Acessibilidade / Reportar erro

Raquianestesia unilateral com bupivacaína hipobárica

Unilateral spinal anesthesia with hypobaric bupivacaine

Raquianestesia unilateral con bupivacaína hipobárica

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Um bloqueio simpático restrito durante raquianestesia pode minimizar as alterações hemodinâmicas. Teoricamente, o uso de soluções não isobáricas de anestésicos locais pode produzir anestesia unilateral e restringir a desnervação simpática a apenas um lado do corpo. A dose do anestésico local e o tempo que o paciente permanece em decúbito lateral para a realização da raquianestesia unilateral são desconhecidos. O presente estudo prospectivo investiga a incidência de raquianestesia unilateral utilizando bupivacaína a 0,15% preparada a partir de 1,5 ml de solução isobárica de bupivacaína adicionada de 25 µg fentanil, injetada através de agulha 27G tipo Quincke no paciente em decúbito lateral, com membro a ser operado voltado para cima. MÉTODO: Raquianestesia com 0,15% de bupivacaína mais fentanil foi realizada através da agulha 27G Quincke em 22 pacientes estado físico ASA I e II submetidos à cirurgias ortopédicas. A punção subaracnóidea foi realizada com o paciente previamente colocado com o lado a ser operado voltado para cima e foram retirados de 3 a 5 ml de LCR e injetados 5 ml da solução hipobárica na velocidade de 1 ml.15s-1. Bloqueios sensitivo e motor (picada de agulha e escala de 0 a 3) foram comparados entre os lados a ser operado e o contralateral. RESULTADOS: Os bloqueios motor e sensitivo entre o lado operado e o contralateral foram significativamente diferentes em todos os tempos em ambos os grupos. Raquianestesia unilateral foi obtida em 71% dos pacientes. Estabilidade hemodinâmica foi observada em todos os pacientes. Nenhum paciente desenvolveu cefaléia pós-raquianestesia. CONCLUSÕES: A bupivacaína hipobárica a 0,15% (7,5 mg) associada ao fentanil proporciona um predominante bloqueio unilateral. Vinte minutos são suficientes para a instalação do bloqueio. As principais vantagens da raquianestesia unilateral são a estabilidade hemodinâmica, a satisfação do paciente e a ausência de cefaléia pós-punção.

ANALGÉSICOS; ANALGÉSICOS; ANESTÉSICOS; ANESTÉSICOS; ANESTÉSICOS; TÉCNICAS ANESTÉSICAS; TÉCNICAS ANESTÉSICAS


BACKGROUND AND OBJECTIVES: Restricted sympathetic block during spinal anesthesia may minimize hemodynamic changes. In theory, the use of non-isobaric local anesthetics may induce unilateral anesthesia and limit sympathetic blockade to one side of the body. The local anesthetic dose and the time patients need to remain in the lateral position for achieving unilateral spinal anesthesia are not known. This prospective study investigated the incidence of unilateral spinal anesthesia following injection through a 27G Quincke needle of 0.15% hypobaric bupivacaine, prepared with 1.5 ml standard isobaric bupivacaine plus fentanyl (25 µg), in patients in the lateral position with the limb to be operated upwards. METHODS: Spinal anesthesia with 0.15% bupivacaine + fentanyl (25 µg) was induced through a 27G Quincke needle in 22 ASA I and II patients undergoing orthopedic surgery. Dural puncture was performed with the patient in the lateral position with the side to be operated upwards. After removal of 3 to 5 ml of CSF, 5 ml of the hypobaric bupivacaine-fentanyl mixture were injected at a speed of 1 ml.15 s-1. Sensory and motor block (pinprick/scale 0 to 3) were compared between operated and contralateral sides. RESULTS: Motor and sensory blocks in operated and contralateral sides were significantly different in all moments for both groups. Unilateral spinal anesthesia was obtained in 71% of the patients. No hemodynamic changes were observed in any patient. No patient developed post-dural puncture headache. CONCLUSIONS: Hypobaric 0.15% bupivacaine (7.5 mg) associated to fentanyl provided a predominantly unilateral block after twenty minutes in the lateral position. Major advantages of unilateral spinal anesthesia were hemodynamic stability, patient satisfaction and the absence of post-dural puncture headache.

