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Disfunção entérica ambiental e crescimento Como citar este artigo: Morais MB, Silva GA. Environmental enteric dysfunction and growth. J Pediatr (Rio J). 2019;95:S85-S94.

Resumo

Objetivo:

Descrever os indicadores atuais da disfunção entérica ambiental e sua relação com déficit de crescimento linear e com o indicador antropométrico estatura-idade.

Fontes dos dados:

Revisão narrativa com artigos identificados no PubMed e Scopus com o uso de combinações das seguintes palavras: environmental, enteric, dysfunction, enteropathy e growth e dos arquivos pessoais dos autores.

Síntese dos dados:

Nos últimos 15 anos, vem sendo pesquisados novos marcadores não invasivos para caracterizar disfunção entérica ambiental. No entanto, ainda não foram identificados os melhores testes a serem usados. Existem evidências de que na disfunção entérica ambiental, além das anormalidades da mucosa intestinal, pode ocorrer também processo inflamatório sistêmico em consequência da maior permeabilidade intestinal. Sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado e mudança no perfil da microbiota fecal também estão sendo identificados. Evidências indicam que a disfunção entérica ambiental pode comprometer não somente o pleno crescimento como também comprometer o desenvolvimento neuropsicomotor e a resposta de vacinas administradas por via oral. É importante destacar que a disfunção entérica ambiental não é justificativa para não fazer a vacinação, que deve seguir o calendário normal. Um outro aspecto a ser ressaltado é o risco maior dessas crianças que tiveram comprometimento da estatura na infância precoce, possivelmente associado à disfunção entérica ambiental, apresentarem na idade adulta excesso de peso e obesidade quando expostas a uma dieta rica em calorias, o que tem sido chamado “triple burden”.

Conclusões:

De acordo com as evidências analisadas, o controle da disfunção entérica ambiental é muito importante para plena expressão do crescimento, desenvolvimento e resposta vacinal na faixa etária pediátrica.

PALAVRAS-CHAVE
Disfunção; Entérica; Ambiental; Enteropatia; Desnutrição, crescimento

Abstract

Objective:

To describe the current indicators of environmental enteric dysfunction and its association with linear growth deficit and the height-for-age anthropometric indicator.

Data sources:

Narrative review with articles identified in PubMed and Scopus databases using combinations of the following words: environmental, enteric, dysfunction, enteropathy, and growth, as well as the authors’ personal records.

Data synthesis:

In the last 15 years, new non-invasive markers have been investigated to characterize environmental enteric dysfunction; however, the best tests to be used have not yet been identified. There is evidence that, in environmental enteric dysfunction, a systemic inflammatory process may also occur as a consequence of increased intestinal permeability, in addition to intestinal mucosa abnormalities. Bacterial overgrowth in the small intestine and changes in fecal microbiota profile have also been identified. There is evidence indicating that environmental enteric dysfunction can impair not only full growth but also the neuropsychomotor development and response to orally administered vaccines. It is important to emphasize that the environmental enteric dysfunction is not a justification for not carrying out vaccination, which must follow the regular schedule. Another aspect to emphasize is the greater risk for those children who had height impairment in early childhood, possibly associated with environmental enteric dysfunction, to present overweight and obesity in adulthood when exposed to a high calorie diet, which has been called “triple burden.”

Conclusions:

According to the analyzed evidence, the control of environmental enteric dysfunction is very important for the full expression of growth, development, and vaccine response in the pediatric age group.

KEYWORDS
Dysfunction; Enteric; Environmental; Enteropathy; Malnutrition, growth

Introdução

Na primeira metade da década de 1960 observou-se, na Tailândia, que indivíduos adultos sem sintomatologia gastrintestinal apresentavam redução na absorção intestinal da D-xilose e anormalidades na mucosa do intestino delgado (redução na altura das vilosidades e aumento do infiltrado de linfócitos na lâmina própria) em relação aos indivíduos que viviam nos países desenvolvidos.11 Sprinz H, Sribhibhadh R, Gangarosa EJ, Benyajati C, Kundel D, Halstead S. Biopsy of small bowel of Thai people. With special reference to recovery from Asiatic cholera and to an intestinal malabsorption syndrome. Am J Clin Pathol. 1962;38:43-51. Em outros países tropicais as mesmas anormalidades morfológicas e funcionais foram descritas e o quadro passou a ser denominado enteropatia tropical.22 Klipstein FA. Recent advances in tropical malabsorption. Scand J Gastroenterol Suppl. 1970;6:93-114. As evidências mostraram que essas anormalidades eram adquiridas, ou seja, não estavam presentes no recém-nascido e apareciam depois do primeiro semestre de vida.33 Morais MB [Dissertation] Capacidade de absorção da D-xilose em duas comunidades brasileiras: crianças da periferia da cidade de São Paulo e crianças índias do Alto Xingu. Escola Paulista de Medicina; 1984.

4 Morais MB, Fagundes Neto U. Enteropatia ambiental. Estud Av. 2003;17:137-149.
-55 Louis-Auguste J, Kelly P. Tropical enteropathies. Curr Gastroenterol Rep. 2017;19:29-37. Considerando que a distribuição geográfica da enteropatia tropical não se restringia somente às regiões tropicais, na década de 1980 autores da América do Sul propuseram a denominação enteropatia ambiental.66 Fagundes-Neto U, Viaro T, Wehba J, Patrício FR, Machado NL. Tropical enteropathy (environmental enteropathy) in early childhood: a syndrome caused by contaminated environment. J Trop Pediatr. 1984;30:204-9.,77 Brunser O, Araya M, Espinoza J, Figueroa G, Pacheco I, Lois I. Chronic environmental enteropathy in a temperate climate. Hum Nutr Clin Nutr. 1987;41:251-61. Nesse contexto, vale destacar que em determinados países desenvolvidos situados na região tropical, como o Qatar e Singapura, não foram identificados esses tipos de anormalidades no intestino delgado.88 Watanabe K, Petri WA. Environmental enteropathy: elusive but significant subclinical abnormalities in developing countries. EBioMedicine. 2016;10:25-32.

Outro aspecto fundamental, conhecido desde a década de 1970, é a reversibilidade espontânea da enteropatia ambiental. Em paquistaneses e indianos que se mudaram para Nova York, sem que qualquer intervenção terapêutica fosse usada, constatou-se melhoria dos indicadores de função intestinal.99 Gerson CD, Kent TH, Saha JR, Siddiqi N, Lindenbaum J. Recovery of small-intestinal structure and function after residence in the tropics. II. Studies in Indians and Pakistanis living in New York City. Ann Intern Med. 1971;75:41- 8. Fenômeno inverso, ou seja, aparecimento de alterações funcionais no intestino delgado, foi observado alguns meses após a mudança de americanos para o Paquistão.1010 Lindenbaum J, Kent TH, Sprinz H. Malabsorption and jejunitis in American Peace Corps volunteers in Pakistan. Ann Intern Med. 1966;65:1201-9. Há décadas observou-se, também, que a intensidade da enteropatia ambiental oscilava ao longo do tempo.

Na década de 1980 sugeriu-se definir enteropatia ambiental como um conjunto de alterações inespecíficas do intestino delgado, morfológicas e funcionais, com ou sem exteriorização clínica, que apresentam, potencialmente, reversão espontânea com a mudança para ambiente com boas condições de salubridade.33 Morais MB [Dissertation] Capacidade de absorção da D-xilose em duas comunidades brasileiras: crianças da periferia da cidade de São Paulo e crianças índias do Alto Xingu. Escola Paulista de Medicina; 1984. Nesse contexto, enteropatia ambiental foi considerada uma doença da sociedade que compromete a saúde e qualidade de vida de crianças e adultos que vivem em condições ambientais aquém da dignidade merecida por todos os componentes de uma sociedade civilizada.1111 Fagundes Neto U. Enteropatia ambiental. Rio de Janeiro: Revinter; 1996.

