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Caracterização de um grupo de pacientes não relacionados com artrogripose múltipla congênita

RESUMO

OBJETIVO:

A artrogripose múltipla congênita é uma síndrome neuromuscular relativamente rara, com prevalência de 1:3000-5000 recém-nascidos. É por isso que, neste estudo, descrevemos as características clínicas de um grupo de 50 casos de pacientes mexicanos não relacionados com artrogripose múltipla congênita.

MÉTODOS:

Os pacientes foram diagnosticados por exame físico e radiográfico e o histórico familiar foi avaliado.

RESULTADOS:

Descrevemos 50 pacientes não relacionados com artrogripose múltipla congênita. Nove deles apresentaram outras características (pectus excavatum, fissura palatina, retardo mental, agenesia da ulna etc.). Foram analisados os fatores ambientais, pré-natais e o histórico familiar. Relatamos as anomalias cromossômicas e as entidades clínicas associadas com a artrogripose múltipla congênita. Não havia aberração cromossômica nos casos com retardo mental. Também encontramos três casos familiares não relacionados com artrogripose múltipla congênita, em que são possíveis padrões de herança autossômica recessiva, autossômica dominante e ligada ao cromossomo X. Também analisamos a preocupação da literatura com a artrogripose múltipla congênita.

CONCLUSÕES:

Reiteramos a ideia de que é importante estabelecer programas de fisioterapia e reabilitação específicos para os pacientes. É necessária uma abordagem multidisciplinar com cuidado médico, cirúrgico, de reabilitação, social e psicológico, incluindo aconselhamento genético.

Palavras-chave:
Contratura; Artrogripose; Amioplasia congênita

ABSTRACT

OBJECTIVE:

Arthrogryposis multiplex congenita is a relatively rare neuromuscular syndrome, with a prevalence of 1:3000-5000 newborns. In this study, the authors describe the clinical features of a group of 50 unrelated Mexican patients with arthrogryposis multiplex congenita.

METHODS:

Patients were diagnosed by physical and radiographic examination and the family history was evaluated.

RESULTS:

Of the 50 cases, nine presented other features (pectum excavatum, cleft palate, mental retardation, ulnar agenesis, etc.). Environmental factors, as well as prenatal and family history, were analyzed. The chromosomal anomalies and clinical entities associated with arthrogryposis multiplex congenita were reported. No chromosomal aberrations were present in the cases with mental retardation. Three unrelated familial cases with arthrogryposis multiplex congenita were observed in which autosomal recessive, autosomal dominant and X-linked inheritance patterns are possible. A literature review regarding arthrogryposis multiplex congenita was also conducted.

CONCLUSIONS:

It is important to establish patient-specific physical therapy and rehabilitation programs. A multidisciplinary approach is necessary, with medical, surgical, rehabilitation, social and psychological care, including genetic counseling.