ANALGESICS; ANALGESICS; ANESTHETICS; ANESTHETICS; ANESTHETIC TECHNIQUES; ANESTHETIC TECHNIQUES


JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: Un bloqueo simpático restricto durante la raquianestesia puede minimizar las alteraciones hemodinámicas. Teóricamente, el uso de soluciones no isobáricas de anestésicos locales puede producir anestesia unilateral y restringir la desnervación simpática de apenas un lado del cuerpo. Las dosis del anestésico local y el tiempo que el paciente permanece en decúbito lateral para la realización de la raquianestesia unilateral son desconocidas. El presente estudio prospectivo investiga la incidencia de raquianestesia unilateral utilizando bupivacaína 0,15% preparada a partir de 1,5 ml de solución isobárica de bupivacaína adicionada de 25 µg fentanil, inyectada a través de aguja 27G tipo Quincke en el paciente en decúbito lateral, con el miembro a ser operado vuelto para arriba. MÉTODO: Raquianestesia con 0,15% de bupivacaína más fentanil fue realizada a través de la aguja 27G Quincke en 22 pacientes estado físico ASA I y II sometidos a cirugías ortopédicas. La punción subaracnóidea fue realizada con el paciente previamente colocado con el lado a ser operado vuelto para arriba y fueron retirados de 3 a 5 ml de LCR e inyectados 5 ml de la solución hipobárica en la velocidad de 1 ml.15 s-1. Bloqueo sensitivo y motor (picada de aguja y escala de 0 a 3) fueron comparados entre los lados a ser operados y el contra lateral. RESULTADOS: El bloqueo motor y sensitivo entre el lado operado y el contra lateral fueron significativamente diferentes en todos los tiempos en ambos grupos. Raquianestesia unilateral fue obtenida en 71% de los pacientes. Estabilidad hemodinámica fue observada en todos los pacientes. Ningún paciente desenvolvió cefalea pós-raquianestesia. CONCLUSIONES: La bupivacaína hipobárica a 0,15% (7,5 mg) asociada al fentanil proporciona un predominante bloqueo unilateral. Veinte minutos son suficientes para la instalación del bloqueo. Las principales ventajas de la raquianestesia unilateral son la estabilidad hemodinámica, la satisfacción del paciente y la ausencia de cefalea pós-punción.


ARTIGO CIENTÍFICO

Raquianestesia unilateral com bupivacaína hipobárica

Unilateral spinal anesthesia with hypobaric bupivacaine

Raquianestesia unilateral con bupivacaína hipobárica

Luiz Eduardo Imbelloni, TSAI; Lúcia Beato, TSAI; M.A. Gouveia, TSAII

IAnestesiologista da Casa de Saúde Santa Maria e Clínica São Bernardo, Rio de Janeiro

IIChefe do Serviço de Anestesiologia do Hospital IASERJ, Rio de Janeiro

Endereço para correspondênciaEndereço para correspondência Dr. Luiz Eduardo Imbelloni Av. Epitácio Pessoa, 2356/203, Lagoa 22471-000 Rio de Janeiro, RJ E-mail: imbelloni@openlink.com.br

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

MÉTODO: Raquianestesia com 0,15% de bupivacaína mais fentanil foi realizada através da agulha 27G Quincke em 22 pacientes estado físico ASA I e II submetidos à cirurgias ortopédicas. A punção subaracnóidea foi realizada com o paciente previamente colocado com o lado a ser operado voltado para cima e foram retirados de 3 a 5 ml de LCR e injetados 5 ml da solução hipobárica na velocidade de 1 ml.15s-1. Bloqueios sensitivo e motor (picada de agulha e escala de 0 a 3) foram comparados entre os lados a ser operado e o contralateral.