Nessa época, de acordo com os conhecimentos existentes, era muito difícil vincular as anormalidades da morfologia e função intestinal especificamente com a enteropatia ambiental, uma vez que, frequentemente, ocorria a coexistência com outros problemas comuns das populações que vivem em condições desfavoráveis, como dieta inapropriada quanto a macro e micronutrientes, desnutrição energético-proteica, parasitoses intestinais e surtos repetidos de diarreia aguda e persistente. Apesar de suspeitado, no século XX nunca ficou claro o efeito negativo da má absorção intestinal da enteropatia ambiental no comprometimento do crescimento linear.1212 Brown KH, Khatun M, Ahmed G. Relationship of the xylose absorption status of children in Bangladesh to their absorption of macronutrients from local diets. Am J Clin Nutr. 1981;34:1540-7.

Na década de 1990, consolidava-se a ideia de que a exposição repetida a agentes microbianos do ambiente, em geral de natureza bacteriana, tinha potencial de comprometer a saúde intestinal e constituía o fator mais importante na geração da enteropatia ambiental.22 Klipstein FA. Recent advances in tropical malabsorption. Scand J Gastroenterol Suppl. 1970;6:93-114.,33 Morais MB [Dissertation] Capacidade de absorção da D-xilose em duas comunidades brasileiras: crianças da periferia da cidade de São Paulo e crianças índias do Alto Xingu. Escola Paulista de Medicina; 1984.,55 Louis-Auguste J, Kelly P. Tropical enteropathies. Curr Gastroenterol Rep. 2017;19:29-37.,88 Watanabe K, Petri WA. Environmental enteropathy: elusive but significant subclinical abnormalities in developing countries. EBioMedicine. 2016;10:25-32. Poderiam ocorrer, associadamente, modificações na microbiota do intestino proximal, que levariam ao sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado. Considerando que, a exemplo da obtenção de biópsia de intestino delgado, a coleta de fluido enteral para análise microbiológica é um procedimento invasivo, passou a ser empregado o teste respiratório do hidrogênio no ar expirado como uma opção não invasiva para a caracterização de sobrecrescimento bacteriano.1313 Pereira SP, Khin-Maung U, Bolin TD, Duncombe VM, Nyunt NW, Myo K, et al. A pattern of breath hydrogen excretion suggesting small bowel bacterial overgrowth in Burmese village children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 1991;13:32-8.

14 Donowitz JR, Petri WA. Pediatric small intestine bacterial overgrowth in low-income countries. Trends Mol Med. 2015;21:6-15.

15 Sieczkowska A, Landowski P, Kamińska B, Lifschitz C. Small bowel bacterial overgrowth in children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2016;62:196-207.
-1616 Denno DM, Van Buskirk KM, Nelson ZC, Musser CA, Tarr PI. Environmental enteric dysfunction: advancing current knowledge. St. Louis, MO: Washington University Libraries; 2016, http://dx.doi.org/10.7936/K7WQ0228 [cited 09.11.18].
http://dx.doi.org/10.7936/K7WQ0228...

A partir da década de 1990, até o presente momento, têm sido pesquisados outros indicadores para a caracterização da enteropatia ambiental, destaca-se o teste da permeabilidade intestinal da lactulose e manitol. O teste de absorção da D-xilose, apesar de exequível, foi praticamente abandonado.44 Morais MB, Fagundes Neto U. Enteropatia ambiental. Estud Av. 2003;17:137-149.,55 Louis-Auguste J, Kelly P. Tropical enteropathies. Curr Gastroenterol Rep. 2017;19:29-37.,88 Watanabe K, Petri WA. Environmental enteropathy: elusive but significant subclinical abnormalities in developing countries. EBioMedicine. 2016;10:25-32.

Em 2013, foi proposta a denominação disfunção entérica ambiental como sinônimo do termo enteropatia ambiental.1717 Keusch GT, Rosenberg IH, Denno DM, Duggan C, Guerrant RL, Lavery JV, et al. Implications of acquired environmental enteric dysfunction for growth and stunting in infants and children living in low- and middle-income countries. Food Nutr Bull. 2013;34:357-64. Ampliou-se, também, o interesse na disfunção entérica ambiental em função de sua associação com o déficit de crescimento linear (stunting) observado com frequência em crianças que vivem em condições socioambientais desfavoráveis. Passou-se a valorizar o potencial da disfunção entérica ambiental no comprometimento do pleno crescimento, que ocorre com maior celeridade nos primeiros anos de vida. No entanto, deve ser destacado que a disfunção entérica ambiental pode ocorrer em qualquer faixa etária.1818 Owino V, Ahmed T, Freemark M, Kelly P, Loy A, Manary M, et al. Environmental enteric dysfunction and growth failure/stunting in global child health. Pediatrics. 2016;138:e20160641.

19 Millward DJ. Nutrition, infection and stunting: the roles of deficiencies of individual nutrients and foods, and of inflammation, as determinants of reduced linear growth of children. Nutr Res Rev. 2017;30:50-72.
-2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205.

O objetivo desta revisão é descrever os indicadores atuais da disfunção entérica ambiental e sua relação com déficit de crescimento linear e com o indicador antropométrico estatura-idade.

Métodos

Para esta revisão narrativa foram identificados artigos na base de dados no PubMed e Scopus com o uso das combinações das seguintes palavras: environmental, enteric, dysfunction, enteropathy e growth. Foram considerados não somente artigos originais como também artigos de revisão. Foram usadas, também, referências dos artigos selecionados e dos arquivos dos próprios autores.

Resultados

Disfunção entérica ambiental e outras enteropatias

Define-se, atualmente, disfunção entérica ambiental como uma doença subclínica adquirida, reversível, associada com atrofia parcial das vilosidades intestinais, aumento da profundidade das criptas e infiltrado de linfócitos T na lâmina própria e no epitélio do intestino delgado consequente à exposição repetida do intestino a patógenos exógenos.1717 Keusch GT, Rosenberg IH, Denno DM, Duggan C, Guerrant RL, Lavery JV, et al. Implications of acquired environmental enteric dysfunction for growth and stunting in infants and children living in low- and middle-income countries. Food Nutr Bull. 2013;34:357-64.,2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205.,2121 Ali A, Iqbal NT, Sadiq K. Environmental enteropathy. Curr Opin Gastroenterol. 2016;32:12-7. Associa-se, também, com aumento da permeabilidade intestinal e influxo de elementos inflamatórios através do epitélio intestinal.2222 Attia S, Feenstra M, Swain N, Cuesta M, Bandsma RHJ. Starved guts: morphologic and functional intestinal changes in malnutrition. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2017;65:491-5.

Por sua vez, sprue tropical caracteriza-se por acometimento mais extenso do intestino delgado, inclusive da porção terminal. As descrições mais frequentes são procedentes do Caribe e do Sudeste da Ásia. No passado, era confundido com a enteropatia tropical (ambiental). mas, posteriormente, ficou claro que se tratava de doenças diferentes. Ao contrário da disfunção entérica ambiental, o sprue tropical manifesta-se por diarreia grave associada a emagrecimento abrupto. No passado, era valorizada a presença de esteatorreia e má absorção de vitamina B12. Não existe um indicador laboratorial específico para seu diagnóstico como os marcadores sorológicos da doença celíaca.33 Morais MB [Dissertation] Capacidade de absorção da D-xilose em duas comunidades brasileiras: crianças da periferia da cidade de São Paulo e crianças índias do Alto Xingu. Escola Paulista de Medicina; 1984.,55 Louis-Auguste J, Kelly P. Tropical enteropathies. Curr Gastroenterol Rep. 2017;19:29-37.

