Acessibilidade / Reportar erro

Alguns fatores associados a excesso de peso, baixa estatura e déficit de peso em menores de 5 anos

Resumos

OBJETIVO: Examinar fatores socioeconômicos e outras condições de vida familiar associadas a excesso de peso, baixa estatura e baixo peso para a estatura em menores de 5 anos. MÉTODOS: Estudo transversal avaliou 3.957 crianças entre 1 mês e 5 anos de idade durante campanha nacional de imunização no município de São Leopoldo (RS) em 2002. As condições socioeconômicas e de saneamento das áreas de abrangência das unidades de saúde foram agrupadas por análise de cluster dos setores do censo populacional de 2001. RESULTADOS: Déficit de peso para estatura ocorreu em 2,6% das crianças, baixa estatura em 9,1% e excesso de peso em 9,8%. A regressão logística multivariada sugere que os fatores associados à chance de excesso de peso foram: área de condições socioeconômicas alta (RC = 1,47; IC95% 1,09-1,96), filhos únicos (RC = 1,44; IC95% 1,00-2,07) e peso ao nascer ≥ 2.500 g (RC = 2,21; IC95%1,27-3,83). A chance de déficit de peso associou-se ao baixo peso ao nascer (RC = 3,46; IC95% 2,06-5,80) e idade da mãe < 20 anos (RC = 1,99; IC95% 1,09-3,62). A baixa estatura associou-se à área de condições socioeconômicas baixas (RC = 2,36; IC95% 1,51-3,69), três ou mais irmãos (RC = 3,12; IC95% 2,18-4,47), peso ao nascer < 2.500 g (RC = 3,49; IC95% 2,53-4,80), idade < 36 meses (RC = 1,77; IC95% 1,37-2,29) e idade materna < 20 anos (RC = 1,60; IC95%1,09-2,35). CONCLUSÕES: Excesso de peso e baixa estatura foram os principais desvios antropométricos observados neste estudo, constituindo prioridades que devem ser consideradas nas políticas públicas atuais.

Estado nutricional; criança; fatores de risco; antropometria; excesso de peso e insuficiência de crescimento


OBJECTIVE: To explore whether socioeconomic and sanitary conditions, maternal and child factors are associated with overweight, stunting, and wasting in children under five year old in the city of São Leopoldo, southern Brazil. METHODS: Cross-sectional study of 3,957 children aged 1 month to 5 years conducted in all primary care services of the city during the National Children's Vaccination Day in 2002. Maternal and child factors were assessed by a questionnaire. Children's height and weight were measured. Cluster analysis was used to group the areas served by the primary care services according to socioeconomic and sanitary conditions of the census tracts assessed by the 2001 National Census. RESULTS: Wasting was observed in 2.6% of children, stunting in 9.1% and overweight in 9.8%. The multivariable logistic regression model suggests that overweight was associated with higher socioeconomic status and better sanitation of the area (OR = 1.47; 95%CI 1.09-1.96), single child (OR = 1.44; 95%CI 1.00-2.07) and birth weight ≥ 2,500 g (OR = 2.21; 95%CI 1.27-3.83). Wasting was associated with low birth weight (OR = 3.46; 95%CI 2.06-5.80) and mother's age < 20 years (OR = 1.99; 95%CI 1.09-3.62). Stunting was associated with low socioeconomic status and poor sanitation of the area (OR = 2.36; 95%CI 1.51-3.69), three or more siblings (OR = 3.12; 95%CI 2.18-4.47), low birth weight < 2,500 g (OR = 3.49; 95%CI 2.53-4.80), child age < 36 months (OR = 1.77; 95%CI 1.37-2.29) and mother's age < 20 years (OR = 1.60; 95%CI 1.09-2.35). CONCLUSIONS: Overweight and stunting were the major anthropometric problems and therefore should be a priority for public policies.