RESULTADOS: Os bloqueios motor e sensitivo entre o lado operado e o contralateral foram significativamente diferentes em todos os tempos em ambos os grupos. Raquianestesia unilateral foi obtida em 71% dos pacientes. Estabilidade hemodinâmica foi observada em todos os pacientes. Nenhum paciente desenvolveu cefaléia pós-raquianestesia.

CONCLUSÕES: A bupivacaína hipobárica a 0,15% (7,5 mg) associada ao fentanil proporciona um predominante bloqueio unilateral. Vinte minutos são suficientes para a instalação do bloqueio. As principais vantagens da raquianestesia unilateral são a estabilidade hemodinâmica, a satisfação do paciente e a ausência de cefaléia pós-punção.

Unitermos: ANALGÉSICOS, Opióides: fentanil; ANESTÉSICOS, Local: bupivacaína hipobárica; TÉCNICAS ANESTÉSICAS, Regional: subaracnóidea

SUMMARY

BACKGROUND AND OBJECTIVES: Restricted sympathetic block during spinal anesthesia may minimize hemodynamic changes. In theory, the use of non-isobaric local anesthetics may induce unilateral anesthesia and limit sympathetic blockade to one side of the body. The local anesthetic dose and the time patients need to remain in the lateral position for achieving unilateral spinal anesthesia are not known. This prospective study investigated the incidence of unilateral spinal anesthesia following injection through a 27G Quincke needle of 0.15% hypobaric bupivacaine, prepared with 1.5 ml standard isobaric bupivacaine plus fentanyl (25 µg), in patients in the lateral position with the limb to be operated upwards.

METHODS: Spinal anesthesia with 0.15% bupivacaine + fentanyl (25 µg) was induced through a 27G Quincke needle in 22 ASA I and II patients undergoing orthopedic surgery. Dural puncture was performed with the patient in the lateral position with the side to be operated upwards. After removal of 3 to 5 ml of CSF, 5 ml of the hypobaric bupivacaine-fentanyl mixture were injected at a speed of 1 ml.15 s-1. Sensory and motor block (pinprick/scale 0 to 3) were compared between operated and contralateral sides.

RESULTS: Motor and sensory blocks in operated and contralateral sides were significantly different in all moments for both groups. Unilateral spinal anesthesia was obtained in 71% of the patients. No hemodynamic changes were observed in any patient. No patient developed post-dural puncture headache.

CONCLUSIONS: Hypobaric 0.15% bupivacaine (7.5 mg) associated to fentanyl provided a predominantly unilateral block after twenty minutes in the lateral position. Major advantages of unilateral spinal anesthesia were hemodynamic stability, patient satisfaction and the absence of post-dural puncture headache.

Key Words: ANALGESICS, Opioids: fentanyl; ANESTHETICS, Local: hypobaric bupivacaine; ANESTHETIC TECHNIQUES, Regional: spinal block

RESUMEN

JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: Un bloqueo simpático restricto durante la raquianestesia puede minimizar las alteraciones hemodinámicas. Teóricamente, el uso de soluciones no isobáricas de anestésicos locales puede producir anestesia unilateral y restringir la desnervación simpática de apenas un lado del cuerpo. Las dosis del anestésico local y el tiempo que el paciente permanece en decúbito lateral para la realización de la raquianestesia unilateral son desconocidas. El presente estudio prospectivo investiga la incidencia de raquianestesia unilateral utilizando bupivacaína 0,15% preparada a partir de 1,5 ml de solución isobárica de bupivacaína adicionada de 25 µg fentanil, inyectada a través de aguja 27G tipo Quincke en el paciente en decúbito lateral, con el miembro a ser operado vuelto para arriba.

MÉTODO: Raquianestesia con 0,15% de bupivacaína más fentanil fue realizada a través de la aguja 27G Quincke en 22 pacientes estado físico ASA I y II sometidos a cirugías ortopédicas. La punción subaracnóidea fue realizada con el paciente previamente colocado con el lado a ser operado vuelto para arriba y fueron retirados de 3 a 5 ml de LCR e inyectados 5 ml de la solución hipobárica en la velocidad de 1 ml.15 s-1. Bloqueo sensitivo y motor (picada de aguja y escala de 0 a 3) fueron comparados entre los lados a ser operados y el contra lateral.

