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Fatores relacionados à associação de transtorno de ansiedade social e uso de álcool entre adolescentes: uma revisão sistemática Como citar este artigo: Cruz EL, Martins PD, Diniz PR. Factors related to the association of social anxiety disorder and alcohol use among adolescents: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2017;93:442–51.

Abstract

Objective:

To identify the risk factors related to the association between social anxiety disorder and alcohol use in adolescents.

Source of data:

The PICO research strategy was used to perform a systematic review in Medline, LILACS, Pubmed, IBECS and Cochrane Library databases. DeCS/MeSH: Phobic Disorders, Adolescent, Behavior, Ethanol, Risk Factors, and the Boolean operator “AND” were used. Inclusion criteria were: cross-sectional, prospective/retrospective cohort, and case-control studies, carried out in adolescents (10 to 19 years), original articles on social anxiety disorder and alcohol use published between 2010 and 2015. Studies that did not report the terms “anxiety disorder” and “alcohol use” in the title and abstract were excluded.

Synthesis of data:

409 articles were retrieved; after the exclusion of 277 repeated articles, the following were eligible: 94 in MEDLINE, 68 in Pubmed, 12 in IBCS, and three in LILACS. Titles and abstracts were independently read by two examiners, which resulted in the selection of eight articles for the analysis. Risk factors associated to the two disorders were female gender, age, peer approval and affective problems for alcohol use, confrontation situations and/or compliance reasons, frequency of alcohol use, and secondary comorbidities, such as depression and generalized anxiety.

Conclusions:

It is necessary to assess the period of social anxiety disorders first symptom onset, as well as the risks for alcohol use in order to establish corrective intervention guidelines, especially for socially anxious students.

KEYWORDS
Phobic disorders; Adolescent; Behavior; Ethanol; Risk factors

Abstract

Objective:

To identify the risk factors related to the association between social anxiety disorder and alcohol use in adolescents.

Source of data:

The PICO research strategy was used to perform a systematic review in Medline, LILACS, Pubmed, IBECS and Cochrane Library databases. DeCS/MeSH: Phobic Disorders, Adolescent, Behavior, Ethanol, Risk Factors, and the Boolean operator “AND” were used. Inclusion criteria were: cross-sectional, prospective/retrospective cohort, and case-control studies, carried out in adolescents (10–19 years), original articles on social anxiety disorder and alcohol use published between 2010 and 2015. Studies that did not report the terms “anxiety disorder” and “alcohol use” in the title and abstract were excluded.

Synthesis of data:

409 articles were retrieved; after the exclusion of 277 repeated articles, the following were eligible: 94 in MEDLINE, 68 in Pubmed, 12 in IBCS, and three in LILACS. Titles and abstracts were independently read by two examiners, which resulted in the selection of eight articles for the analysis. Risk factors associated to the two disorders were female gender, age, peer approval and affective problems for alcohol use, confrontation situations and/or compliance reasons, frequency of alcohol use, and secondary comorbidities, such as depression and generalized anxiety.

Conclusions:

It is necessary to assess the period of social anxiety disorders first symptom onset, as well as the risks for alcohol use in order to establish corrective intervention guidelines, especially for socially anxious students.

KEYWORDS
Phobic disorders; Adolescent; Behavior; Ethanol; Risk factors

Introdução

O transtorno de ansiedade social (TAS) é caracterizado pelo medo excessivo ou ansiedade intensa quando o indivíduo se depara com situações sociais de exposição em público ou de conhecer pessoas novas e que tem seu início na infância/adolescência. A estimativa é que entre 5% e 13% da população apresentem esse problema. É considerada uma patologia crônica, capaz de incapacitar o indivíduo e promover o desenvolvimento de altas taxas de comorbidades psiquiátricas, como depressão, transtorno de ansiedade generalizada e agorafobia. O transtorno de ansiedade é mais comum e o terceiro transtorno psiquiátrico mais frequente.11 Garcia JM. Saúde mental na escola: o que os educadores devem saber. Psico-USF. 2016;21:423-5.