No presente, a forma mais comum de desnutrição energético-proteica crônica é o déficit de crescimento linear com escore-z de estatura-idade inferior a -2,0 desvios-padrão (stunting). Considera-se que a disfunção entérica ambiental seja um dos fatores determinantes do stunting. Por outro lado, a desnutrição energético-proteica aguda com expressivo déficit ponderal pode acarretar processo diarreico secundário à atrofia das vilosidades intestinais e inflamação sistêmica. Essas lesões são encontradas, também, no kwashiorkor. Nessas crianças, é difícil a reversão da desnutrição e o risco de morte é elevado.55 Louis-Auguste J, Kelly P. Tropical enteropathies. Curr Gastroenterol Rep. 2017;19:29-37. Além da enteropatia da desnutrição energético-proteica e do sprue tropical, outras enteropatias devem ser diferenciadas da disfunção entérica ambiental, como doença celíaca, enteropatia autoimune, enteropatia induzida por anti-inflamatórios não hormonais, entre outras.55 Louis-Auguste J, Kelly P. Tropical enteropathies. Curr Gastroenterol Rep. 2017;19:29-37.

Papel dos biomarcadores na disfunção entérica ambiental

Até o momento os critérios para o diagnóstico da disfunção entérica ambiental ainda não estão estabelecidos. O fato de os sinais e sintomas serem compartilhados por diversas doenças torna a busca por biomarcadores de patogenicidade um desafio. As mesmas alterações observadas na disfunção entérica ambiental (aumento de permeabilidade intestinal, lesão dos enterócitos, inflamação da mucosa) estão presentes, também, em doenças relativamente comuns na mesma faixa etária: doença inflamatória intestinal, doença celíaca, alergia alimentar e até em alguns casos da síndrome do intestino irritável, na qual predomina a inflamação da mucosa.2323 Prendergast AJ, Humphrey JH, Mutasa K, Majo FD, Rukobo S, Govha M, et al. Assessment of environmental enteric dysfunction in the SHINE trial: methods and challenges. Clin Infect Dis. 2015;61:S726-32.,2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768.

Para facilitar o entendimento e orientar a interpretação dos biomarcadores associados à disfunção entérica ambiental têm sido propostas diferentes abordagens com o objetivo de avaliar: a) dano e reparo da mucosa intestinal; b) permeabilidade intestinal; c) absorção; d) translocação bacteriana; e) inflamação da mucosa intestinal e sistêmica.

Um biomarcador ideal seria o que tivesse especificidade alta, o que permitiria o refinamento diagnóstico. Devido à complexidade da interação de fatores envolvidos, esse biomarcador ainda não está disponível. No entanto, se for possível identificar a alteração fisiopatológica que está na base do processo, é possível identificar a disfunção intestinal na sua fase inicial, subclínica, e em um momento no qual as intervenções possam ser iniciadas com maior chance de serem efetivas. Do ponto de vista teórico, o estudo histopatológico seria o padrão-ouro. No entanto, a feitura de um procedimento invasivo (biopsia intestinal) é um fator limitante.2323 Prendergast AJ, Humphrey JH, Mutasa K, Majo FD, Rukobo S, Govha M, et al. Assessment of environmental enteric dysfunction in the SHINE trial: methods and challenges. Clin Infect Dis. 2015;61:S726-32.,2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768.

Considerando que as alterações teciduais se correlacionam com o aumento da permeabilidade intestinal, a feitura de um teste diagnóstico capaz de aferi-la é útil na clínica. Nesse contexto, o teste lactulose/manitol tem bom desempenho, embora apresente algumas dificuldades de interpretação, principalmente em crianças e quando existe associação com sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado e/oudisbiose. A falta de padronização e de estudos de validação em relação à técnica e a ausência de padrão de referência são dificuldades que ainda precisam ser sanadas.2525 Lifschitz C, Sieczkowska A. New insights into the fecal microbiota of children living in a slum: association with small bowel bacterial overgrowth. J Pediatr (Rio J). 2018;94:455-7.,2626 Denno DM, VanBuskirk K, Nelson ZC, Musser CA, Hay Burgess DC, Tarr PI. Use of the lactulose to mannitol ratio to evaluate childhood environmental enteric dysfunction: a systematic review. Clin Infect Dis. 2014;59:S213-9. As dificuldades incluem necessidade de jejum, coleta completa de urina por período prolongado e a dosagem da lactulose e manitol, que requer a disponibilidade de procedimentos laboratoriais complexos.88 Watanabe K, Petri WA. Environmental enteropathy: elusive but significant subclinical abnormalities in developing countries. EBioMedicine. 2016;10:25-32.

Em condições normais, o manitol é absorvido no intestino delgado, enquanto que lactulose é minimamente absorvida pelos humanose. Portanto, permanece na luz intestinal, onde sofre fermentação bacteriana. Logo, se há comprometimento de área intestinal há redução na absorção do monossacarídeo e consequentemente redução na sua excreção urinária. Por outro lado, se há aumento da permeabilidade intestinal, a lactulose também pode chegar à corrente sanguínea e também ser excretada pelo rim.2323 Prendergast AJ, Humphrey JH, Mutasa K, Majo FD, Rukobo S, Govha M, et al. Assessment of environmental enteric dysfunction in the SHINE trial: methods and challenges. Clin Infect Dis. 2015;61:S726-32.,2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768.

Revisão sistemática a partir de estudos originários de diversas regiões mostrou que quando é alta a probabilidade de ocorrência da disfunção entérica ambiental, o teste da lactulose/manitol alterado apresenta boa associação com a presença de stunting. Dessa forma, tem sido usado não somente como um marcador da doença, mas como parâmetro para avaliar efetividade das intervenções.2626 Denno DM, VanBuskirk K, Nelson ZC, Musser CA, Hay Burgess DC, Tarr PI. Use of the lactulose to mannitol ratio to evaluate childhood environmental enteric dysfunction: a systematic review. Clin Infect Dis. 2014;59:S213-9. Na tabela 1 são apresentados os principais biomarcadores que têm sido pesquisados na disfunção entérica ambiental.2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205.,2323 Prendergast AJ, Humphrey JH, Mutasa K, Majo FD, Rukobo S, Govha M, et al. Assessment of environmental enteric dysfunction in the SHINE trial: methods and challenges. Clin Infect Dis. 2015;61:S726-32.,2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768.,2727 Kosek M, Guerrant RL, Kang G, Bhutta Z, Yori PP, Gratz J, et al. Assessment of environmental enteropathy in the MAL-ED cohort study: theoretical and analytic framework. Clin Infec Dis. 2014;59:S239-47.

Tabela 1
Métodos propostos para a avaliação da disfunção entérica ambiental

A alfa-1-antitripsina (AAT) tem a função de proteger as células dos efeitos deletérios de enzimas proteolíticas liberadas por neutrófilos estimulados. Essa proteína não é sintetizada no intestino e sua presença nas fezes reflete aumento da permeabilidade intestinal e perda proteica secundária à inflamação da mucosa. A calprotectina fecal, uma proteína presente no citoplasma dos neutrófilos, é detectada nas fezes quando existe processo inflamatório ativo. Presença de altas concentrações de zonulina nas fezes também sugere aumento da permeabilidade intestinal, uma vez que sua função é modular as junções entre os enterócitos.2323 Prendergast AJ, Humphrey JH, Mutasa K, Majo FD, Rukobo S, Govha M, et al. Assessment of environmental enteric dysfunction in the SHINE trial: methods and challenges. Clin Infect Dis. 2015;61:S726-32.,2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768.,2727 Kosek M, Guerrant RL, Kang G, Bhutta Z, Yori PP, Gratz J, et al. Assessment of environmental enteropathy in the MAL-ED cohort study: theoretical and analytic framework. Clin Infec Dis. 2014;59:S239-47.

