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A influência da atividade lúdica sobre a ansiedade da criança durante o período pré-operatório no centro cirúrgico ambulatorial

Resumos

OBJETIVO: Verificar a influência das atividades lúdicas realizadas durante o pré-operatório sobre a ansiedade de crianças participantes do projeto de recreação terapêutica desenvolvido no Centro Cirúrgico Ambulatorial (CCA) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Porto Alegre (RS). MÉTODOS: Para a realização do estudo, foi aplicada a Escala de Ansiedade Pré-operatória de Yale modificada (modified Yale Preoperative Anxiety Scale, mYPAS) em 50 crianças de 5 a 12 anos submetidas a procedimentos médicos no CCA. As crianças foram divididas em dois grupos: grupo recreação (participou de intervenções lúdicas na sala de recreação) e grupo controle (não participou de intervenções lúdicas). A ansiedade foi mensurada através da escala mYPAS em dois momentos: logo que os indivíduos chegaram ao CCA (minuto 0) e 15 minutos após a primeira medida. RESULTADOS: Os resultados mostraram que, logo ao entrar no CCA, os pacientes não apresentaram diferenças significativas com relação à ansiedade, sendo os valores elevados. No entanto, após 15 minutos de espera ou intervenção, as crianças do grupo recreação diminuíram a ansiedade, e as do grupo controle permaneceram ansiosas. CONCLUSÕES: Durante o período pré-operatório, crianças que participam de atividades lúdicas na sala de recreação diminuem a sua ansiedade em comparação àquelas que somente ficam na sala de espera pelo menos durante 15 minutos.

Criança; ansiedade; atividade lúdica; pré-operatório


OBJECTIVE: To verify the influence of playful activities during the preoperative period on the anxiety of children participating in the therapeutic recreation project conducted at the outpatient surgical center of Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Porto Alegre, Brazil. METHODS: The modified Yale Preoperative Anxiety Scale (mYPAS) was administered to 50 children between 5 and 12 years of age undergoing medical procedures at the outpatient surgical center. The children were divided in two groups: recreation group (individuals who participated in playful interventions in the recreation room) and control group (individuals who did not participate in playful interventions). Anxiety was measured using the mYPAS at two different moments: soon after the individuals arrived at the outpatient surgical center (minute 0) and 15 minutes after the first measurement. RESULTS: The results showed that soon after arriving at the outpatient surgical center, the patients did not have significant differences regarding anxiety, showing high values. However, after 15 minutes waiting or undergoing intervention, the children in the recreation group had reduced anxiety levels and those in the control group remained anxious. CONCLUSIONS: During the preoperative period, children who participate in playful activities in the recreation room have their anxiety reduced in comparison with those that only stay in the preoperative holding area for at least 15 minutes.

Child; anxiety; playful activities; preoperative


ARTIGO ORIGINAL

A influência da atividade lúdica sobre a ansiedade da criança durante o período pré-operatório no centro cirúrgico ambulatorial

Fernanda Seganfredo Weber

Professora, Educação Física, Graduação, Educação Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS, Serviço de Recreação Terapêutica, Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), UFRGS, Porto Alegre, RS

Correspondência Correspondência: Fernanda Seganfredo Weber Rua Torres Gonçalves, 816 CEP 99700-000 - Erechim, RS Tel.: (51) 9105.2252 E-mail: feweber@terra.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Verificar a influência das atividades lúdicas realizadas durante o pré-operatório sobre a ansiedade de crianças participantes do projeto de recreação terapêutica desenvolvido no Centro Cirúrgico Ambulatorial (CCA) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Porto Alegre (RS).

MÉTODOS: Para a realização do estudo, foi aplicada a Escala de Ansiedade Pré-operatória de Yale modificada (modified Yale Preoperative Anxiety Scale, mYPAS) em 50 crianças de 5 a 12 anos submetidas a procedimentos médicos no CCA. As crianças foram divididas em dois grupos: grupo recreação (participou de intervenções lúdicas na sala de recreação) e grupo controle (não participou de intervenções lúdicas). A ansiedade foi mensurada através da escala mYPAS em dois momentos: logo que os indivíduos chegaram ao CCA (minuto 0) e 15 minutos após a primeira medida.