Keywords:
Contracture; Arthrogryposis; Amyoplasia congenita

Introdução

O termo artrogripose deriva das palavras gregas "arthron" e "gryposis" e significa "articulações encurvadas". Vários sinônimos foram usados para descrever essa característica clínica: rigidez articular congênita múltipla, amioplasia congênita, miodistrofia fetal deformante, artromiodisplasia congênita, contraturas congênitas múltiplas e artrogripose múltipla congênita (AMC).11. Hall JG. Arthrogryposis (multiple congenital contractures): diagnostic approach to etiology, classification, genetics, and general principles. Eur J Med Genet. 2014;57:464-72.and22. Stilli S, Antonioli D, Lampasi M, Donzelli O. Management of hip contractures and dislocations in arthrogryposis. Musculoskelet Surg. 2012;96:17-21. A AMC refere-se a um grande grupo heterogêneo de doenças, caracterizado por músculos contraídos e pela limitação congênita não progressiva do movimento de duas ou mais articulações diferentes com grossas cápsulas periarticulares. A AMC é relativamente rara, ocorre em aproximadamente 1:3000-5000 recém-nascidos e meninos e meninas são igualmente afetados. Todas as quatro extremidades estão envolvidas em 50-60% dos casos, os membros inferiores em 30-40% e os membros superiores em 10-15%. Em 20% dos casos ocorre a luxação e subluxação dos quadris, das patelas e dos joelhos, ao passo que as articulações vertebrais e temporomandibulares raramente estão envolvidas.33. Bevan WP, Hall JG, Bamshad M, Staheli LT, Jaffe KM, Song K. Arthrogryposis multiplex congenita (amyoplasia): an orthopaedic perspective. J Pediatr Orthop. 2007;27:594-600.and44. Hodgson P, Weinberg S, Consky C. Arthrogryposis multiplex con- genita of the temporomandibular joint. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 1988;65:289-91. O tipo mais comum de artrogripose é a amioplasia, que representa um terço de todos os casos. A amioplasia é caracterizada pelo posicionamento simétrico dos membros com pé torto equinovaro grave e cotovelos estendidos. Uma característica que normalmente poderá ocorrer é um hemangioma facial médio característico. Alguns pacientes também podem apresentar anomalias estruturais ou genitais, os ombros são curvados e voltados para dentro e os antebraços são pronados com deformidades de flexão de punhos e dedos. Além do pé torto equinovaro, o envolvimento dos membros inferiores inclui frequentemente joelhos flexionados ou estendidos; os quadris poderão estar flexionados e voltados para fora ou estendidos e subluxados ou luxados.33. Bevan WP, Hall JG, Bamshad M, Staheli LT, Jaffe KM, Song K. Arthrogryposis multiplex congenita (amyoplasia): an orthopaedic perspective. J Pediatr Orthop. 2007;27:594-600.,55. Hall JG, Reed SD, Driscoll EP, Part I. Amyoplasia: a common, sporadic condition with congenital contractures. Am J Med Genet. 1983;15:571-90.and66. Sarwark JF, MacEwen GD, Scott CI Jr. Amyoplasia (a common form of arthrogryposis). J Bone Joint Surg Am. 1990;72:465-9.

A AMC pode estar presente em mais de 150 doenças específicas e essas doenças incluem um grande grupo de doenças miopáticas e neurogênicas, anomalias no tecido conjuntivo e fatores que produzem uma limitação intrauterina do movimento fetal (anomalias estruturais do útero, síndrome da banda amniótica, entrelaçamento, oligodrâmnio ou polidrâmnio).77. Swinyard CA, Bleck EE. The etiology of arthrogryposis (multiple congenital contracture). Clin Orthop Relat Res. 1985;194:15-29.and88. Børlum KG. Amniotic band syndrome in second trimester associated with fetal malformations. Prenat Diagn. 1984;4:311-4. Em modelos animais, as contraturas foram induzidas por vírus, bloqueadores neuromusculares, inseticidas, anticonvulsivantes, agentes bloqueadores neuromusculares, etanol, imobilização dos membros e hipertermia.88. Børlum KG. Amniotic band syndrome in second trimester associated with fetal malformations. Prenat Diagn. 1984;4:311-4.,99. Del Torto U, Bianchi O, Pone G, Santé G. Experimental study on the etiology of congenital multiple arthrogryposis. Ital J Orthop Traumatol. 1983;9:91-9.,1010. Hall JG, Reed SD. Teratogens associated with congeni- tal contractures in humans and in animals. Teratology. 1982;25:173-91.,1111. Hall JG, Reed SD, Greene G. The distal arthrogryposes: delineation of new entities - review and nosologic discussion. Am J Med Genet. 1982;11:185-239.,1212. Hall JG, Reed SD, Scott CI, Rogers JG, Jones KL, Camarano A. Three distinct types of X-linked arthrogryposis seen in 6 families. Clin Genet. 1982;21:81-97.,1313. Hall JG. In utero movement and use of limbs are necessary for normal growth: a study of individuals with arthrogryposis. Prog Clin Biol Res. 1985;200:155-62.and1414. Hall JG. Genetic aspects of arthrogryposis. Clin Orthop Relat Res. 1985;194:44-53. Esses fatores parecem interferir no desenvolvimento dos membros, resultam na perda de massa muscular com o desequilíbrio da força muscular nas articulações. A etiologia da artrogripose inclui tanto fatores genéticos quanto ambientais; entre as causas genéticas foram relatados defeitos em um único gene e cromossomopatias. A análise molecular revelou que um determinado fenótipo pode ser causado por mutações em diferentes genes, o que comprova a heterogeneidade genética dessa doença.33. Bevan WP, Hall JG, Bamshad M, Staheli LT, Jaffe KM, Song K. Arthrogryposis multiplex congenita (amyoplasia): an orthopaedic perspective. J Pediatr Orthop. 2007;27:594-600.

