Acessibilidade / Reportar erro

Anestesia venosa total com infusão alvo-controlada de remifentanil e propofol para ablação de fibrilação atrial

Anestesia venosa total con infusión objeto-controlada de remifentanil y propofol para ablación de la fibrilación atrial

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A ablação de fibrilação atrial (FA) é um procedimento novo em nosso meio, embora seja comum em outros centros. A escolha da anestesia, monitores e cuidados anestesiológicos para esse procedimento, realizado fora do bloco cirúrgico, não tem sido descrita. O objetivo deste relato foi descrever uma técnica de anestesia para a realização de ablação de FA. RELATO DO CASO: Paciente feminina, 49 anos, 73 kg, 155 cm, ASA II por hipertensão arterial sistêmica. A monitorização constou de eletrocardiograma com 12 derivações, oximetria de pulso, frequência cardíaca, eletroencefalografia bispectral para medidas de BIS, taxa de supressão (SR) e SEF95 e pressão arterial média (PAM). A indução anestésica foi realizada com propofol por via venosa, em infusão alvo-controlada (IAC), com alvo regulado em 4 µg.mL-1, remifentanil por via venosa, em IAC, com alvo de 3 ng.mL¹, e rocurônio por via venosa em bolus na dose de 0,2 mg.kg-1. O modelo farmacocinético de propofol utilizado foi o descrito por Marsh e incorporado à bomba de propofol PFS®. O modelo farmacocinético de remifentanil utilizado foi o descrito por Minto e incorporado à bomba de infusão Alaris PK®. As concentrações, no local efetor ou biofase, corresponderam às informações obtidas através das bombas de infusão e representaram medidas preditivas das concentrações de ambos os fármacos nos respectivos locais de ação. As concentrações de propofol e de remifentanil foram reguladas de acordo com o BIS e a PAM, respectivamente. CONCLUSÕES: A anestesia venosa total para ablação de FA pode ser uma opção segura, levando-se em conta que não há alteração da eletrofisiologia das vias acessórias. A literatura é escassa a este respeito e novas publicações poderão ou não justificar esta modalidade de anestesia durante ablação de FA.

ANESTESIA, Geral; EQUIPAMENTOS, Bomba de infusão; PROCEDIMENTOS DE DIAGNOSE E TERAPIA


JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: La ablación de fibrilación atrial (FA) es un procedimiento nuevo en nuestro medio, aunque sea común en otros centros. No han sido descritos la elección de la anestesia, los monitores y los cuidados anestesiológicos para ese procedimiento realizado fuera del bloque quirúrgico. El objetivo de este relato fue describir una técnica de anestesia para la realización de la ablación de FA. RELATO DEL CASO: Paciente femenina, 49 años, 73 kg, 155 cm, ASA II por hipertensión arterial sistémica. El monitoreo tuvo un electrocardiograma con 12 derivaciones, oximetría de pulso, frecuencia cardiaca, electroencefalografía bispectral para medidas de BIS, tasa de supresión (SR) y SEF95, y presión arterial promedio (PAM). La inducción anestésica fue realizada con propofol por vía venosa, en infusión objeto-controlada (IAC), con objeto regulado en 4 µg.mL-1, remifentanil por vía venosa, en IAC, con objeto de 3 ng.mL-1, y rocuronio por vía venosa en bolo con dosis de 0,2 mg.kg-1. El modelo farmacocinético de propofol utilizado fue el descrito por Marsh y fue incorporado a la bomba de propofol PFS®. El modelo farmacocinético de remifentanil utilizado fue el descrito por Minto y fue incorporado a la bomba de infusión Alaris PK®. Las concentraciones en el local efector o biofase, correspondieron a informaciones obtenidas a través de las bombas de infusión, y representaron medidas de predicción de las concentraciones de los dos fármacos en los respectivos locales de acción. Las concentraciones de propofol y de remifentanil se regularon a tono con el BIS y la PAM, respectivamente. CONCLUSIONES: La anestesia venosa total para la ablación de FA, puede ser una opción segura si tenemos en cuenta que no hay alteración de la electrofisiología de las vías accesorias. La literatura es escasa en ese sentido, y nuevas publicaciones podrán o no justificar esa modalidad de anestesia durante la ablación de FA.


