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Má absorção intestinal de frutose associa-se com maior fermentação de lactulose na luz intestinal Como citar este artigo: Ozaki RK, Speridião PG, Soares AC, Morais MB. Intestinal fructose malabsorption is associated with increased lactulose fermentation in the intestinal lumen. J Pediatr (Rio J). 2018;94:609-15. , ☆☆ ☆☆ Trabalho desenvolvido na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola Paulista de Medicina (EPM), Disciplina de Gastroenterologia Pediátrica, São Paulo, SP, Brasil.

Resumo

Objetivo:

Pesquisar a má absorção de frutose em crianças e adolescentes com dor abdominal associada com distúrbios funcionais gastrintestinais. Como objetivo adicional, estudou-se a relação entre a má absorção intestinal de frutose e a ingestão alimentar, inclusive a estimativa de consumo de frutose, o peso e a estatura dos pacientes e a capacidade de fermentação de lactulose.

Métodos:

Foram incluídos 31 pacientes com dor abdominal (11 com dispepsia funcional, 10 com síndrome do intestino irritável e 10 com dor abdominal funcional). O teste de hidrogênio no ar expirado foi usado para pesquisar a má absorção de frutose e a fermentação de lactulose na luz intestinal. O consumo alimentar foi avaliado por registro alimentar. Foram mensurados também o peso e a estatura dos pacientes.

Resultados:

Má absorção de frutose foi caracterizada em 21 (67,7%) pacientes (nove com síndrome do intestino irritável, sete com dor abdominal funcional e cinco com dispepsia funcional). Intolerância após administração de frutose foi observada em seis (28,6%) dos 21 pacientes com má absorção de frutose. Má absorção de frutose associou-se com maior produção de hidrogênio após ingestão de lactulose (p < 0,05), maior consumo de energia e carboidratos (p < 0,05) e maior valor de escore z de IMC para a idade (p < 0,05). As medianas da estimativa de ingestão diária de frutose pelos pacientes com e sem má absorção de frutose foram, respectivamente, 16,1 e 10,5 g/dia (p = 0,087).

Conclusão:

Má absorção de frutose associa-se com maior capacidade de fermentação de lactulose na luz intestinal. O índice de massa corporal foi maior nos pacientes com má absorção de frutose.

PALAVRAS-CHAVE
Dor abdominal; Frutose; Dispepsia; Ingestão alimentar; Índice de massa corporal

Abstract

Objective:

To study fructose malabsorption in children and adolescents with abdominal pain associated with functional gastrointestinal disorders. As an additional objective, the association between intestinal fructose malabsorption and food intake, including the estimated fructose consumption, weight, height, and lactulose fermentability were also studied.

Methods:

The study included 31 patients with abdominal pain (11 with functional dyspepsia, 10 with irritable bowel syndrome, and 10 with functional abdominal pain). The hydrogen breath test was used to investigate fructose malabsorption and lactulose fermentation in the intestinal lumen. Food consumption was assessed by food registry. Weight and height were measured.

Results:

Fructose malabsorption was characterized in 21 (67.7%) patients (nine with irritable bowel syndrome, seven with functional abdominal pain, and five with functional dyspepsia). Intolerance after fructose administration was observed in six (28.6%) of the 21 patients with fructose malabsorption. Fructose malabsorption was associated with higher (p < 0.05) hydrogen production after lactulose ingestion, higher (p < 0.05) energy and carbohydrate consumption, and higher (p < 0.05) body mass index z-score value for age. Median estimates of daily fructose intake by patients with and without fructose malabsorption were, respectively, 16.1 and 10.5 g/day (p = 0.087).

Conclusion:

Fructose malabsorption is associated with increased lactulose fermentability in the intestinal lumen. Body mass index was higher in patients with fructose malabsorption.

KEYWORDS
Abdominal pain; Fructose; Dyspepsia; Eating; Body mass index

Introdução

Dor abdominal crônica ocorre em cerca de 10% a 20% das crianças e dos adolescentes.11 Di Lorenzo C, Colletti RB, Lehmann HP, Boyle JT, Gerson WT, Hyams JS, et al. Chronic abdominal pain in children: a technical report of the American Academy of Pediatrics and the North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2005;40:249-61. A maioria dos pacientes apresenta distúrbios gastrintestinais funcionais resultantes da interação de fatores biopsicossociais.11 Di Lorenzo C, Colletti RB, Lehmann HP, Boyle JT, Gerson WT, Hyams JS, et al. Chronic abdominal pain in children: a technical report of the American Academy of Pediatrics and the North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2005;40:249-61.,22 Rasquin A, Di Lorenzo C, Forbes D, Guiraldes E, Hyams JS, Staiano A, et al. Childhood functional gastrointestinal disorders: child/adolescent. Gastroenterology. 2006;130:1527-37. Dentre os fatores envolvidos na etiologia da dor abdominal associada com distúrbios funcionais gastrintestinais destacam-se características individuais da personalidade, eventos traumáticos pregressos, capacidade de enfrentamento em situações adversas, além de hipersensibilidade visceral, anormalidades na motilidade gastrintestinal e na microbiota intestinal.11 Di Lorenzo C, Colletti RB, Lehmann HP, Boyle JT, Gerson WT, Hyams JS, et al. Chronic abdominal pain in children: a technical report of the American Academy of Pediatrics and the North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2005;40:249-61.,22 Rasquin A, Di Lorenzo C, Forbes D, Guiraldes E, Hyams JS, Staiano A, et al. Childhood functional gastrointestinal disorders: child/adolescent. Gastroenterology. 2006;130:1527-37.