2 Pereira SM, Tavares FS, Souza LC, de Badaró AC, Gomes DA, Peres FS, et al. Análise bibliométrica dos estudos sobre fobia social e o uso de álcool. Psicol Pesqui. 2011;5:168-78.

3 Crippa JA, Chagas MH, Nardi AE, Manfro G, Hetem LA, Levitan MN, et al. Transtorno da ansiedade social: diagnóstico. Diretrizes clínicas da saúde suplementar associação brasileira de psiquiatria sociedade brasileira de medicina de família e comunidade. [cited 2015 Aug 15]. Available from: http://diretrizes.amb.org.br/ans/transtorno_da_ansiedade_sociedade_social-diagnostico.pdf http://diretrizes.amb.org.br/ans/transtorno_da_ansiedade_sociedade_social-diagnostico.pdf.
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-44 Chagas MH, Nardi AE, Manfro GG, Hetem LA, Andrada NC, Levitan MN, et al. Diretrizes da Associação Médica Brasileira para o diagnóstico e diagnóstico diferencial do transtorno de ansiedade social. Rev Bras Psiquiatr. 2010;32:444-52.

Esses indivíduos apresentam dificuldades de relacionamento interpessoal (interação familiar e nos setores da sociedade), baixa autoestima, baixo desempenho escolar, evasão escolar e prejuízo no processo de memória, percepção e pensamento. Vale ressaltar que o transtorno de ansiedade social, geralmente, precede o abuso e a dependência do álcool e outras substâncias ilícitas, o que agrava os sintomas.55 Estanislau GM, Bressan RA. Saúde mental na escola: o que os educadores devem saber. Artmed: Porto Alegre; 2014.

Considerada um problema de saúde pública, a experimentação do álcool inicia tipicamente na adolescência, entre 12 e 15 anos, independentemente do contexto social e conforme os indivíduos que tiveram início precoce do transtorno de ansiedade social apresentam risco para desenvolver depressão ou alcoolismo.22 Pereira SM, Tavares FS, Souza LC, de Badaró AC, Gomes DA, Peres FS, et al. Análise bibliométrica dos estudos sobre fobia social e o uso de álcool. Psicol Pesqui. 2011;5:168-78.,66 Fernandes LF, Alckmin-Carvalho F, Izbicki S, Melo MH da S. Prevenção universal de ansiedade na infância e adolescência: uma revisão sistemática. Psicol Teor Prat. 2014;16:83-99.,77 Nardi AE, Quevedo J, da Silva AG. Transtorno de ansiedade social: teoria e clínica. Porto Alegre: Artmed; 2014. Esse diagnóstico acontece pouco tempo antes ou concomitante ao início do uso de substâncias, o que sugere uma associação entre esses dois problemas de saúde. Mesmo diante dessas evidências, esse tipo de transtorno na adolescência apresentou associação conflitante com o uso de álcool.

A presente revisão sistemática tem por objetivo identificar os fatores de risco relacionados à associação entre o transtorno de ansiedade social e uso de álcool entre adolescentes.

Método

Foi feita uma revisão sistemática da literatura a partir da busca nas bases de dados Medical Literature Analyses and Retrieval Online (Medline), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), PubMed, Indice Bibliográfico Español de Ciencias de la Salud (Ibecs) e Biblioteca Cochrane.

Para cada portal de pesquisa, foi elaborada uma estratégia específica de cruzamento dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS, um banco de dados brasileiro de palavras-chave médicas) ou do Medical Subject Headings (MeSH). As palavras-chave usadas para selecionar os estudos foram: transtornos fóbicos, adolescente, comportamento, etanol, fatores de risco e seus correspondentes em inglês. Foi usado o operador boleano “AND” para combinar palavras-chave e termos para as buscas. A seleção foi limitada a estudos publicados em português, inglês ou espanhol entre 2010 a 2015.