Nutritional status; children; risk factors; anthropometrics; overweight, and stunted growth


ARTIGO ORIGINAL

Alguns fatores associados a excesso de peso, baixa estatura e déficit de peso em menores de 5 anos

Márcia R. VitoloI; Cíntia M. GamaI; Gisele A. BortoliniII; Paula D. B. CampagnoloII; Maria de Lourdes DrachlerIII

I

IIMestre. UFCSPA, Porto Alegre, RS

IIIDoutora. School of Allied Health Professions, University of East Anglia (UEA), UK

Correspondência Correspondência: Márcia Regina Vitolo Departamento de Saúde Coletiva - UFCSPA Avenida Sarmento Leite, 245 CEP 90050-170 - Porto Alegre, RS Email: vitolo@fffcmpa.edu.br

RESUMO

OBJETIVO: Examinar fatores socioeconômicos e outras condições de vida familiar associadas a excesso de peso, baixa estatura e baixo peso para a estatura em menores de 5 anos.

MÉTODOS: Estudo transversal avaliou 3.957 crianças entre 1 mês e 5 anos de idade durante campanha nacional de imunização no município de São Leopoldo (RS) em 2002. As condições socioeconômicas e de saneamento das áreas de abrangência das unidades de saúde foram agrupadas por análise de cluster dos setores do censo populacional de 2001.

RESULTADOS: Déficit de peso para estatura ocorreu em 2,6% das crianças, baixa estatura em 9,1% e excesso de peso em 9,8%. A regressão logística multivariada sugere que os fatores associados à chance de excesso de peso foram: área de condições socioeconômicas alta (RC = 1,47; IC95% 1,09-1,96), filhos únicos (RC = 1,44; IC95% 1,00-2,07) e peso ao nascer ≥ 2.500 g (RC = 2,21; IC95%1,27-3,83). A chance de déficit de peso associou-se ao baixo peso ao nascer (RC = 3,46; IC95% 2,06-5,80) e idade da mãe < 20 anos (RC = 1,99; IC95% 1,09-3,62). A baixa estatura associou-se à área de condições socioeconômicas baixas (RC = 2,36; IC95% 1,51-3,69), três ou mais irmãos (RC = 3,12; IC95% 2,18-4,47), peso ao nascer < 2.500 g (RC = 3,49; IC95% 2,53-4,80), idade < 36 meses (RC = 1,77; IC95% 1,37-2,29) e idade materna < 20 anos (RC = 1,60; IC95%1,09-2,35).

CONCLUSÕES: Excesso de peso e baixa estatura foram os principais desvios antropométricos observados neste estudo, constituindo prioridades que devem ser consideradas nas políticas públicas atuais.

Palavras-chave: Estado nutricional, criança, fatores de risco, antropometria, excesso de peso e insuficiência de crescimento.

Introdução

Pesquisas nacionais entre 1975 e 19961-3 e estudos de base populacional mais recentes realizados em diversas regiões do Brasil4,5 têm sugerido redução da desnutrição e aumento do excesso de peso entre crianças menores de 5 anos no Brasil. Não existem dados nacionais atuais que tenham investigado o estado nutricional das crianças brasileiras. A Pesquisa de Orçamento Familiar 2002/2003 apresentou dados de crianças, mas a publicação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) não recomenda a utilização dos mesmos por serem inconsistentes quanto às medidas de estatura, validando somente para adolescentes e adultos6.

A identificação do estado nutricional das crianças, relacionada às diferenças nas condições socioeconômicas e condições de vida das famílias, é informação fundamental para o desenvolvimento e avaliação de políticas públicas voltadas à eqüidade em saúde. Estudos em diversas regiões brasileiras que compararam o estado nutricional das crianças, entre grupos de renda e escolaridade dos pais, indicam que as crianças de famílias com piores condições socioeconômicas apresentam riscos significativamente maiores de déficit de peso e retardo de crescimento7-10, ao passo que o risco de excesso de peso tende a ser maior em famílias com elevadas condições socioeconômicas4,11. Nos últimos 5 anos, poucos estudos de base populacional sobre o estado nutricional e fatores associados têm sido realizados no Brasil12,13. Tais estudos são necessários para informar sobre o perfil atual da desigualdade social no estado nutricional das crianças brasileiras.

