Acessibilidade / Reportar erro

Valores de consumo máximo de oxigênio determinados pelo teste cardiopulmonar em adolescentes: uma proposta de classificação

Resumos

OBJETIVO: A identificação de valores populacionais do consumo máximo de oxigênio (VO2 máx) auxilia nos estudos que se propõem a relacionar a aptidão física ao risco cardiovascular, bem como na prescrição do exercício e na análise do efeito do treinamento. Em amostras de adolescentes da população brasileira, ainda não existem informações para classificação desse parâmetro. Portanto, a proposta inédita deste estudo foi de determinar os valores médios de VO2 máx de uma amostra da população brasileira. MÉTODOS: Foi selecionada aleatoriamente uma amostra de 380 escolares (177 meninos e 203 meninas) da rede pública de Vitória (ES), com idade de 10 a 14 anos. Após avaliação antropométrica, foram submetidos a teste cardiopulmonar para medida direta do VO2 máx, cujos valores foram classificados de acordo com o quintil calculado a partir da amostra estudada. RESULTADOS: Os valores médios de VO2 máx encontrados para os meninos foram de 42,95 a 49,55 mL.kg-1.min-1 e, nas meninas, entre 36,76 e 38,29 mL.kg-1.min-1. CONCLUSÕES: O presente trabalho propõe faixas de valores médios de VO2 máx como parâmetro para classificação de aptidão cardiorrespiratória, além de contribuir para a definição dos valores de normalidade da população brasileira. Essa classificação auxilia também no estabelecimento de pontos de corte para estudos posteriores.

Consumo máximo de oxigênio; adolescentes; aptidão aeróbia; teste cardiopulmonar


OBJECTIVE: The identification of populational levels of maximum oxygen uptake (VO2max) is an aid to studies that propose to relate physical fitness to cardiovascular risk, and also for prescribing exercise and analyzing the effects of training. To date, there is no information with which this parameter can be classified in samples of adolescents from the Brazilian population. This study is, therefore, the first to propose the determination of mean VO2max levels in a sample of the Brazilian population. METHODS: A sample of 380 schoolchildren (177 boys and 203 girls, aged 10 to 14 years) was selected at random from public schools in Vitória, ES. After anthropometric assessment they underwent cardiopulmonary exercise testing, VO2max was measured directly and results were classified according to quintiles calculated from the study sample. RESULTS: The mean VO2max values observed ranged from 42.95 to 49.55 mL.kg-1.min-1 for boys and from 36.76 to 38.29 mL.kg-1.min-1 for girls. CONCLUSIONS: This paper proposes mean VO2max ranges as a classification parameter for cardiorespiratory fitness, in addition to contributing to a definition of normal values for the Brazilian population. This classification will also be of use for establishing cutoff points in future studies.

Maximum oxygen uptake; adolescents; aerobic fitness; cardiopulmonary exercise testing


ARTIGO ORIGINAL

Valores de consumo máximo de oxigênio determinados pelo teste cardiopulmonar em adolescentes: uma proposta de classificação

Anabel N. RodriguesI; Anselmo José PerezII; Luciana CarlettiII; Nazaré S. BissoliIII; Gláucia R. AbreuIII

IMestre, Faculdade Salesiana de Vitória, Vitória, ES

IIDoutor(a), Faculdade Salesiana de Vitória, Vitória, ES

IIIDoutora, Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Vitória, ES

Correspondência Correspondência: Anabel Nunes Rodrigues Rua Otávio Manhães de Andrade, 124/2, Edifício Topázio CEP 29200-450 - Guarapari, ES Tel.: (27) 3361.5136, (27) 9944.6823 Fax: (27) 3222.3829 E-mail: arodrigues@salesiano.com.br

RESUMO

OBJETIVO: A identificação de valores populacionais do consumo máximo de oxigênio (VO2 máx) auxilia nos estudos que se propõem a relacionar a aptidão física ao risco cardiovascular, bem como na prescrição do exercício e na análise do efeito do treinamento. Em amostras de adolescentes da população brasileira, ainda não existem informações para classificação desse parâmetro. Portanto, a proposta inédita deste estudo foi de determinar os valores médios de VO2 máx de uma amostra da população brasileira.

