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Notificação imprecisa da ingestão energética na dieta de adolescentes

Resumos

OBJETIVOS: Examinar a prevalência da sub e supernotificação da ingestão energética em adolescentes e seus fatores associados. MÉTODOS: Estudo transversal com 96 adolescentes na pós-puberdade (47 com peso normal e 49 obesos), com idade média de 16,6±1,3 anos. Peso e altura foram medidos e o índice de massa corporal foi calculado. A composição corporal foi avaliada através de absorciometria por raios X de dupla energia. A ingestão de alimentos foi avaliada por meio de um registro alimentar de 3 dias. Realizou-se uma avaliação bioquímica (níveis séricos de colesterol total, LDL, HDL, glicose plasmática e insulina). Os subnotificadores relataram uma ingestão energética < 1,35 x taxa metabólica basal (TMB), enquanto os supernotificadores relataram uma ingestão energética > 2,4 x TMB. RESULTADOS: Notificação imprecisa (sub ou supernotificação) da ingestão energética foi identificada em 65,6% dos adolescentes (64,6 e 1% de sub e supernotificação, respectivamente). Os adolescentes obesos apresentaram 5.0 vezes mais chances de subnotificar a ingestão energética (IC95% 2,0-12,7) do que os participantes com peso normal. Os subnotificadores apresentaram taxas mais altas de ingestão insuficiente de carboidratos (19,3 versus 12,1%, p = 0,046) e de lipídios (11,3 versus 0%, p < 0,001) do que os notificadores plausíveis. A ingestão de colesterol também foi mais baixa entre os subnotificadores (p = 0,017). Não houve diferenças significativas na composição corporal e nos parâmetros bioquímicos em relação à notificação imprecisa. CONCLUSÕES: Os resultados obtidos demonstraram alta porcentagem de notificação imprecisa da ingestão energética entre adolescentes, principalmente entre os obesos, o que sugere que os valores de consumo de nutrientes ajustado para o consumo de energia deveriam ser empregados na análise de risco da relação dieta-doença a fim de contribuir para a redução de erros associados à notificação imprecisa.

Adolescentes; avaliação dietética; ingestão energética; notificação imprecisa; subnotificação


OBJECTIVES: To examine the prevalence of under and overreporting of energy intake in adolescents and their associated factors. METHODS: Cross-sectional study with 96 postpubertal adolescents (47 normal-weight and 49 obese), mean age of 16.6±1.3 years. Weight and height were measured, and body mass index was calculated. Body composition was assessed by dual energy X-ray absorptiometry. Dietary intake was evaluated by a 3-day dietary record. Biochemical assessment was performed (serum total cholesterol, LDL-cholesterol, HDL-cholesterol, plasma glucose, and insulin). Underreporters reported energy intake < 1.35 x basal metabolic rate (BMR), whereas overreporters reported energy intake > 2.4 x BMR. RESULTS: Energy intake misreporting (under or overreporting) was identified in 65.6% of adolescents (64.6 and 1% of under and overreporting, respectively). Obese adolescents were 5.0 times more likely to underreport energy intake (95%CI 2.0-12.7) than normal-weight participants. Underreporters showed higher rates of insufficient intake of carbohydrate (19.3 vs. 12.1%, p = 0.046) and lipids (11.3 vs. 0%, p < 0.001) than plausible reporters. Cholesterol intake was also lower in underreporters (p = 0.017). There were no significant differences in body composition and biochemical parameters in relation to misreporting. CONCLUSIONS: The results obtained demonstrated a high percentage of misreporting of energy intake among adolescents, especially among obese subjects, which suggests that energy-adjusted nutrient intake values should be employed in diet-disease risk analysis in order to contribute to a reduction in errors associated with misreporting.