Localizados os artigos, aplicaram-se os critérios de elegibilidade, seleção e exclusão. Foram considerados elegíveis artigos originais que tinham o uso de álcool como fator de risco para transtorno de ansiedade social. Usou-se a estratégia de pesquisa Population, Intervention, Comparison, Outcome, Study Design (PICO) para a construção da pergunta de pesquisa, a fim de fazer a busca direcionada para as evidências clínicas de associação entre a fobia social e o uso de álcool.88 Santos CM da C, Pimenta CA de M, Nobre MRC. A estratégia PICO para a construção da pergunta de pesquisa e busca de evidências. Rev Latino-am Enferm. [cited 2016 Apr 29]. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v15n3/pt_v15n3a23.pdf http://www.scielo.br/pdf/rlae/v15n3/pt_v15n3a23.pdf.
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,99 Campos J, Álvaro F. Manual prático de pesquisa científica - da graduação à pós-graduação. 1st ed. Rio de Janeiro: Revinter; 2016. Foram selecionados os estudos: transversal, coorte prospectiva/retrospectiva e caso-controle; em seres humanos entre 10 e 19 anos;1010 Donovan JE, Molina BS. Childhood risk factors for early-onset drinking. J Stud Alcohol Drugs. 2011;72:741-51. estudos originais; o alcoolismo como fator de risco para transtornos fóbicos. Foram excluídos os estudos que não referiam alcoolismo e transtornos fóbicos no título do artigo, população de jovens adultos entre 20 a 24 anos.

A seleção dos artigos foi feita em três etapas, seguindo o método Prisma, do inglês Transparent Reporting of Systematic Reviews and Meta-Analyses.1111 Prisma: Transparent reporting of systematic reviews and meta-analyses. [cited 2016 Apr 29]. Available from: http://www.prisma-statement.org/PRISMAStatement/Default.aspx http://www.prisma-statement.org/PRISMAStatement/Default.aspx.
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Na primeira, dois pesquisadores independentes procederam à leitura dos títulos, sem conhecer os autores e o periódico no qual foram publicados. Após a exclusão dos artigos repetidos, teve início a segunda etapa, na qual foi feita a leitura dos resumos dos estudos selecionados e, da mesma forma, foram excluídos aqueles que não se adequavam a qualquer dos critérios de inclusão. As discordâncias foram resolvidas por consenso. Na terceira etapa, todos os estudos não excluídos nas etapas anteriores foram lidos na íntegra para seleção dos que seriam incluídos nesta revisão (fig. 1).

Figura 1
Fluxograma representativo das etapas de seleção dos artigos sobre transtorno de ansiedade social e uso abusivo de álcool em adolescentes.Fonte: Prisma (Transparent Reporting of Systematic Reviews and Meta-Analyses).

Resultados

Após exclusão dos artigos repetidos, 277 estudos foram elegíveis: 94 no Medline, 68 em Pubmed, 12 Ibecs e três Lilacs. Foi feita a leitura dos títulos e resumos de forma independente por dois examinadores, totalizaram-se oito artigos para análise nesta revisão.

Na tabela 1 estão expressos as características dos oito estudos e os tipos de protocolo usados. Um estudo foi feito na Finlândia e sete nos Estados Unidos. Foram investigados 4.579 adolescentes, entre 10 a 19 anos, que apresentavam os sintomas do transtorno de ansiedade social e que consumiam álcool. Em 62,5% dos estudos houve predomínio do sexo feminino, 54% da amostra total.

Tabela 1
Características dos estudos e tipos de protocolo usados

A associação entre os sintomas de ansiedade social e o uso de álcool foi confirmada em seis estudos, dois desses foram feitos em um grupo de adolescentes com idade média entre 10 e 11 anos, os demais avaliaram após os 15 anos. Os fatores de risco atribuídos pelos estudos para essa associação foram o gênero feminino, aceitação pelos pares e problemas afetivos para o uso do álcool e a presença de comorbidades secundárias, como depressão, ansiedade generalizada, agorafobia, ansiedade de separação e transtorno obsessivo compulsivo. Outros fatores, como culturais, frequência de uso do álcool e frequência de embriaguez investigados pelos estudos, não parecem estar relacionados a essa associação (tabela 2).

Tabela 2
Resumo dos estudos e os fatores de riscos associados ao transtorno de ansiedade social e uso de álcool em adolescentes

Discussão

Os achados mostram que a associação investigada ainda não está clara, isso se deve ao número pequeno de estudos encontrados, porém 75% dos estudos apresentam evidências positivas entre a associação do transtorno de ansiedade social e o uso de álcool.

