outras instituições no sistema político diante das regras legais vigentes. Na teoria positiva, procura-se entender não como os juízes devem agir, mas por que eles agem da forma que de fato agem, o que motiva os juízes a decidir da forma que decidem e que forças podem influenciar essa atuação. Uma das melhores discussões dessa distinção e de sua importância tanto para a ciência política quanto para estudiosos de Direito é de Friedman (2005).
  • 2
    . Para uma discussão mais ampla da dimensão hobbesiana e madisoniana, ver Magaloni (2003). Adiciono aqui o que chamo da dimensão smithiana por achar que o impacto do Judiciário na economia é uma terceira dimensão de suma importância ao se pensar o impacto do Judiciário na governabilidade.
  • 3
    . Entre muitos trabalhos nesse sentido, alguns servem de exemplo: livros como os de Arantes (1997); Favetti (2003); Sadek (1995; 1999; 2000); Werneck Vianna
    et alii (1999); e Werneck Vianna (2002); artigos e capítulos como os de Cunha (2001); Faro de Castro (1997a; 1997b); Koerner (2005; 2006); Oliveira (2005); Werneck Vianna e Burgos (2005); e recentes teses de doutorado como Carvalho Neto (2005); Oliveira (2006); e Pacheco (2006).
  • 4
    . A natureza dicotômica do debate sobre as instituições políticas brasileiras é explicitada em Palermo (2000) e Pereira e Mueller (2003).
  • 5
    . Por exemplo: Abrucio (1998); Ames (2001); Kinzo (1997; 1999); Mainwaring (1995); Stepan (2000).
  • 6
    . Por exemplo: Figueiredo (2001); Figueiredo e Limongi (1999; 2002).
  • 7
    . No entanto, a troca de votos por cargos ou receitas (
    pork) continua, só que melhor administrado por um grupo menor, com menos "
    free agents", parlamentares agindo individualmente, fora do âmbito das negociações partidárias.
  • 8
    . De acordo com a Constituição (art. 106), o STF e o Superior Tribunal de Justiça – STJ não fazem parte da Justiça Federal, que é composta apenas pelos Tribunais Regionais Federais – TRFs e pelos juízes federais de instâncias inferiores. No entanto, como o STF e o STJ têm jurisdição nacional, como instâncias recursais (art. 92, §2), eles têm controle sobre toda a legislação, inclusive a federal. Quando uso aqui Judiciário ou Judiciário federal, portanto, estou me referindo ao STF, ao STJ, aos TRFs e aos juízes federais de primeira instância.
  • 9
    . Sobre as experiências de outros países neste sentido, ver, por exemplo, Chavez (2001; 2004); Scribner (2003); Shapiro (2004); e Uprimny (2004).
  • 10
    . As 10 políticas mencionadas são o Fundo Social de Emergência, o Plano Real, as reformas da ordem econômica, o Plano Nacional de Desestatização, o Fundo de Estabilização Fiscal, a Contribuição Provisória sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – CPMF, a reforma administrativa, a reforma previdenciária, a tributação da aposentadoria de servidores públicos e o racionamento de energia elétrica (Taylor, 2006a).
  • 11
    . Como em muitos outros casos, nessa Adin, a liminar foi deferida, mas até hoje o STF não se pronunciou sobre o mérito da Adin, já que a liminar criou um fato novo.
  • 12
    . Uma reflexão não muito incomum de um ministro do STF nesse sentido foi auferida pelo ministro Moreira Alves na Adin n
    º 896: "Como é sabido, não só a Corte está restrita a examinar os dispositivos ou expressões dele cuja inconstitucionalidade for argüida, mas também não pode ela declarar inconstitucionalidade parcial que mude o sentido e o alcance da norma impugnada (quando isso ocorre, a declaração de inconstitucionalidade tem de alcançar todo o dispositivo), porquanto, se assim não fosse, a Corte se transformaria em 'legislador positivo', uma vez que, com a supressão da expressão atacada, estaria modificando o sentido e o alcance da norma impugnada. E o controle de constitucionalidade dos atos normativos pelo Poder Judiciário só lhe permitem agir como 'legislador negativo'."
  • 13
    . "O Judiciário [...] não tem influência sobre a espada nem sobre a bolsa; não pode dirigir nem a força nem a riqueza da sociedade; e não pode tomar nenhuma iniciativa ativa [...]" (Hamilton, 1961, tradução do autor).
  • 14
    . Os conceitos de
    decisiveness e
    resoluteness em relação à formulação de políticas públicas originam-se no trabalho de Haggard e McCubbins (2001). No entanto, os autores não discutem o papel do Judiciário no processo.
  • *
    Gostaria de agradecer os comentários e críticas oferecidas por dois pareceristas anônimos da
    Dados; por Luciana Gross Cunha, Vitor Ferraz e Andrei Koerner; e pelos participantes do grupo que este último organizou para discutir assuntos relacionados à justiça no 3
    º Congresso Latinoamericano de Ciência Política, realizado na Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, em setembro de 2006. O artigo também se beneficiou de uma valiosa assessoria editorial de Simone Costa, Josué Nóbrega, Elisabeth Lissovsky e Mônica Farias. Os erros remanescentes são de total responsabilidade do autor.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Set 2007
    • Data do Fascículo
      2007

    Histórico

    • Aceito
      Maio 2007
    • Recebido
      Nov 2006
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