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Mortalidade por pneumonia até 4 anos de idade

CARTA AO EDITOR

Mortalidade por pneumonia até 4 anos de idade

Silvânia Suely Caribé de Araújo Andrade

Doutoranda, Saúde Pública, Área de Concentração Epidemiologia, Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP. E-mail: silvania.andrade@usp.br

Senhor Editor,

O Jornal de Pediatria publicou um trabalho sobre a análise da tendência temporal da mortalidade por pneumonia em crianças brasileiras com até 4 anos de idade, no período de 1991 a 2007, em todo território nacional e nas cinco regiões1. Esta carta tem o objetivo de apontar questões para discussão sobre o referido artigo. Os autores relataram que o desenho de estudo foi retrospectivo analítico, porém identificamos este trabalho como um estudo ecológico, pois foram comparados dados agregados temporalmente em locais geográficos. Os autores usaram dados secundários provenientes da base de dados disponível no site do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). Não foi realizado cálculo amostral, pois a série temporal é considerada como uma amostra do processo estocástico, já que representa uma de todas as possíveis trajetórias obtidas no gráfico da série histórica2.

A variável dependente foi o coeficiente de mortalidade por pneumonia (número de óbitos por pneumonia/população) multiplicado por 1.000 para menores de 1 ano e por 10.000 para crianças de 1 a 4 anos. Ressaltamos que, para o cálculo de mortalidade de menores de 1 ano, o denominador considerado deve ser o número de nascidos vivos3,4, e os autores erroneamente calcularam utilizando a população dessa faixa etária como denominador. Para verificar a redução da tendência, os autores calcularam a redução relativa do coeficiente de mortalidade por pneumonia (o coeficiente de mortalidade em 2007, menos o coeficiente de mortalidade em 1991, dividido pelo coeficiente de mortalidade em 1991, multiplicado por 100). Para análise estatística, foi feita regressão linear simples; o coeficiente de regressão representou a mudança média anual do coeficiente de mortalidade por pneumonia, porém não identificamos no texto que outros modelos de ordem maior foram testados, mesmo que possamos identificar nos gráficos momentos em que a série poderia ser dividida e usada uma função de segunda ordem.

Não há relato no texto sobre construção de diagrama de dispersão entre os coeficientes e o tempo para verificar o tipo de relação entre essas variáveis. Os autores não citaram nenhum dos dois métodos para análise de tendência: ajuste de uma função polinomial do tempo (modelos de regressão polinomial) e análise do comportamento da série ao redor de um ponto, estimando a tendência naquele (modelos autorregressivos)2. Acreditamos que os autores fizeram a análise de tendência usando o ajuste da função polinomial, pois utilizaram todo o período da série.

Foi comparada a redução dos coeficientes entre o país e as cinco regiões, e esta foi maior no Sul e no Sudeste. Essas regiões apresentaram os maiores coeficientes no início do período; todavia, salientamos que os autores não discutiram a qualidade dos registros de dados de mortalidade entre as regiões4.

Não foram apresentadas as equações dos modelos (ou o β0) nem o coeficiente de determinação (r2), o que poderia favorecer o entendimento sobre a capacidade explicativa dos modelos testados2,5. Apesar de apresentar os intervalos de confiança dos β1, os autores não discutem a significância dos modelos no texto. O β0 forneceria os coeficientes anuais médios de cada região e do país.

Enfim, os autores também não citaram remoção do ruído branco (suavização da série). A vantagem de fazer a série histórica com ano centralizado permitiria comparações entre os locais. Não há relato sobre centralização da variável período (período centralizado evitaria correlação serial - colinearidade - entre os termos da regressão: remoção da sazonalidade).

Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação desta carta.