A citrulina é um aminoácido produzido pelos enterócitos e seus níveis são baixos quando há achatamento das vilosidades e consequente redução de área intestinal. GLP-2 (Glucagon-likepeptide 2) é um fator trófico importante na reparação das células intestinais, estimula o crescimento das vilosidades intestinais, a integridade da barreira mucosa e as funções absortivas e tem papel anti-inflamatório, reduz a inflamação da mucosa intestinal.2323 Prendergast AJ, Humphrey JH, Mutasa K, Majo FD, Rukobo S, Govha M, et al. Assessment of environmental enteric dysfunction in the SHINE trial: methods and challenges. Clin Infect Dis. 2015;61:S726-32.,2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768.,2727 Kosek M, Guerrant RL, Kang G, Bhutta Z, Yori PP, Gratz J, et al. Assessment of environmental enteropathy in the MAL-ED cohort study: theoretical and analytic framework. Clin Infec Dis. 2014;59:S239-47.

Como biomarcadores de translocação bacterina têm sido estudados dois componentes estruturais bacterianos, o lipo-olissacarídeo (LPS) e a flagelina. Como uma das explicações para a presença da inflamação é a exposição sistêmica ao LPS, o Endocab mede essa exposição e está aumentado quando há aumento da permeabilidade intestinal e endotoxemia secundária à inflamação. Outros marcadores da inflamação que têm despertado interesse são a mieloperoxidase (MPO) - uma enzima presente no citoplasma dos neutrófilos - e a neopterina (NEO), que é produzida por macrófagos e células dendríticas.2323 Prendergast AJ, Humphrey JH, Mutasa K, Majo FD, Rukobo S, Govha M, et al. Assessment of environmental enteric dysfunction in the SHINE trial: methods and challenges. Clin Infect Dis. 2015;61:S726-32.,2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768.,2727 Kosek M, Guerrant RL, Kang G, Bhutta Z, Yori PP, Gratz J, et al. Assessment of environmental enteropathy in the MAL-ED cohort study: theoretical and analytic framework. Clin Infec Dis. 2014;59:S239-47.

O projeto BEED (Bangladesh Environmental EntericDysfunction)2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768. tem o objetivo de comparar o desempenho de diferentes biomarcadores frequentemente usados na pesquisa de disfunção entérica ambiental em relação ao exame histopatológico da mucosa do intestino delgado, considerado o padrão-ouro. O projeto ainda está em andamento e recrutou 400 crianças com stunting e 400 crianças em risco de apresentar retardo de crescimento linear. Uma das expectativas é a criação de um escore que permita refinar o diagnóstico. Uma das dificuldades é que ainda não foi identificado um padrão típico de alterações histológicas da biopsia do intestino delgado que permita definir o padrão-ouro para diagnóstico da disfunção entérica ambiental.2424 Mahfuz M, Das S, Mazumder RN, Masudur RM, Haque R, Bhuiyan MM, et al. Bangladesh Environmental Enteric Dysfunction (BEED) study: protocol for a community-based intervention study to validate non-invasive biomarkers of environmental enteric dysfunction. BMJ Open. 2017;7:e017768.

Em outro estudo feito na mesma região geográfica com alto risco de disfunção entérica ambiental, que envolveu cerca de 180 lactentes no segundo ano de vida, foi avaliada a concordância entre o teste da lactulose:manitol com um conjunto de biomarcadores indicativos de comprometimento da estrutura da mucosa intestinal e inflamação sistêmica. Os resultados foram desanimadores e concluiu-se que a existência de outros fatores que podem comprometer a permeabilidade intestinal pode explicar a dificuldade para a interpretação dos testes. Diante da complexidade dos mecanismos patogênicos envolvidos na gênese da disfunção entérica ambiental, ressalta-se a necessidade de se buscar marcadores com maior especificidade.2828 Campbell RK, Schulze KJ, Shaikh S, Mehra S, Ali H, Wu L, et al. Biomarkers of environmental enteric dysfunction among children in rural Bangladesh. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2017;65:40-6.

Portanto, ainda não se encontrou um biomarcador ou conjunto de biomarcadores que tenha se mostrado preciso para refinar a probabilidade diagnóstica em um paciente com suspeita clínica de disfunção entérica ambiental. Como os mecanismos fisiopatogênicos e a fisiopatologia são comuns a várias outras doenças, pode-se especular que esse problema não terá solução em curto prazo.

Disfunção entérica ambiental e crescimento

A estatura final dos seres humanos depende basicamente do genótipo e dos fatores ambientais que influenciam o crescimento.1818 Owino V, Ahmed T, Freemark M, Kelly P, Loy A, Manary M, et al. Environmental enteric dysfunction and growth failure/stunting in global child health. Pediatrics. 2016;138:e20160641.,1919 Millward DJ. Nutrition, infection and stunting: the roles of deficiencies of individual nutrients and foods, and of inflammation, as determinants of reduced linear growth of children. Nutr Res Rev. 2017;30:50-72. Mesmo após a redução na sua prevalência, stunting continua a ser um importante problema de saúde pública, presente, praticamente, em todas as regiões do mundo.2929 Black RE, Victora CG, Walker SP, Bhutta ZA, Christian P, de Onis M, et al. Maternal and child undernutrition and overweight in low-income and middle-income countries. Lancet. 2013;382:427-51. No Brasil, constatou-se expressiva redução na prevalência do stunting, que diminuiu de 37% em 1974 para 7% em 2007 nas crianças menores de cinco anos.3030 Monteiro CA, Benicio MH, Conde WL, Konno S, Lovadino AL, Barros AJ, et al. Narrowing socioeconomic inequality in child stunting: the Brazilian experience, 1974-2007. Bull World Health Organ. 2010;88:305-11. Entretanto, no mundo, estima-se que aproximadamente 25% das crianças nos primeiros cinco anos de vida apresentam déficit de estatura (stunting), caracterizado por escore-z inferior a -2,0 desvios-padrão em relação à curva de crescimento da Organização Mundial da Saúde, principalmente na África e no Sudeste da Ásia.1818 Owino V, Ahmed T, Freemark M, Kelly P, Loy A, Manary M, et al. Environmental enteric dysfunction and growth failure/stunting in global child health. Pediatrics. 2016;138:e20160641.,1919 Millward DJ. Nutrition, infection and stunting: the roles of deficiencies of individual nutrients and foods, and of inflammation, as determinants of reduced linear growth of children. Nutr Res Rev. 2017;30:50-72.

O mecanismo de desenvolvimento do déficit de estatura é complexo e não está plenamente esclarecido. Considera-se que déficits de nutrientes na vida intrauterina e pós-natal possam contribuir para o seu desenvolvimento. Nos últimos anos, tem sido valorizado, também, o papel da disfunção entérica ambiental no aparecimento do déficit de crescimento linear.1818 Owino V, Ahmed T, Freemark M, Kelly P, Loy A, Manary M, et al. Environmental enteric dysfunction and growth failure/stunting in global child health. Pediatrics. 2016;138:e20160641.,1919 Millward DJ. Nutrition, infection and stunting: the roles of deficiencies of individual nutrients and foods, and of inflammation, as determinants of reduced linear growth of children. Nutr Res Rev. 2017;30:50-72.

No passado, suspeitava-se que a má absorção intestinal subclínica observada na disfunção entérica ambiental era o mecanismo mais importante para o comprometimento do estado nutricional e do crescimento. Mais recentemente, tem sido valorizado não somente o acometimento do intestino delgado como também a ocorrência de inflamação sistêmica. A inflamação sistêmica pode ser secundária ao aumento da permeabilidade intestinal, que permite translocação bacteriana e/ou passagem de substância com potencial de gerar resposta inflamatória. Outro aspecto são as mudanças na microbiota intestinal. Assim, recentemente, foram apresentados os seguintes mecanismos para explicar a interferência da disfunção entérica ambiental no crescimento: 1. aumento da permeabilidade intestinal, 2. translocação bacteriana; 3. inflamação intestinal; 4. inflamação sistêmica; 5. disbiose, 6. má absorção de nutrientes.1818 Owino V, Ahmed T, Freemark M, Kelly P, Loy A, Manary M, et al. Environmental enteric dysfunction and growth failure/stunting in global child health. Pediatrics. 2016;138:e20160641.