RESULTADOS: El bloqueo motor y sensitivo entre el lado operado y el contra lateral fueron significativamente diferentes en todos los tiempos en ambos grupos. Raquianestesia unilateral fue obtenida en 71% de los pacientes. Estabilidad hemodinámica fue observada en todos los pacientes. Ningún paciente desenvolvió cefalea pós-raquianestesia.

CONCLUSIONES: La bupivacaína hipobárica a 0,15% (7,5 mg) asociada al fentanil proporciona un predominante bloqueo unilateral. Veinte minutos son suficientes para la instalación del bloqueo. Las principales ventajas de la raquianestesia unilateral son la estabilidad hemodinámica, la satisfacción del paciente y la ausencia de cefalea pós-punción.

INTRODUÇÃO

Há mais de 50 anos a cirurgia dos membros inferiores ou do quadril foi realizada sob raquianestesia unilateral. Inicialmente foram usadas soluções hipobáricas 1-3, posteriormente soluções hiperbáricas 4,5. Hipotensão arterial é o mais freqüente efeito colateral da raquianestesia, ocorrendo em aproximadamente 30% dos pacientes 6. Teoricamente, injeções de soluções não isobáricas de anestésicos locais podem produzir bloqueio unilateral no paciente na posição de decúbito lateral. Desta forma, pode-se influenciar a dispersão da anestesia pela mudança de posição do paciente e os efeitos hemodinâmicos causados pelo bloqueio do neuro-eixo podem ser mínimos.

O objetivo desta investigação foi avaliar a tentativa de distribuição assimétrica do bloqueio entre o membro a ser operado e o contralateral e a influência na incidência de hipotensão arterial durante a raquianestesia.

MÉTODO

Após aprovação da Diretoria de Publicação e Divulgação das Clínicas e consentimento informado, 22 pacientes, estado físico ASA I e II, com idades entre 14 e 80 anos, a serem submetidos à raquianestesia para cirurgias ortopédicas eletivas envolvendo apenas um dos membros participaram deste estudo prospectivo. Critérios de exclusão foram hipovolemia, distúrbios de coagulação, infecção e recusa do método proposto. Monitorização incluiu avaliação da pressão arterial por método não invasivo, freqüência cardíaca e oximetria de pulso. Não foi administrada nenhuma medicação pré-anestésica. Após chegada à sala de operação, foi instalada venóclise com solução de Ringer com lactato e injetados 25-50 µg de fentanil.

O paciente foi colocado em decúbito lateral com o membro a ser operado voltado para cima. A coluna vertebral foi posicionada horizontalmente antes da punção subaracnóidea e a mesa nivelada na posição horizontal (zero) durante o procedimento. A punção subaracnóidea foi realizada no espaço L3-L4 usando agulha 27G tipo Quincke (B.Braun) pela via paramediana e foram retirados 3 a 5 ml de LCR. Imediatamente após foram injetados 5 ml de bupivacaína hipobárica a 0,15% (preparada a partir de 7,5 mg da bupivacaína a 0,5% isobárica) associada ao fentanil (25 µg) acrescida de água bidestilada 3 ml (Tabela I) na velocidade de 1 ml.15 s-1. O paciente foi mantido nesta posição por 20 minutos e em seguida colocado em decúbito dorsal horizontal.

Revista Brasileira de Anestesiologia, 2002; 52: 5: 542 - 548

Raquianestesia Unilateral com Bupivacaína Hipobárica

Luiz Eduardo Imbelloni, Lúcia Beato, M.A. Gouveia

&nbsp:

O nível sensitivo foi avaliado pela perda da sensação de frio (gelo) e picada de agulha 27G, enquanto o bloqueio motor o foi pela escala modificada de Bromage (0 = sem bloqueio motor a 3 = bloqueio motor completo). A avaliação dos bloqueios sensitivo e motor foi realizada em ambos os membros aos 20, 40 e 60 minutos e ao final da cirurgia. Os parâmetros hemodinâmicos foram avaliados a cada três minutos durante os primeiros 15 minutos após a punção subaracnóidea e posteriormente a cada cinco minutos até o final da cirurgia.