MÉTODOS: Foi selecionada aleatoriamente uma amostra de 380 escolares (177 meninos e 203 meninas) da rede pública de Vitória (ES), com idade de 10 a 14 anos. Após avaliação antropométrica, foram submetidos a teste cardiopulmonar para medida direta do VO2 máx, cujos valores foram classificados de acordo com o quintil calculado a partir da amostra estudada.

RESULTADOS: Os valores médios de VO2 máx encontrados para os meninos foram de 42,95 a 49,55 mL.kg-1.min-1 e, nas meninas, entre 36,76 e 38,29 mL.kg-1.min-1.

CONCLUSÕES: O presente trabalho propõe faixas de valores médios de VO2 máx como parâmetro para classificação de aptidão cardiorrespiratória, além de contribuir para a definição dos valores de normalidade da população brasileira. Essa classificação auxilia também no estabelecimento de pontos de corte para estudos posteriores.

Palavras-chave: Consumo máximo de oxigênio, adolescentes, aptidão aeróbia, teste cardiopulmonar.

Introdução

O sedentarismo é um problema crescente que tem atingido um número cada vez maior de crianças e adolescentes. Autores relatam que há uma tendência entre os adolescentes de se envolverem menos nas atividades de educação física escolar e em atividades vigorosas e de aumentarem o tempo dedicado a assistir televisão1. Essas mudanças comportamentais podem repercutir futuramente em problemas de saúde. Por outro lado, uma maior aptidão física vêm sendo relacionada a menor perfil de risco cardiovascular em crianças e adolescentes2, assim como a menores valores de pressão arterial, tanto em meninos quanto em meninas3-7. Apesar da importante correlação entre consumo máximo de oxigênio (VO2 máx) e riscos cardiovasculares, a literatura brasileira não dispõe de valores de referência para a classificação do VO2 máx de crianças e adolescentes.

A identificação de valores populacionais do VO2 máx auxilia nos estudos que se propõem a relacionar a aptidão física ao risco cardiovascular. É importante destacar também que o VO2 máx é uma medida utilizada para nortear a prescrição do exercício e a análise do efeito dos programas de treinamento8,9.

A capacidade aeróbia mensurada através do VO2 máx depende dos componentes cardiovasculares, respiratórios, hematológicos e de mecanismos oxidativos do músculo em exercício. É determinada através do teste cardiopulmonar, que permite uma avaliação simultânea da habilidade dos sistemas cardiovascular e respiratório para realizar suas principais funções, como a troca gasosa9. As mensurações das trocas gasosas são fundamentais para a compreensão dos mecanismos de limitação ao exercício, porque este requer uma resposta cardiopulmonar integrada para atender ao aumento das necessidades metabólicas do músculo para realizá-lo.

O VO2 máx é o melhor indicador da condição cardiovascular, o que o torna um importante parâmetro preditivo de morbidades associadas10. Uma forma de analisar o valor clínico do VO2 máx é relacioná-lo às dimensões do corpo ou a vários órgãos, tais como tamanho cardíaco, massa muscular e volume pulmonar11.

No período de transição da adolescência para a fase adulta, ocorrem muitas mudanças estruturais, hormonais e bioquímicas nos sistemas fisiológicos que interferem no VO2 máx12. Desta forma, faz-se necessário estabelecer valores de VO2 máx específicos para essa população. A literatura internacional apresenta valores de referência para crianças e adolescentes saudáveis9. Entretanto, em amostras da população brasileira, ainda há uma carência de informações para classificar esse parâmetro.

Considerando a importância da medida do VO2 máx para classificação da aptidão física, bem como para prescrição de exercícios, este estudo visa a estabelecer valores médios de VO2 máx de uma amostra regional da população brasileira, além de apresentar uma análise comparativa por gênero.