Contextualização dos locais de estudos

Nesta revisão, identificou-se predominância de estudos feitos em país desenvolvidos, a maioria nos Estados Unidos, o que pode estar relacionado à maior vigilância epidemiológica em saúde mental para crianças e adolescentes. É importante lembrar que cerca de um em cinco adolescentes no país em questão sofrem de um transtorno mental grave, o suficiente para impactar em suas atividades diárias e dado relevante para a intensificação das investigações.1212 Live Science Staff. In US, 1 in 5 teens have serious mental disorder. Live Sci. [cited 2016 Apr 29]. Available from: http://www.livescience.com/8787-1-5-teens-mental-disorder.html http://www.livescience.com/8787-1-5-teens-mental-disorder.html.
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No Brasil, estudos de base populacional evidenciaram que o início dos transtornos de ansiedade acontece com a idade média de 13 anos e o uso de álcool entre 12 e 15 anos, enquanto o uso abusivo de substâncias inicia-se mais tardiamente, aos 24 anos. Isso pode ser um indício de que os recursos para tratamento dos transtornos mentais em crianças e adolescentes podem estar deficitários, o que eleva as taxas de comorbidade no início da vida adulta.1313 Viana MC, Andrade LH. Lifetime prevalence, age and gender distribution and age-of-onset of psychiatric disorders in the São Paulo metropolitan area, Brazil: results from the São Paulo megacity mental health survey. Rev Bras Psiquiatr Off J Brazilian Psychiatr Assoc. 2012;34:249-60.,1414 Lopes CS, Abreu G de A, dos Santos DF, Menezes PR, Carvalho KM, Cunha C de F, et al. Transtornos mentais comuns em adolescentes. Rev Saude Publ. 2016;50:14s. Esta revisão não identificou trabalho brasileiro que pudesse elucidar a realidade nacional sobre a relação entre transtorno de ansiedade social e o uso de álcool.

Esses dados são importantes para destacar a necessidade de diagnosticar e acompanhar os adolescentes predispostos a desenvolver transtornos mentais e agir inicialmente de forma preventiva nas escolas e nos serviços de saúde, para diminuir os encargos associados em longo prazo para o indivíduo, a família e a comunidade.

Transtorno de ansiedade social e o uso de álcool

Dado que o transtorno de ansiedade social é uma das condições psiquiátricas mais prevalentes na população mundial, depois da depressão,66 Fernandes LF, Alckmin-Carvalho F, Izbicki S, Melo MH da S. Prevenção universal de ansiedade na infância e adolescência: uma revisão sistemática. Psicol Teor Prat. 2014;16:83-99. e o seu desenvolvimento precede o aparecimento de transtornos por uso de álcool, é importante fazer as intervenções sobre o álcool,1515 Terlecki MA, Buckner JD, Larimer ME, Copeland AL. Brief motivational intervention for college drinking: the synergistic impact of social anxiety and perceived drinking norms. Psychol Addict Behav. 2012;26:917-23. uma vez que jovens com transtorno de ansiedade social são cinco vezes mais propensos a desenvolver dependência do álcool do que aqueles sem o transtorno.1414 Lopes CS, Abreu G de A, dos Santos DF, Menezes PR, Carvalho KM, Cunha C de F, et al. Transtornos mentais comuns em adolescentes. Rev Saude Publ. 2016;50:14s.,1616 Buckner JD, Schmidt NB, Lang AR, Small JW, Schlauch RC, Lewinsohn PM. Specificity of social anxiety disorder as a risk factor for alcohol and cannabis dependence. J Psychiatr Res. 2008;42:230-9.

17 Buckner JD, Timpano KR, Zvolensky MJ, Sachs-Ericsson N, Schmidt NB. Implications of comorbir alcohol dependence among individuals with social anxiety disorder. Depress Anxiety. 2008;25:1028-37.

18 Buckner JD, Turner RJ. Social anxiety disorder as a risk factor for alcohol use disorders: a prospective examination of parental and peer influences. Drug Alcohol Depend. 2009;100:128-37.