BACKGROUND AND OBJECTIVES: Although ablation of atrial fibrillation (AF) is common in other centers, among us it is a new procedure. The choice of anesthesia, monitors, and anesthesiologic care for this procedure performed outside the surgical center has not been described. The objective of this report was to describe an anesthesia technique for ablation of AF. CASE REPORT: This is a 49-year old female weighing 73 kg, 155 cm, and ASA II due to hypertension. The patient was monitored with a 12-lead ECG, pulse oximetry, heart rate, bispectral electroencephalography for BIS measurement, suppression rate (SR), and SEF95, and mean arterial pressure (MAP). Intravenous target-controlled infusion (TCI) of propofol with a target of 4 µg.mL-1, intravenous TCI of remifentanil with a target of 3 ng.mL-1, and intravenous bolus of rocuronium 0.2 mg.kg-1 were used for induction of anesthesia. The pharmacokinetic model of propofol described by Marsh was used and incorporated into the propofol PFS pump®. The pharmacokinetic model of remifentanil described by Minto was incorporated into the Alaris PK® infusion pump. Local effector, or biophase, concentrations corresponded to the information obtained from the infusion pumps and represented predictive measurements of the concentrations of both drugs on their sites of action. The concentrations of propofol and remifentanil were regulated according to BIS and MAP, respectively. CONCLUSIONS: Total intravenous anesthesia for ablation of AF can be a safe option considering the lack of electrophysiological changes in accessory pathways. The literature on this subject is scarce and new publications could justify, or not, this type of anesthesia during ablation of AF.

ANESTHESIA, General; DIAGNOSTIC AND TREATMENT PROCEDURES; EQUIPMENT, Infusion pump


INFORMAÇÃO CLÍNICA

Anestesia venosa total com infusão alvo-controlada de remifentanil e propofol para ablação de fibrilação atrial* * Recebido da Hospital das Clínicas de Porto Alegre

Anestesia venosa total con infusión objeto-controlada de remifentanil y propofol para ablación de la fibrilación atrial

Fernando Squeff Nora, TSAI; Maurício PimentelII; Leandro Ioschpe ZimermanIII; Eduardo B. SaadIV

IAnestesiologista do Grupo Alfa de Porto Alegre; Membro da Câmara Técnica de Anestesiologia do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul

IIMestre em Cardiologia pela UFRGS; Médico do Grupo de Eletrofisiologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e Hospital Moinhos de Vento

IIIDoutor em Cardiologia pela Duke University/UFRGS; Professor Adjunto da Faculdade de Medicina da UFGRS; Presidente da Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas

IVCardiologista; Coordenador do Serviço de Arritmias e Estimulação do Hospital Pró-Cardíaco; Eletrofisiologista do Instituto Nacional de Cardiologia, RJ

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. Fernando Squeff Nora Rua Almirante Abreu, 235 - Rio Branco 90420-010 Porto Alegre, RS E-mail: fernandosqueff@terra.com.br

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A ablação de fibrilação atrial (FA) é um procedimento novo em nosso meio, embora seja comum em outros centros. A escolha da anestesia, monitores e cuidados anestesiológicos para esse procedimento, realizado fora do bloco cirúrgico, não tem sido descrita. O objetivo deste relato foi descrever uma técnica de anestesia para a realização de ablação de FA.