Má absorção intestinal de frutose foi descrita em crianças33 Gomara RE, Halata MS, Newman LJ, Bostwick HE, Berezin SH, Cukaj L, et al. Fructose intolerance in children presenting with abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;47:303-8.

4 Tsampalieros A, Beauchamp J, Boland M, Mack DR. Dietary fructose intolerance in children and adolescents. Arch Dis Child. 2008;93:1078.

5 Jones HF, Burt E, Dowling K, Davidson G, Brooks DA, Butler RN. Effect of age on fructose malabsorption in children presenting with gastrointestinal symptoms. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2011;52:581-4.

6 Wintermeyer P, Baur M, Pilic D, Schmidt-Choudhury A, Zilbauer M, Wirth S. Fructose malabsorption in children with recurrent abdominal pain: positive effects of dietary treatment. Klin Padiatr. 2012;224:17-21.

7 Escobar MA, Lustig D, Pflugeisen BM, Amoroso PJ, Sherif D, Saeed R, et al. Fructose intolerance/malabsorption and recurrent abdominal pain in children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2014;58:498-501.

8 Waibel KH. Fructose intolerance/malabsorption and recurrent abdominal pain in children. Pediatrics. 2014;134:S158.

9 Wirth S, Klodt C, Wintermeyer P, Berrang J, Hensel K, Langer T, et al. Positive or negative fructose breath test results do not predict response to fructose restricted diet in children with recurrent abdominal pain: results from a prospective randomized trial. Klin Padiatr. 2014;226:268-73.
-1010 Yuce O, Kalayci AG, Comba A, Eren E, Caltepe G. Lactose and fructose intolerance in Turkish children with chronic abdominal pain. Indian Pediatr. 2016;53:394-7. e adultos como causa de dor abdominal ou como fator desencadeante de episódios de dor abdominal em pacientes com distúrbios gastrintestinais funcionais.1111 Chumpitazi BP, Shulman RJ. Dietary carbohydrates and childhood functional abdominal pain. Ann Nutr Metab. 2016;68:8-17.,1212 De Giorgio R, Volta U, Gibson PR. Sensitivity to wheat, gluten and FODMAPs in IBS: facts or fiction?. Gut. 2016;65:169-78. A frutose é considerada um dos carboidratos fermentáveis (Fodmaps: fermentable oligosaccharides, disaccharides, monosaccharides and polyols) mais importantes. O interesse pelo papel dos Fodmaps nos distúrbios funcionais gastrintestinais tem recebido destaque crescente na literatura.1111 Chumpitazi BP, Shulman RJ. Dietary carbohydrates and childhood functional abdominal pain. Ann Nutr Metab. 2016;68:8-17.,1212 De Giorgio R, Volta U, Gibson PR. Sensitivity to wheat, gluten and FODMAPs in IBS: facts or fiction?. Gut. 2016;65:169-78. A frutose não absorvida é fermentada, resulta na produção de ácidos graxos de cadeia curta e gases, como o hidrogênio.33 Gomara RE, Halata MS, Newman LJ, Bostwick HE, Berezin SH, Cukaj L, et al. Fructose intolerance in children presenting with abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;47:303-8. O hidrogênio produzido na fermentação é parcialmente absorvido para a corrente sanguínea e chega até os pulmões, torna possível sua mensuração no ar expirado. O diagnóstico de má absorção de frutose pode ser feito com o teste de hidrogênio no ar expirado após administração da frutose. O resultado desse teste depende da dose de frutose usada.33 Gomara RE, Halata MS, Newman LJ, Bostwick HE, Berezin SH, Cukaj L, et al. Fructose intolerance in children presenting with abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;47:303-8.

4 Tsampalieros A, Beauchamp J, Boland M, Mack DR. Dietary fructose intolerance in children and adolescents. Arch Dis Child. 2008;93:1078.

5 Jones HF, Burt E, Dowling K, Davidson G, Brooks DA, Butler RN. Effect of age on fructose malabsorption in children presenting with gastrointestinal symptoms. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2011;52:581-4.

