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Ampliando as fontes: António Manuel Hespanha e a literatura jurídica portuguesa da Idade Moderna

Expanding the sources: António Manuel Hespanha and the Early Modern Portuguese legal literature

RESUMO

Este artigo pretende discutir algumas questões metodológicas nas obras de António Manuel Hespanha (1945-2019), particularmente no que se refere às fontes que devem ser utilizadas pelos historiadores do direito especializados na Idade Moderna. O foco principal será a literatura jurídica portuguesa moderna, uma espécie de fonte que foi bastante negligenciada durante os anos em que Hespanha escreveu os seus primeiros trabalhos de impacto. A fim de compreender esse ponto, dois textos foram relevantes para este estudo, nomeadamente “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime” (1984) e Como os juristas viam o mundo (2015), nenhum deles costumeiramente mencionados como trabalhos canônicos do autor.

PALAVRAS-CHAVE
História do direito; literatura jurídica; António Manuel Hespanha

ABSTRACT

This paper aims to discuss some methodological issues in the works published by António Manuel Hespanha (1945-2019), particularly those related to the sources a legal historian specialized in the Early Modern period should use. The focus is the Portuguese early modern legal literature, a kind source that had been neglected during the years Hespanha wrote some of his first texts with high impact. In order to understand this point, two texts are in the spotlight of this article, namely “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime” (1984) and Como os juristas viam o mundo (2015), none of them often mentioned as a canonic work of the author.

KEYWORDS
Legal history; legal literature; António Manuel Hespanha

Durante quatro décadas, António Manuel Hespanha (1945-2019) produziu uma obra que foi não apenas vasta, mas também seminal para vários aspectos da história do direito europeu. Cronologicamente, sua predileção foi a Idade Moderna, à qual dedicou a maioria dos seus trabalhos, ainda que outros períodos também tenham sido visitados, a exemplo do liberalismo português e do salazarismo. Espacialmente, sua obra alcança o império português, originalmente na sua porção peninsular, mas estudos sobre algumas dessas extensões, como o Brasil (HESPANHA, 2006aHESPANHA, António Manuel. O direito dos letrados no Império português. 2 ed. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2006a.; HESPANHA, 2007HESPANHA, António Manuel. Depois do Leviathan. Almanack Braziliense, n. 5, 2007, p. 55-66.), Macau (HESPANHA, 1995HESPANHA, António Manuel. Panorama da história institucional e jurídica de Macau. Macau: Fundação Macau, 1995.) e espaços no Índico e sudeste da Ásia (HESPANHA, 2019cHESPANHA, António Manuel. Filhos da terra: identidades mestiças nos confins da expansão portuguesa. Lisboa: Tinta da China, 2019c.) cuidaram de outras realidades. O diálogo com outras experiências coloniais, sobretudo a espanhola (HESPANHA, 2017HESPANHA, António Manuel. O “direito das Índias” no contexto da historiografia das colonizações ibéricas. In: DUVE, Thomas (Org.). Actas del XIX Congreso del Instituto Internacional de Historia del Derecho Indiano. Madrid: Dykinson, 2017, p. 43-83.), também esteve presente na sua bibliografia.

Um dos grandes legados do autor foi a ênfase na necessidade de ampliação das fontes a serem utilizadas pelos historiadores do direito. Não foram raros os momentos em que Hespanha criticou uma historiografia que se restringia ao uso das Ordenações, como se fazer história do direito se identificasse com fazer uma história da legislação. Isso deixa de considerar tanto que o quadro de fontes do direito não é estático e que a centralidade da legislação nas ordens jurídicas modernas, no âmbito do Civil Law, é cronologicamente recente, quanto que a própria referência das Ordenações como legislação pode e deve ser problematizada. Se não é possível afirmar que Hespanha tenha sido o primeiro historiador do direito do mundo português a chamar a atenção para essa necessidade de ampliação das fontes, é plenamente cabível enxergar nele um dos principais responsáveis pela difusão dessa ideia.

Nesse quadro, a relação de Hespanha com uma fonte em especial será analisada nestas páginas: a literatura jurídica moderna, ou seja, produzida entre os séculos XVI e XVIII. O seu uso foi marcante nos trabalhos de Hespanha dedicados ao período, os quais contribuíram para um crescimento significativo do uso e do prestígio dessa fonte na historiografia do fenômeno jurídico moderno. Para analisar esse aspecto, este artigo se divide em duas etapas, sendo a primeira dedicada ao mapeamento de lacunas na historiografia do direito português que Hespanha ofereceu em vários de seus textos, dentre os quais “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”. Na segunda, já de posse desse mapeamento, o uso da literatura jurídica é analisado com mais cautela, com um destaque para a obra Como os juristas viam o mundo.

O foco nesses dois textos nem significa um estudo integral e vertical sobre essas fontes nem uma restrição ao uso de outros trabalhos. Vários outros textos aparecem ao longo desta exposição, ilustrando e corroborando os argumentos aqui levantados.

As lacunas na historiografia e as fontes

Em 1984, António Manuel Hespanha organizou a paradigmática obra Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Como o subtítulo indica, tratou-se de uma reunião de trabalhos de importantes nomes da história institucional2 2 Entre os autores que tiveram textos publicados na coletânea estão Perry Anderson, José António Maravall, Guido Astuti e Bartolomé Clavero. , aos quais se acrescentou, como último capítulo, uma versão fac-símile das Prelecções de direito pátrio, de Francisco Coelho de Sousa e Sampaio (1748-1828). Essa obra, publicada em 1793, foi um dos mais bem acabados produtos decorrentes da reforma pombalina da Universidade de Coimbra, que, além de ter instituído os estudos de direito pátrio no currículo universitário, determinou que os professores elaborassem compêndios que sintetizassem o conteúdo ministrado.

A decisão do organizador de publicar integralmente o texto de Sampaio é coerente com os objetivos da obra na qual se deu a publicação, os quais foram claramente debatidos na introdução que Hespanha escreveu para o livro, intitulada “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”. Em cerca de 70 páginas, esse estudo introdutório apresentou os problemas fundamentais que o autor gostaria que fossem debatidos na coletânea, mas não se resumiu a isso. Uma leitura atenta do texto faz perceber, na verdade, que os temas centrais enfrentados na extensa obra de Hespanha já foram apontados ali, bem como os temas que motivaram os estudos, sobretudo os iniciais, de alguns dos muitos pesquisadores que foram influenciados por ele, seja porque foram seus alunos ou orientandos seja porque se motivaram a partir dos seus escritos.