A hipotensão arterial foi definida como a diminuição de 30% dos valores basais, enquanto que bradicardia foi definida como FC menor do que 50 bpm. A hipotensão arterial foi tratada com 5 mg de etilenofenilefrina e a bradicardia com 0,5 mg de atropina, por via venosa. Durante o procedimento um garrote pneumático foi inflado 100 mmHg acima da pressão arterial sistólica. Um fluxo 2 L.min-1 de oxigênio foi administrado através de cateter nasal ou máscara de Hudson. Midazolam (1 a 2 mg) foi administrado após a segunda avaliação (40 min).

Os pacientes foram acompanhados até o terceiro dia de pós-operatório para se obter informação sobre sua satisfação com a técnica e para pesquisa de cefaléia pós-punção ou sintomas neurológicos transitórios (SNT), e até o 30º dia com relação às complicações neurológicas definitivas.

As variáveis quantitativas foram analisadas em termos de estatística descritiva e as comparações foram feitas com o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis. O nível de significância adotado foi de 5%.

RESULTADOS

Os dados demográficos dos pacientes estão apresentados na tabela II.

Revista Brasileira de Anestesiologia, 2002; 52: 5: 542 - 548

Raquianestesia Unilateral com Bupivacaína Hipobárica

Luiz Eduardo Imbelloni, Lúcia Beato, M.A. Gouveia

&nbsp:

A dispersão do bloqueio sensitivo no membro operado variou de T12 a T8, sendo a moda igual a T12. No membro contralateral apenas quatro pacientes apresentaram bloqueio sensitivo que variou de L2 a T12. O bloqueio sensitivo unilateral ocorreu em 17 pacientes (81%) e em ambos os membros em 4 pacientes (19%).

O bloqueio motor completo ocorreu em 20 dos 22 pacientes e grau 2 em apenas 1 paciente no membro operado. Nenhum paciente apresentou bloqueio motor completo no membro contralateral. Ocorreu bloqueio motor grau 2 em 2 pacientes e grau 1 em 4 pacientes. O bloqueio motor unilateral ocorreu em 15 pacientes (71%).

Nos 22 pacientes foi retirado um volume de LCR que variou de 3 a 5 ml, sendo que em 3 pacientes foram retirados 3 ml de LCR, em 1 paciente 4 ml, em 3 pacientes 4,5 ml e nos restantes 5 ml. Não houve correlação entre o volume de LCR retirado e a obtenção do bloqueio unilateral.

Em todos os pacientes a raquianestesia foi satisfatória para o procedimento e nenhum paciente necessitou de complementação com anestesia geral. Nenhum paciente referiu dor ao torniquete. Não ocorreram alterações da pressão arterial e da freqüência cardíaca em nenhum paciente. Nenhum paciente desenvolveu cefaléia pós-raquianestesia. Não se evidenciou SNT nem complicações neurológicas tardias.

Ocorreu uma falha completa da anestesia, sendo realizada nova raquianestesia com 10 mg de bupivacaína a 0,5% isobárica. Os 21 pacientes restantes ficaram satisfeitos com a técnica. Os 16 pacientes que apresentaram a raquianestesia unilateral relataram sensação agradável em permanecer sentindo o membro contralateral.

DISCUSSÃO

A injeção de bupivacaína hipobárica (7,5 mg) associada a 25 µg de fentanil na velocidade de 1 ml.15s-1 através de agulha 27G Quincke depois da retirada de um volume de 3 a 5 ml de LCR resultou em bloqueio unilateral em 71% dos pacientes. Todos os pacientes ficaram satisfeitos com a técnica e não foi observada nenhuma alteração hemodinâmica.