Este artigo examina fatores socioeconômicos e outras condições de vida familiar associadas a excesso de peso, baixa estatura e baixo peso para a estatura em menores de 5 anos entre crianças que compareceram nos postos de vacinação durante a Campanha Nacional de imunização no município de São Leopoldo (RS) em 2002.

Métodos

A coleta de dados foi realizada no Dia Nacional da Vacinação (24/08/02) no município de São Leopoldo (RS). O município localiza-se a 30 km de Porto Alegre, tem aproximadamente 193.547 habitantes, sendo 17.779 menores de 5 anos. O índice de alfabetização é de 95,6%14. A campanha de vacinação baseou-se em 13 unidades de saúde (US) do município. Os quatro postos volantes não foram incluídos na avaliação porque não ofereciam condições para a realização da antropometria das crianças. Foram estudadas crianças de 1 mês a 5 anos de idade.

A coleta de dados foi realizada por 102 estudantes de nutrição da Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Eles foram treinados por nutricionistas para medir o peso e estatura das crianças e aplicar um questionário às mães ou responsáveis pela criança. O questionário avaliou idade, sexo, data de nascimento, prematuridade, peso ao nascer da criança, número de filhos e idade da mãe. A coleta de dados foi supervisionada por nutricionistas da rede básica de saúde e por docentes responsáveis pelo projeto. As crianças menores de 2 anos tiveram o comprimento medido por meio do estadiômetro de madeira, e o peso aferido pelas balanças pediátricas marca Welmy®. As crianças foram pesadas apenas com fraldas, sendo que o peso das fraldas foi descontado, usando como base uma tabela de peso médio de fraldas. As crianças maiores de 2 anos foram pesadas em balanças digitais portáteis marca Techline®, sem sapatos e com o mínimo de roupa possível, descontando-se o valor das roupas conforme tabela de peso de roupas para a faixa etária. A altura foi medida com fita métrica não extensível marca Seca®, presa em uma parede lisa e sem rodapé e com auxílio de um esquadro de madeira de base larga. O estado nutricional foi expresso em escore z de acordo com o padrão de referência do Multicentre Growth Study, atualmente recomendado pela Organização Mundial da Saúde15. Foram adotados os seguintes indicadores para definição da baixa estatura, déficit de peso e excesso de peso, respectivamente: altura para a idade < -2 desvio padrão (DP), peso para altura < -2 DP e peso para altura > 2 DP16.

A condição socioeconômica da área de abrangência das US foi estimada a partir de informações socioeconômicas do censo populacional de 2001 para os setores censitários da área de abrangência de cada US (informada pela prefeitura). As informações do censo utilizadas foram: escolaridade dos chefes das famílias (porcentagem com ensino fundamental), renda dos chefes das famílias (distribuição de acordo com os percentis) e tipo de esgotamento sanitário dos domicílios (porcentagem com esgotamento inadequado). Análise de k-means clusters foi realizada para agrupar as 13 US de acordo com renda, escolaridade e saneamento em sua área de abrangência. A análise de clusters revelou três categorias de áreas das US: (I) área com condição socioeconômica baixa (uma US), caracterizada por 1/3 dos domicílios (28%) com esgotamento sanitário inadequado e grande maioria dos chefes de família com escolaridade e baixa renda (86% deles com escolaridade menor do que ensino fundamental e 73% com renda < percentil 3 para o município); (II) área com condição socioeconômica média (oito US), caracterizada por baixa proporção (< 10%) dos domicílios com esgotamento sanitário inadequado e predomínio de escolaridade e renda baixas (65% com escolaridade menor do que ensino fundamental e 53% com renda < percentil 3 para o município); (III) área com condição socioeconômica alta (quatro US), onde a maior parte dos domicílios tinha esgotamento sanitário adequado (97,5%), havia predomínio de chefes da família com escolaridade igual ou superior ao ensino fundamental (58%) e com renda acima do percentil 3 para o município (71%).

