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Resposta do autor: "Autismo em 2016: descoberta adicional" Como citar este artigo: Posar A, Visconti P. Authors' reply: "Autism in 2016: additional discovery". J Pediatr (Rio J). 2017;93:309-10.

Fluegge, em sua carta,11 Fluegge K. Autism in 2016: additional discovery. J Pediatr (Rio J). 2017;93:308-9. comentou sobre nossa revisão a respeito da etiopatogenia do transtorno do espectro do autismo (TEA) e destacou o possível papel de um gás poluente atmosférico e de efeito estufa, o óxido nitroso (N2O), bem conhecido como gás do riso, usado em cirurgia por suas propriedades analgésicas e anestésicas.22 Cohen BI. Ammonia (NH3), nitric oxide (NO) and nitrous oxide (N2O) – the connection with infantile autism. Autism. 2006;10:221-3. Em 2006, Cohen considerou a hipótese de envolvimento do N2O na etiopatogenia do TEA, observou que quantidades elevadas de N2O no sangue podem explicar o riso incontrolado e o alto limiar de dor detectado em alguns indivíduos com TEA.22 Cohen BI. Ammonia (NH3), nitric oxide (NO) and nitrous oxide (N2O) – the connection with infantile autism. Autism. 2006;10:221-3. Por alguns anos, essa hipótese passou despercebida, apesar de muitos estudos terem sido feitos, principalmente nos Estados Unidos da América (EUA), para investigar a possível associação entre vários poluentes atmosféricos e um aumento no risco de TEA. Os dados desses estudos sugerem o envolvimento da exposição precoce a vários poluentes atmosféricos (inclusive ozônio, óxido nítrico, dióxido de nitrogênio, monóxido de carbono, dióxido de enxofre, particulado de diesel, alguns metais pesados, solventes aromáticos) na etiopatogenia do TEA. Recentemente, Fluegge mencionou, por várias vezes, a teoria de que a exposição precoce ao N2O pode aumentar o risco de distúrbios do desenvolvimento neurológico, inclusive os TEAs, e, em uma revisão, ele descreveu em detalhes vários possíveis mecanismos etiopatogênicos por meio dos quais o N2O pode levar a distúrbios do desenvolvimento neurológico, inclusive desregulação dopaminérgica; antagonismo do receptor N-metil-D-aspartato (NMDA); ativação do receptor kappa-opioide; e inibição colinérgica dos receptores α7.33 Fluegge K. Does environmental exposure to the greenhouse gas, N2O, contribute to etiological factors in neurodevelopmental disorders? A mini-review of the evidence. Environ Toxicol Pharmacol. 2016;47:6-18.

Acreditamos que é válido qualquer esforço para melhorar o entendimento da etiopatogenia dos TEAs e, principalmente, as causas de sua prevalência drasticamente crescente observada nas últimas décadas, pelo menos nos EUA.44 Christensen DL, Baio J, Van Naarden Braun K, Bilder D, Charles J, Constantino JN, et al. Prevalence and characteristics of autism spectrum disorder among children aged 8 years – Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network, 11 Sites, United States, 2012. MMWR Surveill Summ. 2016;65:1-23. Contudo, no momento, não há estudo, retrospectivo ou prospectivo, que envolva indivíduos humanos que sugerem uma associação entre a exposição precoce à poluição por N2O e o aumento no risco de TEA. Por esse motivo, em nossa revisão, não mencionamos o N2O entre os poluentes envolvidos na etiopatogenia do TEA com base nos dados atualmente disponíveis. Além disso, acreditamos que focar em um único poluente hipotético na pesquisa com relação à etiopatogenia do TEA pode ser algo enganoso. Considerando a miríade de possíveis poluentes aos quais um indivíduo é exposto a partir dos estágios iniciais da vida intrauterina, acreditamos que é provável que não apenas um poluente, mas uma interação complexa entre vários poluentes, possa ser o fator determinante no aumento do risco de TEA por meio, por exemplo, de mecanismos epigenéticos. De fato, de acordo com von Ehrenstein et al., sugerimos considerar a possibilidade de que não poluentes isolados, mas, em vez disso, uma mistura de poluentes estar envolvida na etiopatogenia do TEA, devido aos efeitos sinérgicos.55 von Ehrenstein OS, Aralis H, Cockburn M, Ritz B. In utero exposure to toxic air pollutants and risk of childhood autism. Epidemiology. 2014;25:851-8. Contudo, com base nas observações de Fluegge, consideramos recomendável incluir o N2O entre os poluentes a serem monitorados nos estudos epidemiológicos futuros sobre os fatores de risco do TEA.