Logo no primeiro tópico, Hespanha apresenta um balanço crítico da historiografia sobre o Antigo Regime português, enfatizando as lacunas que se apresentavam no momento, as quais decorriam da não consideração de “extensos domínios temáticos” e do uso restrito a apenas “uma pequeníssima parte das fontes disponíveis” (HESPANHA, 1984HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. In: HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 7-89., p. 9-10). E passa a detalhar algumas dessas lacunas, nas quais inclui as cortes, os órgãos superiores da administração central, o papel dos letrados na burocracia nascente, a burocracia local, a administração militar, a administração da justiça, a administração financeira, entre outros (HESPANHA, 1984HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. In: HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 7-89., p. 10-16). Em vários trabalhos, Hespanha enfrentou a fundo essas questões, de que se toma como exemplo a administração fazendária. Sobre a fazenda, ele publicou trabalhos em obras coletivas, como o seu texto no volume que ele próprio coordenou na História de Portugal dirigida por José Mattoso (MATTOSO; HESPANHA, 1998MATTOSO, José; HESPANHA, António Manuel (Org.). História de Portugal. V. 4: o Antigo Regime (1620-1807). Lisboa: Estampa, 1998.), em capítulos de obras monográficas, como em As vésperas do Leviathan (HESPANHA, 1994HESPANHA, António Manuel. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político Portugal – séc. XVII. Coimbra: Almedina, 1994.), ou nas suas obras finais, nas quais reuniu textos publicados ao longo da sua vida, como no tópico sobre a fazenda em Uma monarquia tradicional (HESPANHA, 2019bHESPANHA, António Manuel. Uma monarquia tradicional: imagens e mecanismos da política no Portugal Seiscentista. Lisboa: edição do autor, 2019b., p. 251-338).

Já outros temas foram conduzidos com profundidade por alguns dos seus discípulos, que posteriormente também se tornaram destacados autores na área. Nesse sentido, mencionam-se os casos dos estudos de Pedro Cardim (1998)CARDIM, Pedro. Cortes e cultura política no Portugal do Antigo Regime. Lisboa: Cosmos, 1998. sobre as cortes e de José Subtil (1996)MATTOSO, José; HESPANHA, António Manuel (Org.). História de Portugal. V. 4: o Antigo Regime (1620-1807). Lisboa: Estampa, 1998. sobre o Desembargo do Paço, uma das instituições da administração central que ainda não haviam sido devidamente pesquisadas (HESPANHA, 1984HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. In: HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 7-89., p. 11-12) antes da obra de Subtil. Essas questões que o autor considerou, em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”, como essenciais para compreender o Portugal da Idade Moderna foram recuperadas e novamente debatidas no já referido quarto volume da História de Portugal, dedicado a cobrir o período entre 1620 e 1807. Os tópicos alcançam tanto elementos de história social, focando na presença da Igreja e no papel da família no período, e de história econômica quanto no detalhamento de pontos levantados previamente: as dinâmicas de poder e o absolutismo foram tratadas por ele e por Ângela Barreto Xavier; as cortes, por Pedro Cardim; os poderes do centro, por José SubtilSUBTIL, José. O desembargo do Paço (1750-1833). Lisboa: Universidade Autónoma de Lisboa, 2011.; os poderes locais e os poderes senhoriais, por Nuno Gonçalo Monteiro.

As conexões entre essas duas obras são evidentes. Na primeira, Hespanha estabelece um elenco de questões que ele considera essenciais para fazer um estudo sério sobre o período em Portugal, ao passo que, na segunda, sob a sua coordenação, a escolha dos temas e da equipe demonstra que o autor seguiu a linha traçada uma década e meia antes a fim de abordar satisfatoriamente esses pontos. Muitos deles, em contribuições próprias, mas também a partir de um trabalho coletivo. Por isso, esse volume da História de Portugal ilustra como os eixos de investigação de um pesquisador cuja carreira ainda estava em consolidação se transformaram, tempos depois, em uma agenda coletiva de trabalho sob a liderança de um professor.

Retornando ao balanço realizado em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”, Hespanha (1984, p. 16)HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. In: HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 7-89. aponta as lacunas nos estudos do direito privado, que o próprio autor especifica como o direito comum. Não havia, à época, obra portuguesa sobre o tema, o que se supriu quando o próprio Hespanha traduziu diretamente do alemão a História do direito privado moderno, de Franz Wieacker (2004)WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. 3. ed. Trad. António Manuel Hespanha. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 353-395.. O tema foi enfrentado em diferentes trabalhos publicados por Hespanha anos depois, inclusive da perspectiva de um manual de história do direito, como A cultura jurídica europeia: síntese de um milénio (HESPANHA, 2012HESPANHA, António Manuel. A cultura jurídica europeia: síntese de um milénio. Coimbra: Almedina, 2012.), e se constitui como questão fundamental para este estudo, pois a essência do direito comum residiu na literatura jurídica (CABRAL, 2019aCABRAL, Gustavo César Machado. Ius commune: uma introdução à história do direito comum do Medievo à Idade Moderna. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019a., p. 119-138), a qual foi amplamente explorada na obra de Hespanha.

A proposta de estudar o direito privado a partir de uma dimensão prática tornava necessária uma análise mais ampla do rol de fontes. Hespanha propôs que se utilizassem mais decisões judiciais e atos notariais, que confeririam ao historiador informações adicionais sobre a prática jurídica. Evidentemente, como ele mesmo aponta, essas fontes teriam um grande impacto na historiografia por fazerem perceber um “frequente desencontro entre o direito legislado ou o direito doutrinal e o direito praticado pelos juízes e tabeliães”, especialmente porque a aplicação do direito costumava caber a pessoas sem formação técnica (HESPANHA, 1984HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. In: HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 7-89., p. 16-17)3 3 Hespanha tratou desse aspecto em outro paradigmático trabalho publicado na mesma época, “Savants et rustiques” (1983), que sofreu algumas modificações até ganhar uma versão definitiva, em uma das últimas obras do autor (HESPANHA, 2017). . Entender como os juízes construíam os fundamentos das suas decisões era um desafio que precisava ser enfrentado pelos historiadores do direito, o que poderia mudar a maneira como muitos pontos eram pensados à época.