Recente revisão sistemática da literatura analisou as publicações entre 2010 e 2018 que relacionaram os indicadores de disfunção entérica ambiental com déficit de crescimento ou estatura.2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205. Dos cinco artigos publicados que analisaram os indicadores de lesão e ou reparação do intestino delgado (citrulina, proteína ligadora de ácidos graxos intestinais [intestinal fatty acid binding protein], proteínas regeneradoras [regenerating family proteins, REG] e GLP-2 [glucagon-likepeptide 2]), apenas dois identificaram relação positiva entre disfunção entérica ambiental e déficit de crescimento.2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205. Com relação à análise dos dez artigos que avaliaram a permeabilidade intestinal (relação lactulose/manitol ou ramnose; percentagem de absorção de lactulose, zonulina, claudulina-4 e 15), constatou-se associação entre aumento da permeabilidade intestinal com déficit de crescimento em metade das publicações.2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205. Por sua vez, dos 11 estudos que avaliaram indicadores de translocação bacteriana (anticorpo antilipolissacarídeo [LPS] e anticorpo antiflagelina), apenas quatro mostraram associação com comprometimento do crescimento linear. Resultados semelhantes foram encontrados em relação aos indicadores de inflamação no intestino (mieloperoxidade, neopterina e alfa-1-antitripsina), ou seja, ausência de relação entre o crescimento linear e inflamação em quatro das cinco publicações.2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205. Em relação aos indicadores de inflamação sistêmica (citocinas, proteína C reativa, ferritina, entre outros), também foram encontradas informações conflitantes. A tentativa de relacionar os diferentes indicadores de disfunção entérica ambiental não mostrou associação relevante.2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205. Portanto, até o presente momento, não é possível escolher um marcador não invasivo que permita o estabelecimento do diagnóstico da disfunção entérica ambiental com precisão e definir sua relação com a ocorrência de déficit do crescimento linear.2020 Harper KM, Mutasa M, Prendergast AJ, Humphrey J, Manges AR. Environmental enteric dysfunction pathways and child stunting: a systematic review. PLoS Negl Trop Dis. 2018;12:e0006205.

No que se refere às mudanças na microbiota intestinal na disfunção entérica ambiental, a maior parte dos estudos avalia o sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado e a composição da microbiota fecal. Atualmente, o estudo microbiológico da secreção duodenal é o método mais preciso para avaliar sobrecrescimento bacteriano do intestino delgado. No entanto, considerando a complexidade da coleta e do processamento das amostras, o teste respiratório no ar expirado tem sido usado na pesquisa de sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado por não ser invasivo e ter menor custo.1414 Donowitz JR, Petri WA. Pediatric small intestine bacterial overgrowth in low-income countries. Trends Mol Med. 2015;21:6-15.,1515 Sieczkowska A, Landowski P, Kamińska B, Lifschitz C. Small bowel bacterial overgrowth in children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2016;62:196-207. Estudo feito no sul da Ásia avaliou 430 crianças com idade inferior a cinco anos e revelou sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado em 12,5% das crianças no primeiro ano de vida e cerca de 30% nos anos subsequentes. A distribuição do sobrecrescimento bacteriano em relação à idade foi semelhante à observada no número de episódios de diarreia aguda.1313 Pereira SP, Khin-Maung U, Bolin TD, Duncombe VM, Nyunt NW, Myo K, et al. A pattern of breath hydrogen excretion suggesting small bowel bacterial overgrowth in Burmese village children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 1991;13:32-8.

No Brasil, foi usado o teste respiratório para pesquisa de sobrecrescimento bacteriano em crianças em idade escolar que viviam em condições ambientais desfavoráveis. Em 2007, foi publicado um estudo feito com 50 crianças entre cinco e 11 anos estudadas em uma favela no interior do Estado de São Paulo.3131 dos Reis JC, de Morais MB, Oliva CA, Fagundes-Neto U. Breath hydrogen test in the diagnosis of environmental enteropathy in children living in an urban slum. Dig Dis Sci. 2007;52:1253-8. Os resultados foram comparados com os obtidos no grupo controle constituído em uma escola particular da mesma cidade. Foram usados o teste respiratório com dois substratos: glicose e lactulose. A glicose não revelou produção expressiva de hidrogênio nas crianças que viviam na favela em relação aos controles. Por sua vez, sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado foi mais prevalente nas crianças da favela (37,5%) dos que nos controles (2,1%, p < 0,001).3131 dos Reis JC, de Morais MB, Oliva CA, Fagundes-Neto U. Breath hydrogen test in the diagnosis of environmental enteropathy in children living in an urban slum. Dig Dis Sci. 2007;52:1253-8. A média do escore z de estatura-idade das crianças controles (+ 0,19 ± 0,84) foi maior (p < 0,05) do que nas crianças da favela com (-0,63 ± 0,91) ou sem (-0,81 ± 1,19) sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado. Na favela, o sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado não se associou com maior comprometimento da estatura. Outros dois estudos foram feitos em momentos diferentes em favela da região metropolitana da cidade de São Paulo.3232 Mello CS, Tahan S, Melli LC, Rodrigues MS, de Mello RM, Scaletsky IC, et al. Methane production and small intestinal bacterial overgrowth in children living in a slum. World J Gastroenterol. 2012;18:5932-9.,3333 Mello CS, Rodrigues MS, Araújo-Filho HB, Melli LC, Tahan S, Pignatari AC, et al. Fecal microbiota analysis of children with small intestinal bacterial overgrowth among residents of an urban slum in Brazil. J Pediatr (Rio J). 2018;94:483-90. Os dados foram comparados com os de crianças de bom nível socioeconômico recrutadas em escola particular da mesma região. No primeiro, constatou-se maior prevalência de sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado das crianças moradoras na favela (30,9%) do que na escola particular (2,4%; p = 0,0007). Nas crianças moradoras na favela, os indicadores antropométricos foram semelhantes nas crianças com e sem sobrecrescimento bacteriano. Por outro lado, foram inferiores aos da criança da escola particular, inclusive a estatura.3232 Mello CS, Tahan S, Melli LC, Rodrigues MS, de Mello RM, Scaletsky IC, et al. Methane production and small intestinal bacterial overgrowth in children living in a slum. World J Gastroenterol. 2012;18:5932-9. Na segunda pesquisa constatou-se sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado em 61,0% das 100 crianças avaliadas em uma favela.3333 Mello CS, Rodrigues MS, Araújo-Filho HB, Melli LC, Tahan S, Pignatari AC, et al. Fecal microbiota analysis of children with small intestinal bacterial overgrowth among residents of an urban slum in Brazil. J Pediatr (Rio J). 2018;94:483-90. Foi verificada menor média do escore-z do índice estatura para idade (-0,48 ± 0,90vs. -0,11 ± 0,97) e de hemoglobina capilar (12,6 ± 1,0 vs. 13,4 ± 1,2 g/dL) no grupo de crianças com sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado, quando comparadas com aquelas que não apresentavam sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado (p < 0,05).3333 Mello CS, Rodrigues MS, Araújo-Filho HB, Melli LC, Tahan S, Pignatari AC, et al. Fecal microbiota analysis of children with small intestinal bacterial overgrowth among residents of an urban slum in Brazil. J Pediatr (Rio J). 2018;94:483-90. Infelizmente, neste estudo, não foram avaliados os indicadores de inflamação sistêmica.