Em nossa opinião, as outras considerações de Fluegge sobre a dinâmica diferencial hipotética na prevalência do TEA entre o EUA e a Europa11 Fluegge K. Autism in 2016: additional discovery. J Pediatr (Rio J). 2017;93:308-9. são mais questionáveis. Conforme relatado por Boilson et al., na Europa há uma falta de dados sistemáticos e confiáveis relacionados à prevalência do TEA,66 Boilson AM, Staines A, Ramirez A, Posada M, Sweeney MR. Operationalisation of the European Protocol for Autism Prevalence (EPAP) for autism spectrum disorder prevalence measurement in Ireland. J Autism Dev Disord. 2016;46:3054-67. ao contrário dos EUA, onde o sistema da Rede de Monitoramento do Autismo e Transtornos de Desenvolvimento fornece periodicamente estimativas sobre a prevalência do TEA entre as crianças.44 Christensen DL, Baio J, Van Naarden Braun K, Bilder D, Charles J, Constantino JN, et al. Prevalence and characteristics of autism spectrum disorder among children aged 8 years – Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network, 11 Sites, United States, 2012. MMWR Surveill Summ. 2016;65:1-23. Portanto, atualmente, parece ser inviável uma comparação real entre a dinâmica da prevalência do TEA nos EUA e na Europa nas últimas décadas.

Sentimos a necessidade de fazer uma última observação: em sua carta,11 Fluegge K. Autism in 2016: additional discovery. J Pediatr (Rio J). 2017;93:308-9. Fluegge menciona um de seus artigos77 Fluegge KR, Fluegge KR. Glyphosate use predicts ADHD hospital discharges in the Healthcare Cost and Utilization Project Net (HCUPnet): a two-way fixed-effects analysis. PLoS One. 2015;10:e0133525. que foi, contudo, retratado.88 PLOS ONE Staff. Retraction: Glyphosate use predicts ADHD hospital discharges in the Healthcare Cost and Utilization Project Net (HCUPnet): a two-way fixed-effects analysis. PLoS One. 2015;10:e0137489. Acreditamos que não é uma escolha ideal mencionar um trabalho retratado, apesar de refletir o que os autores pensam.

  • Como citar este artigo: Posar A, Visconti P. Authors' reply: "Autism in 2016: additional discovery". J Pediatr (Rio J). 2017;93:309-10.

References

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    Fluegge K. Does environmental exposure to the greenhouse gas, N2O, contribute to etiological factors in neurodevelopmental disorders? A mini-review of the evidence. Environ Toxicol Pharmacol. 2016;47:6-18.
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    Christensen DL, Baio J, Van Naarden Braun K, Bilder D, Charles J, Constantino JN, et al. Prevalence and characteristics of autism spectrum disorder among children aged 8 years – Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network, 11 Sites, United States, 2012. MMWR Surveill Summ. 2016;65:1-23.
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    von Ehrenstein OS, Aralis H, Cockburn M, Ritz B. In utero exposure to toxic air pollutants and risk of childhood autism. Epidemiology. 2014;25:851-8.
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    Boilson AM, Staines A, Ramirez A, Posada M, Sweeney MR. Operationalisation of the European Protocol for Autism Prevalence (EPAP) for autism spectrum disorder prevalence measurement in Ireland. J Autism Dev Disord. 2016;46:3054-67.
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    Fluegge KR, Fluegge KR. Glyphosate use predicts ADHD hospital discharges in the Healthcare Cost and Utilization Project Net (HCUPnet): a two-way fixed-effects analysis. PLoS One. 2015;10:e0133525.
  • 8
    PLOS ONE Staff. Retraction: Glyphosate use predicts ADHD hospital discharges in the Healthcare Cost and Utilization Project Net (HCUPnet): a two-way fixed-effects analysis. PLoS One. 2015;10:e0137489.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2017
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