RESULTADOS: Os resultados mostraram que, logo ao entrar no CCA, os pacientes não apresentaram diferenças significativas com relação à ansiedade, sendo os valores elevados. No entanto, após 15 minutos de espera ou intervenção, as crianças do grupo recreação diminuíram a ansiedade, e as do grupo controle permaneceram ansiosas.

CONCLUSÕES: Durante o período pré-operatório, crianças que participam de atividades lúdicas na sala de recreação diminuem a sua ansiedade em comparação àquelas que somente ficam na sala de espera pelo menos durante 15 minutos.

Palavras-chave: Criança, ansiedade, atividade lúdica, pré-operatório.

Introdução

A ansiedade é definida como um conjunto de manifestações que podem ser divididas em estado e traço. Ansiedade-estado é uma condição emocional transitória que varia de intensidade e grau o tempo todo; já ansiedade-traço é o traço de personalidade que permanece relativamente estável1. Estudos apontam que, durante o período pré-operatório, a ansiedade é caracterizada por sentimentos de tensão, nervosismo, preocupação, angústia e estresse psicológico2,3.

Ela parece estar presente em grande parte dos pacientes submetidos a procedimento cirúrgico pediátrico, podendo se manifestar através de um comportamento que expresse medo, tremor, pânico, choro ou agitação2,4,5. A ansiedade proporcionada pelo ambiente hospitalar, em conjunto com o procedimento cirúrgico, pode ser prejudicial durante o período pré-operatório, pois poderá afetar o desenvolvimento cognitivo, social e afetivo, além de aumentar as condutas negativas no período pós-operatório da criança6-8. A experiência negativa da criança durante o período que antecede a cirurgia poderá ocasionar alguns distúrbios, como alimentares e de sono, e uma série de mudanças de atitude por alguns dias9. Embora existam tantos distúrbios negativos, as reações frente à cirurgia podem também ser positivas, quando proporcionam autoconhecimento e consequente amadurecimento frente a esse tipo de situação, tanto da criança quanto do seu acompanhante10.

Foi realizado um projeto operacional dirigido pelo Serviço de Recreação Terapêutica no Centro Cirúrgico Ambulatorial (CCA), de junho de 2004 a dezembro de 2007, no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Porto Alegre (RS). Pode-se dizer que foi diferenciado dos informativos e educativos mais conhecidos, pois teve como objetivo principal proporcionar um ambiente que oferecesse alegria, conforto e bem-estar ao paciente e seu acompanhante durante a espera, com uma abordagem lúdica. Foi escolhido o trabalho lúdico, pois ele instrumentaliza a criança mediante seu caráter simbólico para a resolução de problemas de ordem imediata ou remota, bem como facilita a comunicação com os seus iguais e com o meio em que está inserida6. Desta forma, a criança tem a possibilidade de enfrentar os seus medos com brincadeiras e jogos e também colaborar com a equipe que está lhe atendendo, deixando-os realizar os procedimentos e respondendo quando questionada.

No ambiente hospitalar é possível caracterizar a brincadeira como terapêutica, pois tanto brincar quanto jogar auxilia na promoção do bem-estar, sendo indispensável à saúde física, intelectual e emocional do ser humano6. Tendo em vista essa importância, em 2005 foi criada no Brasil a Lei nº 11.104, a qual obriga os hospitais públicos e privados que tenham serviços de internação pediátrica a instalarem brinquedotecas para as crianças hospitalizadas11. A sala de recreação na qual foram desenvolvidas atividades lúdicas caracterizava-se como uma brinquedoteca, pois dispunha de vários jogos e brinquedos à escolha da criança. A presença de tantos objetos que podem ser manipulados livremente faz com que o paciente se identifique com o local, aproximando-o da sua realidade. Portanto, é de grande importância, pois a ansiedade causada pelo impacto com o ambiente hospitalar parece diminuir dentro desse espaço.