6 Wintermeyer P, Baur M, Pilic D, Schmidt-Choudhury A, Zilbauer M, Wirth S. Fructose malabsorption in children with recurrent abdominal pain: positive effects of dietary treatment. Klin Padiatr. 2012;224:17-21.

7 Escobar MA, Lustig D, Pflugeisen BM, Amoroso PJ, Sherif D, Saeed R, et al. Fructose intolerance/malabsorption and recurrent abdominal pain in children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2014;58:498-501.

8 Waibel KH. Fructose intolerance/malabsorption and recurrent abdominal pain in children. Pediatrics. 2014;134:S158.

9 Wirth S, Klodt C, Wintermeyer P, Berrang J, Hensel K, Langer T, et al. Positive or negative fructose breath test results do not predict response to fructose restricted diet in children with recurrent abdominal pain: results from a prospective randomized trial. Klin Padiatr. 2014;226:268-73.

10 Yuce O, Kalayci AG, Comba A, Eren E, Caltepe G. Lactose and fructose intolerance in Turkish children with chronic abdominal pain. Indian Pediatr. 2016;53:394-7.
-1111 Chumpitazi BP, Shulman RJ. Dietary carbohydrates and childhood functional abdominal pain. Ann Nutr Metab. 2016;68:8-17. Por sua vez, a lactulose pode ser usada no teste respiratório para avaliar a capacidade de produção de hidrogênio e fermentação da microbiota intestinal.1313 Di Stefano M, Mengoli C, Bergonzi M, Pagani E, Corazza GR. Hydrogen breath test and intestinal gas production. Eur Rev Med Pharmacol Sci. 2013;17:36-8.

A frutose é encontrada na forma de monossacarídeo em verduras, legumes, frutas e mel. É encontrada também em produtos industrializados, como o xarope de milho rico em frutose. Nos últimos 15 anos, o consumo de frutose no mundo aumentou concomitantemente com o aumento da epidemia de obesidade.1414 Beyer PL, Caviar EM, McCallum RW. Fructose intake at current levels in the United States may cause gastrointestinal distress in normal adults. J Am Diet Assoc. 2005;105:1559-66.,1515 Vos MB, Kimmons JE, Gillespie C, Welsh J, Blanck HM. Dietary fructose consumption among US children and adults: the Third National Health and Nutrition Examination Survey. Medscape J Med. 2008;10:160. O consumo excessivo de frutose pode contribuir para o desenvolvimento de excesso de peso e obesidade, hipertensão arterial e resistência periférica à insulina.1616 Vos MB. Nutrition, nonalcoholic fatty liver disease and the microbiome: recent progress in the field. Curr Opin Lipidol. 2014;25:61-6.

Apesar de a má absorção intestinal de frutose poder participar como fator causal ou associado à dor abdominal associada com distúrbios funcionais gastrintestinais e de seu potencial de influenciar o estado nutricional, não existem estudos que tenham avaliado simultaneamente ingestão de frutose, má absorção intestinal de frutose e estado nutricional de crianças e adolescentes com dor abdominal.

O objetivo desta pesquisa foi avaliar má absorção e intolerância à frutose em crianças e adolescentes com dor abdominal associada com distúrbios funcionais gastrintestinais. Como objetivo adicional, estudou-se a relação entre a má absorção intestinal de frutose e a ingestão alimentar, inclusive a estimativa de consumo de frutose, o peso e a estatura dos pacientes e a capacidade de fermentação de lactulose com o emprego do teste respiratório.

Métodos

Delineamento do estudo e casuística

Trata-se de uma série de casos que envolvem pacientes pediátricos atendidos consecutivamente com dor abdominal funcional relacionada com distúrbios gastrintestinais funcionais. O estudo foi feito no Ambulatório de Gastroenterologia Pediátrica da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Na admissão, foi obtida assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O projeto foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo - Hospital São Paulo.

Os dados foram coletados antes de 2016. Foram incluídas todas as crianças e os adolescentes atendidos consecutivamente com dor abdominal funcional entre quatro e 14 anos. Não foram incluídos pacientes com cirurgia abdominal prévia, hérnia de hiato, diabetes melito, hiper ou hipotireoidismo, tratamento pregresso de Helicobacter pylori e uso recente de medicações como beta-adrenérgicos, betabloqueadores, procinéticos, anticolinérgicos e antissecretores. Não foram incluídos pacientes que haviam sido tratados com antibióticos havia menos de 30 dias.