O desenvolvimento de sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado em moradores de áreas com condições ambientais insatisfatórias foi atribuído à inibição do complexo inibidor migratório secundário à exposição repetida do tubo digestivo a lipopolissacarídeos (LPS) através da ingestão de água ou do solo contaminado com bactérias.1414 Donowitz JR, Petri WA. Pediatric small intestine bacterial overgrowth in low-income countries. Trends Mol Med. 2015;21:6-15. Diminuição do peristaltismo aumenta o tempo de trânsito e facilita a proliferação microbiana. Essa hipótese apoia-se em modelos animais nos quais se mostrou diminuição da frequência e vigor das contrações peristálticas no intestino delgado induzida pelo LPS produzido pela Escherichia coli. Adicionalmente, em camundongos livres de micro-organismos (germ-freemice), o Lactobacillus acidophilus e o Bifidobactrium bifidus provocam aumento no complexo inibidor migratório, enquanto o Micrococcusluteus e a Escherichia coli diminuem. São poucas as evidências de efetivo comprometimento do estado nutricional vinculado ao sobrecrescimento bacteriano do intestino delgado. No Brasil, constatou-se que, em crianças moradoras em uma favela entre cinco e 11 anos, as que apresentavam sobrecrescimento bacteriano apresentavam menores valores do escore z de estatura-idade.3333 Mello CS, Rodrigues MS, Araújo-Filho HB, Melli LC, Tahan S, Pignatari AC, et al. Fecal microbiota analysis of children with small intestinal bacterial overgrowth among residents of an urban slum in Brazil. J Pediatr (Rio J). 2018;94:483-90. Esses dados podem ser explicados pela má absorção intestinal, conforme caracterizado na década de 1990, em uma comunidade de Burma/Myanmar.3434 Bolin TD, Duncombe VM, Pereira SP, et al. Epidemiology of small bowel bacterial overgrowth and rice carbohydrate malabsorption in Burmese (Myanmar) village children. Am J Trop Med Hyg. 1992;47:298-304.,3535 Khin-Maung-U, Pereira SP, Bolin TD, Duncombe VM, Myo-Khin,Nyunt-Nyunt-Wai, et al. Malabsorption of carbohydrate from rice and child growth: a longitudinal study with the breath-hydrogen test in Burmese village children. Am J Clin Nutr. 1990;52:348-52. Constatou-se, com o teste do hidrogênio no ar expirado, menor absorção de uma refeição-teste com arroz nas crianças com sobrecrescimento bacteriano do intestino delgado. Constataram, longitudinalmente, que a velocidade de crescimento em estatura das crianças com má absorção de arroz foi menor.3434 Bolin TD, Duncombe VM, Pereira SP, et al. Epidemiology of small bowel bacterial overgrowth and rice carbohydrate malabsorption in Burmese (Myanmar) village children. Am J Trop Med Hyg. 1992;47:298-304.,3535 Khin-Maung-U, Pereira SP, Bolin TD, Duncombe VM, Myo-Khin,Nyunt-Nyunt-Wai, et al. Malabsorption of carbohydrate from rice and child growth: a longitudinal study with the breath-hydrogen test in Burmese village children. Am J Clin Nutr. 1990;52:348-52. Esse é o único estudo longitudinal que mostra que o sobrecrescimento bacteriano pode comprometer o crescimento.

Outro possível mecanismo para explicar o efeito do sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado é o aumento da permeabilidade intestinal.1414 Donowitz JR, Petri WA. Pediatric small intestine bacterial overgrowth in low-income countries. Trends Mol Med. 2015;21:6-15. Assim, pode ocorrer comprometimento funcional da junção firme entre enterócitos com consequente endotoxemia e inflamação sistêmica. Deve ser lembrado o papel da microbiota intestinal no estado de homeostaseintestinal. É bem conhecido que a microbiota regula não somente a barreira intestinal, como também a função imunológica intestinal, interage de maneira complexa, resulta na manutenção de um nível basal mínimo de inflamação e controla a ocorrência de resposta inflamatória plena.1414 Donowitz JR, Petri WA. Pediatric small intestine bacterial overgrowth in low-income countries. Trends Mol Med. 2015;21:6-15.

Do ponto de vista microbiológico, a microbiota fecal de crianças e adultos de Bangladesh que vivem em favelas onde a enteropatia ambiental é prevalente apresenta marcantes diferenças em relação moradores nos Estados Unidos da América.55 Louis-Auguste J, Kelly P. Tropical enteropathies. Curr Gastroenterol Rep. 2017;19:29-37. Amostras de um pequeno número (quatro a seis) de crianças e adultos foram avaliadas mensalmente por cerca de seis meses. Observou-se que a microbiota dos indivíduos de Bangladesh apresentava maior diversidade e menor estabilidade do que a observada nos americanos. Em relação aos americanos, as fezes da casuística de Bangladesh eram mais ricas em Prevotella, Butyrivibrio e Oscillospira e apresentavam maior abundância de Bacterioides.3636 Lin A, Bik EM, Costello EK, Dethlefsen L, Haque R, Relman DA, et al. Distinct distal gut microbiome diversity and composition in healthy children from Bangladesh and the United States. PLOS ONE. 2013;8:e53838. As diferenças da microbiota podem estar relacionadas com o tipo de dieta das comunidades que apresentam elevada prevalência de disfunção entérica ambiental, que, em geral, são ricas em amido e fibras alimentares e pobres em proteína e gordura de origem animal.55 Louis-Auguste J, Kelly P. Tropical enteropathies. Curr Gastroenterol Rep. 2017;19:29-37. Um exemplo é o estudo que comparou a microbiota de 11 crianças africanas de comunidades rurais de Burkina Faso, 13 em áreas urbanas do mesmo país e 13 de crianças italianas de Florença.3737 De Filippo C, Cavalieri D, Di Paola M, Ramazzotti M, Poullet JB, Massart S, et al. Impact of diet in shaping gut microbiota revealed by a comparative study in children from Europe and rural Africa. Proc Natl Acad Sci U S A. 2010;107:14691-14696.,3838 De Filippo C, Di Paola M, Ramazzotti M, Albanese D, Pieraccini G, Banci E, et al. Diet, environments, and gut microbiota. A preliminary investigation in children living in rural and urban Burkina Faso and Italy. Front Microbiol. 2017;8:1979. Observou-se que quando alimentos de origem animal e carboidratos simples são incluídos na dieta em áreas urbanas do país africano, a microbiota passa apresentar maior abundância de bactérias com maior capacidade para metabolizar esses alimentos, a exemplo do observado em crianças europeias. Esse processo se associa com redução na produção de ácidos graxos de cadeia curta pela microbiota intestinal. Crianças que vivem nas comunidades rurais permanecem com microbiota com maior riqueza de Prevotella, Treponema e Succinivibrio, que apresentam maior especificidade para alimentos de dieta rica em fibra alimentar e outros carboidratos complexos presentes em vegetais.3737 De Filippo C, Cavalieri D, Di Paola M, Ramazzotti M, Poullet JB, Massart S, et al. Impact of diet in shaping gut microbiota revealed by a comparative study in children from Europe and rural Africa. Proc Natl Acad Sci U S A. 2010;107:14691-14696.,3838 De Filippo C, Di Paola M, Ramazzotti M, Albanese D, Pieraccini G, Banci E, et al. Diet, environments, and gut microbiota. A preliminary investigation in children living in rural and urban Burkina Faso and Italy. Front Microbiol. 2017;8:1979.