O objetivo de se produzir uma raquianestesia unilateral é proporcionar um bloqueio motor que facilite o conforto do paciente, já que o bloqueio motor prolongado pode ser inconveniente, além de evitar as alterações hemodinâmicas. Vários fatores afetam a dispersão do anestésico injetado no espaço subaracnóideo 7: volume de LCR, baricidade do anestésico local, posição do paciente durante e após a injeção, dose do anestésico e local de injeção. Neste estudo, o local da punção, o volume, a concentração de bupivacaína e a adição de fentanil foram constantes e os pacientes permaneceram em decúbito lateral por 20 minutos.

Procurou-se retirar um volume de LCR igual ao volume de anestésico local a ser injetado no espaço subaracnóideo 2. Desta forma tentou-se retirar um volume de 5 ml, o que não foi possível em todos os casos. No entanto, não existiu correlação entre a retirada do volume acima de 3 ml e o bloqueio unilateral.

As densidades da bupivacaína a 0,5% e do fentanil (50 µg.ml-1) a 37 ºC são respectivamente 0,9993 g.ml-1 e 0,9932 g.ml-18. A solução de bupivacaína a 0,15% foi selecionada por assegurar a hipobaricidade da solução 3. Por definição, a baricidade é a relação entre a densidade da solução injetada e a densidade do LCR. A densidade média do LCR é de 1,00059 ± 0,00020 g.ml-19. A baricidade dos anestésicos locais (tetracaína e bupivacaína) pode ser diminuída pela diluição com água 2,3. A densidade da bupivacaína a 0,15% adicionada de 25 µg de fentanil foi de 0,996 g.ml-1 a 37 ºC, portanto hipobárica em todos os pacientes.

A duração da raquianestesia depende não só da escolha do anestésico local mas também da dose administrada. A bupivacaína a 0,5% isobárica é um anestésico local de longa duração. A dose do anestésico usualmente empregada para raquianestesia é uma sobredose em relação à concentração mínima necessária para bloquear os vários tipos de fibras e esta é uma das razões da instalação rápida do bloqueio e sua longa duração. Neste estudo, 1h45 min foi o tempo mais longo entre a injeção e o final da operação. A dose de 7,5 mg de bupivacaína a 0,15% hipobárica associada ao fentanil e diluída com água proporcionou um tempo de recuperação de 2,9 horas, resultado igual ao obtido com 6,1 mg de bupivacaína a 0,18% 10.

A agulha tipo Quincke foi escolhida por proporcionar um rápido aparecimento do LCR 11 e facilitar sua retirada, além de cursar com uma baixa incidência de cefaléia 12. O tempo médio para atingir o nível máximo de analgesia com 5 ml de bupivacaína a 0,5% foi de 17,3 minutos 13. O nível da analgesia da bupivacaína a 0,5% isobárica aumenta acima de 4 segmentos quando o paciente é colocado em cefaloaclive de 30º por 80-115 minutos 14. Neste estudo os pacientes permaneceram na posição lateral por 20 minutos e com a mesa cirúrgica horizontal e o nível sensitivo no membro operado variou de T12 a T8 e alguns pacientes apresentaram um certo grau de bloqueio no membro contralateral.

Alguns autores mostraram que baixas doses de bupivacaína hiperbárica e manutenção em posição de decúbito lateral por 15 15 ou 30 minutos 16 são suficientes para evitar o bloqueio no lado contralateral após colocação em decúbito horizontal. Diferentemente de outros autores que demonstraram que doses de 12,5 a 15 mg de bupivacaína hiperbárica e manutenção por 15 a 30 minutos não evitam o bloqueio contralateral 4. Baixas doses de tetracaína 2 e bupivacaína 3,11,17,18 hipobáricas cursam com um bloqueio unilateral na maioria dos pacientes, fato observado neste estudo com uma incidência de 71%, utilizando bupivacaína associada ao fentanil.