Avaliação clínica e classificação da dor abdominal

Todos os pacientes foram avaliados de modo padronizado por uma gastroenterologista pediátrica (ACFS). Foram obtidas informações referentes à duração dos episódios e à sede da dor abdominal e sua relação com as evacuações. Foram obtidos, também, dados sobre o hábito intestinal (frequência de evacuações, formato e consistência das fezes, ocorrência de dor ou dificuldade para eliminação das fezes e ocorrência de comportamento de retenção ou incontinência fecal). As informações coletadas foram usadas para classificar os pacientes1717 Ozaki RK, Soares AC, Speridião PG, Morais MB. Water load test in childhood functional abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2015;61:330-3. em dispepsia funcional, síndrome do intestino irritável e dor abdominal funcional, de acordo com o critério de Roma III.22 Rasquin A, Di Lorenzo C, Forbes D, Guiraldes E, Hyams JS, Staiano A, et al. Childhood functional gastrointestinal disorders: child/adolescent. Gastroenterology. 2006;130:1527-37. Na avaliação médica, foi dada especial atenção à pesquisa de evidências de alteração anatômica, processo inflamatório, metabólico ou neoplásico que indicassem que os sintomas não eram de natureza funcional.22 Rasquin A, Di Lorenzo C, Forbes D, Guiraldes E, Hyams JS, Staiano A, et al. Childhood functional gastrointestinal disorders: child/adolescent. Gastroenterology. 2006;130:1527-37. Quando necessário, foram solicitados exames de acordo com as necessidades individuais de cada paciente. Indivíduos que não apresentavam quadro compatível com dispepsia funcional, síndrome do intestino irritável ou dor abdominal funcional não foram incluídos no estudo.

Teste de hidrogênio no ar expirado

Os testes de hidrogênio no ar expirado com frutose e com lactulose foram feitos com intervalo de uma semana. Na dieta do dia anterior aos exames, recomendou-se evitar o consumo de alimentos que contivessem lactose e frutose, além de alimentos ricos em fibra alimentar e gordura. O teste foi feito após jejum por 12 horas e higienização da cavidade oral com clorhexidine 0,05%. Foram coletadas amostras do ar expirado com auxílio do sistema GaSample (Quintron Instrument Co. Inc. Menomonee Falls, Wisconsin, EUA). As amostras foram imediatamente analisadas em cromatógrafo a gás - Quintron Microlyser, modelo 12i (Quintron Instrument Co. Inc. Menomonee Falls, Wisconsin, EUA). A calibragem foi feita no início do teste e repetida nos intervalos das análises das amostras com emprego de gás padrão com 92 ppm de hidrogênio (White Martins, São Paulo, Brasil).1818 Soares AC, Lederman HM, Fagundes-Neto U, de Morais MB. Breath hydrogen test after a bean meal demonstrates delayed oro-cecal transit time in children with chronic constipation. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2005;41:221-4.,1919 Medeiros LC, Lederman HM, de Morais MB. Lactose malabsorption, calcium intake, and bone mass in children and adolescents. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2012;54:204-9.

Uma amostra de ar expirado foi coletada em jejum. Em seguida, administrou-se, por via oral, 1 g de frutose/kg/peso (máximo de 50 g) ou 10 g de lactulose diluída em 150 mL de água. Esse procedimento foi acompanhado por um dos pesquisadores (RKFO) para confirmar a ingestão completa do carboidrato.33 Gomara RE, Halata MS, Newman LJ, Bostwick HE, Berezin SH, Cukaj L, et al. Fructose intolerance in children presenting with abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;47:303-8. Após a ingestão do substrato, amostras de ar expirado foram coletadas a cada 15 minutos na primeira hora e a cada 30 minutos nas duas horas subsequentes. Foram registrados os sintomas (distensão abdominal, náusea, vômito, flatulência excessiva e diarreia) que porventura ocorressem durante o teste respiratório com a frutose, assim como nas 24 horas subsequentes, conforme informações obtidas por ligação telefônica.1919 Medeiros LC, Lederman HM, de Morais MB. Lactose malabsorption, calcium intake, and bone mass in children and adolescents. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2012;54:204-9.

Má absorção de frutose

A má absorção de frutose foi caracterizada pelo aumento na concentração de hidrogênio igual ou superior a 20 ppm, em relação ao basal, em qualquer uma das amostras de ar expirado coletada após a administração da frutose.33 Gomara RE, Halata MS, Newman LJ, Bostwick HE, Berezin SH, Cukaj L, et al. Fructose intolerance in children presenting with abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;47:303-8.

Intolerância à frutose

A intolerância à frutose caracterizou-se pela ocorrência de sintomas gastrintestinais nos pacientes com má absorção de frutose, como dor abdominal, flatulência, distensão abdominal, diarreia, náusea e vômito durante as 24 horas subsequentes à ingestão da frutose.33 Gomara RE, Halata MS, Newman LJ, Bostwick HE, Berezin SH, Cukaj L, et al. Fructose intolerance in children presenting with abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;47:303-8.,1919 Medeiros LC, Lederman HM, de Morais MB. Lactose malabsorption, calcium intake, and bone mass in children and adolescents. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2012;54:204-9.