19 Schneier FR, Foose TE, Hasin DS, Heimberg RG, Liu S-M, Grant BF, et al. Social anxiety disorder and alcohol use disorder comorbidity in the national epidemiologic survey on alcohol and related conditions. Psychol Med Psychol Med. 2010;40:977-88.
-2020 Gomes AG, Lourenço DM, Baptista LN. Construção da escala cognitiva e comportamental de ansiedade social (ECCAS). Universidade Federal de Juiz de Fora; 2014. [cited 2016 Jul 15]. Available from: https://repositorio.ufjf.br/jspui/bitstream/ufjf/558/3/danielalexandregouveagomes.pdf https://repositorio.ufjf.br/jspui/bitstream/ufjf/558/3/danielalexandregouveagomes.pdf.
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Estudos que não apresentaram associação significativa entre o transtorno de ansiedade social e o uso de álcool em adolescentes1515 Terlecki MA, Buckner JD, Larimer ME, Copeland AL. Brief motivational intervention for college drinking: the synergistic impact of social anxiety and perceived drinking norms. Psychol Addict Behav. 2012;26:917-23.,2121 Fröjd S, Ranta K, Kaltiala-Heino R, Marttunen M. Associations of social phobia and general anxiety with alcohol and drug use in a community sample of adolescents. Alcohol Alcohol. 2011;46:192-9. apontaram ainda a possibilidade de obter diferentes resultados quando observada as diferenças culturais, como, por exemplo, o acesso gratuito a álcool pelo adolescente. Outro risco notado foi o desenvolvimento dessa associação com a comorbidade da depressão, pode acontecer na adolescência tardia ou demorar mais do que dois anos para se desenvolver.

Vale ressaltar a importância de reconhecer e tratar transtornos de ansiedade na infância, especialmente entre as meninas, a fim de ajudá-las a evitar o desenvolvimento de transtornos de uso de substância e comorbidades secundárias.2222 Wu P, Goodwin RD, Fuller C, Liu X, Comer JS, Cohen P, et al. The relationship between anxiety disorders and substance use among adolescents in the community: specificity and gender differences. J Youth Adolesc. 2010;39:177-8.

Conforme as Diretrizes de Diagnóstico Diferencial para o Transtorno de Ansiedade Social, a idade de início do TAS tende a ser mais precoce e a distribuição entre os sexos é mais homogênea.33 Crippa JA, Chagas MH, Nardi AE, Manfro G, Hetem LA, Levitan MN, et al. Transtorno da ansiedade social: diagnóstico. Diretrizes clínicas da saúde suplementar associação brasileira de psiquiatria sociedade brasileira de medicina de família e comunidade. [cited 2015 Aug 15]. Available from: http://diretrizes.amb.org.br/ans/transtorno_da_ansiedade_sociedade_social-diagnostico.pdf http://diretrizes.amb.org.br/ans/transtorno_da_ansiedade_sociedade_social-diagnostico.pdf.
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Ao observar o gênero em destaque com o consumo de álcool entre os adolescentes brasileiros na Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (Pense 2012), destaca-se maior prevalência do sexo feminino (51,7%; IC95% 50,8-52,6).2323 Malta DC, Machado IE, Porto DL, da Costa AW, et al. Alcohol consumption among Brazilian adolescents according to the National Adolescent School-based Health Survey (PeNSE 2012). Rev Bras Epidemiol. 2014;17:203-14.

Ao verificar a influência do gênero na associação entre consumo de substâncias ilícitas e ansiedade social, destaca-se que as mulheres com níveis mais elevados de ansiedade social têm um maior número de amigos que usam drogas e álcool.2424 Buckner JD, Mallott MA, Schmidt NB, Taylor J. Peer influence and gender differences in problematic cannabis use among individuals with social anxiety. J Anxiety Disord. 2006;20:1087-102.