O objetivo deste estudo é descrever as características clínicas de 50 casos de AMC e incluir uma breve análise da literatura a respeito desse assunto.

Paciente e métodos

Foi feito um estudo prospectivo e transversal que incluiu uma série de 50 pacientes com AMC. Esses pacientes foram encaminhados ao Departamento de Genética do Instituto Nacional de Reabilitação (Cidade do México, México) com diagnóstico presumível de AMC durante um período de três anos. Todos eram descendentes de mexicanos. Os pacientes e seus pais foram informados sobre as características do estudo e concordaram em participar.

O protocolo foi aprovado pelos comitês de pesquisa e ética do Instituto. O diagnóstico de AMC teve como base características clínicas típicas, como contraturas articulares não progressivas que limitam movimentos de extensão ou de flexão evidentes no nascimento e envolvem mais de uma articulação, tanto dos membros superiores quanto dos inferiores ou de ambos. Em todos os casos, os pacientes foram submetidos a exame físico e radiográfico. Avaliamos o histórico familiar médico e as características do parto durante a consulta médica no Departamento de Genética. A avaliação de histórico de gravidez das mães dos pacientes incluiu a posição do feto no útero, infecções, febre, substâncias ilegais, medicamentos e acontecimentos incomuns durante a gravidez. A análise do cariótipo foi feita a partir dos leucócitos do sangue periférico com o uso da coloração banda G segundo técnicas padrão: resumidamente, o sangue periférico coletado por punção venosa, com o uso de uma seringa heparinizada, foi cultivado na presença de fito-hemaglutinina. Após 72 horas, o crescimento das células foi interrompido ao se acrescentar demecolcina e as culturas de células foram colhidas e tratadas com solução hipotônica e fixadora. As amostras foram colocadas em lâminas de vidro para coloração.1515. Babu A, Verma RS. Anatomy of human genome by restriction endonucleases Alul, Ddel, Haelll, Hinfl, Mobol and Rsal, and their application in clinical cytogenetics. Cytobios. 1990;62:7-19. Foram analisadas 25 metáfases no microscópio de luz em cada caso.

Resultados

No presente estudo, 28 (56%) dos pacientes eram do sexo feminino e 22 (44%) do masculino e ambos os sexos foram afetados. Apresentaram afecção das quatro extremidades 27 (54%) pacientes e tanto os membros inferiores quanto os superiores foram afetados em 18 (36%) e cinco (10%) casos, respectivamente. A distribuição de envolvimento dos membros é apresentada na figura 1A. O comprometimento articular pode apresentar uma grande variabilidade em um mesmo paciente: ao mesmo tempo em que uma articulação pode estar completamente estendida, a articulação contralateral pode estar flexionada. A figura 1B retrata o envolvimento clínico de membros superiores: a pronossupinação do antebraço foi comprometida bilateralmente, os pulsos e articulações interfalangeanas estavam fixados em posição semiflexionada e não apareceu linha de flexão. A figura 1Cexemplifica o envolvimento dos membros inferiores: os joelhos direito e esquerdo foram fixados em posição semiflexionada e estendida, respectivamente, o tornozelo direito foi estendido e o tornozelo esquerdo em adução e a paciente não conseguia mover seus tornozelos. A idade média de apresentação na clínica foi de 4,6 anos (faixa etária de recém-nascido a sete anos). Com relação ao envolvimento de outras articulações, observou-se luxação e subluxação dos quadris em 14 casos (28%) e hipermobilidade articular com hiperflexão em dois casos. Uma grande variedade de anomalias congênitas (ortopédicas ou não ortopédicas) foi relatada como associada a AMC; em nossos pacientes, outras características clínicas eventuais também foram observadas em nove de 50 casos (tabela 1). Em nossa série, havia doença materna em 10 casos: um caso com diabetes mellitus, cinco casos apresentaram infecção do trato urinário e febre (acima de 39 °C) no primeiro e segundo trimestre de gravidez, quatro casos apresentaram eclâmpsia e seis tiveram sangramento vaginal durante a gravidez no primeiro trimestre. O histórico dos partos em nossos pacientes mostrou que a posição do feto no parto foi cefálica em 25 casos, pélvica em 16, transversal em sete casos e outra posição em dois. Também foram observados um parto múltiplo (gêmeos dizigóticos) e um caso com anomalias no útero.