Ingestão alimentar

Para avaliar a ingestão alimentar, empregou-se o registro alimentar de três dias. As mães ou os responsáveis foram orientados a anotar todos os alimentos que os pacientes consumiam durante três dias consecutivos (dois dias da semana e um dia do fim de semana). As anotações consistiram da descrição das refeições feitas e dos alimentos consumidos, quantificados em medidas caseiras.2020 Block G. Human dietary assessment: methods and issues. Prev Med. 1989;18:653-60.,2121 Freudheim JL. Review of study designs and methods of dietary assessment in nutritional epidemiology of chronic diseases. J Nutr. 1993;123:401-5.

Os dados obtidos no registro alimentar de 72 horas foram analisados com auxílio do programa de computador Nut Win - Sistema de Apoio à Nutrição versão 2.5, desenvolvido pelo Centro de Informática da Saúde da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (São Paulo, Brasil). O teor de frutose da dieta foi estimado com base na Tabela de Alimentos do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos da América (USDA).2222 Matthews RH, Pehrsson PR, Farhat-Sabet M. Sugar content of selected foods: individuals and total sugars. In: Home economics research report. Washington, DC: Hum Nutr Information Service; 1987. p. 3-14.

Mensuração do peso e da altura

Peso e estatura foram aferidos conforme sugerido por Jelliffe.2323 Jelliffe DB. Evaluación del estado de nutrición de la comunidad. Ginebra: OMS (OMS - Série de monografias, 53); 1968. Usou-se uma balança digital (Filizola Balanças Industriais, São Paulo, Brasil) com capacidade para 150 quilos e sensibilidade de 100 gramas e um antropômetro vertical fixo com mensuração até 190 cm e sensibilidade de 0,1 cm. Os indicadores antropométricos foram calculados com o emprego do software Anthro Plus (World Health Organization, Genebra, Suíça). Peso e estatura foram expressos em escores z de estatura-idade e do índice de massa corporal (IMC)-idade.

Análise estatística

As variáveis contínuas foram apresentadas como média e desvio-padrão ou mediana e percentis 25 e 75, na dependência da distribuição das variáveis de acordo com o teste de Shapiro Wilk. As variáveis categóricas foram apresentadas em porcentagens. Os testes usados são apresentados em conjunto com os resultados, considerou-se o nível de significância de 5%. Foi usado o módulo SigmaStat do Sigma Plot 11.0 (Systat Software, San Jose, CA, EUA).

Resultados

Foram incluídos 31 pacientes com média de 9,2 anos, dos quais 14 eram do sexo masculino. Todos os exames laboratoriais feitos para a investigação da etiologia da dor abdominal foram normais. Endoscopia digestiva alta foi feita em seis pacientes e em nenhum deles foi caracterizado qualquer tipo de alteração.

De acordo com os critérios de Roma III, 11 pacientes apresentavam dispepsia funcional, 10 apresentavam síndrome do intestino irritável e 10 tinham dor abdominal funcional.

O teste respiratório após administração de frutose mostrou que 21 (67,7%) dos 31 pacientes apresentavam má absorção de frutose. A dose de frutose administrada no teste respiratório foi semelhante (p = 0,807) nos pacientes com (31,0 ± 8,3 g) e sem (30,2 ± 8,5 g) má absorção de frutose. Não foi observada diferença em relação à idade e ao gênero nos pacientes com e sem má absorção de frutose (tabela 1). Nas 24 horas subsequentes à administração de frutose para o teste respiratório, ocorreram sintomas (intolerância à frutose) em seis (28,6%) dos 21 pacientes com má absorção de frutose e em dois (20,0%) dos 10 sem má absorção de frutose (p = 1,000). Os sintomas observados nos pacientes com má absorção e intolerância à frutose foram: um apresentou somente diarreia, dois relataram somente dor abdominal e três relataram dor abdominal associada com náusea, vômito, distensão abdominal e/ou diarreia. Nos pacientes sem má absorção de frutose observou-se dor abdominal em dois (20%).

Tabela 1
Idade, gênero, intolerância à frutose e tipo de distúrbio gastrintestinal funcional segundo a presença de má absorção intestinal de frutose

A figura 1 mostra a mediana da concentração de hidrogênio no ar expirado nas várias amostras do teste respiratório com lactulose de acordo com a presença ou não de má absorção de frutose. Na tabela 2 pode-se constatar que a produção de hidrogênio após a administração de lactulose, usada como indicador de fermentação intestinal, foi maior nos pacientes com má absorção de frutose tanto na primeira hora (produção de hidrogênio presumivelmente no intestino delgado) quanto na segunda e terceira horas do teste (produção de hidrogênio presumivelmente no cólon).

Figura 1
Mediana da concentração de hidrogênio no ar expirado após a administração de lactulose ao longo do teste respiratório de acordo com a presença de má absorção intestinal de frutose.