O projeto foi aprovado pelo comitê de ética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). As coletas de dados das crianças e das mães foram realizadas após consentimento informado dos pais ou responsáveis, e as assinaturas foram obtidas em lista única para cada US. Nas 2 semanas anteriores ao dia da vacinação, a comunidade foi sensibilizada por meio de faixas nas ruas mais estratégicas da cidade e nas próprias US. Foi realizada dupla digitação dos dados no programa Epi-Info por digitadores independentes. O programa Anthro 2005 foi utilizado para o cálculo do estado nutricional das crianças17.

Realizou-se a regressão logística hierárquica por meio do pacote estatístico SPSS, versão 11.0, para estimar razões de chance de excesso de peso, baixa estatura e déficit de peso para as variáveis de interesse. Inicialmente, foram estimadas as razões de chance para as condições sociodemográficas, idade da criança e sexo, ajustadas umas pelas outras (bloco de variáveis 1). Foi pré-estabelecido que as variáveis do bloco 1, cuja significância estatística fosse menor do que 20% (p < 0,2), seriam incluídas como possíveis confundidores das variáveis de interesse dos blocos seguintes (bloco de variáveis 2: idade materna; modelo 3: número de irmãos e peso ao nascer). Do mesmo modo, se o p para a variável idade materna fosse menor do que 0,2, estas variáveis também seriam mantidas como possíveis confundidoras das variáveis de interesse do bloco 3 (bloco de variáveis 3: número de irmãos e peso ao nascer). Foi considerada associação significante quando p < 5% (p < 0,05).

Resultados

Observou-se déficit de peso para estatura (P/E) em 2,6% (n = 103), baixa estatura em 9,1% (n = 361) e excesso de peso em 9,8% (n = 389) das crianças. As Tabelas de 1 a 3 apresentam a distribuição das crianças conforme as variáveis estudadas.

A Tabela 1 mostra os fatores associados ao excesso de peso. As razões de chance ajustadas para possíveis fatores de confundimento sugerem que a presença de excesso de peso está positivamente associada à área com condição socioeconômica alta (RC = 1,47; IC95% 1,09-1,96), ao peso da criança ao nascimento ≥ 2.500 g (RC = 2,21; IC95% 1,27-3,83) e à tendência de associação significativa quando filho único (RC = 1,44; IC95% 1,00-2,07).

A Tabela 2 apresenta os fatores associados ao déficit de P/E. O baixo peso ao nascer triplicou a chance da criança ter déficit de peso (RC = 3,46; IC95% 2,06-5,80) aos 5 anos, ao passo que a idade da mãe inferior a 20 anos duplicou a chance de déficit de peso (RC = 1,99; IC95% 1,09-3,62).

A Tabela 3 mostra os fatores associados à baixa estatura. A chance de baixa estatura foi o dobro na área de condição socioeconômica baixa, comparada com a área de condição socioeconômica alta (RC = 2,36; IC95% 1,51-3,69) e 1,5 vezes maior na área de condição socioeconômica média (RC = 1,57; IC95% 1,20-2,05). A ocorrência de baixa estatura foi maior entre os nascidos com déficit de peso (RC = 3,49; IC95% 2,53-4,80). Observou-se o dobro de baixa estatura entre as crianças com um ou dois irmãos (RC = 1,82; IC95% 1,36-2,43) e o triplo para aquelas com três ou mais irmãos comparadas aos filhos únicos (RC = 3,12; IC95% 2,18-4,47). O sexo masculino (RC = 1,36; IC95% 1,07-1,72) e a faixa etária de até 36 meses (RC = 1,77; IC95% 1,37-2,29) também foram associados à baixa estatura.