Métodos

Amostra

O presente estudo de desenho transversal foi realizado no período de março de 2003 a agosto de 2005, com escolares da rede pública do município de Vitória (ES), na faixa etária de 10 a 14 anos, de ambos os sexos. A amostra mínima foi determinada utilizando a equação geral para tamanho de amostra em todas as populações13 - grandes e pequenas - com um nível de confiança de 95% e intervalo de confiança de 5%; atribuiu-se a p o valor que resultaria no maior tamanho da amostra, chegando assim a um n = 380. A amostragem foi obtida por um processo de seleção amostral aleatória, levando em consideração a proporcionalidade entre a população dessa faixa etária (total de 27.491 adolescentes na faixa etária do estudo, dos quais 59.7% estão matriculados na rede pública de ensino) nas sete regiões administrativas do município. As escolas de cada uma das sete regiões administrativas foram sorteadas e convidadas a participar por meio de seus diretores, que forneceram uma listagem de seus alunos. A partir dessa lista, foram sorteados, de maneira aleatória, 380 escolares, sendo 177 do sexo masculino e 203 de sexo feminino. Apenas duas das crianças selecionadas desistiram de participar do estudo, as quais foram substituídas através de novo sorteio.

Os adolescentes sorteados foram convidados, por meio de seus pais ou responsáveis, a participarem do estudo. Todos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido sobre os benefícios, riscos e procedimentos a serem realizados no estudo. O protocolo de estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da Faculdade Salesiana de Vitória. Nenhum deles se declarou tabagista, portador de alguma doença metabólica previamente conhecida ou ser usuário de contraceptivo oral, que eram critérios de exclusão. A idade cronológica dos adolescentes foi determinada em forma centesimal, tendo como referência a data da coleta de dados e a data do nascimento.

Medidas antropométricas

A massa corporal foi determinada utilizando uma balança antropométrica com precisão de 100 g e capacidade máxima para 150 kg, e a estatura foi determinada com um estadiômetro com escala de 0,1 cm, conforme padronizações conhecidas. A partir dessas duas variáveis, calculou-se o índice de massa corporal (IMC). Sobrepeso e obesidade foram definidos utilizando os valores médios de IMC para idade e sexo, estabelecendo como ponto de corte o percentil > 85 e < 95 para sobrepeso e > 95 para obesidade14-17.

O protocolo do teste de esforço cardiopulmonar

Antes da realização do teste, os indivíduos foram orientados a respeito dos cuidados a serem considerados para a realização do teste. Para o monitoramento das variáveis cardiopulmonares, utilizou-se um ergoespirômetro da marca MedGraphics Corporation (MGC), o qual fornecia informações acerca do consumo de oxigênio (VO2), produção de dióxido de carbono (VCO2), ventilação pulmonar (VE), equivalentes respiratórios de oxigênio (VE/VO2) e gás carbônico (VE/VCO2) e razão de troca respiratória (RER = VCO2/VO2). Inicialmente, todos foram submetidos a um eletrocardiograma de repouso (ECG), utilizando as 12 derivações convencionais. As crianças e adolescentes permaneciam em decúbito dorsal por cerca de 5 minutos, em um ambiente tranqüilo, com temperatura mantida em torno de 22 ºC; a seguir, era feito o registro da atividade elétrica do coração. O local de realização do teste era equipado com equipamentos e fármacos para intercorrências. Os indivíduos eram então encaminhados para a esteira ergométrica (Inbrasport Super ATL) e orientados a respeito do desenvolvimento do teste e critérios para a interrupção. Nesse momento, ajustava-se uma máscara de neoprene, utilizando o tamanho pequeno ou médio de acordo com o tamanho do rosto dos jovens avaliados. A máscara, que permitia a respiração pela boca e pelo nariz, era conectada ao pneumotacômetro (para medida do fluxo de ar e análise dos gases expirados), e havia sempre o cuidado de conferir se não apresentava vazamento nessa conexão.