Projeto feito na Região Metropolitana de São Paulo comparou a microbiota de 100 crianças em idade escolar moradoras em uma favela com a de 30 crianças que viviam em boas condições ambientais recrutadas em escola particular. Foi usada a técnica do PCR em tempo real para a quantificação dos filos, gêneros e espécies selecionadas. As crianças que viviam em condições desfavoráveis apresentam maior número de bactérias, organismos dos filos Firmicutes e Bacteroidetes, dos gêneros Escherichia e Lactobacillus e menores contagens de Salmonella. Observou-se também menor prevalência e contagens de Clostridium difficile. Comparativamente, especulou-se que a maior participação de Salmonella e Clostridium difficile possa representar aspectos negativos na microbiota das crianças que vivem em boas condições ambientais.3939 Mello CS, Carmo-Rodrigues MS, Filho HB, Melli LC, Tahan S, Pignatari AC, et al. Gut microbiota differences in children from distinct socioeconomic levels living in the same urban area in Brazil. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2016;63:460-5. É interessante mencionar que se constatou, também, maior quantidade da archea Methanobrevibacter smithii nas crianças moradoras na favela acompanhada de maior produção de metano caracterizada no ar expirado, o que indica diferente padrão de metabolismo bacteriano.4040 de Araujo Filho HB, Carmo-Rodrigues MS, Mello CS, Melli LC, Tahan S, Pignatari AC. Children living near a sanitary landfill have increased breath methane and Methanobrevibacter smithii in their intestinal microbiota. Archaea. 2014:576249. Nas crianças das favelas com sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado, segundo o teste respiratório com lactulose, constatou-se que a microbiota fecal apresentava menor contagem de bactérias e Firmicutes e maior contagem de bactérias do gênero Salmonella.

Entretanto, ainda existem muitas questões sobre o papel da microbiota no desenvolvimento da disfunção entérica ambiental, como a estabilidade do perfil da microbiota das crianças em risco de stunting, se existem particularidades na microbiota das crianças que vivem em países não industrializados que não apresentam stunting e se são possíveis intervenções para corrigir os eventuais desvios da microbiota intestinal.4141 Syed S, Ali A, Duggan C. Environmental enteric dysfunction in children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2016;63:6-14. Outra questão é sobre a validade de considerar a microbiota fecal como um indicador das anormalidades que ocorrem no intestino delgado, inclusive o sobrecrescimento bacteriano. Estudos com técnicas de biologia molecular poderão contribuir para o melhor entendimento da microbiota no intestino delgado proximal. Lembra-se, no entanto, a dificuldade e o caráter invasivo da coleta de amostras dessa porção do intestino, a exemplo da obtenção de fragmentos de tecido para os estudos histológicos.

Disfunção entérica ambiental e resposta à imunização oral

Existem evidências de que o estado inflamatório local e sistêmico descrito na disfunção entérica ambiental, além de ser a principal causa do stunting, pode também diminuir a resposta das vacinas orais.4242 Velasquez DE, Parashar UD, Jiang B. Strain diversity plays no major role in the varying efficacy of rotavirus vaccines: an overview. Infect Genet Evol. 2014;28:561-71.,4343 Parker EP, Ramani S, Lopman BA, Church JA, Iturriza-Gomara M, Prendergast AJ, et al. Causes of impaired oral vaccine efficacy in developing countries. Future Microbiol. 2018;13:97-118.

Nesse contexto, diminuição da resposta à vacina do rotavírus, vacina oral contra poliomielite e vacina atenuada da cólera observada principalmente na África e na Ásia tem sido associada com a disfunção entérica ambiental. Várias hipóteses têm sido levantadas para explicar o fenômeno, desde a heterogeneidade de cepas, o que dificultaria o desenvolvimento de uma vacina que tivesse o mesmo desempenho universalmente, até fatores associados ao hospedeiro e ao ambiente.4242 Velasquez DE, Parashar UD, Jiang B. Strain diversity plays no major role in the varying efficacy of rotavirus vaccines: an overview. Infect Genet Evol. 2014;28:561-71.,4343 Parker EP, Ramani S, Lopman BA, Church JA, Iturriza-Gomara M, Prendergast AJ, et al. Causes of impaired oral vaccine efficacy in developing countries. Future Microbiol. 2018;13:97-118. Em editorial recente,4444 Iturriza-Gómara MI, Cunliffe NA. The gut microbiome as possible key to understanding and improving rotavirus vaccine performance in high-disease burden settings. J Infect Dis. 2017;215:8-10. foi discutida a hipótese de que as características da microbiota intestinal, as alterações na mucosa intestinal decorrentes do processo inflamatório que afeta principalmente a resposta imunológica inata e o estado pró-inflamatório sistêmico poderiam estar envolvidos na resposta comprometida às vacinas orais documentada em crianças que vivem em regiões com más condições de higiene ambiental.

Estudos do tipo caso-controle aninhados em ensaios clínicos feitos em Gana e na Índia mostraram que a microbiota intestinal analisada antes de as crianças receberem a vacina do rotavírus era qualitativamente diferente entre as crianças que responderam e as que não responderam ao estímulo vacinal.4545 Harris VC, Armah G, Fuentes S, Korpela KE, Parashar U, Victor JC, et al. Significant correlation between the infant gut microbiome and rotavirus vaccine response in rural Ghana. J Infect Dis. 2017;215:34-41.,4646 Harris V, Alic A, Fuentes S, Korpelad K, Kazic M, Tatef J, et al. Rotavirus vaccine response correlates with the infant gut microbiota composition in Pakistan. Gut Microbes. 2018;9:93-101. Esses estudos também compararam a microbiota intestinal das crianças de Gana e da Índia respondedoras ao estímulo vacinal com um grupo de crianças alemãs e constataram que o perfil da microbiota dos dois grupos era semelhante. Por outro lado, a microbiota das crianças não respondedoras apresentava diferenças em relação às crianças alemãs.4545 Harris VC, Armah G, Fuentes S, Korpela KE, Parashar U, Victor JC, et al. Significant correlation between the infant gut microbiome and rotavirus vaccine response in rural Ghana. J Infect Dis. 2017;215:34-41.,4646 Harris V, Alic A, Fuentes S, Korpelad K, Kazic M, Tatef J, et al. Rotavirus vaccine response correlates with the infant gut microbiota composition in Pakistan. Gut Microbes. 2018;9:93-101. Esses achados não podem ser extrapolados para toda a população infantil que vive em ambientes contaminados, uma vez que essa hipótese não foi corroborada em outros contextos, nos quais a prevalência da disfunção entérica ambiental é elevada.4747 Parker EPK, Praharaj I, Zekavati A, Lazarus RP, Giri S, Operario DJ, et al. Influence of the intestinal microbiota on the immunogenicity of oral rotavirus vaccine given to infants in south India. Vaccine. 2018;36:264-72.

Artigo recente de revisão4848 Church JA, Parker EPK, Kosek MN, Kang G, Grassly NC, Kelly P, et al. Exploring the relationship between environmental enteric dysfunction and oral vaccine responses. Future Microbiol. 2018;13:1055-70. analisou os oito estudos feitos na África, Ásia e América do Sul com o objetivo de avaliar a resposta a vacinas orais em regiões onde é alta a frequência de disfunção entérica ambiental. Foram encontradas várias dificuldades para a interpretação integrada desses estudos, entre as quais: critérios diagnósticos diferentes para disfunção entérica ambiental, uso de biomarcadores que podem ser alterados por outras doenças e outras limitações na metodologia desses artigos. Assim, não foi possível chegar a conclusões substanciais. Dos oito artigos, quatro mostraram evidência de que a resposta vacinal foi menor em crianças com alta probabilidade de disfunção entérica ambiental, dois encontraram um resultado inverso, ou seja, maior imunogenicidade vacinal, e dois não encontraram relação estatisticamente significante. Concluem que embora seja plausível do ponto de vista biológico, ainda não há dados empíricos suficientes que permitam um posicionamento definitivo sobre a possibilidade de a disfunção entérica ambiental reduzir a responsividade das vacinas orais em regiões subdesenvolvidas.