Discussão

O excesso de peso e o déficit estatural aparecem como os principais problemas nutricionais relativos aos dados antropométricos avaliados, corroborando as últimas pesquisas nacionais1-3. Neste estudo, a chance de excesso de peso foi maior para as crianças atendidas nas US localizadas na área com condição socioeconômica alta. A associação entre excesso de peso e fatores socioeconômicos parece depender do país e da faixa etária avaliada. Nos países desenvolvidos, demonstrou-se que a prevalência de obesidade entre crianças é maior entre aquelas pertencentes a estratos socioeconômicos menos privilegiados18,19. Diferentemente, nos países em desenvolvimento, o excesso de peso e a obesidade em crianças tendem a ser mais prevalentes em famílias com melhores condições socioeconômicas4,11,20,21. Em nosso estudo, a setorização de abrangência das US a partir da renda familiar, escolaridade do chefe da família e de esgotamento sanitário da área também mostra maior prevalência de excesso de peso na área com condição socioeconômica alta e corrobora os dados das últimas pesquisas nacionais. As maiores chances de excesso de peso observadas neste estudo entre os nascidos com peso ≥ 2.500 g e os filhos únicos, comparados aos com três ou mais irmãos, podem representar a condição socioeconômica mais favorecida das famílias. Nossos resultados alinham-se também a estudos que mostraram menor chance de excesso de peso entre crianças que apresentaram baixo peso ao nascer5,11,18. Ressalta-se, entretanto, que há outros fatores fortemente associados ao excesso de peso entre crianças e que não foram avaliados neste estudo, como desmame precoce, práticas alimentares inadequadas e atividades sedentárias. Estudos em crianças de outros municípios e regiões brasileiras também têm sugerido baixa prevalência de déficit de peso entre crianças4,12,22,23. É importante ressaltar que foi utilizado neste estudo o P/E e não peso por idade. As curvas de crescimento baseadas em percentil por idade, utilizadas nas US, são úteis para acompanhamento do canal de crescimento da criança, e não para o diagnóstico nutricional, uma vez que a maioria das crianças com déficit de estatura, desde o nascimento ou não, estariam sendo erroneamente diagnosticadas como déficit de peso. A prevalência de 2,6% de déficit de peso, observada neste estudo, corresponde ao valor esperado na distribuição da população em geral. Contudo, observou-se que o déficit de P/E associou-se ao baixo peso ao nascer, confirmando a importância da atenção à saúde da mulher, do pré-natal e do acompanhamento dessas crianças, considerando também que essa variável teve forte associação com a baixa estatura, que é a forma de desnutrição crônica de impacto relevante na saúde coletiva de grupos populacionais menos privilegiados. A associação do déficit de peso da criança com mães menores de 20 anos reforça a necessidade de se priorizar a vigilância nutricional às mães adolescentes em função do maior risco nutricional a que seus filhos estão submetidos24.

O déficit estatural é melhor que o ponderal como indicador de influências ambientais negativas sobre a saúde da criança, sendo o indicador mais sensível de má nutrição nos países. Ao contrário do observado para o excesso de peso, a chance de baixa estatura foi o dobro na área em condição socioeconômica mais baixa, como demonstrada em outros estudos8,10,25, e o triplo entre crianças com baixo peso ao nascer4,12,23. A chance de baixa estatura aumentou com o número de irmãos, sendo o triplo para aqueles com três ou mais irmãos, comparados aos filhos únicos, o que possivelmente representa outro indicador de condições socioeconômicas familiares menos privilegiadas e menor disponibilidade materna para o cuidado da criança. No presente estudo, também foi observado que a chance de baixa estatura foi maior para a faixa etária de até 36 meses. A mesma associação foi demonstrada por outras investigações e deve ser interpretada com cuidados em função da transversalidade do estudo13,26. Estudos longitudinais poderiam elucidar melhor se há algum processo de recuperação em relação ao crescimento linear após os 3 primeiros anos. As crianças do sexo masculino, neste estudo, apresentaram maior risco para baixa estatura, sugerindo que, em ambiente desfavorável ao crescimento, os meninos parecem ser mais vulneráveis. Estudo de base populacional em Porto Alegre (RS), na década de 1990, mostrou maior prevalência de baixa estatura entre os meninos, mas sem significância estatística13.