Após cerca de 2 minutos de repouso em pé realizando os registros eletrocardiográficos e ventilatórios (fase pré-esforço), iniciava-se o teste. Durante a execução, os indivíduos eram monitorados através do ECG de 12 derivações, para acompanhar a resposta cardíaca e a freqüência cardíaca (FC) do esforço. Neste estudo, utilizamos um protocolo de rampa, que progredia de acordo com o VO2 predito, em equivalentes metabólicos (MET), comparado com o VO2 medido. Dessa forma, para os indivíduos que apresentavam uma resposta mais lenta de elevação do VO2 ou para aqueles em que o VO2 estimado era muito alto, a velocidade máxima era rapidamente atingida. De acordo com o Colégio Americano de Medicina do Esporte, o teste de rampa com esforço gradativo na esteira rolante consiste em um procedimento relativamente novo, que se diferencia dos tradicionais protocolos com cargas incrementais e necessita equipamento moderno10. Em função disso, para definição da velocidade máxima predita, foi necessário utilizar a experiência adquirida anteriormente em outros trabalhos desenvolvidos em nosso laboratório18,19. Assim, considerando a idade e as condições físicas de cada adolescente, foi feito um acompanhamento durante o teste, o que permitiu monitorar as condições preditas anteriormente. Quando se atingia a velocidade máxima sem entrar em fadiga, o protocolo automaticamente modificava a carga através de mudanças na inclinação da esteira. O uso de protocolo individualizado, como o de rampa, tem sido relatado como o método mais adequado para se atingir o VO2 máx em crianças20. O teste era interrompido se os avaliados sinalizassem (através de gestos pré-combinados) para a fadiga, ou algum desconforto que impedisse a continuidade do teste. Para considerar se o VO2 atingido era o máximo, pelo menos três dos seguintes critérios deveriam ser observados20: a) exaustão ou inabilidade para manter a velocidade requerida; b) RER > 1,0; c) FC máxima alcançada > 90% da FC estimada; d) platô do VO2 máx, ou ter atingido valores > 85% do predito.

A análise dos gases

Para a análise dos gases durante o esforço, utilizou-se o ergoespirômetro Cardio2 da marca MGC, que consiste em um sistema de calorimetria de circuito aberto, ou seja, o gás referência para calibração era ajustado por uma mistura de gases com concentração constante de dióxido de carbono (CO2) e oxigênio (O2). Um software breeze suite era utilizado para determinação da concentração de VO2 e VCO2 pela medida, na VE (volume minuto ou volume expirado de ventilação por minuto), da diferença entre as pressões gasosas no ar inspirado e no ar expirado aferidos a cada respiração (breath by breath). Um transdutor fazia quantificação da concentração do CO2 através de análise infravermelha não dispersiva (NDIR), e outro fazia a quantificação do O2 por meio de célula de zircônio. A RER foi calculada a partir da relação entre VCO2 e VO2 a cada incursão respiratória (RER = VCO2/VO2). O equipamento da ergoespirometria era calibrado antes do teste da seguinte forma: aguardava-se 30 minutos para o aquecimento do circuito. Em seguida, ajustava-se o fluxo de ar através do uso de uma seringa de calibração com capacidade de gerar um volume de 3 L. A seringa era manipulada manualmente para produzir um fluxo de 0,4 a 12 L/s, para verificar a calibração do sistema para fluxo baixo e alto. O sensor de O2 e CO2 era calibrado usando como referência um gás composto de 22% de O2 e 0% de CO2; posteriormente, era calibrado com o uso de um gás composto de 12% de O2 e 5% de CO2.

Estatística

A análise estatística dos dados foi processada empregando-se recursos da estatística descritiva (média, desvio padrão) para as medidas antropométricas e para o VO2 máx nas faixas etárias e gêneros. Com o objetivo de manter as mesmas categorias de classificação da aptidão cardiorrespiratória propostas pela American Heart Association (AHA)21, calculou-se o quintil do VO2 máx por gênero. Para comparação de médias entre os gêneros, utilizou-se o teste t de Student para amostras independentes. O nível de p < 0,05 foi usado para determinar as significâncias estatísticas.

Resultados

Este estudo propôs-se a apresentar valores médios de VO2 máx para uma amostra de adolescentes da população brasileira. As características antropométricas e etárias dessa amostra são apresentadas na Tabela 1. Os valores médios de IMC estão dentro da faixa de normalidade de acordo com a literatura14-17, caracterizando a amostra como eutróficos.

Na Tabela 2, são apresentados os valores de VO2 máx relativos à massa corporal (mL.kg-1.min-1). Observa-se que os meninos apresentam valores maiores de VO2 máx quando comparados com as meninas para todas as faixas etárias (p < 0,01), bem como um comportamento diferente de progressão com a idade. Enquanto entre meninas houve uma variação de 38,29±6,28 (faixa etária de 10 anos) para 36,76±5,98 mL.kg-1.min-1 (faixa etária de 14 anos), entre meninos a progressão foi de 43,53±6,65 (faixa etária de 10 anos) para 49,55±7,29 mL.kg-1.min-1 (faixa etária de 14 anos).