Figura 1
Características gerais dos pacientes com artrogripose múltipla congênita estudados. A) Percentual de envolvimento dos membros. B) Membros superiores de um paciente afetado: os movimentos de pronossupinação do antebraço não eram possíveis, os pulsos e as articulações interfalangeanas estavam fixados em posição semiflexionada e não apareceu linha de flexão. C) Membros inferiores de um paciente com AMC: os joelhos direito e esquerdo foram fixados em posição semiflexionada e estendida, respectivamente, o tornozelo direito foi estendido e o tornozelo esquerdo em adução.

Tabela 1
Anomalias congênitas associadas a artrogripose múltipla congênita em nossos pacientes

A tabela 2 inclui uma breve análise da literatura sobre diferentes variantes descritas de artrogripose múltipla congênita e distal. Em nossa série, há dois casos não familiares e não relacionados em que se observou consanguinidade. Além disso, também foram observados três casos familiares sem comprovação de consanguinidade (fig. 2).

Tabela 2
Algumas variantes descritas na classificação da artrogripose múltipla congênita e distal

Figura 2
Genealogia dos três casos familiares (A, B, C) com o mesmo tipo de artrogripose múltipla congênita. As setas indicam os pacientes estudados. Os quadrados representam o sexo masculino e os círculos, o sexo feminino; os quadrados/círculos pretos representam os indivíduos afetados.

Discussão

Na AMC, uma contratura é a limitação de mobilidade em uma articulação específica; a AMC não representa um problema intrínseco da articulação durante o desenvolvimento fetal porque a organização das articulações parece normal. É a falta de mobilidade articular durante o crescimento fetal que está associada ao desenvolvimento de tecido conjuntivo extra ao redor das articulações. Essas deformidades normalmente são simétricas, não progressivas e envolvem mais de uma área do corpo.33. Bevan WP, Hall JG, Bamshad M, Staheli LT, Jaffe KM, Song K. Arthrogryposis multiplex congenita (amyoplasia): an orthopaedic perspective. J Pediatr Orthop. 2007;27:594-600. A AMC é muito evidente no nascimento e o diagnóstico é possível no pré-natal com ultrassom em tempo real.1616. Bendon R, Dignan P, Siddiqi T. Prenatal diagnosis of arthrogryposis multiplex congenita. J Pediatr. 1987;111:942-7.and1717. Bui TH, Lindholm H, Demir N, Thomassen P. Prenatal diagnosis of distal arthrogryposis type I by ultrasonography. Prenat Diagn. 1992;12:1047-53.