Poucos estudos preocupam-se em relacionar ansiedade, atividades lúdicas e cirurgia com o objetivo de proporcionar maior cuidado e equilíbrio emocional para a criança. Portanto, a presente pesquisa teve por objetivo verificar a influência das atividades lúdicas realizadas durante o pré-operatório sobre a ansiedade de crianças participantes do projeto de recreação terapêutica desenvolvido no CCA do HCPA.

Métodos

Após aprovação desta pesquisa pelo Comitê de Ética do HCPA em maio de 2007, foi realizado um ensaio clínico randomizado. Os responsáveis pelos pacientes foram previamente avisados sobre a realização da pesquisa e permitiram sua participação assinando um termo de consentimento livre e esclarecido. Foram incluídas na pesquisa crianças de 5 a 12 anos que realizaram procedimentos cirúrgicos no CCA do HCPA no turno da manhã nos meses de julho a setembro de 2007. Como critério de exclusão, foram considerados uso de medicamentos ansiolíticos e tempo de espera menor de 15 minutos.

Durante o período de coleta, foram realizados os seguintes procedimentos médicos no CCA: adenoidectomia, amigdalectomia, laringoscopia, biópsias de medula óssea, punção lombar, quimioterapia intratecal, retirada de cateter, colocação de cateter, colonoscopia, endoscopia, cirurgia plástica e de estrabismo. Todos necessitavam de anestesia geral e, no momento da sua realização, um acompanhante poderia ficar com o paciente na sala de cirurgia. Ressaltamos que durante o período de espera, apesar de estarem no local por diferentes motivos, os indivíduos tiveram o mesmo modelo de atendimento médico.

Para caracterização da amostra, foi aplicado um questionário sobre informações pessoais do paciente ao responsável. Para a realização das observações, as crianças foram divididas em dois grupos de acordo com a ordem de chegada no CCA. As crianças do grupo controle (GC) foram observadas em dois momentos: logo que entraram no CCA (minuto 0) e 15 minutos após a primeira medida (minuto 15), no mesmo local de espera. As crianças do grupo recreação (GR) foram também observadas em dois momentos: logo que entraram no CCA (minuto 0) e 15 minutos após a entrada na sala de recreação (minuto 15). Quem observou as crianças foi sempre a mesma pessoa, assim como quem as auxiliou nas atividades lúdicas.

As atividades na sala de recreação foram realizadas em grupos de, no máximo, quatro crianças de acordo com a vontade delas e os materiais disponíveis. Nessa sala, havia jogos, brinquedos, livros, gibis, materiais para desenho (folhas, caneta hidrocor, lápis de cor, giz de cera, régua, lápis e borracha), filmes e televisão. Para medir o nível de ansiedade, foi aplicada a Escala de Ansiedade Pré-operatória de Yale modificada (modified Yale Preoperative Anxiety Scale, mYPAS) traduzida para o português e já utilizada para avaliar a ansiedade em crianças brasileiras no estudo de Guaratini et al.12 A mYPAS é uma escala de observação que contém 22 itens divididos em cinco categorias: atividade, vocalizações, expressão emocional, estado de consciência e uso dos pais. O escore varia de 23-100, sendo obtido através da escolha do número correspondente à conduta da criança com relação a cada categoria. Foram consideradas crianças ansiosas aquelas que tiveram escore maior do que 30.

Esse instrumento é validado para medir a ansiedade de crianças durante o pré-operatório e já foi utilizado em diversos estudos para medir o nível de ansiedade no pré-cirúrgico e sua relação com intervenções com brinquedos3 videogames8 presença de palhaços10 brincadeira de médico e filmes4. Porém, não foi encontrado nenhum trabalho brasileiro com a proposta do presente artigo.

Análise estatística

Foi realizada análise estatística descritiva de distribuição de frequência e mediana, pois se tratam de variáveis não contínuas. Posteriormente, procedeu-se à comparação dos valores da escala de ansiedade entre os grupos e entre os minutos através do teste não-paramétrico U de Mann-Whitney. As análises foram realizadas com auxílio do software SPSS 14.0, e o nível de significância considerado foi p < 0,05.