Os valores do VO2 máx de acordo o gênero distribuído por quintis são apresentados na Tabela 3. Trata-se de uma proposta de classificação para a faixa etária de 10 a 14 anos em cinco categorias. Observa-se, no resultado apresentado, que os maiores valores foram de 52,3 mL.kg-1.min-1 para os meninos e 42,5 mL.kg-1.min-1 para as meninas.

Cerca de 93% das meninas e 87% dos meninos atingiram critério para considerar o VO2 atingido como máximo, de acordo com o critério adotado neste estudo20.

Discussão

Os resultados deste estudo indicaram que o teste cardiopulmonar apresentou qualidade considerável, com cerca de 90% dos avaliados atingindo os critérios para VO2 máx, de acordo com a literatura proposta20.

Os indivíduos avaliados (n = 380), perfazendo um total de 71 a 82 representantes por grupo etário, foram selecionados aleatoriamente entre os escolares da rede pública de Vitória (ES), o que garantiu igualmente uma boa qualidade aos dados coletados.

Embora a amostra deste estudo seja representativa para a faixa etária investigada, nossos dados não devem ser extrapolados a toda a população. Isso se deve ao fato de que apenas indivíduos da rede pública foram selecionados, onde, em sua maioria, estão agregados indivíduos de extratos socioeconômicos mais baixos. É interessante, portanto, que estudos posteriores invistam em uma categorização mais ampla do VO2 máx, abrangendo outros extratos populacionais.

Normalmente, os estudos internacionais apontam para valores de VO2 máx relativos à massa corporal, semelhantes ou superiores entre adolescentes15 quando comparados com adultos. Isso acontece porque, em detrimento da menor capacidade de aumento do débito cardíaco máximo, vinculada a um menor volume sistólico, os adolescentes apresentam maior capacidade cronotrópica máxima e melhor eficiência na utilização da via oxidativa, em comparação à via glicolítica, para ressíntese de ATP12,22. Entretanto, a capacidade de realizar trabalho é bem inferior entre os mais jovens, pois eles têm limitações estruturais no sistema cardiorrespiratório em razão do reduzido tamanho desse órgão e de limitações bioquímicas para a produção anaeróbia de ATP9,22,23.

Outra diferença importante entre adultos e adolescentes está na dificuldade de encontrar entre estes o platô do VO2, a fim de identificar a aptidão aeróbia máxima9,20,24. Estudos23,25,26 indicam que o VO2 pico é um bom indicador da aptidão aeróbia em crianças, mesmo na ausência do platô de VO220,25.

Foram identificados valores de VO2 máx superiores entre meninos quando comparados com as meninas. Isso já era esperado12, tendo em vista que os fatores culturais para a prática de atividade física e o desenvolvimento muscular entre meninos são mais favoráveis27. Vale ressaltar que não havia atletas entre os adolescentes estudados, e que as diferenças no nível habitual de atividade física, se existiram, foram muito mais em função dos aspectos culturais.

Embora não se possa tomar como referência o padrão internacional para a população brasileira, é interessante observar que o comportamento do VO2 máx ao longo da adolescência, observado neste estudo, é semelhante ao apresentado pela literatura internacional, ou seja, ascendente para os meninos e descendente para as meninas25.

Na amostra estudada, observa-se que o maior valor de VO2 máx categorizado como excelente foi de 42,5 mL.kg-1.min-1 para as meninas e 52,3 mL.kg-1.min-1 para os meninos. Entretanto, se observarmos os valores médios por faixa etária e gênero, podemos observar que, para meninos, os valores encontrados estão entre 42,95 e 49,55 mL.kg-1.min-1, e os das meninas estão entre 36,76 e 38,29 mL.kg-1.min-1. Armstong et al.25 apresentaram valores típicos para os meninos, de 48 a 50 mL.kg-1.min-1 ao longo da adolescência, enquanto que, para as meninas, os valores foram de 39 a 45 mL.kg-1.min-1.