Na AMC, os quatro membros estão envolvidos em 50-60% dos casos, os membros inferiores em 30-40% e em 10-15% as contraturas são limitadas aos membros superiores.77. Swinyard CA, Bleck EE. The etiology of arthrogryposis (multiple congenital contracture). Clin Orthop Relat Res. 1985;194:15-29. Em nossos casos, 54% mostraram envolvimento de todas as extremidades, 36%, dos membros inferiores, ao passo que os membros superiores estavam envolvidos em 10% e não foi observada diferença entre meninos e meninas. Esses dados são compatíveis com aqueles relatados na literatura internacional (fig. 1).33. Bevan WP, Hall JG, Bamshad M, Staheli LT, Jaffe KM, Song K. Arthrogryposis multiplex congenita (amyoplasia): an orthopaedic perspective. J Pediatr Orthop. 2007;27:594-600.,77. Swinyard CA, Bleck EE. The etiology of arthrogryposis (multiple congenital contracture). Clin Orthop Relat Res. 1985;194:15-29.,1313. Hall JG. In utero movement and use of limbs are necessary for normal growth: a study of individuals with arthrogryposis. Prog Clin Biol Res. 1985;200:155-62.,1414. Hall JG. Genetic aspects of arthrogryposis. Clin Orthop Relat Res. 1985;194:44-53.and1818. Robin NH, Franklin J, Prucka S, Ryan AB, Grant JH. Clefting amniotic bands, and polydactyly: a distinct phenotype that sup- ports an intrinsic mechanism for amniotic band sequence. Am J Med Genet A. 2005;137A:298-301.

Pelo menos 150 entidades clínicas específicas foram descritas com AMC. É evidente que múltiplos fatores etiológicos convergem para uma resposta comum, o que resulta em perda do movimento das articulações. A AMC também é conhecida por ocorrer como componente de um grande grupo de disfunções heterogêneas miopáticas, neurogênicas, vasculares e de outras anomalias, como displasia esquelética.33. Bevan WP, Hall JG, Bamshad M, Staheli LT, Jaffe KM, Song K. Arthrogryposis multiplex congenita (amyoplasia): an orthopaedic perspective. J Pediatr Orthop. 2007;27:594-600.and77. Swinyard CA, Bleck EE. The etiology of arthrogryposis (multiple congenital contracture). Clin Orthop Relat Res. 1985;194:15-29. A tabela 2 descreve um resumo atualizado das diferentes variantes descritas na classificação da artrogripose múltipla congênita e distal. O tecido conjuntivo anormal, especificamente o colágeno, pode interferir no desenvolvimento normal do osso, da cartilagem e dos tendões, pode resultar em contraturas da articulação e fibrose. Nesta série, observamos um paciente com síndrome de Ehlers-Danlos tipo 3 e um com osteogênese imperfeita tipo I (pacientes 4 e 9, tabela 1).

O histórico de pré-natal é muito importante no estudo da AMC; nesta série, foram observadas doenças maternais, como diabetes mellitus, infecção do trato urinário com febre e eclâmpsia. Houve também um evento de sangramento vaginal durante o primeiro trimestre de gravidez. A identificação desses fatores ambientais e não genéticos eventuais é importante para estabelecer tipos específicos de AMC. Nesses casos, existe a possibilidade de fatores ambientais terem contribuído para a etiologia da AMC.

Foi descrito que posições anormais do feto, gestação múltipla e anomalias estruturais do útero podem gerar limitação de movimentos nas articulações e, consequentemente, promover a AMC. Metade de nossos pacientes teve apresentação cefálica, ao passo que a outra metade teve uma das apresentações de risco consideradas (pélvica, transversal ou outra posição). Também observamos um nascimento múltiplo e um caso com anomalias no útero que também são consideradas fatores de risco.