Hipotensão arterial durante a raquianestesia ocorre por três mecanismos principais: vasodilatação, diminuição do retorno venoso e do débito cardíaco. A solução hipobárica a 0,19% (15 mg) injetada na posição sentada durante 2,40 minutos proporcionou um nível superior de analgesia mais alto quando comparada com a mesma dose de solução isobárica 19. Além disso, a raquianestesia cursou com uma maior incidência de hipotensão arterial que necessitou de tratamento com vasopressor 19. Resultado diferente do nosso, em que a solução hipobárica foi injetada em decúbito lateral e o paciente permaneceu por 20 minutos, não se observando nível acima de T8, e sem aparecimento de hipotensão arterial.

Os ventrículos cerebrais e a medula espinhal são preenchidos por aproximadamente 150 ml de LCR. No adulto, aproximadamente 500 ml de LCR são formados diariamente, com renovação do volume total a cada oito horas, sendo a maior parte secretada pelos plexos coróides nos ventrículos e absorvida pelas vilosidades aracnóideas nas granulações aracnóideas dos seios venosos. A pressão do LCR varia de 5 a 15 cmH2O na posição horizontal para 40 cmH2O na posição sentada 20. O líquor exerce uma função de coxim líquido entre o espaço ósseo e o sistema nervoso central. Variações de pressão neste coxim são transmitidas em toda sua extensão 21. Acredita-se que a cefaléia pós-punção (CPP) seja devida à diminuição da pressão liquórica resultante da perda de LCR através do orifício na duramáter, criado pela punção. A retirada de 15 a 20 ml de LCR em voluntários produziu cefaléia com as mesmas características da CPP, e alívio imediato foi obtido com a reposição subaracnóidea de igual volume de solução de cloreto de sódio a 0,9% 22. A reposição de um volume igual ou maior do que o retirado de LCR parece corroborar para a ausência de CCP. Desta forma, a reposição de anestésico local e opióide diluídos com água destilada parece produzir o mesmo efeito na prevenção da CPP que a reposição com cloreto de sódio a 0,9% .

Concluindo, o bloqueio foi unilateral em 71% dos pacientes quando se retirou um volume de 3 a 5 ml de LCR e substituído por volume de 5 ml da associação de bupivacaína e fentanil hipobáricos. A principal vantagem da raquianestesia unilateral é a grande estabilidade cardiocirculatória, a satisfação dos pacientes em permanecer com um membro não bloqueado e a ausência de cefaléia.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Prof. José Antonio Cordeiro pela valiosa orientação no estudo estatístico.

Bupivacaína a 0,15% gentilmente produzida e avaliada pela Cristália Produtos Farmacêuticos Ltda.

Apresentado (Submitted) em 01 de novembro de 2001

Aceito (Accepted) para publicação em 25 de janeiro de 2002

Recebido da (Received from) Casa de Saúde Santa Maria, Clínica São Bernardo e Hospital IASERJ, Rio de Janeiro, RJ