RELATO DO CASO: Paciente feminina, 49 anos, 73 kg, 155 cm, ASA II por hipertensão arterial sistêmica. A monitorização constou de eletrocardiograma com 12 derivações, oximetria de pulso, frequência cardíaca, eletroencefalografia bispectral para medidas de BIS, taxa de supressão (SR) e SEF95 e pressão arterial média (PAM). A indução anestésica foi realizada com propofol por via venosa, em infusão alvo-controlada (IAC), com alvo regulado em 4 µg.mL-1, remifentanil por via venosa, em IAC, com alvo de 3 ng.mL1, e rocurônio por via venosa em bolus na dose de 0,2 mg.kg-1. O modelo farmacocinético de propofol utilizado foi o descrito por Marsh e incorporado à bomba de propofol PFS®. O modelo farmacocinético de remifentanil utilizado foi o descrito por Minto e incorporado à bomba de infusão Alaris PK®. As concentrações, no local efetor ou biofase, corresponderam às informações obtidas através das bombas de infusão e representaram medidas preditivas das concentrações de ambos os fármacos nos respectivos locais de ação. As concentrações de propofol e de remifentanil foram reguladas de acordo com o BIS e a PAM, respectivamente.

CONCLUSÕES: A anestesia venosa total para ablação de FA pode ser uma opção segura, levando-se em conta que não há alteração da eletrofisiologia das vias acessórias. A literatura é escassa a este respeito e novas publicações poderão ou não justificar esta modalidade de anestesia durante ablação de FA.

Unitermos: ANESTESIA, Geral: venosa; EQUIPAMENTOS, Bomba de infusão: alvo controlada; PROCEDIMENTOS DE DIAGNOSE E TERAPIA: ablação foco fibrilação atrial.

RESUMEN

JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: La ablación de fibrilación atrial (FA) es un procedimiento nuevo en nuestro medio, aunque sea común en otros centros. No han sido descritos la elección de la anestesia, los monitores y los cuidados anestesiológicos para ese procedimiento realizado fuera del bloque quirúrgico. El objetivo de este relato fue describir una técnica de anestesia para la realización de la ablación de FA.

RELATO DEL CASO: Paciente femenina, 49 años, 73 kg, 155 cm, ASA II por hipertensión arterial sistémica. El monitoreo tuvo un electrocardiograma con 12 derivaciones, oximetría de pulso, frecuencia cardiaca, electroencefalografía bispectral para medidas de BIS, tasa de supresión (SR) y SEF95, y presión arterial promedio (PAM). La inducción anestésica fue realizada con propofol por vía venosa, en infusión objeto-controlada (IAC), con objeto regulado en 4 µg.mL-1, remifentanil por vía venosa, en IAC, con objeto de 3 ng.mL-1, y rocuronio por vía venosa en bolo con dosis de 0,2 mg.kg-1. El modelo farmacocinético de propofol utilizado fue el descrito por Marsh y fue incorporado a la bomba de propofol PFS®. El modelo farmacocinético de remifentanil utilizado fue el descrito por Minto y fue incorporado a la bomba de infusión Alaris PK®. Las concentraciones en el local efector o biofase, correspondieron a informaciones obtenidas a través de las bombas de infusión, y representaron medidas de predicción de las concentraciones de los dos fármacos en los respectivos locales de acción. Las concentraciones de propofol y de remifentanil se regularon a tono con el BIS y la PAM, respectivamente.

CONCLUSIONES: La anestesia venosa total para la ablación de FA, puede ser una opción segura si tenemos en cuenta que no hay alteración de la electrofisiología de las vías accesorias. La literatura es escasa en ese sentido, y nuevas publicaciones podrán o no justificar esa modalidad de anestesia durante la ablación de FA.

INTRODUÇÃO

A ablação de fibrilação atrial (FA) é um procedimento relativamente novo em nosso meio, embora seja comum em outros centros. A escolha da anestesia, monitores e cuidados anestesiológicos para esse procedimento, realizado fora do bloco cirúrgico, não tem sido descrita. O objetivo deste relato foi descrever uma técnica de anestesia para a realização de ablação de FA, bem como apresentar breve revisão sobre a segurança dos anestésicos utilizados, uma vez que alguns deles podem alterar a condução elétrica do coração normal e dos feixes de condução anômalos, dificultando a realização do procedimento e a avaliação da eficácia do mesmo.