No entanto, há diferenças entre os padrões observados em adolescentes e os resultados de estudos com adultos, ou seja, a relação entre transtornos de ansiedade e uso de substâncias pode mudar da adolescência para a idade adulta.2222 Wu P, Goodwin RD, Fuller C, Liu X, Comer JS, Cohen P, et al. The relationship between anxiety disorders and substance use among adolescents in the community: specificity and gender differences. J Youth Adolesc. 2010;39:177-8. O que inicialmente é usado como ferramenta de enfrentamento da ansiedade os deixa desinibidos e seguros para o alívio do pavor da situação social, no decorrer da vida pode ocasionar situações constrangedoras e de dependência, além da persistência dos sintomas da fobia.2525 Paiva DP, de Araújo LF, Pereira SM, Ronzani TM, Lourenço LM. O estudo da comorbidade entre fobia social e álcool. Psicol Pesqui. 2008;2:40-5.

No estudo feito em escolas, bibliotecas e clubes de adolescentes da região metropolitana de Washington (DC), apontou-se que as taxas de uso de álcool foram relativamente baixas, no entanto os resultados indicaram que os jovens teriam maiores chances de chegar ao uso problemático de álcool ao longo do tempo.2626 Dahne J, Banducci AN, Kurdziel G, MacPherson L. Early adolescent symptoms of social phobia prospectively predict alcohol use. J Stud Alcohol Drugs. 2014;75:929-36.

No estudo que pesquisou a ansiedade social, a ansiedade generalizada e o uso de sustâncias (cigarro e álcool) na fase inicial da adolescência, observou-se que para o sexo feminino a ansiedade social é um fator de risco quando a aprovação do uso de álcool pelos pares é alta (altos níveis de aprovação dos pares, altos níveis de ansiedade social foram associados com uma alta probabilidade de uso de substância). Enquanto para a ansiedade generalizada é considerada fator de risco quando o uso pelos pares é baixo.2727 Zehe JM, Colder CR, Read JP, Wieczorek WF, Lengua LJ. Social and generalized anxiety symptoms and alcohol and cigarette use in early adolescence: the moderating role of perceived peer norms. Addict Behav. 2013;38:1931-9.

Todavia, o sexo não foi significativamente relacionado com ansiedade social e uso do álcool, destacaram-se a idade, a frequência do uso de álcool e os problemas afetivos.2828 Blumenthal H, Leen-Feldner EW, Frala JL, Badour CL, Ham LS. Social anxiety and motives for alcohol use among adolescents. Psychol Addict Behav. 2010;24:529-34. Mas essa associação foi relacionada com os problemas afetivos, bem como os motivos de sobrevivência e de enfrentamento, de tal forma que jovens que apresentaram elevados sintomas do transtorno relataram aumento da motivação para beber relacionada a fins de enfrentamento. Isso também foi evidenciado nos três modelos usados, porque se verificaram os grupos de pessoas com ansiedade social que usavam o álcool em situações de enfrentamento e/ou motivos de conformidade.2929 Terlecki MA, Buckner JD. Social anxiety and heavy situational drinking: coping and conformity motives as multiple mediators. Addict Behav. 2015;40:77-83.

Os adolescentes ricos em sintomas de ansiedade social consomem menos álcool, porém apresentam uma associação maior quando relacionada com o endosso de enfrentamento e os motivos de conformidade.3030 Clerkin EM, Barnett N. The separate and interactive effects of drinking motives and social anxiety symptoms in predicting drinking outcomes. Addict Behav. 2012;37:674-7.