Adolescents; dietary assessment; energy intake; misreporting; underreporting


ARTIGO ORIGINAL

Notificação imprecisa da ingestão energética na dieta de adolescentes

Luana C. dos SantosI; Mariana N. PascoalII; Mauro FisbergIII; Isa de P. CintraIV; Lígia A. MartiniV

IDoutora, Saúde Pública. Nutricionista. Professora adjunta, Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Saúde Pública, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG

IINutricionista, Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Saúde Pública, UFMG, Belo Horizonte, MG

IIIDoutor, Pediatria. Médico, Professor associado, Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente, Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP

IVDoutora, Nutrição. Nutricionista. Professora adjunta, Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente, UNIFESP, São Paulo, SP

VDoutora, Nutrição. Nutricionista. Professora associada, Departamento de Nutrição, Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP

Correspondência Correspondência: Luana Caroline dos Santos Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Saúde Pública Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais Av. Prof. Alfredo Balena, 190 CEP 30130-100 - Belo Horizonte, MG E-mail: luanacs@enf.ufmg.br

RESUMO

OBJETIVOS: Examinar a prevalência da sub e supernotificação da ingestão energética em adolescentes e seus fatores associados.

MÉTODOS: Estudo transversal com 96 adolescentes na pós-puberdade (47 com peso normal e 49 obesos), com idade média de 16,6±1,3 anos. Peso e altura foram medidos e o índice de massa corporal foi calculado. A composição corporal foi avaliada através de absorciometria por raios X de dupla energia. A ingestão de alimentos foi avaliada por meio de um registro alimentar de 3 dias. Realizou-se uma avaliação bioquímica (níveis séricos de colesterol total, LDL, HDL, glicose plasmática e insulina). Os subnotificadores relataram uma ingestão energética < 1,35 x taxa metabólica basal (TMB), enquanto os supernotificadores relataram uma ingestão energética > 2,4 x TMB.

RESULTADOS: Notificação imprecisa (sub ou supernotificação) da ingestão energética foi identificada em 65,6% dos adolescentes (64,6 e 1% de sub e supernotificação, respectivamente). Os adolescentes obesos apresentaram 5.0 vezes mais chances de subnotificar a ingestão energética (IC95% 2,0-12,7) do que os participantes com peso normal. Os subnotificadores apresentaram taxas mais altas de ingestão insuficiente de carboidratos (19,3 versus 12,1%, p = 0,046) e de lipídios (11,3 versus 0%, p < 0,001) do que os notificadores plausíveis. A ingestão de colesterol também foi mais baixa entre os subnotificadores (p = 0,017). Não houve diferenças significativas na composição corporal e nos parâmetros bioquímicos em relação à notificação imprecisa.

CONCLUSÕES: Os resultados obtidos demonstraram alta porcentagem de notificação imprecisa da ingestão energética entre adolescentes, principalmente entre os obesos, o que sugere que os valores de consumo de nutrientes ajustado para o consumo de energia deveriam ser empregados na análise de risco da relação dieta-doença a fim de contribuir para a redução de erros associados à notificação imprecisa.

Palavras-chave: Adolescentes, avaliação dietética, ingestão energética, notificação imprecisa, subnotificação.

Introdução

A compreensão da relação entre a dieta e os desfechos de saúde exige um autorrelato preciso do consumo de alimentos. Embora a notificação imprecisa ocorra em ambas as direções, a subestimação da ingestão energética é mais prevalente1,2. Sabe-se, com base em estudos de larga escala, que a subnotificação é difundida e está associada ao índice de massa corporal (IMC), ao sexo feminino, à baixa renda, à idade maior e a um maior grau de desejabilidade social2. Entretanto, poucos estudos examinaram questões relacionadas à acurácia das medidas de ingestão alimentar na população adolescente.

A adolescência é um período de transição que geralmente resulta em mudanças dos hábitos alimentares, como um maior consumo de doces e fast food e menor ingestão de frutas e vegetais, como um sinal de independência crescente3,4. Kourlaba et al.5 avaliaram 2.118 adolescentes gregos e observaram que um comportamento alimentar pouco saudável estava associado a um estilo de vida pouco saudável e uma crescente prevalência da obesidade.

A obesidade na adolescência tende a persistir na vida adulta e está associada a um aumento da morbimortalidade em adultos, incluindo diabetes melito tipo 2, doenças cardiovasculares, ortopédicas e respiratórias6. Pearson et al.7, após monitorarem alunos de Copenhagen por quatro anos, identificaram uma potencial estagnação na epidemia de obesidade entre crianças, porém com um aumento contínuo entre os adolescentes.