Resposta dos autores

Linjie Zhang

Doutor, Medicina. Professor associado, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande, Rio Grande, RS. E-mail: zhanglinjie63@yahoo.com.br

Agradecemos à leitora pelo interesse e comentários sobre nosso trabalho. Apresentamos, a seguir, as respostas dos principais pontos levantados na carta ao editor:

1. Desenho de estudo: estamos de acordo com a recomendação da leitora sobre o desenho de estudo, isto é, este trabalho deve ser classificado como estudo ecológico, de séries temporais, baseado em dados secundários1.

2. Cálculo do coeficiente de mortalidade por pneumonia: estamos conscientes de que, para o cálculo do coeficiente de mortalidade infantil, o denominador deve ser o número de nascidos vivos2. Porém, a variável dependente deste trabalho foi o coeficiente de mortalidade por pneumonia em crianças de até 4 anos de idade, as quais foram divididas em duas faixas etárias: < 1 ano e 1-4 anos. A utilização do mesmo tipo de denominador - a população - para o cálculo do coeficiente de mortalidade facilita a comparação entre dois grupos etários. Por outro lado, o tipo de denominador para o cálculo do coeficiente de mortalidade por pneumonia em crianças menores de 1 ano não deveria afetar significativamente os resultados de tendência temporal, pois a população foi utilizada como denominador em todo o período estudado.

3. Método de análise estatística: consultamos dois epidemiologistas, e ambos consideraram que o teste de regressão linear simples foi adequado para análise de tendência temporal dos coeficientes de mortalidade por pneumonia. A qualidade de ajuste dos modelos também foi demonstrada pelo coeficiente de determinação (r2) e significância dos modelos (Tabela 1).

Acrescentamos as seguintes informações sobre os procedimentos de análise estatística deste trabalho: procedeu-se à modelagem, considerando os coeficientes de mortalidade por pneumonia como variáveis dependentes (Y) e os anos calendários como variáveis independentes (X); optou-se por utilizar a variável de forma centralizada (X-1999) para evitar a autocorrelação entre os termos da equação3,4; o modelo estimado foi Y = β0 + β1 (X-1999), onde Y = coeficiente de mortalidade por pneumonia, β0 = coeficiente médio no período, β1 = mudança média anual do coeficiente e X = ano calendário.

Não foram declarados conflitos de interesse associados à publicação desta carta.

Referências (Carta ao editor)

1. Rodrigues FE, Tatto RB, Vauchinski L, Leães LM, Rodrigues MM, Rodrigues VB, et al. Pneumonia mortality in Brazilian children aged 4 years and younger. J Pediatr (Rio J). 2011;87:111-4.

2. Latorre MR, Cardoso MR. Análise de séries temporais em epidemiologia: uma introdução sobre os aspectos metodológicos. Rev Bras Epidemiol. 2001;4:145-52.

3. Pereira MG. Epidemiologia: teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008.

4. Costa M da C, Mota EL, Paim JS, da Silva LM, Teixeira M da G, Mendes CM. Mortalidade infantil no Brasil em períodos recentes de crise econômica. Rev Saude Publica. 2003;37:699-706.

5. Box GE, Jenkins GM. Times series analysis: forecasting and control. 2nd ed. San Francisco: Holden-Day; 1976.

  • 1. Lima-Costa MF, Barreto SM. Tipo de estudos epidemiológicos: conceitos básicos e aplicaçőes na área de envelhecimento. Epidemiol Serv Saude. 2003;12:189-201.
  • 2. Bonita R, Beaglehole R, Kjellström T. Epidemiologia básica. 2Ş ed. Săo Paulo: Santos; 2010. 213p.
  • 3. Morgenstern H. Ecologic studies. In: Rothman KJ, Greenland S, eds. Modern epidemiology. 2nd ed. Philadelphia: Lippincott-Raven Publishers; 1998. p. 459-80.
  • 4. Francisco PM, Donalisio MR, Lattorre M do R. Tendęncia da mortalidade por doenças respiratórias em idosos do Estado de Săo Paulo, 1980 a 1998.  Rev Saude Publica. 2003;37:191-6.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Fev 2012
  • Data do Fascículo
    Dez 2011
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