As fontes documentais encontradas em arquivos importantes em Portugal aparecem como uma base de dados que deve ser mais explorada (HESPANHA, 1984HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. In: HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 7-89., p. 19-20). De fato, algumas das obras de maior impacto do autor foram fundamentadas nessas fontes, a exemplo do Livro das avaliações de todos os officios do Reyno de Portugal. Anno 1640, localizado no Arquivo da Ajuda e amplamente utilizado em As vésperas do Leviathan, em que ele tratou das rendas (HESPANHA, 1994HESPANHA, António Manuel. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político Portugal – séc. XVII. Coimbra: Almedina, 1994., p. 47), e do artigo “Da ‘iustitia’ à ‘disciplina’”, no qual ele fundamentou, com base em um documento manuscrito intitulado Lembrança de todos os criminozos e estado dos liuramentos dos prezos da Cadeia da Corte, localizado no Arquivo da Relação de Lisboa, a sua argumentação sobre a execução de penas em Portugal no final do século XVII (HESPANHA, 1987HESPANHA, António Manuel. Da “iustitia” à “disciplina”: textos, poder e política penal no Antigo Regime. Anuario de Historia del Derecho Español, v. 57, 1987, p. 493-578.). Este último texto abriu caminho para outra obra extremamente importante, na qual ele discutiu a chamada economia da graça, largamente materializada nos pedidos de comutação de penas como os que foram discutidos em “Da iustitia à disciplina”.

Mesmo tendo sugerido uma mais ampla utilização de fontes manuscritas de várias naturezas, Hespanha não foi, ele mesmo, um profundo conhecedor de documentos como processos judiciais e atos notariais. Contudo, a relevância que ele atribuiu a essas fontes e à necessidade de a história do direito se debruçar sobre elas e, principalmente, interpretá-las corretamente foi suficiente para incentivar o seu emprego em diferentes níveis. A quantidade de trabalhos na área, oriundos tanto da história quanto do direito, que têm como base esses documentos manuscritos mostra uma conexão imediata com essa proposta.

Hespanha constata o amplo uso de fontes jurídicas impressas, mas “quase exclusivamente” fontes legislativas, especialmente as Ordenações filipinas de 1604 (HESPANHA, 1984HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. In: HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 7-89., p. 20). Isso seria um erro, porque significava ignorar uma série de outras fontes impressas indispensáveis para o período. Do ponto de vista legislativo4 4 Trata-se de termo que, apesar de poder ser problematizado para a Idade Moderna, foi amplamente utilizado em uma bibliografia que influenciou o autor na década de 1980, como o Handbuch der Quellen, editado por Helmut Coing. , a grande quantidade de atos normativos editados pela Coroa Portuguesa sem que tenham sido incorporados às Ordenações costumava ser ignorada pela historiografia, e Hespanha menciona expressamente em nota de rodapé algumas dessas coletâneas de legislação da Idade Moderna que foram impressas no final do século XVIII e ao longo do século XIX. Entre as compilações mencionadas, encontram-se, por exemplo, os seis volumes da Collecção chronologica de leis extravagantes, a Collecção chronologica dos assentos da Casa da Suplicação e do Cível, os onze tomos da Collecção chronologica da legislação portuguesa, organizada por José Justino de Andrade e Silva, e os seis tomos e três complementos da Collecção de legislação portuguesa desde a última compilação das Ordenações, compilada por António Delgado da Silva.

Essas compilações fizeram parte de uma das mais inovadoras contribuições de Hespanha: a digitalização e a disponibilização integral desse material na internet, em um site intitulado Ius Lusitaniae, hospedado no portal da Universidade Nova de Lisboa, onde ele foi professor catedrático por vários anos. Rebatizado de “O governo dos outrosO GOVERNO dos outros. Imaginários políticos no Império português. Disponível em: http://www.governodosoutros.ics.ul.pt/?menu=arquivo. Acesso em: 21 jun. 2022.
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” e administrado por duas ex-alunas e hoje professoras da mesma Universidade, Cristina Nogueira da Silva e Ângela Barreto Xavier, essa iniciativa, coerente com a proposta de trabalho já enunciada por Hespanha em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”, pode ser considerada um dos marcos fundadores das chamadas digital humanities no mundo ibérico, o que torna Hespanha um dos seus pioneiros.

Seguindo com as fontes impressas, Hespanha passa a tratar da possibilidade de se pesquisarem, por meio da literatura jurídica, decisões judiciais tomadas pelos grandes tribunais da Corte. Embora parte significativa – talvez a maior – das fontes primárias que consistissem em decisões desses tribunais e que datassem de antes do terremoto que atingiu Lisboa, em 1755, tenha se perdido, o conteúdo de algumas delas ficou preservado na literatura jurídica. É nesse sentido que a relevância da chamada literatura prática é destacada, funcionando como verdadeiras bases de dados de decisões tomadas pelos altos tribunais, sobretudo pela Casa da Suplicação e pelo Tribunal da Relação do Porto, desde o final do século XVI até o início do XVIII. Apesar das muitas possibilidades de se trabalhar com a literatura jurídica portuguesa, pouco havia sido feito até o momento em que se publicou “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”. Percebia-se um profundo desconhecimento sobre essa literatura jurídica, o que também decorre do ostracismo em que ela caiu, sobretudo as obras produzidas antes da Lei da Boa Razão, por ter sido encarada como a materialização de uma perspectiva de direito arcaica e que deveria ser reformulada5 5 Exemplares, dessa perspectiva, foram as críticas formuladas no Demétrio Moderno (1781), de Barnabé de Elescano. . O que pertencesse à tradição do mos italicus foi atacado pelas reformas pombalinas, especialmente a literatura prática, ainda que a efetividade desse ataque seja questionável pela presença, tempos depois dessas reformas, de citações dos autores que se queria ver afastados do mundo jurídico português.