Outros estudos24 indicam valores esperados entre 44,2 e 58 mL.kg-1.min-1 para meninos e meninas na faixa etária de 6 a 12 anos27,28, 47,7 mL.kg-1.min-1 para meninas de 12 a 14 anos e entre 49 e 52,1 mL.kg-1.min-1 para meninos de 13 a 14 anos29-32.

Portanto, os achados até o momento, com base na amostra estudada, sinalizam para uma menor aptidão aeróbia da população brasileira de adolescentes expressa pelo VO2 máx em mL.kg-1.min-1, quando comparados com dados internacionais.

O presente trabalho apresentou uma proposta inédita de faixas de valores médios para VO2 máx como parâmetro para classificação de aptidão cardiorrespiratória em adolescentes brasileiros. Essa classificação contribui para uma definição de valores de normalidade. Além disso, também auxilia no estabelecimento de pontos de corte para estudos posteriores que visem estudar a ocorrência de limitações fisiológicas dos sistemas orgânicos e possíveis fatores de risco cardiovascular entre adolescentes com menor classificação de aptidão cardiorrespiratória.

Artigo submetido em 10.05.06, aceito em 16.08.06.

  • 1. Freedman DS, Srinivasan SR, Valdez RA, Williamson DF, Berenson GS. Secular increases in relative weight and adiposity among children over two decades: The Bogalusa Heart Study. Pediatrics. 1997;99:420-6.
  • 2. Al-Hazaa HM. Physical activity, fitness and fatness among Saudi children and adolescents: implications for cardiovascular health. Saudi Med J. 2002;23:144-50.
  • 3. Fraser GE, Phillips RL, Harris R. Physical fitness and blood pressure in school children. Circulation. 1983;67:405-12.
  • 4. Hofman A, Walter HJ, Connelly PA, Vaughan, RD. Blood pressure and physical fitness in children. Hypertension. 1987;9:188-91.
  • 5. Gutin B, Basch C, Shea S, Contento I, DeLozier M, Rips J, et al. Blood pressure, fitness and fatness in 5 - and 6 - year - old children. J Am Med Ass. 1990;264:1123-27.
  • 6. Hansen HS, Hyldebrandt N, Froberg K, Rokkedal Nielsen J. Blood pressure and physical fitness in school children. Scand J Clin Lab Invest Suppl. 1989;192:42-6.
  • 7. Shear CL, Burke GL, Freedman DS, Berenson GS. Value of childhood blood pressure measurements and family history in predicting future blood pressure status: results from 8 years of follow-up in the Bogalusa heart study. Pediatrics. 1986;77:862-9.
  • 8. Obert P, Mandigout S, Nottin S, Vinet A, N'Guyen LD, Lecoq AM. Cardiovascular responses to endurance training in children: effect of gender. Eur J Clin Invest. 2003;33:199-208.
  • 9. Armstrong N, Welsman JR. Assessment and interpretation of aerobic fitness in children and adolescents. Exerc Sport Scien Ver. 1994;22:435-76.
  • 10
    ACSM/American College of Sports Medicine. Manual do ACSM para avaliação da aptidão física relacionada à saúde. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006.
  • 11. Astrand Per-Olof, Rodhal Kaare, Dahl HA, Stromme SB. Tratado de Fisiologia do Trabalho. Porto Alegre: Art Med; 2006.
  • 12. Tourinho Filho H, Tourinho LS. Crianças, adolescentes e atividade física: aspectos maturacionais e funcionais. Rev Paul Educ Fis. 1998;12:71-84.
  • 13. Rea LM, Parker RA. Metodologia de Pesquisa - do planejamento a execução. São Paulo: Pioneira; 2000.
  • 14. Williams CL, Hayman LL, Daniels SR, Robinson TM, Steinberger J, Paridon S, et al. Cardiovascular health in childhood: a statement for health professionals from the Committee on Atherosclerosis, Hypertension, and Obesity in the Young (AHOY) of the Council on Cardiovascular Disease in the Young, American Heart Association. Circulation. 2002;106:143-60.