Tabela 2
Produção de hidrogênio (ppm por minuto) de acordo com a área abaixo da curva no teste respiratório com lactulose, segundo a presença de má absorção de frutose

As estimativas do consumo alimentar e os escores z de estatura-idade e IMC-idade estão apresentados na tabela 3, segundo a ocorrência ou não de má absorção intestinal de frutose. O consumo de energia e carboidratos foi maior nos pacientes com má absorção de frutose. O consumo de frutose foi maior no grupo de pacientes com má absorção de frutose; no entanto, o estudo estatístico não atingiu significância (p = 0,087).

Tabela 3
Estimativa da ingestão de frutose e de macronutrientes e escores z de estatura-idade e IMC-idade segundo a presença de má absorção intestinal de frutose

A tabela 3 evidencia que o escore z de estatura-idade foi semelhante nos pacientes com e sem má absorção de frutose. Os valores do escore z do IMC-idade foram maiores no grupo com má absorção de frutose, com diferença estatisticamente significante.

Discussão

Nosso estudo evidenciou má absorção de frutose em 21 (67,7%) dos 31 pacientes com dor abdominal, mais frequente nas crianças com síndrome do intestino irritável. Intolerância à frutose ocorreu em seis (28,6%) dos 21 pacientes com má absorção intestinal de frutose. Crianças e adolescentes com má absorção de frutose apresentaram microbiota intestinal com maior capacidade de fermentação, caracterizada pela maior produção de hidrogênio no teste respiratório com lactulose (tabela 2), e maiores valores de escore z do IMC (tabela 3).

A maioria das publicações mostra variada prevalência de má absorção intestinal de frutose em crianças com dor abdominal, entre 13% e 60%.33 Gomara RE, Halata MS, Newman LJ, Bostwick HE, Berezin SH, Cukaj L, et al. Fructose intolerance in children presenting with abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;47:303-8.

4 Tsampalieros A, Beauchamp J, Boland M, Mack DR. Dietary fructose intolerance in children and adolescents. Arch Dis Child. 2008;93:1078.

5 Jones HF, Burt E, Dowling K, Davidson G, Brooks DA, Butler RN. Effect of age on fructose malabsorption in children presenting with gastrointestinal symptoms. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2011;52:581-4.

6 Wintermeyer P, Baur M, Pilic D, Schmidt-Choudhury A, Zilbauer M, Wirth S. Fructose malabsorption in children with recurrent abdominal pain: positive effects of dietary treatment. Klin Padiatr. 2012;224:17-21.

7 Escobar MA, Lustig D, Pflugeisen BM, Amoroso PJ, Sherif D, Saeed R, et al. Fructose intolerance/malabsorption and recurrent abdominal pain in children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2014;58:498-501.

8 Waibel KH. Fructose intolerance/malabsorption and recurrent abdominal pain in children. Pediatrics. 2014;134:S158.

9 Wirth S, Klodt C, Wintermeyer P, Berrang J, Hensel K, Langer T, et al. Positive or negative fructose breath test results do not predict response to fructose restricted diet in children with recurrent abdominal pain: results from a prospective randomized trial. Klin Padiatr. 2014;226:268-73.
-1010 Yuce O, Kalayci AG, Comba A, Eren E, Caltepe G. Lactose and fructose intolerance in Turkish children with chronic abdominal pain. Indian Pediatr. 2016;53:394-7. A análise desses artigos torna possível especular que parte dessa variabilidade é consequência de diferenças na técnica de feitura do teste respiratório no que se refere à dose de frutose e aos pontos de corte para caracterizar a má absorção de frutose. Nesse contexto, a má absorção de frutose tem sido considerada uma possível causa de dor abdominal ou um fator desencadeante de episódios de dor abdominal em pacientes com distúrbios gastintestinais funcionais.1111 Chumpitazi BP, Shulman RJ. Dietary carbohydrates and childhood functional abdominal pain. Ann Nutr Metab. 2016;68:8-17. Entretanto, o papel terapêutico da dieta pobre em frutose em pacientes com dor abdominal associada com má absorção intestinal de frutose são preliminares e conflitantes.33 Gomara RE, Halata MS, Newman LJ, Bostwick HE, Berezin SH, Cukaj L, et al. Fructose intolerance in children presenting with abdominal pain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2008;47:303-8.,66 Wintermeyer P, Baur M, Pilic D, Schmidt-Choudhury A, Zilbauer M, Wirth S. Fructose malabsorption in children with recurrent abdominal pain: positive effects of dietary treatment. Klin Padiatr. 2012;224:17-21.,99 Wirth S, Klodt C, Wintermeyer P, Berrang J, Hensel K, Langer T, et al. Positive or negative fructose breath test results do not predict response to fructose restricted diet in children with recurrent abdominal pain: results from a prospective randomized trial. Klin Padiatr. 2014;226:268-73.,2424 Götze H, Mahdi A. Fructose malabsorption and dysfunctional gastrointestinal manifestations. Monatsschr Kinderheilkd. 1992;140:814-7.,2525 Choi YK, Kraft N, Zimmerman B, Jackson M, Rao SS. Fructose intolerance in IBS and utility of fructose-restricted diet. J Clin Gastroenterol. 2008;42:233-8. Do ponto de vista clínico, o ideal é que se estabeleça a relação de causalidade entre a má absorção de frutose e o sintoma dor abdominal. Teoricamente, para se atingir esse objetivo seria necessário obter reposta clínica favorável durante a dieta de exclusão da frutose e o reaparecimento da sintomatologia com sua reintrodução na dieta. Entretanto, nenhum artigo da literatura seguiu tal procedimento de investigação clínica para vincular má absorção intestinal de frutose com manifestações clínicas gastrintestinais. A inclusão de um grupo controle em nosso estudo poderia possibilitar a caracterização da má absorção de frutose como fator associado com dor abdominal; no entanto, não permitiria o estabelecimento da relação de causalidade entre má absorção de frutose e dor abdominal.