Em relação a alguns juristas, o fato de serem quase plenamente ignorados causa maior estranhamento a Hespanha. Foi o caso de Manuel Álvares Pegas, autor de uma vastíssima obra que contempla muitos dos gêneros da literatura jurídica, como os comentários, as monografias e a literatura prática (alegações e resoluções forenses). Mencionando os 14 volumes dos Commentaria ad Ordinationes regni Portugalliae, publicados entre 1680 e 1696, Hespanha define como espantosa a omissão sobre autor e texto, o que vem sendo suprido vagarosamente nos últimos anos (cf. CABRAL, 2018aCABRAL, Gustavo César Machado. Foreign law and circulation of ideas in the Early Modern Age: analyzing an “allegatio” of Manuel Álvares Pegas on maioratus. Forum historiae iuris, 2018a. Disponível em: https://forhistiur.de/2018-12-cabral/. Acessado em: 21 jun. 2022.
https://forhistiur.de/2018-12-cabral/....
; 2018bCABRAL, Gustavo César Machado. Pegas e Pernambuco: notas sobre o direito comum e o espaço colonial. Direito & Práxis, v. 9, n. 2, 2018b, p. 697-720.; 2019bCABRAL, Gustavo César Machado. Literatura jurídica e prática processual no Portugal Seiscentista: o uso de casos julgados nas Resolutiones forenses practicabiles de Manuel Álvares Pegas. Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito/UFRGS, v. 14, n. 1, 2019b, p. 301-326.), mesmo existindo uma grande quantidade de aspectos em sua obra que ainda não foram devidamente analisados. Pegas é um autor representativo do que Hespanha acreditava ser relevante para se pensar no fenômeno jurídico na Idade Moderna, sobretudo pela centralidade que a prática assume na sua obra. Mesmo nos Commentaria, que se propõem a ser comentários exaustivos das Ordenações (ou, mais precisamente, dos seus primeiros dois livros), os argumentos de Pegas utilizam largamente a literatura do ius commune e menções a decisões judiciais, sobretudo da Casa da Suplicação, mas também de outros juízos da Coroa. Esse mesmo expediente pode ser encontrado em uma obra classificada como de literatura prática, as Resolutiones Forenses Practicabiles, publicadas em 1682. Por meio delas, é possível encontrar uma significativa quantidade de decisões tomadas por juízes da Coroa em diversos níveis, em referências que apresentam níveis de detalhamento variáveis entre uma simples menção indireta ao que foi decidido e a transcrição integral do acórdão6 6 Para se ter uma noção concreta do material disponível nas Resolutiones Forenses Practicabiles, foram citadas 1.272 decisões ao longo da obra, incluindo-se simples menções a casos decididos pelos tribunais (com destaque para a Casa da Suplicação, mas, em uma grande quantidade de casos, o juízo não era informado), mas também transcrições do inteiro teor dos acórdãos (cerca de 45% do total apresenta alguma forma de transcrição). Para maiores informações, cf. Cabral (2019b). . Retoma-se, assim, o argumento de Hespanha sobre a relevância de se conhecer a obra de Manuel Álvares Pegas: o acesso aos seus livros significa, no mínimo, a possibilidade de ter um contato imediato com decisões tomadas pelos grandes tribunais do Reino.

As referências a autores considerados centrais para compreender o direito português na Idade Moderna continuam para além de Pegas. Domingos Antunes Portugal e Gabriel Pereira de Castro são mencionados pela sua importância para questões que tratam do direito público no período, especificamente as doações régias e as atribuições do rei em matérias eclesiásticas. João Baptista Fragoso também é lembrado como indispensável para os estudos sobre as instituições portuguesas modernas. Ainda sobre a literatura prática, enfatizando-se a possibilidade de se conhecerem decisões judiciais a partir das referências a casos, Hespanha menciona a literatura conciliar e as decisiones, nas quais os problemas concretos, tal como apresentados e discutidos nos altos tribunais, guiam um percurso que possibilita verificar que tipo de matéria ocupava a atenção dos juristas. Em rodapé, Hespanha cita António da Gama, Jorge de Cabedo, Álvaro Valasco e Belchior Febo7 7 Sobre a literatura de decisiones, com especial atenção para esses autores, cf. Cabral (2017). , autores que, seguindo o seu raciocínio, são muito mais aptos para informar os historiadores do direito sobre o fenômeno jurídico na época moderna do que as fontes tradicionalmente utilizadas.

Luís de Molina, que, quando Hespanha publicou o seu texto, era muito mais lembrado pelas suas contribuições como um dos principais teólogos da neoescolástica, é mencionado como uma fonte relevante para se conhecerem “as particularidades das instituições jurídicas portuguesas – que ele conheceu bem durante a sua prolongada estadia em Évora e que se compraz em citar” (HESPANHA, 1984HESPANHA, António Manuel. Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime. In: HESPANHA, António Manuel. Poder e instituições na Europa do Antigo Regime: colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 7-89., p. 22). Obras de teologia moral como o seu De iustitiae et de iure não eram utilizadas com grande frequência por historiadores do direito especializados no período moderno; em verdade, pelo menos para o mundo ibérico, essa utilização ampla é mais recente. Por isso, a referência de Hespanha a Molina como uma obra que deveria ser empregada com esse objetivo não deixa de ser também uma inovação para a área.

Ele voltou ao tema anos depois, ao publicar “Luís de Molina e a escravização dos negros”, artigo que analisa uma parte muito específica da vasta obra de Molina e que, como ele mesmo reforçou, se tratava de texto “geralmente desconhecido” (HESPANHA, 2001HESPANHA, António Manuel. Luís de Molina e a escravização dos negros. Análise Social, v. 35, n. 157, 2001, p. 937-960., p. 937). Dessa maneira, além do regresso a um autor que já havia sido indicado como chave para entender o período, esse trabalho sobre Molina é representativo de uma orientação presente na obra de Hespanha: abordar textos ou autores que, a despeito da sua importância para a compreensão do período em que viveram, passaram a uma condição de esquecidos. Recuperar autores estruturais para uma determinada temporalidade, seguindo um modelo que se aproxima do contextualismo linguístico, seria uma maneira de compreender mais amplamente determinados momentos a partir de autores que representam a média do que se produzia, ou seja, não necessariamente autores que mudaram a forma de pensar, mas aqueles que possibilitam reconstruir a forma como se tratava das questões8 8 O diálogo de Hespanha com o contextualismo linguístico inglês ou com a história dos conceitos alemã resultou em influência em sua obra de menos intensidade do que, por exemplo, a do pós-estruturalismo (especialmente de Michel Foucault) ou de uma sociologia do poder de Pierre Bourdieu. Para uma visão desse diálogo, cf. Hespanha (2003). . Buscar a média para se reconstruir um período é uma estratégia que se delineia em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime” e que pode ser encontrada em muitos dos seus outros escritos que se fundamentaram na literatura jurídica, atingindo o seu ponto máximo em Como os juristas viam o mundo, da qual se tratará a seguir.