RELATO DO CASO

Paciente feminina, 49 anos, 73 kg, 155 cm, ASA II por hipertensão arterial sistêmica. Medicação pré-anestésica realizada com 15 mg de midazolam via oral, que foi também utilizado para sedação durante a realização de ecocardiografia transesofágica para confirmação de ausência de trombos intracavitários. Na sala de hemodinâmica foram realizadas: venóclise com cateter de teflon periférico 16G sob anestesia local com lidocaína a 1% sem epinefrina e punção da artéria radial com cateter 20G para medida de pressão arterial invasiva (PAM). A monitorização constou de eletrocardiograma com 12 derivações, oximetria de pulso, frequência cardíaca, eletroencefalografia bispectral para medidas de BIS, taxa de supressão (SR) e SEF95 e PAM. A indução anestésica foi realizada com propofol por via venosa, em infusão alvo-controlada (IAC), com alvo regulado em 4 µg.mL-1, remifentanil por via venosa, em IAC, com alvo de 3 ng.mL-1, e rocurônio por via venosa em bolus na dose de 0,2 mg.kg-1. A paciente foi oxigenada momentos antes da indução, intubada e mantida em ventilação mecânica controlada a volume para manter PETCO2 entre 30 e 35 mm Hg. Contato verbal foi mantido durante a indução com o objetivo de detectar o momento da perda da resposta verbal. Ocorreu perda da resposta verbal quando a concentração no local efetor de propofol foi de 0,7 µg.mL-1 e remifentanil de 2 ng.mL-1. O BIS, nesse momento, era de 70, com SEF95 = 22, motivo pelo qual a paciente foi mantida em ventilação sob máscara até que ocorresse diminuição mais acentuada do BIS. A intubação traqueal ocorreu quando a concentração no local efetor de propofol alcançou 2,2 µg.mL-1 e BIS = 30, com SEF = 12. Após a indução, foi realizada punção da veia jugular interna direita para colocação de cateter duodecapolar no interior do seio coronariano e com pólos para registro também na junção do átrio direito com a veia cava superior. Foram realizadas outras duas punções na veia femoral direita para o acesso a duas bainhas para punção transeptal. A partir de punção venosa femoral esquerda, uma sonda de ultrassom intracardíaco foi posicionada no átrio direito. Foram realizadas duas punções transeptais guiadas pelo ecocardiograma intracardíaco, para posicionamento de cateter decapolar circular (Lasso) e do cateter de ablação em átrio esquerdo. Foi iniciada a heparinização sistêmica com monitoramento pelo tempo de coagulação ativado (TCA > 300 seg.). Com o cateter Lasso foi realizado o mapeamento elétrico das veias pulmonares. Todas as veias pulmonares foram desconectadas do átrio esquerdo com aplicações de radiofrequência por meio de cateter irrigado, com 30 watts de potência. Propofol e remifentanil foram administrados em IAC, através de bombas de infusão dotadas do sistema farmacocinético de cada um dos fármacos. O modelo farmacocinético de propofol utilizado foi o descrito por Marsh e incorporado à bomba de propofol PFS®. O modelo farmacocinético de remifentanil utilizado foi o descrito por Minto e incorporado à bomba de infusão Alaris PK®. As concentrações, no local efetor ou biofase, corresponderam às informações obtidas através das bombas de infusão e representaram medidas preditivas das concentrações de ambos os fármacos nos respectivos locais de ação. As concentrações de propofol e remifentanil foram reguladas de acordo com o BIS e a PAM, respectivamente. A manutenção da anestesia geral foi realizada com propofol, em IAC, nas concentrações necessárias para manter o BIS entre 40 e 50. A PAM e a FC estiveram dentro dos limites da normalidade durante todo o procedimento. As concentrações máximas e mínimas no local efetor de propofol utilizadas foram de 2,5 e 1,9 µg.mL-1, respectivamente. O remifentanil era titulado de forma a manter variação máxima de 20% da PAM. As concentrações máximas e mínimas de remifentanil no local efetor foram de 4 e 2 ng.mL-1, respectivamente. O tempo total de infusão de propofol e remifentanil foi de 300 minutos. A vazão média de propofol utilizada foi de 4,6 mg.kg.h-1. A vazão média de remifentanil utilizada foi de 0,1 µg.kg.h-1. A dose total de propofol utilizada foi de 1.697 mg, e a de remifentanil foi de 2 mg. A PAM inicial era de 80 mmHg e foi mantida entre 65 e 80 mmHg durante todo o procedimento, com o auxílio de vasopressores em bolus por via venosa em apenas duas ocasiões durante o procedimento. Um termômetro esofágico foi posicionado para determinar a temperatura esofágica durante as aplicações de radiofrequência próximas ao esôfago. As infusões de remifentanil e propofol foram interrompidas no final do procedimento. A paciente foi extubada quando a concentração no local efetor de propofol alcançou 1,2 µg.mL-1 em ritmo sinusal, sinais vitais estáveis e em ventilação espontânea, após reversão do bloqueio neuromuscular. A paciente foi encaminhada à unidade de recuperação.