Os modos específicos de herança da artrogripose são descritos com relação a formas específicas de contraturas. Às vezes a AMC é causada por um defeito em um único gene; nesses casos, é possível ter herança autossômica dominante, autossômica recessiva e ligada ao cromossomo X. No momento, foram relatados diversos loci relacionados a diferentes tipos de artrogripose, por exemplo: aracnodactilia contratural (5q23-31), displasia diastrófica (5q31), atrofia muscular espinhal letal (5q13.3), artrogripose distal tipo I (9q21.2), sinfalangismo (9q), artrogripose letal ligada ao cromossomo X (Xp11.3-q11.2) e oftalmoplegia (12p11.2-q12) ( tabela 2). 1010. Hall JG, Reed SD. Teratogens associated with congeni- tal contractures in humans and in animals. Teratology. 1982;25:173-91.,1111. Hall JG, Reed SD, Greene G. The distal arthrogryposes: delineation of new entities - review and nosologic discussion. Am J Med Genet. 1982;11:185-239.,1212. Hall JG, Reed SD, Scott CI, Rogers JG, Jones KL, Camarano A. Three distinct types of X-linked arthrogryposis seen in 6 families. Clin Genet. 1982;21:81-97.,1313. Hall JG. In utero movement and use of limbs are necessary for normal growth: a study of individuals with arthrogryposis. Prog Clin Biol Res. 1985;200:155-62.,1919. Lai MM, Tettenborn MA, Hall JG, Smith LJ, Berry AC. A new form of autosomal dominant arthrogryposis. J Med Genet. 1991;28:701-3.,2020. McCormack MK, Coppola-McCormack PJ, Lee ML. Autosomal- dominant inheritance of distal arthrogryposis. Am J Med Genet. 1980;6:163-9.,2121. Pagnan NA, Gollop TR. Distal arthrogryposis type II D in three generations of a Brazilian family. Am J Med Genet. 1987;26:613-9.,2222. Rivera MR, Avila CA, Kofman-Alfaro S. Distal arthrogryposis type IIB: probable autosomal recessive inheritance. Clin Genet. 1999;56:95-7.,2323. Emy Dorfman L, Leite JC, Giugliani R, Riegel M. Microarray- based comparative genomic hybridization analysis in neonates with congenital anomalies: detection of chromosomal imbal- ances. J Pediatr (Rio J). 2015;91:59-67.and2424. Genini S, Malek M, Spilar S, Nguyen TT, Ménétrey F, Gebert S, et al. Arthrogryposis multiplex congenita (AMC), a hereditary disease in swine, maps to chromosome 5 by linkage analysis. Mamm Genome. 2004;15:935-41. Existem até alguns relatos de que um paciente com AMC tem uma duplicação de um cromossomo e a deleção de outro cromossomo.2323. Emy Dorfman L, Leite JC, Giugliani R, Riegel M. Microarray- based comparative genomic hybridization analysis in neonates with congenital anomalies: detection of chromosomal imbal- ances. J Pediatr (Rio J). 2015;91:59-67.

A análise familiar é uma parte importante da avaliação de uma criança com AMC; ela é necessária para sugerir o modo de herança e fornecer o risco de recidiva para os pais. Figura 2A: Família com três irmãos afetados (mãos e pés), apesar de não haver dados de consanguinidade, o traço mais provável é de transmissão autossômica recessiva e o mosaicismo germinal é outra possibilidade que não pode ser descartada. Figura 2B: Família com dois irmãos afetados (mãos e pés), traços de herança autossômica recessiva ou ligada ao cromossomo X como modo de transmissão mais provável e mosaicismo germinal também deve ser considerado. Figura 2C: Família com três membros afetados em três gerações (mãos e pés afetados). Essa genealogia sugere fortemente uma herança autossômica dominante. O fato de o paciente II-1 não ser afetado pode ser explicado em virtude da penetrância incompleta.

A AMC também pode ser causada por aberrações cromossômicas numéricas ou estruturais. Essas anomalias são particularmente frequentes em casos de AMC associada a retardo mental. A maioria dessas anomalias cromossômicas está presente como novos eventos; isso significa que o risco de recidiva em parentes é muito baixo.2525. Reed SD, Hall JG, Riccardi VM, Aylsworth A, Timmons C. Chro- mosomal abnormalities associated with congenital contractures (arthrogryposis). Clin Genet. 1985;27:353-72.and2626. Serville F, Dufau-Casanabe J, Fontan D. Arthrogryposisand 46,XY,t(1;16) chromosome constitution. Clin Genet.1986;29:453-5. Neste estudo, as anomalias cromossômicas estiveram presentes em dois de 50 casos, um com 47,XY,+21 e outro com 47,XXY. Contudo, essas anomalias cromossômicas não estão associadas à AMC. Nenhum dos dois pacientes com retardo mental nesta série (2 e 8) apresentou anomalias cromossômicas, conforme mostrado pela análise do cariótipo feita em leucócitos do sangue periférico. Contudo, não podemos descartar completamente a possibilidade de um mosaicismo cromossômico de pequena proporção, pois nenhum outro tecido, como a pele (fibroblastos), foi usado na análise do cariótipo.2525. Reed SD, Hall JG, Riccardi VM, Aylsworth A, Timmons C. Chro- mosomal abnormalities associated with congenital contractures (arthrogryposis). Clin Genet. 1985;27:353-72. Estudos cromossômicos em pacientes com AMC e retardo mental ou doenças multissistêmicas são muito importantes para o reconhecimento de síndromes clínicas com implicações cromossômicas.