  • 15. Paradis G, Lambert M, O'Loughlin J, Lavallée C, Aubin J, Delvin E, et al. Blood pressure and adiposity in children and adolescents. Circulation. 2004;110:1832-38.
  • 16. Daniels SR, Arnett DK, Eckel RH, Gidding SS, Hayman LL, Kamnyika S, et al. Overweight in children and adolescents. Pathophysiology, consequences, prevention, and treatment. Circulation. 2005;111:1999-2012.
  • 17. McWhorter JW, Wallmann HW, Alpert PT. The obese child: motivation as a tool for exercise. J Pediatr Care. 2003;17:11-17.
  • 18. Hauer TM, Rodrigues AN, Carletti L, Vassallo DV, Perez A. Freqüência cardíaca de recuperação após 1 minuto em crianças com sobrepeso e eutróficas. Rev Bras Fisiol Exerc. 2004;3:113.
  • 19. Rodrigues AN, Bissoli NS, Pires JGP, Abreu GR. A populational study on cardiorespiratory and metabolic parameters in schoolchildren of Vitoria, Brazil: preliminary results. J Hypertens. 2004;23 Suppl 1:51.
  • 20. Karila C, Blic J, Waerbessyckle S, Bernoist M, Scheinmann P. Cardiopulmonary exercise testing in children: an individualized protocol for workload increase. Chest. 2001;120:81-7.
  • 21. Kawamura T. Avaliação da capacidade física e teste ergométrico. Rev Soc Cardiol SP. 2001;3:659-72.
  • 22. Turley KR, Wilmore JH. Cardiovascular responses to treadmill and cycle ergometer exercise in children and adults. J Appl Physiol . 1997;83:948-57.
  • 23. Tolfrey K, Armstrong N. Child-adult differences in whole blood lactate responses to incremental treadmill exercise. Br J Sports Med. 1995;29:196-99.
  • 24. Stanganelli LCR. Mudanças no VO2 máx e limiar anaeróbico em crianças pré-púberes ocorridas após treinamento de resistência aeróbia. Festur. 1991;3:42-5.
  • 25. Armstrong N, Welsman J, Winsley R. Is peak VO2 a maximal index of children's aerobic fitness? Int J Sports Med. 1996;17:356-59.
  • 26. Hebestreit H, Staschen B, Hebestreit A. Ventilatory threshold: a useful method to determine aerobic fitness in children? Med Sci Sports Exerc. 2000;32:1964-69.
  • 27. Malina RM. Adolescent changes in size, build, composition and performance. Human Biology. 1974;46:117-31.
  • 28. Mahon AD, Gay JA, Stolen KQ. Differentiated ratings of perceived exertion at ventilatory threshold in children and adults. Eur J Appl Physiol. 1998;18:115-20.
  • 29. Allor KM, Pivarnik JM, Sam LJ, Perkins CD. Treadmill economy in girls and women matched for height and weight. J Appl Physiol. 2000;89:512-16.
  • 30. Heberstreit H, Kriemler S, Hughson RL, Bar-Or O. Kinetics of oxygen uptake at the onset of exercise in boys and men. J Appl Physiol. 1998;85:1833-41.
  • 31. Williams CA, Carter H, Jones AM, Doust JH. Oxygen uptake kinetics during treadmill running in boys and men. J Appl Physiol. 2001;90:1700-6.
  • 32. Eriksson BO, Grimby G, Saltin B. Cardiac output and arterial blood gases during exercise in pubertal boys. J Appl Physiol. 1971;31:348-52.
  • Correspondência:

    Anabel Nunes Rodrigues
    Rua Otávio Manhães de Andrade, 124/2, Edifício Topázio
    CEP 29200-450 - Guarapari, ES
    Tel.: (27) 3361.5136, (27) 9944.6823
    Fax: (27) 3222.3829
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Fev 2007
    • Data do Fascículo
      Dez 2006

    Histórico

    • Recebido
      10 Maio 2006
    • Aceito
      16 Ago 2006
    Sociedade Brasileira de Pediatria Av. Carlos Gomes, 328 cj. 304, 90480-000 Porto Alegre RS Brazil, Tel.: +55 51 3328-9520 - Porto Alegre - RS - Brazil
    E-mail: jped@jped.com.br