No entanto, é importante registrar que esses resultados não devem desencorajar o uso dessas vacinas em populações de risco para disfunção entérica ambiental, porque mesmo que tenham menor efetividade, a imunização é capaz de proteger um número significativo de crianças e contribuir para redução de hospitalizações e mortes.4242 Velasquez DE, Parashar UD, Jiang B. Strain diversity plays no major role in the varying efficacy of rotavirus vaccines: an overview. Infect Genet Evol. 2014;28:561-71. Ou seja, esses dados devem ser considerados uma indicação da necessidade urgente de controle da disfunção entérica ambiental.

Disfunção entérica ambiental e desenvolvimento neurocognitivo

Estudos experimentais têm mostrado que o estado inflamatório pode induzir alterações neurocognitivas. Teoriza-se que, além do estado inflamatório, metabólitos associados à disbiose intestinal estimulam a produção de neurotransmissores que interferem no processo do desenvolvimento do cérebro. Em humanos, é mais difícil avaliar esse processo porque os processos inflamatórios podem estar associados a outros fatores, como déficit de micronutrientes (ferro), falta de estímulos ambientais, situação de pobreza e disbiose intestinal.88 Watanabe K, Petri WA. Environmental enteropathy: elusive but significant subclinical abnormalities in developing countries. EBioMedicine. 2016;10:25-32.

Um estudo multicêntrico intitulado MAL-ED (The Etiology, Risk Factors and Interactions of Enteric Infections and Malnutrition and the Consequences for Child Health and Development) acompanha uma coorte de 1.600 crianças recrutadas ao nascimento em oito países (África do Sul, Bangladesh, Brasil, Índia, Nepal, Paquistão, Peru e Tanzânia). Dados sobre exposições ambientais, inflamação intestinal, avaliação da permeabilidade intestinal, exposição a enteropatógenos, medidas periódicas da ingestão alimentar, inclusive micronutrientes, resposta às vacinas orais, desenvolvimento cognitivo e acompanhamento do crescimento, estão sendo analisados. Esse projeto permite estudar as consequências da disfunção entérica ambiental em diferentes contextos geográficos e epidemiológicos.2727 Kosek M, Guerrant RL, Kang G, Bhutta Z, Yori PP, Gratz J, et al. Assessment of environmental enteropathy in the MAL-ED cohort study: theoretical and analytic framework. Clin Infec Dis. 2014;59:S239-47. A figura 1 esquematiza a etiologia e consequências da disfunção entérica ambiental.

Figura 1
Disfunção entérica ambiental: origem e consequências.

Considerações finais

Até o presente momento não existe medida preventiva ou terapêutica plenamente efetiva para a disfunção entérica ambiental. Desde a década de 1970 existem evidências de que as anormalidades da disfunção entérica ambiental podem regredir com a melhoria das condições ambientais.99 Gerson CD, Kent TH, Saha JR, Siddiqi N, Lindenbaum J. Recovery of small-intestinal structure and function after residence in the tropics. II. Studies in Indians and Pakistanis living in New York City. Ann Intern Med. 1971;75:41- 8. Considerando que as exposições repetidas do intestino a agentes infecciosos constituem um dos mecanismos mais valorizados na gênese da disfunção entérica ambiental,2121 Ali A, Iqbal NT, Sadiq K. Environmental enteropathy. Curr Opin Gastroenterol. 2016;32:12-7. as medidas de prevenção e o tratamento da diarreia aguda podem ter um impacto importante na redução do problema.2121 Ali A, Iqbal NT, Sadiq K. Environmental enteropathy. Curr Opin Gastroenterol. 2016;32:12-7.,4949 Guerrant RL, De Boer MD, Moore SR, Scharf RJ, Lima AA. The impoverished gut - a triple burden of diarrhoea, stunting and chronic disease. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2013;10:220-9.,5050 Trehan I, Kelly P, Shaikh N, Manary MJ. New insights into environmental enteric dysfunction. Arch Dis Child. 2016;101:741-4.

Nesse contexto, valoriza-se não somente a distribuição de água tratada e saneamento, como também o aprimoramento da terapia de reidratação oral, suplementação com zinco e vitamina A.2121 Ali A, Iqbal NT, Sadiq K. Environmental enteropathy. Curr Opin Gastroenterol. 2016;32:12-7.,4949 Guerrant RL, De Boer MD, Moore SR, Scharf RJ, Lima AA. The impoverished gut - a triple burden of diarrhoea, stunting and chronic disease. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2013;10:220-9.,5050 Trehan I, Kelly P, Shaikh N, Manary MJ. New insights into environmental enteric dysfunction. Arch Dis Child. 2016;101:741-4.

O uso de antimicrobianos não absorvíveis não se acompanhou de normalização da permeabilidade intestinal aferida pelo teste da lactulose/manitol.2121 Ali A, Iqbal NT, Sadiq K. Environmental enteropathy. Curr Opin Gastroenterol. 2016;32:12-7. Por outro lado, constatou-se normalização do teste do hidrogênio no ar expirado com lactulose após a administração de antimicrobianos durante duas semanas para escolares com sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado que moravam em uma favela localizada em região metropolitana do Brasil.5151 Tahan S, Melli LC, Mello CS, Rodrigues MS, Bezerra Filho H, de Morais MB. Effectiveness of trimethoprim-sulfamethoxazole and metronidazole in the treatment of small intestinal bacterial overgrowth in children living in a slum. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2013;57:316-8. Tratamento do sobrecrescimento bacteriano do intestino delgado deve ser considerado, principalmente quando o paciente apresenta manifestações clínicas gastrintestinais.

Para finalizar, deve ser enfatizado que alterações do trato gastrointestinal tradicionalmente descritas como associadas à desnutrição primária grave têm sido descritas em crianças com quadros mais leves de desnutrição e estão incluídas no diagnóstico de disfunção entérica ambiental. Essa constatação é interessante porque ajuda a entender por que intervenções focadas apenas na oferta de alimentos não conseguem impactar na recuperação nutricional em muitos casos, principalmente na retomada do crescimento linear. A sobreposição das duas desordens torna mais difícil a recuperação do estado nutricional das crianças.4949 Guerrant RL, De Boer MD, Moore SR, Scharf RJ, Lima AA. The impoverished gut - a triple burden of diarrhoea, stunting and chronic disease. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2013;10:220-9.

Um outro aspecto a ser ressaltado é o risco maior de essas crianças que tiveram comprometimento da estatura na infância precoce apresentarem na idade adulta excesso de peso e obesidade quando expostas a uma dieta rica em energia, o que tem sido chamado triple burden. Ou seja, no início da vida crianças que vivem em um ambiente com grau elevado de contaminação ambiental têm maior exposição às infecções intestinais e à desnutrição (double burden) e na vida adulta acrescentam-se o excesso de peso/obesidade e as comorbidades associadas (triple burden).4949 Guerrant RL, De Boer MD, Moore SR, Scharf RJ, Lima AA. The impoverished gut - a triple burden of diarrhoea, stunting and chronic disease. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2013;10:220-9.

Do que se conhece até o momento, estudos epidemiológicos substanciais mostram que o stunting é mais observado em regiões pobres, com alta contaminação ambiental, onde é mais frequentemente relatada alta prevalência de disfunção entérica ambiental. No entanto, a sobreposição com outros fatores que podem comprometer o crescimento linear dificulta a se chegar a uma conclusão definitiva. Vários estudos de coorte estão em andamento e no futuro é possível que tenhamos dados mais confiáveis que permitam fazer uma inferência causal com segurança.

  • Como citar este artigo: Morais MB, Silva GA. Environmental enteric dysfunction and growth. J Pediatr (Rio J). 2019;95:S85-S94.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    9 Nov 2018
  • Aceito
    23 Nov 2018
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