Deve ser destacado que nosso artigo foi o único no qual se estimou o consumo habitual de frutose na dieta de pacientes com dor abdominal. A mediana da estimativa de consumo de frutose no grupo com má absorção intestinal de frutose (16,1 g) foi maior do que nos pacientes sem má absorção (10,5 g); entretanto, a diferença não atingiu significância estatística (p = 0,087). Esse resultado contraria a expectativa de que pacientes com dor abdominal secundária a má absorção de frutose poderiam reduzir o consumo de frutose como mecanismo de defesa para diminuir a intensidade da dor abdominal. É interessante mencionar que apenas uma parcela dos pacientes apresentou sintomas gastrintestinais durante o teste respiratório com sobrecarga de frutose. A avaliação da dieta evidenciou, ainda, maior consumo de energia e carboidratos pelos pacientes com má absorção de frutose. Na avaliação antropométrica, constatou-se que os valores de IMC foram superiores no grupo com má absorção intestinal de frutose. Assim, é possível especular que o maior consumo de energia e carboidratos, entre os quais a frutose, poderia levar, em longo prazo, a maior ganho de peso e acúmulo corporal de gordura.2626 Takeichi H, Taniguchi H, Fukinbara M, Tanaka N, Shikanai S, Sarukura N, et al. Sugar intakes from snacks and beverages in Japanese children. J Nutr Sci Vitaminol (Tokyo). 2012;58:113-7.

Nosso resultado mostra maior valor de IMC nos pacientes com má absorção de frutose e é diferente do que se observou em um estudo recente2727 Sullivan JS, Le MT, Pan Z, Rivard C, Love-Osborne K, Robbins K, et al. Oral fructose absorption in obese children with non-alcoholic fatty liver disease. Pediatr Obes. 2015;10:188-95. que investigou o efeito metabólico da ingestão de frutose em 24 crianças, das quais 14 eram obesas. Dessas, nove apresentavam doença hepática gordurosa não alcoólica e maior absorção intestinal de frutose em relação aos pacientes obesos sem acometimento hepático e às crianças com peso normal, além de maior aumento na glicemia, insulinemia e concentração sérica de ácido úrico após ingestão de frutose. Os autores concluíram que as crianças obesas com doença hepática absorvem e metabolizam frutose de maneira mais efetiva.2727 Sullivan JS, Le MT, Pan Z, Rivard C, Love-Osborne K, Robbins K, et al. Oral fructose absorption in obese children with non-alcoholic fatty liver disease. Pediatr Obes. 2015;10:188-95. Em outro estudo, observou-se em americanos adultos negros moderada correlação positiva entre absorção intestinal de frutose e teor de gordura no fígado.2828 Walker RW, Lê KA, Davis J, Alderete TL, Cherry R, Lebel S, et al. High rates of fructose malabsorption are associated with reduced liver fat in obese African Americans. J Am Coll Nutr. 2012;31:369-74. Deve ser destacado que ainda não se identificou, de maneira definitiva, uma relação direta entre ingestão de frutose com excesso de peso e outras anormalidades metabólicas em humanos.2929 Rizkalla SW. Health implications of fructose consumption: a review of recent data. Nutr Metab. 2010;7:1-17.