Os hábitos alimentares dos adolescentes podem contribuir para a notificação imprecisa da ingestão de alimentos durante a avaliação dietética independentemente do método de avaliação utilizado. Os métodos mais comumente usados, incluindo o recordatório de 24 horas, os questionários de frequência alimentar e os diários alimentares, estão todos associados aos desafios de uma avaliação precisa. A magnitude da subnotificação apresenta grande variação entre os estudos1,7-9. Portanto, o objetivo deste estudo foi examinar a prevalência da sub e supernotificação entre adolescentes obesos e de peso normal e seus fatores associados.

Métodos

Conduziu-se um estudo transversal com adolescentes de peso normal e obesos. O tamanho da amostra foi estimado em 80 participantes com base no período de avaliação proposto (três meses) e na capacidade do serviço. Os adolescentes foram definidos como a população-alvo devido a um interesse em estudar a notificação imprecisa nesse estágio da vida e à escassez de estudos semelhantes. Os sujeitos foram recrutados através de agências do serviço comunitário e de anúncios em jornais. Os adolescentes que satisfaziam os critérios de inclusão (sedentário10, pós-púbere de acordo com os estágios de Tanner11, não gestante e saudável) foram convidados a participar, obtendo-se uma amostra de 96 adolescentes.

Medidas antropométricas de altura e massa corporal foram realizadas de acordo com procedimentos padrão12. A composição corporal (massa mineral óssea e tecido mole) foi avaliada através de absorciometria por raios X de dupla energia (DXA), Hologic QDR-4500 (Hologic Inc., Waltham, EUA). A massa de tecido mole foi dividida em massa gorda e massa magra. A massa gorda foi determinada na região do tronco, braços e pernas (ambas consideradas como gordura periférica).

Os adolescentes foram então divididos em dois grupos de acordo com o percentil do IMC para idade13: 47 sujeitos de peso normal (IMC < percentil 85 para idade e gênero) e 49 obesos (IMC > percentil 95). Os grupos eram semelhantes com relação à distribuição por idade e gênero.

Além disso, uma amostra de sangue venoso foi obtida após 12 horas de jejum para medir os níveis de triglicerídeos, colesterol total, de lipoproteína de baixa densidade (LDL-c) e de lipoproteína de alta densidade (HDL-c), glicose plasmática e insulina. Lipídios e triacilgliceróis sanguíneos foram medidos pelo método colorimétrico enzimático; o LDL-c foi calculado pela equação de Friedlander; as concentrações de glicose sérica foram determinadas usando um espectrofotômetro UV-1601PC (Shimadzu Corp., Kyoto, Japão); e os níveis de insulina sérica foram determinados com um kit de radioimunoensaio (Molecular Research Center, Inc., Cincinnati, EUA).

A ingestão de alimentos foi avaliada por meio de um registro alimentar de três dias ao longo de três dias não consecutivos. O método de registro alimentar para a avaliação do consumo de nutrientes foi usado devido à sua alta especificidade para descrever alimentos e métodos de preparação de alimentos14.

Todos os sujeitos foram instruídos a anotar seu consumo diário total de alimentos, em medidas caseiras, descrevendo a quantidade consumida de cada alimento durante três dias não consecutivos. Quando os participantes entregaram seus registros, um dietetista checou os registros e esclareceu as informações com os participantes.

O consumo de nutrientes foi calculado usando o programa NutWin, versão 1.5 (Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP) e a distribuição de macronutrientes foi avaliada com base nos valores propostos para esse estágio da vida9.

Para reconhecer a notificação imprecisa realizou-se uma comparação entre a ingestão energética total e a taxa metabólica basal (TMB) para cada participante15. Os subnotificadores relataram ingestão energética < 1,35 x TMB, enquanto os supernotificadores relataram ingestão energética > 2,4 x TMB1,15. A TMB foi calculada com base nas fórmulas propostas pela FAO/WHO/ONU16 de acordo com a idade, gênero, peso e altura dos adolescentes.

As análises estatísticas foram realizadas usando o programa SPSS, versão 13.0, para Windows (SPSS Inc., Chicago, EUA). Realizou-se o teste de normalidade de Kolmogorov-Smirnov. O teste t de Student foi utilizado para comparar as médias entre os grupos. O teste do qui-quadrado e o teste exato de Fischer foram usados para comparar as proporções. A razão de chances foi utilizada para verificar a probabilidade de subnotificação entre os participantes.