Perspectivas

As limitações dos estudos analisados se baseiam no tamanho da amostra; no curto período de acompanhamento dos adolescentes, não foi possível observar o comportamento dos alunos no período de transição do ensino fundamental ao ensino médio,1515 Terlecki MA, Buckner JD, Larimer ME, Copeland AL. Brief motivational intervention for college drinking: the synergistic impact of social anxiety and perceived drinking norms. Psychol Addict Behav. 2012;26:917-23.,2626 Dahne J, Banducci AN, Kurdziel G, MacPherson L. Early adolescent symptoms of social phobia prospectively predict alcohol use. J Stud Alcohol Drugs. 2014;75:929-36.,2828 Blumenthal H, Leen-Feldner EW, Frala JL, Badour CL, Ham LS. Social anxiety and motives for alcohol use among adolescents. Psychol Addict Behav. 2010;24:529-34. os resultados não podem ser generalizados para todas as fases da adolescência e nem para todas as regiões (áreas rurais e urbanas), pois cada fase tem características e comportamentos distintos quanto a tomada de decisão para o uso do álcool conforme a região de moradia;2727 Zehe JM, Colder CR, Read JP, Wieczorek WF, Lengua LJ. Social and generalized anxiety symptoms and alcohol and cigarette use in early adolescence: the moderating role of perceived peer norms. Addict Behav. 2013;38:1931-9. e ao se usar a combinação das variáveis de uso de álcool, cigarro, maconha e outros tipos de substâncias, ela tem implicações na associação com a ansiedade, pois cada substância tem propriedade única e efeitos fisiológicos distintos.2121 Fröjd S, Ranta K, Kaltiala-Heino R, Marttunen M. Associations of social phobia and general anxiety with alcohol and drug use in a community sample of adolescents. Alcohol Alcohol. 2011;46:192-9.,2222 Wu P, Goodwin RD, Fuller C, Liu X, Comer JS, Cohen P, et al. The relationship between anxiety disorders and substance use among adolescents in the community: specificity and gender differences. J Youth Adolesc. 2010;39:177-8.,2727 Zehe JM, Colder CR, Read JP, Wieczorek WF, Lengua LJ. Social and generalized anxiety symptoms and alcohol and cigarette use in early adolescence: the moderating role of perceived peer norms. Addict Behav. 2013;38:1931-9.

Para futuras investigações é necessário abranger o adolescente em idade inicial, média e tardia, bem como ampliar os grupos étnicos; usar tanto a análise descritiva (percepções do comportamento de beber) como a análise das normas cautelares (aprovação/reprovação do comportamento de beber); e avaliar o tratamento e seus efeitos no adolescente; verificar os motivos de enfrentamento para beber e uso problemático de álcool com o objetivo final de elaboração de programas de prevenção que visem a jovens em risco.

Limitações

O presente estudo de revisão sistemática apresentou como limitações: a) não uso das bases de dados científicas Web of Science e Pschynfo. Essa última é a base de dados especializada em pesquisa de ciência comportamental e social; b) limitação de estudos publicados nos idiomas português, inglês ou espanhol; c) O pequeno número de artigos incluídos para a análise.

Apesar das limitações, esta revisão torna-se relevante, pois permitiu identificar e compreender os principais fatores de riscos associados ao transtorno de ansiedade social e uso de álcool em adolescentes, além de conhecer ampliar o conhecimento sobre a temática.

Conclusões

A associação entre o transtorno de ansiedade social e uso de álcool em adolescentes parece ainda não estar clara, devido aos poucos trabalhos identificados, à heterogeneidade metodológica e à regionalização. Apesar de tudo, esta revisão levanta evidências interessantes da existência dessa relação e identifica os principais fatores de risco relacionados à associação entre o transtorno de ansiedade social e uso de álcool entre adolescentes como: gênero feminino, aceitação pelos pares e problemas afetivos quanto ao uso de álcool e a presença de comorbidades secundárias, como depressão e transtornos de ansiedade. Assim, estudos com amostras representativas, com ampliação dos grupos étnicos e que contemplem as fases inicial, média e tardia da adolescência ainda são necessários.

Alguns autores ainda sugerem que sejam feitos estudos prospectivos para observar o comportamento dos alunos no período de transição do ensino fundamental ao ensino médio. Como também avaliar o período de surgimento dos primeiros sintomas de transtorno de ansiedade social e dos riscos para o uso de álcool; examinar os motivos para o uso de álcool; avaliar o tratamento e seus efeitos no adolescente e instituir normas corretivas de intervenções sobre o uso de álcool para os alunos socialmente ansiosos.

  • Como citar este artigo: Cruz EL, Martins PD, Diniz PR. Factors related to the association of social anxiety disorder and alcohol use among adolescents: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2017;93:442–51.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2017

Histórico

  • Recebido
    20 Out 2016
  • Aceito
    9 Jan 2017
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