Resultados

No total, foram observadas 50 crianças (média de idade 8,4±2,15); destas, 25 eram do GC e 25 do GR, 22 eram meninas e 28 eram meninos.

Os dados coletados através do questionário estão presentes na Tabela 1. Ao analisar a diferença entre os sexos e o nível de ansiedade nos escores da escala, não foi constatada diferença significativa entre eles (p > 0,05).

Os dados coletados através da mYPAS podem ser visualizados na Tabela 2. No minuto 0, o GR apresentou mediana de 38,32, e no minuto 15 ela diminuiu significativamente (p = 0,00) para 23,32. Já o GC, no minuto 0, apresentou mediana de 41,66, e no minuto 15 ela aumentou para 46,66, porém não foi uma mudança significativa (p = 0,44). É possível visualizar esses resultados na Figura 1.


O ponto de corte da escala é igual a 30, ou seja, crianças abaixo de 30 não são consideradas ansiosas, e acima de 30 são consideradas ansiosas. Foi visto que, no minuto 0, 28% das crianças do GR não estavam ansiosas e 72% estavam ansiosas. Após 15 minutos na recreação, 92% das crianças passaram a não apresentar ansiedade e somente 8% ainda apresentavam ansiedade. No GC, foi visto que, no minuto 0, 12% das crianças não estavam ansiosas e 88% apresentavam ansiedade. Após 15 minutos na sala de espera, apenas 16% das crianças não estavam ansiosas e 84% ainda apresentavam ansiedade.

Através da aplicação do U de Mann-Whitney, pode ser visto que, no minuto 0, ambos os grupos apresentavam níveis semelhantes de ansiedade, ou seja, não havia diferença significativa entre eles. Após a intervenção, houve diferença significativa entre os grupos, sendo que o GR mostrou menores valores de ansiedade. Esses resultados são apresentados na Tabela 3, na qual é possível verificar a diferença entre os grupos após os 15 minutos de espera ou intervenção lúdica.

Discussão

Durante o período que antecede a realização de uma cirurgia, a criança pode sentir medo, tristeza, ansiedade, enfim, ela tende a passar várias emoções em poucos minutos4. Através dos dados coletados no CCA relacionados à ansiedade, foi possível verificar que ela estava presente em mais da metade dos indivíduos. No período pré-operatório, a ansiedade é caracterizada por sentimentos subjetivos de tensão, nervosismo, angústia e medo derivados de antecipação de perigo, de algo desconhecido ou estranho2,13.

Segundo Bar-Mor, as respostas da criança ao processo cirúrgico dependem do estágio de desenvolvimento (emocional e cognitivo), das experiências prévias, dos mecanismos de enfrentamento, do significado da doença ou estado de saúde e da percepção e interpretação que a criança tem dela e dos sentimentos e sensações despertados pelo ambiente hospitalar9. Desta forma, acredita-se que o ambiente e as sensações que este desperta no indivíduo tenham grande influência sobre a ansiedade dos pacientes. Isso pode ser visto no minuto 0, no qual o GC e o GR apresentaram médias elevadas de ansiedade.

Além da mudança externa, existe também o preparo interno da criança para compreender todo o processo cirúrgico. O CCA era desconhecido por 50% das crianças; sendo assim, metade delas estavam passando por uma experiência nova. Estas poderiam apresentar ansiedade por estarem frente a algo desconhecido, que não se sabe se é bom ou ruim, se trará dor ou não. Já a outra metade poderia apresentar ansiedade, pois conhece os incômodos e os riscos que está correndo com os procedimentos.