Os resultados foram expressos como média ± desvio padrão para as variáveis contínuas com distribuição normal e como mediana [intervalo de confiança (IC) de 95%] para as outras variáveis. O nível de significância foi estabelecido em p < 0,05.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade de São Paulo (USP) e pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Tanto os pais quanto os adolescentes participantes assinaram um termo de consentimento informado.

Resultados

Um total de 96 adolescentes na pós-puberdade (47 com peso normal e 49 obesos), com idade média de 16,6 (±1,3) anos, participaram do estudo. A média de ingestão energética da amostra foi de 1895,2 (±630,3) kcal/dia, não apresentando diferenças entre os grupos (p = 0,881). A distribuição da porcentagem de macronutrientes também foi semelhante entre os adolescentes obesos e os de peso normal (p > 0,05) (Tabela 1).

Notificação imprecisa da ingestão energética foi identificada em 65,6% dos participantes, com uma frequência significativamente maior entre os adolescentes obesos (Tabela 1). Sub e supernotificação foram observadas em 64,6 e 1% dos adolescentes, respectivamente.

Visto que apenas um adolescente foi classificado como supernotificador, as análises seguintes consideraram apenas a subnotificação como notificação imprecisa, ou seja, o adolescente classificado como supernotificador foi excluído.

Idade (p = 0,182) e gênero não estiveram associados à subnotificação (p = 0,327). Por outro lado, os adolescentes obesos apresentaram 5,0 vezes mais chances de subnotificar a ingestão energética (IC95% 2,0-12,7) do que os participantes com peso normal.

Os subnotificadores apresentaram taxas mais altas de ingestão insuficiente de carboidratos (19,3 versus 12,1%, p = 0,046) e de lipídios (11,3 versus 0%, p < 0,001) do que os notificadores plausíveis. O consumo de proteínas foi estatisticamente semelhante entre os subnotificadores e os notificadores plausíveis (Figura 1). O consumo excessivo de proteínas não foi verificado em nenhum dos grupos.


A ingestão de colesterol foi mais baixa entre os subnotificadores do que entre aqueles que não relataram subnotificação: 174,1 (78,8) mg/dia versus 215,4 (78,5) mg/dia, respectivamente (p = 0,017). A ingestão de gorduras saturadas também foi menor entre os subnotificadores, embora sem apresentar diferença estatisticamente significativa: 9,5 (2,8) mg/dia versus 10,7 (2,9) mg/dia, p = 0,054.

Não houve diferenças significativas na composição corporal e nos parâmetros bioquímicos entre os subnotificadores e os notificadores plausíveis (Tabela 2).

Discussão

Os resultados apresentaram alta frequência de notificação imprecisa entre os adolescentes deste estudo, principalmente entre os obesos. Semelhantemente a outros estudos, a ocorrência de subnotificação foi maior do que a de supernotificação1,7.

A frequência de subnotificadores foi maior do que a observada em estudos com adultos, provavelmente devido à maior participação de indivíduos obesos neste estudo e às diferenças de amostra entre os estudos. Bazanelli et al.1 avaliaram 40 pacientes tratados com diálise peritoneal e verificaram que 52,5% do total de pacientes estudados subnotificaram contra 83,3% no grupo de sobrepeso. Nielsen et al.17 descobriram que, em 309 homens dinamarqueses, com idades entre 40 e 65 anos, 35% subnotificaram.

Os poucos estudos encontrados na literatura sobre a subnotificação da ingestão energética entre adolescentes apresentam resultados variados. Lanctot et al.18 avaliaram 284 meninas, com idades entre 8 e 10 anos, e 54,8% das meninas foram classificadas como subnotificadoras. Da mesma forma, Singh et al.19 identificaram subnotificação de 35±20% entre meninos e meninas com idades entre 12-15 anos e 12-14 anos, respectivamente. Entretanto, Lazarou et al.20 descobriram que 72% de 50 adolescentes brasileiros, com idades entre 11 e 18 anos, subnotificaram. A escassez de dados para esse estágio da vida demonstra a importância da realização de mais estudos com adolescentes.