A presença da literatura jurídica

Hespanha anunciou, em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”, que via como necessário o uso da literatura jurídica portuguesa da Idade Moderna, a fim de que fosse mais amplamente compreendido o fenômeno jurídico em Portugal. Muitos dos seus trabalhos publicados na sequência contaram com uma ampla utilização da mais relevante doutrina jurídica, alguns dos quais já comentados no tópico anterior

As vésperas do Leviathan, apresentado em 1986 como tese de doutoramento e publicado em português como livro em 1994, não é uma obra sobre a literatura jurídica, mas nela consta uma lista de juristas citados que é coerente com o apontamento feito pelo autor anos antes em relação à necessidade de buscar na bibliografia do período uma opinião mais próxima do que efetivamente se praticava em relação aos institutos jurídicos. Entre os juristas portugueses, Hespanha citou os mais representativos autores de repertórios, alegações, decisiones, comentários às Ordenações e tratados sobre os temas centrais debatidos no livro. Podem ser mencionados António Cardoso do Amaral, Manuel Barbosa, Jorge de Cabedo, Gabriel Pereira de Castro, Manuel Mendes de Castro, João Martins da Costa, Melchior Febo, João Baptista Fragoso, Pascoal de Mello Freire, Mateus Homem Leitão, António de Sousa de Macedo, Luís de Molina, Manuel Álvares Pegas, Domingos Antunes Portugal e Álvaro Valasco.

O uso da literatura jurídica aparece, em certos momentos, como uma etapa necessária para que fossem supridas as lacunas na historiografia. Seguindo o que fez em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”, no qual foram apontados temas que precisavam ser revisitados por uma historiografia mais recente, Hespanha reforçou a necessidade de monografias sobre as instituições portuguesas da Idade Moderna, apontando caminhos para que esses trabalhos fossem realizados. A Casa da Suplicação é exemplar nesse sentido. Sobre ela não havia monografias ao tempo da publicação da obra, o que fez Hespanha tratar das fontes que poderiam ser utilizadas para a elaboração do estudo. As etapas iniciais, as quais se inferem como antecedentes da pesquisa documental, compreenderiam uma consulta aos “textos legais”, como o primeiro livro das Ordenações filipinas, mas que precisaria ser aprofundada com a consulta à literatura jurídica, nos “comentários doutrinais” a esses mesmos “textos legais”, partindo-se, “antes de todos”, do segundo e do terceiro tomos dos comentários de Manuel Álvares Pegas e da obra Domus Supplicationis Curiae Lusitaniae (1608), de João Martins da Costa (HESPANHA, 1994HESPANHA, António Manuel. As vésperas do Leviathan: instituições e poder político Portugal – séc. XVII. Coimbra: Almedina, 1994., p. 228). Esse trecho é coerente com a maneira de Hespanha construir os seus textos: o uso da literatura jurídica do período deveria estar no primeiro plano da pesquisa a fim de que fosse apresentado um panorama sobre como os juristas viam essa questão.

A preocupação com a maneira como os juristas viam o direito perpassa a sua extensa bibliografia, mas talvez nenhuma obra represente tão bem essa proposta quanto Como os juristas viam o mundo. Assim como a maioria dos livros publicados nos seus últimos anos de vida, essa obra foi editada pelo próprio autor e disponibilizada para impressão sob demanda, sem estar vinculada a um grande selo editorial. A ideia era lançar um livro inédito, nem tanto quanto à integralidade do seu conteúdo, que recuperou várias passagens de textos publicados anteriormente, mas quanto à proposta global de se construir um grande manual do comum, “tal como ele vigorou em Portugal dos meados do séc. XVI aos meados do séc. XVIII”, como indica a quarta capa. Entre seus os objetivos estava facilitar o acesso de historiadores do direito, fossem oriundos da história fossem do direito, a uma ampla descrição, “precisa e clara”, dos institutos jurídicos (HESPAHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p 16). A opção editorial por um lançamento independente, não vinculado a grandes editoras, por um preço módico se consideradas as mais de 700 páginas e disponível em uma plataforma que possibilitasse imediatamente a leitura em formato digital e a impressão sob demanda, tinha como finalidade tornar o livro mais acessível aos leitores. Contudo, nesses sete anos desde o lançamento, o impacto da obra ainda parece restrito a certos círculos, o que torna ainda mais relevante uma discussão sobre ela.

Logo no início do trabalho, Hespanha esclarece algumas dificuldades que o motivaram a escrever esse livro, a começar pela escassez de materiais adequados para se compreenderem as fontes jurídicas do período; praticamente não havia fontes sistemáticas no Antigo Regime, e as poucas com essas características, como as Institutiones iuris, de Pascoal de Melo Freire, refletiam uma visão muito própria do final do século XVIII, momento em que a ordem jurídica portuguesa passava por reformas que pretendiam mudar justamente o mundo que Hespanha quis retratar (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 5-6). Por essa razão, o objetivo desse manual era “facultar um panorama do direito tal como ele aparece na literatura jurídica portuguesa anterior ao iluminismo, tal como era presumivelmente aplicado nos tribunais e tal como era vivido pela generalidade das pessoas” (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 8), consistindo, assim, em uma obra largamente baseada em um direito erudito, culto. A relevância desse direito letrado foi enfatizada por Hespanha em diversas obras, como O direito dos letrados no Império Português (2006), mas um estudo organizado e sistematizado das contribuições desses juristas ainda não havia sido proposto.