A ansiedade pode ser desencadeada por qualquer fator que interfira nas necessidades humanas básicas de alimentação, ar, conforto e segurança e pode ser manifestada por sintomas de cada categoria: fisiológicos, emocionais e cognitivos14,15. Considerando isso, é possível concluir que, no período pré-cirúrgico, a ansiedade dos indivíduos também pode ter sido ocasionada pelo jejum de 8 a 12 h ao qual o paciente foi submetido; pelo desconforto que pode ter sentido por estar em um lugar estranho e com roupas diferentes (aventais e sem as roupas íntimas); e pela insegurança gerada ao pensar no risco que acreditam estar correndo ao realizar procedimentos que necessitam de anestesia. Várias das causas citadas, não necessariamente uma, mas a associação delas, podem justificar os níveis elevados de ansiedade encontrados em 80% das crianças da amostra no minuto 0.

Permanecendo no mesmo local em que entraram no CCA, após 15 minutos, das 25 crianças do GC, 21 ainda apresentavam níveis elevados de ansiedade, mostrando também um aumento significativo. Dos 25 indivíduos que foram para a sala de recreação durante 15 minutos, 22 apresentaram menores valores na escala de ansiedade. Acredita-se que, ao deixar o ambiente um pouco mais familiar para o indivíduo, pelo menos com alguns objetos conhecidos, o paciente se sinta mais à vontade e, consequentemente, sua ansiedade diminua16. Já o contrário, permanecer em um ambiente sem nenhum atrativo, junto com outros pacientes adultos, parece impossibilitar a diminuição da ansiedade na criança.

Além do ambiente, que por si só parece ser tranquilizador, a sala de recreação contava com a realização de atividades lúdicas, disponibilizando às crianças brinquedos, livros para ler ou colorir, gibis, jogos, televisão e DVD. Segundo Carvalho & Begnis, recursos lúdicos no contexto hospitalar têm se mostrado catalisadores no processo de adaptação das crianças16. No trabalho de Lindquist, o brinquedo é utilizado como um recurso capaz de proporcionar às crianças atividades estimulantes e divertidas, mas que tragam calma e segurança17. É exatamente com esses intuitos que se utiliza o brinquedo nas atividades, tanto para adaptar a criança rapidamente ao meio, quanto para tranquilizá-la.

Acredita-se que a interação das crianças com os materiais e a estagiária presentes no local também colaborou para a diminuição da ansiedade, pois pesquisas feitas com interação lúdica na própria sala de espera, sem o ambiente favorável, apresentaram diminuição da ansiedade semelhante3,8,10,14,18.

Os primeiros modelos de programas específicos para as crianças que fariam cirurgia no hospital apareceram nos anos 19704. Nestes, a criança tinha uma visão prévia da anestesia e cirurgia através de vídeos ou teatros de fantoches. Mais tarde, na década de 1980, a literatura mostrou que não bastava somente a criança olhar, ela também precisava interagir durante o pré-cirúrgico para que a redução desses sentimentos angustiantes fosse mais efetiva, o que se confirma com os resultados apresentados18.

Kain et al. realizaram uma pesquisa comparando três programas de preparação pré-operatória: no primeiro, a criança fazia uma visita à sala de cirurgia e recebia informações; no segundo, a criança visitava a sala de cirurgia e assistia a um vídeo; e no terceiro, a criança visitava a sala de cirurgia, assistia a um vídeo e tinha uma interação com bonecos através da brincadeira de médico. Como resultado, os pesquisadores viram que, realizando o terceiro programa, a criança apresentava menor ansiedade enquanto estava na sala de espera18. Mais uma vez, aparece a interação como um fator que diminui a ansiedade em crianças neste momento de espera. Os resultados da presente pesquisa foram semelhantes aos de Golden et al., que mostraram que crianças que receberam brinquedos durante o tempo de espera diminuíram os níveis de ansiedade significativamente, ao passo que aquelas que não receberam aumentaram esses níveis3.

Segundo Isayama et al., o lúdico se manifesta com maior intensidade durante a infância e a sua vivência é fundamental, pois representa um espaço para o seu reconhecimento enquanto sujeito que decide, tem autonomia, repensa ações, avalia e busca as alternativas críticas e criativas para os problemas que surgem no cotidiano. Ele também pode ser marcado pela exaltação dos sentidos e das emoções, misturando alegrias e angústias, relaxamento e tensão, prazer e conflito e liberdade e concessão19. No pré-cirúrgico, existe esse confronto entre a atividade lúdica e prazerosa e o medo da realidade, pois no mesmo tempo em que a criança brinca e joga, ela está dentro de um hospital esperando por um procedimento que apresenta risco de morte.