O diagnóstico pós-natal de AMC exige uma compilação de prontuários médicos, histórico familiar (ou seja, outros parentes afetados, hiperextensibilidade, hipotonia e outros sinais relacionados à doença), dados laboratoriais (enzimas séricas), análise radiográfica e estudos eletrofisiológicos e patológicos (incluindo biópsia muscular e do nervo). Para os casos considerados eventuais, em que nenhum histórico de saúde relevante é encontrado e nenhuma herança mendeliana padrão pode ser observada, o risco empírico de recidiva é de cerca de 3-5%. O tratamento adequado na AMC deve ser multidisciplinar, com a participação de um pediatra especialista em ortopedia, um fisioterapeuta, um geneticista, um neurologista, dentre outros. O objetivo principal do tratamento é melhorar a função dos membros afetados. O manejo de complicações possivelmente evitáveis (luxação das articulações, osteoartrite e escoliose) é fundamental para garantir a qualidade de vida dos pacientes. Por outro lado, os programas de reabilitação facilitam e promovem a função independente nas atividades diárias. E por fim, conforme exposto acima, essa doença envolve fatores genéticos e ambientais. Portanto, o aconselhamento genético deve ser levado em consideração caso a família planeje ter outro filho.2727. Hahn G. Arthrogryposis. Pediatric review and habilitative aspects. Clin Orthop Relat Res. 1985;194:104-14.and2828. Williams PF. Management of upper limb problems in arthrogryposis. Clin Orthop Relat Res. 1985;194:60-7.

Neste trabalho, a classificação da AMC foi atualizada de acordo com a literatura. Descobrimos que existem apenas alguns relatos sobre AMC na população mexicana: em 1976, um relatório descreveu 83 casos,2929. Gilberto Soriano J, Ruiz-Figueroa F. Multiple congenital arthro- gryposis as a cause of learning and communicating problems. Bol Med Hosp Infant Mex. 1976;33:179-88. depois 46 em 19913030. Gallegos-Rivera M, Carnevale A, Valdés H, del Castillo V. Con- genital multiple arthrogryposis. Clinical and genetic study. Bol Med Hosp Infant Mex. 1991;48:88-95. e um manuscrito relacionado a artrogripose distal tipo IIB em 1999.2222. Rivera MR, Avila CA, Kofman-Alfaro S. Distal arthrogryposis type IIB: probable autosomal recessive inheritance. Clin Genet. 1999;56:95-7. Neste estudo, incluímos 50 novos casos com grau variado de gravidade, alguns deles associados a outros problemas médicos, o que resultou em graves limitações nesses pacientes. Portanto, é importante estabelecer programas de fisioterapia e reabilitação específicos para os pacientes de acordo com as características específicas e a evolução de cada caso. Como em estudos anteriores, reiteramos que é necessária uma abordagem multidisciplinar com cuidado médico, cirúrgico, de reabilitação, social e psicológico, incluindo aconselhamento genético, para atingir uma gestão bem-sucedida desses pacientes.

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    ☆Como citar este artigo: Valdés-Flores M, Casas-Avila L, Hernández-Zamora E, Kofman S, Hidalgo-Bravo A. Characterization of a group unrelated patients with arthrogryposis multiplex congenita. J Pediatr (Rio J). 2016;92:58-64.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2016

Histórico

  • Recebido
    19 Jan 2015
  • Aceito
    13 Abr 2015
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