Com relação às limitações do presente estudo, menciona-se a formação de filas, em função da insuficiência de equipamentos adequados para agilizar o processo, o que pode ter desmotivado os pais a esperarem para medir e pesar seus filhos. A classificação sociodemográfica não foi realizada individualmente, portanto não é possível garantir que todas as crianças foram vacinadas nas US localizadas nas áreas de abrangência de sua moradia.

Conclusões

Excesso de peso e baixa estatura foram os principais desvios antropométricos observados neste estudo, constituindo condições que devem ser consideradas nas políticas públicas atuais. O momento é de reflexão quanto a essas políticas estabelecidas no combate aos problemas nutricionais nas redes básicas de saúde, municipais e estaduais, que ainda priorizam o combate à desnutrição infantil no contexto antropométrico. Estudo anterior, com 1.200 pré-escolares da rede pública municipal no Estado de São Paulo, observou maior proporção de excesso de peso entre as crianças, evidenciando o processo de transição nutricional nessa faixa etária27. A implementação de políticas públicas, como a vigilância nutricional e de saúde da criança, desde sua concepção, pode reduzir as taxas de baixo peso ao nascer no país e de baixa estatura, além de controlar o ganho de peso excessivo nos primeiros anos de vida.

Agradecimentos

À Coordenação da Área de Nutrição da Secretaria Municipal de Saúde de São Leopoldo.

Artigo submetido em 14.11.07, aceito em 30.01.08.