Concebendo o direito comum como um processo no qual a origem geográfica dos autores não foi uma questão necessariamente influente, Hespanha tentou entender como se deu a presença de autores portugueses entre os citados nas obras dos próprios juristas portugueses. Anos antes, Hespanha publicou um artigo especificamente dedicado a uma obra muito relevante publicada em 1645, o De jure lusitano, de Mateus Homem Leitão, em que foram expostos três temas (agravos, cartas de seguro e devassas) nos quais “o direito português se afastava do direito comum, preferindo precisamente aqueles que maiores embaraços causavam na prática quotidiana dos tribunais, nomeadamente de tribunais superiores, que enfrentava como magistrado” (HESPANHA, 2008HESPANHA, António Manuel. Direito moderno e intertextualidade. Direito próprio e direito comum em De jure lusitano (1645), de Mateus Homem Leitão. Revista de História das Ideias, v. 29, 2008, p. 67-102., p. 70). Leitão ofereceu aos leitores uma obra cujo objetivo era tratar essencialmente do direito pátrio português, e foi nesse sentido a abordagem detalhada por Hespanha, permitindo, ao mesmo tempo, que o autor se debruçasse sobre as principais influências na construção dos argumentos de Leitão, das quais se destacavam as menções à literatura jurídica. Hespanha (2008, p. 77-90)HESPANHA, António Manuel. Direito moderno e intertextualidade. Direito próprio e direito comum em De jure lusitano (1645), de Mateus Homem Leitão. Revista de História das Ideias, v. 29, 2008, p. 67-102. se debruçou com profundidade sobre os juristas citados na obra de Leitão, verificando também uma participação cronologicamente crescente de juristas portugueses.

A análise global que Como os juristas viam o mundo oferece sobre o quadro de autores utilizados pelos juristas portugueses, facilitada por outros trabalhos que empregaram mecanismos quantitativos e qualitativos para outros gêneros literários, como as decisiones (CABRAL, 2017CABRAL, Gustavo César Machado. Literatura jurídica na Idade Moderna: as decisiones no Reino de Portugal (séculos XVI e XVII). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017.), resultou em uma descrição sobre quais obras e quais autores eram dotados de autoridade suficiente para embasar os argumentos (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 9-10). Hespanha reconhece a dificuldade de se acessarem diretamente os livros citados durante a Idade Moderna, o que era suprido pela utilização de repertórios, dicionários ou simplesmente citações indiretas a partir do acesso de obras intermediárias (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 10). Isso significa reconhecer que o papel central da literatura jurídica era fornecer autoridade ao argumento do autor do texto, fosse ele um prático (advogado ou juiz) ou mesmo um autor de obras jurídicas, de modo que essa autoridade não decorreria necessariamente de um conhecimento imediato do conteúdo dos livros.

A opção pelas fontes que Hespanha utilizou para a construção da sua própria obra é coerente com essa perspectiva: uma ampla utilização de comentários às Ordenações (com destaque para os de Pegas), de monografias sobre temas específicos (como a de Domingos Antunes Portugal), de obras de prática (como a de Manuel Mendes de Castro), de teologia moral (sobretudo Luís de Molina e João Baptista Fragoso), de literatura de decisiones e de repertórios (principalmente o Liber utilissimus, de António Cardoso do Amaral, provavelmente o mais citado, e o Promptuarium juridicium, de Bento Pereira). Trata-se de um conjunto de gêneros cuja alta utilidade e baixa utilização já haviam sido debatidas por Hespanha 30 anos antes em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”. Por se tratar de uma proposta de reconstrução “do direito mais praticado e não de alguma subtileza mais singular”, o uso desses gêneros literários é essencial para “identificar o direito que efetivamente vigorava na esmagadora maioria das situações” (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 11).

A crítica ao reducionismo das fontes do direito à lei está marcada nesse livro, que sustenta não haver um protagonismo legislativo, mesmo em áreas como o direito penal9 9 De alguma maneira, o trecho em que Hespanha (2015, p. 11) afirma “havia crimes sem lei e, ainda mais, penas sem lei” precisa ser analisado com cautela e confrontado com uma recente historiografia que identificou um crescente papel da ideia de legalidade em ramos como o direito penal. Nesse sentido, cf. Martyn (2013). , mas sim uma centralidade da literatura jurídica, a qual se difundia e teve impacto em diversos ambientes além dos restritos círculos das elites letradas às quais aparentemente estava circunscrita. A preocupação com a circulação do conhecimento formal, fosse pela redução em frases curtas para a circulação oral, fosse pela ampla utilização de fórmulas por escrivães ou pela presença de livros nas periferias do império português10 10 Para um exemplo de trabalho de história do direito influenciado por esse ponto levantado por Hespanha (presença de livros na periferia), cf. Silva Júnior (2021). (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 12-13), fez Hespanha constatar que essa cultura jurídica erudita extrapolava certos limites previsíveis. Em uma versão ampliada do seu seminal Savants et rustiques, no qual a ideia de um pluralismo jurídico, que também foi bastante explorada em outros textos (HESPANHA, 2019aHESPANHA, António Manuel. Pluralismo jurídico e direito democrático: prospetivas do direito no século XXI. Coimbra: Almedina, 2019a.), é constitutiva da existência de formas de organização jurídica paralelas à ordem geral, a dinâmica das relações entre cultura jurídica escrita e cultura jurídica oral é explorada partindo de características que lhes são próprias, mas que não implicam uma separação completa. Muito pelo contrário. Hespanha trata dessas culturas jurídicas como inter-relacionadas (HESPANHA, 2017HESPANHA, António Manuel. O “direito das Índias” no contexto da historiografia das colonizações ibéricas. In: DUVE, Thomas (Org.). Actas del XIX Congreso del Instituto Internacional de Historia del Derecho Indiano. Madrid: Dykinson, 2017, p. 43-83., p. 213-219).