Encontram-se relatadas na literatura diferenças de subnotificação de acordo com o gênero. Alguns autores identificaram maior prevalência de subnotificação entre mulheres8,9. Contudo, no presente estudo o gênero não esteve associado à subnotificação (p = 0,327). O pequeno número de homens pode ter contribuído para este resultado.

Da mesma forma, a subnotificação não esteve associada à idade (p = 0,182), ao contrário de outros estudos2,9. Em populações de adultos e idosos, ingestão alimentar e estado de saúde comprometidos podem servir como explicações alternativas para a subnotificação21. No presente estudo, a homogeneidade da amostra, apenas com adolescentes na pós-puberdade, com idades entre 13,3 e 19,8 anos, pode explicar essa falta de associação.

Neste estudo, a subnotificação esteve positivamente associada à obesidade, corroborando os achados de Nielsen et al.17. O sobrepeso parece ser um dos fatores mais consistentes para prever a subnotificação da ingestão energética nos estudos de avaliação nutricional, visto que as percepções sobre o peso corporal e o desejo de perder peso influenciam a maneira como os obesos relatam seu consumo de alimentos8,9,22.

Os subnotificadores avaliados neste estudo apresentaram taxas mais baixas de ingestão alimentar de carboidratos (p = 0,046), de gordura total e saturada (p = 0,054) e de colesterol (p = 0,017). Resultados semelhantes foram relatados demonstrando que os subnotificadores possuem hábitos alimentares que se parecem mais com as diretrizes alimentares8,23. Entre estudantes japonesas, a porcentagem de energia oriunda de carboidratos foi significativamente maior, enquanto a energia oriunda de gorduras e proteínas foi significativamente menor entre as subnotificadoras24. Provavelmente essas estudantes estimaram menos energia dos grupos alimentares considerados socialmente indesejáveis (ex.: lanches, doces e frituras) do que as notificadoras plausíveis.

O presente estudo identificou 1% de supernotificação, e existem apenas alguns poucos estudos avaliando a supernotificação da ingestão energética. Biltoft-Jensen et al.25 identificaram valores semelhantes aos encontrados no presente estudo. Além disso, em um estudo com homens dinamarqueses com idades entre 40 e 65 anos, Nielsen et al.17 descobriram que 7% eram supernotificadores. Entre os adultos, Bazelmans et al.8 identificaram que 7,9% dos participantes supernotificaram. Diferenças relacionadas à idade entre as amostras e diferentes pontos de corte para a supernotificação podem explicar esses resultados e fornecer direções para mais estudos.

Este estudo possui certas limitações. Primeiramente, trata-se de um estudo transversal e uma relação temporal não pôde ser estabelecida entre a subnotificação e seus fatores associados. Em segundo lugar, não utilizamos um biomarcador da ingestão energética. Entretanto, a validade da utilização da razão da ingestão energética pela TMB (IE:TMB) para estimar a subnotificação já foi demonstrada em estudos anteriores. Embora nossa amostra não seja representativa da população adolescente brasileira, este é o único estudo nacional avaliando adolescentes na pós-puberdade com diferentes estados nutricionais.

Os resultados obtidos demonstraram alta frequência de notificação imprecisa da ingestão energética entre os adolescentes, principalmente entre os obesos. A subnotificação foi mais prevalente do que a supernotificação, sugerindo que os valores de consumo de nutrientes ajustado para o consumo de energia, de acordo com o modelo de residual dos nutrientes, deveriam ser empregados na análise de risco da relação dieta-doença a fim de contribuir para a redução de erros associados à notificação imprecisa.

Agradecimentos

Os autores gostariam de agradecer à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) o auxílio financeiro à pesquisa.

Artigo submetido em 05.04.2010, aceito em 30.06.2010.

Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação deste artigo.

Como citar este artigo: dos Santos LC, Pascoal MN, Fisberg M, Cintra IP, Martini LA. Misreporting of dietary energy intake in adolescents. J Pediatr (Rio J). 2010;86(5):400-404.

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  • Correspondência:

    Luana Caroline dos Santos
    Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Saúde Pública
    Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais
    Av. Prof. Alfredo Balena, 190
    CEP 30130-100 - Belo Horizonte, MG
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Aceito
      30 Jun 2010
    • Recebido
      05 Abr 2010
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