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Oneyda Alvarenga escreve a Mário de Andrade

Oneyda Alvarenga writes to Mário de Andrade

Resumos

As cartas de Oneyda Alvarenga endereçadas ao escritor Mário de Andrade são objetos-lembranças, objetos-relíquias, dotados da potencialidade de lembrar a relação de educação, trabalho e amizade que os uniram. Além disso, essas cartas são documentos literários marcados por uma escrita de si, no sentido apontado pelo filósofo Michel Foucault, que permitem aos indivíduos traçar retratos singulares de si mesmo. Neste texto, busco me aproximar dos rascunhos da existência que Oneyda Alvarenga construiu nas redes intersubjetivas da amizade e escrita epistolar com Mário de Andrade. Assim, leio suas cartas como documentos que guardam uma literatura de caráter autógrafo tão transgressiva quanto aquela que visa transpor os limites da linguagem, pois, no caso específico da escrita contida nas missivas de Oneyda Alvarenga, tratava-se de ultrapassar os limites de si mesma, de se (re)construir na e pela prática da escrita cotidiana.

Escrita de si; amizade; gênero; correspondência


Oneyda Alvarenga's letters addressed to the writer Mário de Andrade are here considerer as memory-objects and relic-objects, endowed with the ability to revive the relationship of education, work and friendship by which they were united. Moreover, these letters are literary documents of a writing of itself, in the meaning suggested by Michel Foucault, by which individuals are able to build images of themselves. In this work, I have approached the poetic of itself formulated by Oneyda Alvarenga in the intersubjective networks of friendship and letter writing with Andrade. Their letters were read as documents, which retain a literature of themselves. This literature can be considered as transgressive as the literature that sought to overcome the limits of language. In the letter writing of Oneyda Alvarenga, this actually meant to overcome the limits of herself and to (re) build herself in and by the action of daily writing.

Writing of itself; gender; friendship; correspondence


  • 1
    1 LE GOFF, Jacques. História e memória Campinas: Ed. da Unicamp, 1996.
  • 2
    2 ANDRADE, Mário de; ALVARENGA, Oneyda. Cartas: Mário de Andrade e Oneyda Alvarenga. São Paulo: Duas Cidades, 1983.
  • 4 ALVARENGA, Oneyda. Mário de Andrade um pouco. Rio de Janeiro: José Olympio/SCET-CEC, 1974. p. 3-4.
  • 6 BENJAMIN, Walter. O narrador. Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: _______ . Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 197-221. (Obras escolhidas 1).
  • 7 A amizade entre homens e mulheres é vista em certas tradições filosóficas como impossíveis. Tais crenças vinculam-se à remota tradição filosófica em que, de Platão a Montaigne, de Aristóteles a Kant, postulava-se a incapacidade das mulheres de contraírem relações de amizade entre si e com o sexo oposto. Para Aristóteles (384 - 322 a.C.), por exemplo, as mulheres não exercem a amizade em sua plenitude, pois elas e os homens afeminados são propensos às lamentações e suas relações com o outro derivam de situações aflitivas e da tristeza. Isso faz com que elas se afastem da verdadeira amizade. ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos 2. ed. Trad. Mário da Gama Kury. Brasília: UnB, 1991.
  • 12 Em seus últimos cursos (1982 - 1984), Foucault problematizou as práticas de si na Antiguidade clássica, apontando com esses estudos uma nova forma de conceber o sujeito e a verdade. Nessas reflexões, destacou a importância das atividades de escrita e leitura que acompanhavam os processos de subjetivação dos gregos e romanos. Como ele demonstra, as transformações de si por si mesmo visando modos de existências estéticos que perpassam os processos de subjetivação greco-romanos acompanharam-se rapidamente de escritas - em especial, a escrita epistolar. É nesse contexto de problematizações dos processos de subjetivação que a escrita de si assume lugar importante, como prática da liberdade e como espaço de constituição da subjetividade. FOUCAULT, Michel. A escrita de si. In: ______ . O que é um autor? Lisboa: Vega, 1992. p. 129-160.
  • 13 FOUCAULT, Michel apud MOREY, M. Tecnologías del yo, y otros textos afines Barcelona: Paidos, 1990. p. 48.
  • 15 DIDIER, Beatrice. La correspondance de Flaubert et George Sand Les amis de Georg Sand. Paris: Nouvelle série, 1989. p. 26.
  • 19 Para os gregos, o conceito de páthos aplicava-se tanto à paixão da alma quanto à doença física. Na Paideia grega, formar-se e cuidar-se eram atividades correlatas. Veja-se FOUCAULT, Michel. História da sexualidade III: o cuidado de si. Rio de Janeiro: Graal, 1985.
  • 23 WOOLF, Virgínia. Profissão para mulheres e outros artigos feministas Porto Alegre: L&PM, 2012 (Coleção L&PM Pocket).
  • 24 DELEUZE, Gilles. Kafka: por uma literatura menor. Rio de Janeiro: Imago, 1977.
  • 29 BUTLER, Judith. La vida psíquica del poder. Teorías de la sujeción. Feminaria, v. 12, (22/23), p. 1, 1999.
  • 31 RAGO, Margareth. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
  • 33 CAMARGOS, Marcia. Villa Kyrial: crônica da Belle Époque paulistana. São Paulo: Senac, 2001.
  • 39 DÉPECHE, Marie France. A tradução feminista. Teorias e práticas subversivas. Feminismos: teorias e perspectiva. Revista de Pós-Graduação em História da UnB, v. 8, n. 1-2, p. 165, 2000.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Fev 2014
  • Data do Fascículo
    Dez 2013

Histórico

  • Recebido
    20 Ago 2012
  • Aceito
    08 Mar 2013
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