Ao atribuir à criança a decisão da atividade que ela quer realizar, a estagiária atuante na recreação proporciona aos pacientes a criação do mundo deles, onde as atividades sejam relevantes para lidar com a situação pela qual estão passando e as experiências lhe propiciem satisfação e prazer. Desta forma, é possível promover uma ressignificação do ambiente hospitalar, passando de lugar frio e solitário para um lugar caloroso e divertido, contribuindo para uma melhoria nas relações humanas e mudança de paradigmas geralmente presentes nas ações de atendimento hospitalar, como a dualidade mente-corpo e o conceito de saúde restrito ao aspecto biológico19,20. Mesmo sabendo que estão no hospital, ao entrar na brinquedoteca, parece que o paciente entra em um lugar encantado, abre um sorriso e corre para pegar os brinquedos sem se preocupar com o que está acontecendo ao seu redor.

Justus et al. citam que o desafio da preparação pré-cirúrgica é desenvolver estratégias dentro do desenvolvimento cognitivo e emocional de cada criança4. Tendo em vista que todos somos indivíduos diferentes, não é possível realizar sempre a mesma atividade para entreter todas as crianças. A estratégia de trabalho no CCA, então, era de oferecer opções de atividades com os materiais presentes na sala de recreação condizentes com o desenvolvimento maturacional, emocional e preferências dos pacientes. Através das análises estatísticas obtidas no trabalho, mostrando que o GR diminuiu significativamente a ansiedade, é possível concluir que essa forma de trabalho, apresentando um profissional ou estagiário que motive e encoraje as crianças para a realização de atividades à sua escolha e participe das mesmas, vem desenvolvendo resultados positivos no pré-operatório.

Além do ambiente e da intervenção lúdica, existe também a interação da estagiária com a criança, o que pode ter influenciado os resultados. Segundo Bersch, quando há envolvimento pessoal de adultos nas atividades do brincar da criança, essa experiência pode ser bastante significativa para elas, constituindo-se em uma base sólida a partir da qual ela construirá diversas outras relações6. Isso leva à reciprocidade, equilíbrio de poder e sentimento afetivo, assim como à segurança e confiança, que são importantes neste momento.

Para finalizar, pode-se dizer que a realização de atividades lúdicas durante 15 minutos dentro de uma sala com recursos materiais recreativos pode ser um meio para diminuição da ansiedade em crianças durante o período pré-operatório, porém não se sabe por quanto tempo, pois segundo Bougère a brincadeira parece ter efeito imediato, mas não a longo prazo21.

Conclusão

Com a realização deste estudo, conclui-se que, durante o período pré-operatório, crianças que participaram de atividades lúdicas na sala de recreação diminuíram a sua ansiedade em comparação com aquelas que somente ficaram na sala de espera pelo menos durante 15 minutos. Considerando a relação estabelecida da ansiedade com as condutas negativas no pós-operatório, devemos considerar este meio lúdico como uma forma de qualificar o atendimento hospitalar de pacientes pediátricos que necessitem realizar procedimentos médicos cirúrgicos.

É necessário dar importância às relações estabelecidas entre o paciente e o meio no qual ele está inserido, mesmo que sua permanência seja de apenas poucas horas. Tudo que ocorre nesse período de tempo poderá influenciar a criança positiva ou negativamente, podendo afetar seu desenvolvimento. Para comprovar a eficácia desta forma de trabalho, podem ser realizadas outras pesquisas com objetivos semelhantes em mais hospitais.

Artigo submetido em 23.10.09, aceito em 22.02.10.

Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação deste artigo.

Como citar este artigo: Weber FS. The influence of playful activities on children's anxiety during the preoperative period at the outpatient surgical center. J Pediatr (Rio J). 2010;86(3):209-214.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Jul 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Recebido
      23 Out 2009
    • Aceito
      22 Fev 2010
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