  • 1
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudo Nacional de Despesa Familiar (ENDEF). Rio de Janeiro: IBGE; 1974.
  • 2
    Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN). Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição. Perfil de Crescimento da População Brasileira de 0 a 25 anos - PNSN. Brasília: INAN; 1989.
  • 3
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Sociedade Civil Bem-Estar Familiar no Brasil. Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde - PNDS; 1996. Rio de Janeiro: IBGE; 1996.
  • 4. Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade na infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saude Publica. 2000;34:S52-61.
  • 5. Gigante DP, Victora CG, Pavin CL, Barros AFC. Tendências no perfil nutricional das crianças nascidas em 1993 em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil: análises longitudinais. Cad Saude Publica. 2003;19:S141-7.
  • 6
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).Pesquisa de Orçamentos Familiares 2002-2003. Antropometria e análise do estado nutricional de crianças e adolescentes no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2006.
  • 7. Wang Y, Monteiro C, Popkin BM. Trends of obesity and underweight in older children and adolescents in the United States, Brazil, China, and Russia. Am J Clin Nutr. 2002;75:971-7.
  • 8. Engstrom EM, Anjos LA. Relação entre o estado nutricional materno e sobrepeso nas crianças brasileiras. Rev Saude Publica. 1996;30:233-9.
  • 9. Arifeen AE, Black RE, Caulfield LE, Antelman G, Baqui AH, Nahar Q. Infant growth patterns in the slums of Dhaka in relation to birth weight, intrauterine growth retardation, and prematurity. Am J Clin Nutr. 2000;72:1010-7.
  • 10. Guimarães LV, Latorre MD, Barros MB. Fatores de risco para a ocorrência de déficit estatural em pré-escolares. Cad Saude Publica. 1999;15:605-15.
  • 11. Drachler ML, Macluf SP, Leite JC, Aerts DR, Giugliani ER, Horta BL. Fatores de risco para sobrepeso em crianças no Sul do Brasil. Cad Saude Publica. 2003;19:1073-81.
  • 12. Corso AC, Botelho LJ, Zeni LA, Moreira EA.Sobrepeso em crianças menores de 6 anos de idade em Florianópolis, SC. Rev Nutr. 2003;16:21-8.
  • 13. Aerts D, Drachler ML, Giugliani ER. Determinants of growth retardation in Southern Brazil. Cad Saude Publica. 2004;20:1182-90.
  • 14
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Sistema de Recuperação de Informação Georreferenciadas; Censo 2000. [CD ROM ]. Rio de Janeiro: IBGE; 2003.
  • 15
    World Health Organization (WHO). The WHO Multicentre Growth Reference Study (MGRS). Child Growth Standard. http://www.who.int/childgrowth/standards/en/ Acesso: 14.9.2007.
  • 16. World Health Organization (WHO). Physical Status: The use and interpretation of anthropometry. Report of WHO Expert Committee, WHO Technical Report Series, 854. Geneva: WHO; 1995.
  • 17. World Health Organization (WHO). Anthro 2005. [computer program ].Versão beta (Feb 17th, 2006). http://www.who.int/childgrowth/software/en/
  • 18. von Kries R, Koletzko B, Sauerwald T, von Mutius E, Barnert D, Grunert V, et al. Breast feeding and obesity: cross sectional study. BMJ. 1999;319:147-50.
  • 19. Ogden CL, Flegal KM, Carroll MD, Johnson CL. Prevalence and trends in overweight among US children and adolescents, 1999-2000. JAMA. 2002;288:1728-32.
  • 20. al-Isa AN, Moussa MA. Factors associated with overweight and obesity among Kuwaiti kindergarten children aged 3-5 years. Nutr Health. 1999;13:125-39.
  • 21. Kain J, Vio F, Albala C. Obesity trends and determinant factors in Latin America. Cad Saude Publica. 2003;19 Suppl 1:S77-86.
  • 22. Victora CG, Gigante DP, Barros AJ, Monteiro CA, de Onis M. Estimativa da prevalência de déficit de altura/idade em criança brasileiras. Rev Saude Publica. 1998;32:321-7.
  • 23. Strufaldi MW, Puccini RF, Pedroso GC, da Silva EM, da Silva NN. Prevalência de desnutrição em crianças residentes no município de Embu, São Paulo, Brasil, 1996-1997. Cad Saude Publica. 2003;19:421-8.
  • 24. Lima M, Figueira, F, Ebrahim GJ. Malnutrition among children of adolescent mothers in a squatter community of Recife, Brazil. J Trop Pediatr. 1990;36:14-9.
  • 25. Marins VM, Coelho MA, Matos HJ, Amaral NS, Valle J, Gismondi RC, et al. Perfil antropométrico de crianças de 0 a 5 anos do município de Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saude Publica. 1995;11:246-53.
  • 26. de Onis M, Frongillo EA, Blössner M. Is malnutrition declining? An analysis of changes in levels of child malnutrition since 1980. Bull World Health Organ. 2000;78:1222-33.
  • 27. Guimarães LV, Barros MB. As diferenças de estado nutricional em pré-escolares de rede pública e a transição nutricional. J Pediatr (Rio J). 2001;77:381-6.
  • Correspondência:

    Márcia Regina Vitolo
    Departamento de Saúde Coletiva - UFCSPA
    Avenida Sarmento Leite, 245
    CEP 90050-170 - Porto Alegre, RS
    Email:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jun 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Aceito
      30 Jan 2008
    • Recebido
      14 Nov 2007
    Sociedade Brasileira de Pediatria Av. Carlos Gomes, 328 cj. 304, 90480-000 Porto Alegre RS Brazil, Tel.: +55 51 3328-9520 - Porto Alegre - RS - Brazil
    E-mail: jped@jped.com.br