Ainda na introdução de Como os juristas viam o mundo, Hespanha apresenta a maneira como o livro se organizou, contando com um longo capítulo introdutório (“As jurisdições e o direto”) que retoma o conteúdo de vários outros textos publicados anteriormente, mas dessa vez apresentados com uma nova organização, com enfoque no que se refere à pluralidade de jurisdições característica do direito português moderno. Os capítulos que se seguem discutem minuciosamente as muitas questões que compõem os grandes títulos em que se organiza o livro: o direito das pessoas, o direito das coisas, as sucessões, as obrigações, as ações e os crimes e penas, numa ordem expositiva que também foi objeto de explicações conjunturais. Expressamente fugindo de propostas de sistematização típicas da contemporaneidade, Hespanha constata as diferentes ordens de organização em fontes como as Institutiones, o Digesto, as Siete partidas ou as Ordenações filipinas, tendo optado por um plano próximo às Institutiones, “por ter uma raiz forte nos textos, desde logo nos comentários a esse livro” (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 15). Assim, a literatura jurídica do período também foi o elemento decisivo, nessa “arqueologia da ordem”, como ele próprio descreveu, para organizar a exposição dos temas.

Tomem-se como exemplo os morgados, tema explorado no capítulo dedicado às sucessões e para o qual Hespanha já havia chamado a atenção em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime” não apenas por ter uma enorme relevância em Portugal no período, mas por ter sido dedicada a ele uma vastíssima literatura na Idade Moderna. Na proposta de Como os juristas viam o mundo, o tema seria explorado justamente a partir do uso dessa literatura, seguindo o “método geométrico, que começa pela definição e pela regra” (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 15), ainda que, como ele mesmo reconheceu, nem sempre essa forma tenha sido utilizada pela própria literatura jurídica moderna. A definição de morgado trazida por Hespanha11 11 “Os morgados eram conjuntos de bens cuja transmissão por morte obedecia a uma ordem sucessória, para sempre, pelo instituidor no documento de instituição, diferente da ordem de sucessão legítima” (HESPANHA, 2015, p. 435-436). é diretamente inspirada em Luís de Molina, o autor de De primogeniorum hispamorum origine ac natura (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 435-436), e outros autores foram recuperados para a apresentação de outras características ou elementos centrais, como uma menção a Jorge de Cabedo para falar da finalidade dos morgados como atrelados à conservação da memória da família ou a António Cardoso do Amaral para reforçar a limitação da capacidade de disposição dos bens. Ainda que outras fontes, como a legislação portuguesa (Ordenações do Reino e a Lei de 3/8/1770) e uma grande quantidade de documentos de registros de morgados disponíveis no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, apareçam no texto, as menções à literatura jurídica estruturam os argumentos, construindo as definições, os detalhes e as exceções.

Ao longo de sete seções (noção de morgados; instituidor e instituição; bens de morgado; chamados à posse ou administração; ordem sucessória; o direito de representação; poderes do possuidor), Hespanha (2015, p. 435-454)HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015. construiu a sua descrição sobre como funcionavam os morgados em Portugal, sustentando-se na literatura jurídica da Idade Moderna. Utilizando-se de mecanismo que, conforme esclarecido no tópico anterior, foi empregado pelo próprio Hespanha em um artigo sobre Mateus Homem Leitão, optou-se por fazer um levantamento quantitativo dos juristas mencionados. Citaram-se António da Gama (33 menções), António Cardoso do Amaral (31 menções), Álvaro Valasco (25 menções), Gabriel Pereira de Castro (21 menções), Melchior Febo (19 menções), Miguel de Reinoso (19 menções), Jorge de Cabedo (14 menções), Pascoal de Mello Freire (6 menções), Manuel Álvares Pegas e Manuel de Almeida e Sousa de Lobão (3 menções cada) e António de Sousa de Macedo, Bento Pereira, Luís de Molina, Manuel da Costa e Tomé Valasco (1 menção cada). Hespanha também citou as Ordenações filipinas (11 menções), as Leyes de Toro (3 menções) e as Siete partidas e a Nueva recopilación (2 menções cada).

A presença da literatura jurídica moderna foi a principal base de apoio de Hespanha em todos os outros institutos jurídicos discutidos, o que é particularmente relevante quando se tratava de instituto que não existia mais nas ordens jurídicas contemporâneas, como os morgados, ou com importância reduzida, a despeito da centralidade de outrora, como a enfiteuse. Na seção dedicada a ela (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 378-396), foram citados Mello Freire (35 menções), António Cardoso do Amaral (32 menções), Francisco Caldas Pereira (19 menções), Álvaro Valasco (18 menções), António da Gama (15 menções), Gabriel Pereira de Castro e Jorge de Cabedo (8 menções), Melchior Febo (6 menções), Miguel de Reinoso (3 menções), Francisco Pinheiro, Manuel Barbosa, Luís de Molina, João Batista Fragoso, Mauro Luís de Lima e Mauro Luís de Lima (1 menções). O uso das Ordenações filipinas foi muito amplo (39 menções), com alguma referência às Novellae (4 menções) e às Siete Partidas (1 menção).

As duas listas são muito parecidas, o que resulta tanto das proximidades temáticas entre morgados e enfiteuse quanto de uma opção deliberada do autor de utilizar a literatura jurídica portuguesa moderna, escolhendo nela os autores mais representativos do período. Em temas um pouco mais distantes, como as ações, Hespanha (2015, p. 553-604) utilizou mais obras como as de Mello Freire, Manuel Mendes de Castro ou os comentários que João Martins da Costa fez ao livro de fórmulas de Gregório Martins Caminha, sem deixar de citar, em outras passagens, juristas como António Cardoso do Amaral ou Jorge de Cabedo. Ainda assim, a semelhança estrutural persiste, já que, diferentemente dos juristas modernos, que pretendiam conferir autoridade aos seus argumentos ao utilizarem o nome de outros juristas, a opção de Hespanha foi usar esses autores dos séculos XVI a XVIII como fontes para a descrição dos institutos jurídicos. Uma descrição que partia de quem era ator no período, e uma descrição que trazia uma pluralidade de autores, tentando evitar que a escolha de apenas um nome, de alguma maneira, embaraçasse certo grau de verossimilhança que só poderia ser mais firmemente alcançado com a consideração de mais vozes.