Além da frutose, outros Fodmaps que não são absorvidos podem estar envolvidos na gênese de sintomas gastrintestinais observados nos distúrbios gastrintestinais funcionais.1111 Chumpitazi BP, Shulman RJ. Dietary carbohydrates and childhood functional abdominal pain. Ann Nutr Metab. 2016;68:8-17.,1212 De Giorgio R, Volta U, Gibson PR. Sensitivity to wheat, gluten and FODMAPs in IBS: facts or fiction?. Gut. 2016;65:169-78. A interação entre a sintomatologia gastrintestinal e a microbiota intestinal foi demonstrada com clareza em estudo feito com 33 crianças americanas com síndrome do intestino irritável. Os pacientes receberam em ensaio clínico cross-over dieta americana típica e dieta com baixo teor de Fodmaps.3030 Chumpitazi BP, Cope JL, Hollister EB, Tsai CM, McMeans AR, Luna RA, et al. Randomised clinical trial: gut microbiome biomarkers are associated with clinical response to a low FODMAP diet in children with the irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther. 2015;42:418-27. O ensaio clínico mostrou que durante a dieta com baixo teor de Fodmaps a sintomatologia gastrintestinal foi reduzida expressivamente. Além disso, constatou-se que os pacientes com melhor resposta apresentavam, na admissão, microbiota intestinal com maior capacidade sacarolítica (Bacteroides, Ruminococcaceae, Faecalibaterium prausnitzii).3030 Chumpitazi BP, Cope JL, Hollister EB, Tsai CM, McMeans AR, Luna RA, et al. Randomised clinical trial: gut microbiome biomarkers are associated with clinical response to a low FODMAP diet in children with the irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther. 2015;42:418-27. A capacidade de absorção de frutose não foi avaliada nos pacientes incluídos nesse ensaio clínico.3030 Chumpitazi BP, Cope JL, Hollister EB, Tsai CM, McMeans AR, Luna RA, et al. Randomised clinical trial: gut microbiome biomarkers are associated with clinical response to a low FODMAP diet in children with the irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther. 2015;42:418-27. Nossos resultados apontaram que as crianças com dor abdominal e má absorção de frutose apresentaram também maior produção de hidrogênio como indicador de fermentação intestinal tanto na fase inicial quanto no período presumivelmente colônico do teste respiratório com lactulose (figura 1 e tabela 2). Esses resultados indicam que a microbiota intestinal tem maior capacidade fermentativa e pode estar envolvida na geração dos sintomas gastrintestinais, conforme demonstrado por Chumptazzi et al.3030 Chumpitazi BP, Cope JL, Hollister EB, Tsai CM, McMeans AR, Luna RA, et al. Randomised clinical trial: gut microbiome biomarkers are associated with clinical response to a low FODMAP diet in children with the irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther. 2015;42:418-27. Nesse contexto, nossos resultados mostraram com clareza que os indivíduos com má absorção de frutose apresentaram maior fermentação de lactulose na luz intestinal. Assim, é possível especular que a frutose não absorvida e seus produtos da fermentação estimulem o crescimento de bactérias com maior capacidade de fermentação.

Nosso estudo, a exemplo de outros sobre o assunto, apresenta várias limitações. Os pacientes incluídos na pesquisa constituem uma amostra de conveniência que obedeceu à demanda assistencial no período da coleta de dados. Assim, não foi estimado previamente o tamanho da amostra. O poder (0,474) obtido na comparação da má absorção de frutose nos pacientes com dispepsia funcional, síndrome do intestino irritável e dor abdominal (tabela 1, p = 0,091) foi menor do que o recomendado. Por outro lado, considerando a diferença observada na proporção de má absorção de frutose na dispepsia funcional (5/11) em relação aos outros dois grupos em conjunto (16/20), pode-se estimar que para demonstrar significância estatística seria necessário estudar cerca de 40 pacientes em cada grupo. Ainda, deve ser destacado que a amostra possibilitou que se encontrassem relevantes diferenças, com significância estatística, entre os grupos com e sem má absorção intestinal de frutose. Nesse sentido, nossos resultados contribuíram para melhor entendimento da relação entre o consumo e absorção intestinal de frutose, os distúrbios gastrintestinais funcionais e o estado nutricional.

Assim, conclui-se que a má absorção intestinal de frutose associou-se com maior capacidade de fermentação no intestino, aferida com emprego do teste respiratório com lactulose. Má absorção de frutose associou-se com maior consumo de energia e carboidratos que teoricamente podem explicar, pelo menos em parte, os maiores valores de IMC para a idade. Entretanto, estudos futuros são necessários para avaliar a relação da ingestão e da má absorção intestinal de frutose, dor abdominal, excesso de peso e outras alterações no perfil metabólico.

  • Como citar este artigo: Ozaki RK, Speridião PG, Soares AC, Morais MB. Intestinal fructose malabsorption is associated with increased lactulose fermentation in the intestinal lumen. J Pediatr (Rio J). 2018;94:609-15.
  • ☆☆
    Trabalho desenvolvido na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Escola Paulista de Medicina (EPM), Disciplina de Gastroenterologia Pediátrica, São Paulo, SP, Brasil.
  • Financiamento
    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    2 Jan 2017
  • Aceito
    2 Ago 2017
  • Publicado
    28 Out 2017
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