  • 01. Lund PC, Rumbal AC - Hypobaric pontocaine spinal anesthesia. 1640 consecutives cases. Anesthesiology, 1947;8:181-199.
  • 02. Gouveia MA, Labrunie GM - Raquianestesia hipobárica com tetracaína 0,1%. Rev Bras Anestesiol, 1985;35:232-233.
  • 03. Gouveia MA, Labrunie GM - Raquianestesia hipobárica com bupivacaína 0,15%. Rev Bras Anestesiol, 1985;35:519-521.
  • 04. Lotz SMN, Crosgnac M, Katayama M et al - Anestesia subaracnóidea com bupivacaína 0,5% hiperbárica: influęncia do tempo de permanęncia em decúbito lateral sobre a dispersăo cefálica. Rev Bras Anestesiol, 1992;42:257-264.
  • 05. Harder HJ - Unilateral lumbale spinal anaesthesie mit hyperbarer lösung. Anaesthesist, 1959;30:555-557.
  • 06. Carpenter RL, Caplan RA, Brown DL et al. Incidence and risk factors for side effects of spinal anesthesia. Anesthesiology, 1992;76:906-916.
  • 07. Gouveia MA - Fatores que controlam a dispersăo das drogas na raquianestesia. em: Imbelloni LE - Tratado de Anestesia Raquidiana, 2001;7:67-73.
  • 08. Cangiani LM - Determinaçăo da densidade e da baricidade das misturas para anestesia subaracnóidea. Rev Bras Anestesiol, 2000;50:92-94.
  • 09. Lui ACP, Polis TZ, Cicutti NJ - Densities of cerebrospinal fluid and spinal anaesthetic solutions in surgical patients at body temperature. Can J Anesth, 1998;45:297-303.
  • 10. Kuusniemi KS, Pihlajamäki KK, Pitkänen MT et al - Low-dose bupivacaína: a comparison of hypobaric and near isobaric solutions for arthroscopic surgery of the knee. Anaesthesia, 1999;54:540-545.
  • 11. Imbelloni LE, Carneiro ANG, Sobral MGC - Tempo de gotejamento de líquido cefalorraquidiano com agulhas espinhais de fino calibre. Rev Bras Anestesiol, 1995;45: 155-158.
  • 12. Imbelloni LE, Sobral MGC, Carneiro ANG - Cefaléia pós-raquianestesia e o desenho das agulhas. Experięncia com 5050 casos. Rev Bras Anestesiol, 2001;51:43-52.
  • 13. Cameron AE, Arnold RW, Ghoris MW et al - Spinal analgesia using bupivacaína 0.5% plain. Anaesthesia, 1981;36:318-322.
  • 14. Niemi L, Tuominen M, Pitkänen M et al - Effect of late posture change on the level of spinal anaesthesia with plain bupivacaine. Br J Anaesth, 1993;71:807-809.
  • 15. Casati A, Fanelli G, Berti M et al - Cardiac performance during unilateral lumbar spinal block after crystalloid preload. Can J Anaesth, 1997;44:623-628.
  • 16. Pittoni G, Toffoletto F, Calcarella G et al - Spinal Anesthesia in outpatient knee surgery: 22-gauge versus 25-gauge Sprotte needle. Anesth Analg, 1995;81:73-79.
  • 17. Kuusniemi KS, Pihlajamäki KK, Pitkänen Mt et al - A low-dose hypobaric bupivacaine spinal anesthesia for knee arthroscopies. Reg Anesth, 1997;22:534-538.
  • 18. Kuusniemi KS, Pihlajamäki KK, Irjala JK et al - Restricted spinal anaesthesia for ambulatory surgery: a pilot study. Eur J Anaesth, 1999;16:2-6.
  • 19. Taivainen T, Tuominen M, Rosengerg PH - Spinal anaesthesia with hypobaric 0.19% or plain 0.5% bupivacaine. Br J Anaesth, 1990;65:234-236.
  • 20. Imbelloni LE, Carneiro ANG - Cefaléia pós-raquianestesia: causas, prevençăo e tratamento. Rev Bras Anestesiol, 1997; 47:453-454.
  • 21. Stanicia S - Bloqueios Subaracnóideo e Peridural, em: Ortensi AV, Tardelli MA - Anestesiologia - SAESP. Săo Paulo, Editora Atheneu, 1996;24:358-371.
  • 22. Kunkle EC, Ray BS, Wolff HG - Experimental studies on headache. Analysis of the headache associated with changes in intracranial pressure. Arch Neurol, 1943;49:323-358.
  • Endereço para correspondência

    Dr. Luiz Eduardo Imbelloni
    Av. Epitácio Pessoa, 2356/203, Lagoa
    22471-000 Rio de Janeiro, RJ
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Abr 2003
    • Data do Fascículo
      Set 2002

    Histórico

    • Recebido
      01 Nov 2001
    • Aceito
      25 Jan 2002
    Sociedade Brasileira de Anestesiologia R. Professor Alfredo Gomes, 36, 22251-080 Botafogo RJ Brasil, Tel: +55 21 2537-8100, Fax: +55 21 2537-8188 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: bjan@sbahq.org