Palavras finais

Os dois textos utilizados para nortear a discussão que se fez aqui são muito menos célebres do que as grandes obras que tornaram Hespanha um dos mais importantes historiadores do direito do mundo no seu tempo. “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime” tem relevância por demonstrar que os temas centrais enfrentados por Hespanha já apareciam muito concreta e organizadamente em seus textos, de forma que muitos dos pontos levantados foram efetivamente respondidos, por ele ou por quem se influenciou pela sua obra, nas décadas seguintes. Entre essas questões, a ampliação das fontes teve uma centralidade que já se manifestou no texto de 1984, especialmente a necessidade de utilizar mais fortemente a literatura jurídica moderna.

Ao longo da sua obra, Hespanha tentou ser coerente com as questões metodológicas que ele vinha apontando desde A história do direito na história social (1978)HESPANHA, Antonio Manuel. A história do direito na história social. Lisboa: Livros Horizonte, 1978., mas que, em “Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime”, se mostraram mais bem organizadas. O uso da literatura jurídica moderna, presente sempre que o autor tratou, mais superficial ou detalhadamente, de um instituto jurídico, alcançou o seu ponto máximo em Como os juristas viam o mundo, uma vez que a proposta dessa obra foi justamente organizar as visões dos autores desse período sobre os vários ramos e temas que interessavam ao direito português moderno.

Ao final, Como os juristas viam o mundo foi, como o próprio autor confessou privadamente, um manual do direito comum. Assim como todo manual, sua finalidade precípua foi introduzir leitores a uma determinada discussão. Ao fazer isso, Hespanha apresentou com mais clareza o mundo que os juristas portugueses enxergavam nos séculos XVI a XVIII; um mundo muito debatido e pouco conhecido, mas que ganha cores mais vivas a partir da descrição de Hespanha.

  • 1
    Universidade Federal do Ceará (UFC, Fortaleza, CE, Brasil).
  • 2
    Entre os autores que tiveram textos publicados na coletânea estão Perry Anderson, José António Maravall, Guido Astuti e Bartolomé Clavero.
  • 3
    Hespanha tratou desse aspecto em outro paradigmático trabalho publicado na mesma época, “Savants et rustiques” (1983HESPANHA, António Manuel. Savants et rustiques. La violence douce de la raison juridique. Ius commune, n. 10, 1983, p. 1-48.), que sofreu algumas modificações até ganhar uma versão definitiva, em uma das últimas obras do autor (HESPANHA, 2017HESPANHA, António Manuel. O “direito das Índias” no contexto da historiografia das colonizações ibéricas. In: DUVE, Thomas (Org.). Actas del XIX Congreso del Instituto Internacional de Historia del Derecho Indiano. Madrid: Dykinson, 2017, p. 43-83.).
  • 4
    Trata-se de termo que, apesar de poder ser problematizado para a Idade Moderna, foi amplamente utilizado em uma bibliografia que influenciou o autor na década de 1980, como o Handbuch der Quellen, editado por Helmut Coing.
  • 5
    Exemplares, dessa perspectiva, foram as críticas formuladas no Demétrio Moderno (1781), de Barnabé de Elescano.
  • 6
    Para se ter uma noção concreta do material disponível nas Resolutiones Forenses Practicabiles, foram citadas 1.272 decisões ao longo da obra, incluindo-se simples menções a casos decididos pelos tribunais (com destaque para a Casa da Suplicação, mas, em uma grande quantidade de casos, o juízo não era informado), mas também transcrições do inteiro teor dos acórdãos (cerca de 45% do total apresenta alguma forma de transcrição). Para maiores informações, cf. Cabral (2019b)CABRAL, Gustavo César Machado. Literatura jurídica e prática processual no Portugal Seiscentista: o uso de casos julgados nas Resolutiones forenses practicabiles de Manuel Álvares Pegas. Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito/UFRGS, v. 14, n. 1, 2019b, p. 301-326..
  • 7
    Sobre a literatura de decisiones, com especial atenção para esses autores, cf. Cabral (2017)CABRAL, Gustavo César Machado. Literatura jurídica na Idade Moderna: as decisiones no Reino de Portugal (séculos XVI e XVII). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017..
  • 8
    O diálogo de Hespanha com o contextualismo linguístico inglês ou com a história dos conceitos alemã resultou em influência em sua obra de menos intensidade do que, por exemplo, a do pós-estruturalismo (especialmente de Michel Foucault) ou de uma sociologia do poder de Pierre Bourdieu. Para uma visão desse diálogo, cf. Hespanha (2003)HESPANHA, António Manuel. Categorias. Uma reflexão sobre a prática de classificar. Análise Social, v. 38, n. 168, 2003, p. 823-840..
  • 9
    De alguma maneira, o trecho em que Hespanha (2015, p. 11)HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015. afirma “havia crimes sem lei e, ainda mais, penas sem lei” precisa ser analisado com cautela e confrontado com uma recente historiografia que identificou um crescente papel da ideia de legalidade em ramos como o direito penal. Nesse sentido, cf. Martyn (2013)MARTYN, George. Introduction: From arbitrium to legality? Or legality and arbitrium?. In: MARTYN, Georges; MUSSON, Anthony; PIHLAJAMÄKI, Heikki (Org.). From the judge’s arbitrium to the legality principle: legislation as a source of law in Criminal Trials. Berlin: Duncker & Humblot, 2013, p. 7-31..
  • 10
    Para um exemplo de trabalho de história do direito influenciado por esse ponto levantado por Hespanha (presença de livros na periferia), cf. Silva Júnior (2021)SILVA JÚNIOR, Airton Ribeiro. Magistrates’ travelling libraries: the circulation of normative knowledge in the Portuguese Empire of the late 18th century. Rechtsgeschichte – Legal History, v. 29, 2021, p. 128-141..
  • 11
    “Os morgados eram conjuntos de bens cuja transmissão por morte obedecia a uma ordem sucessória, para sempre, pelo instituidor no documento de instituição, diferente da ordem de sucessão legítima” (HESPANHA, 2015HESPANHA, António Manuel. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015., p. 435-436).
  • CABRAL, Gustavo César Machado. Ampliando as fontes: António Manuel Hespanha e a literatura jurídica portuguesa da Idade Moderna. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, Brasil, n. 83, p. 57-71, dez. 2022.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    06 Fev 2022
  • Aceito
    03 Out 2022
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