DISCUSSÃO

A ablação de feixes anômalos intracardíacos é procedimento relativamente frequente em nosso meio. Ela é realizada, mais comumente, sob anestesia local associada à sedação com diversas técnicas. Não existem relatos na literatura nacional que descrevam alternativas anestesiológicas para a realização de ablação de FA. A descrição deste caso objetivou apresentar alternativas e sugestões de anestesia geral para a ablação de FA. A ablação de FA, ao contrário das ablações realizadas para tratamento das taquicardias supraventriculares, é um procedimento mais complexo que envolve anticoagulação, punções venosas centrais em diversos locais, inserção de vários cateteres e termômetros, sondagem vesical e monitorização com múltiplos canais. Por causa desses fatores, optou-se pela anestesia geral com intubação traqueal. Cohen e col. descreveram que, em estudo comparativo entre anestesia geral inalatória com isoflurano e anestesia venosa total com propofol em pacientes pediátricos submetidos à ablação de taquicardia supraventricular, eles apresentaram tempos de indução de taquicardia supraventricular e doses de isoproterenol necessários para indução de taquicardia supraventricular maiores no grupo de pacientes anestesiados com isoflurano 1. Outro estudo de Hermann e col. descreveu que a utilização de propofol é segura em pacientes com taquicardia supraventricular 2. Enflurano, halotano e isoflurano parecem aumentar a refratariedade da via acessória de feixes anômalos, bem como do sistema de condução atrioventricular normal, constituindo contraindicação o uso desses fármacos em anestesia para ablação de feixes anômalos 3. Através do aumento do período refratário atrial, esses agentes inalatórios podem gerar resultados falsos das ablações. O sevoflurano parece não alterar as vias de condução atriais, constituindo-se em alternativa caso a anestesia geral inalatória seja escolhida 4. Apesar disso, o sevoflurano diminui o tempo de condução do nó sinoatrial e o intervalo de condução entre os átrios e os feixes de Hiss, embora a repercussão clínica de tais alterações seja de pequena importância durante a administração de até 1 MAC de sevoflurano, conforme descreveram Sharpe e col. 4. Anestésicos por via venosa como o sufentanil, alfentanil, midazolam e propofol também têm sido descritos pela literatura e parecem não alterar as propriedades eletrofisiológicas das vias de condução anômalas ou as vias de condução atrioventriculares normais 3,5,6. Optou-se pela anestesia venosa total com propofol e remifentanil devido à necessidade de despertar a precoce e baixa possibilidade de alterar o limiar de excitabilidade atrial e da baixa intensidade de estímulos dolorosos durante o procedimento 6. Durante a indução, que foi realizada iniciando-se ao mesmo tempo as infusões de remifentanil e propofol, conforme já havia sido descrito por Nora e col., ocorreu diminuição em torno de 20% da PAM 8. A PAM voltou ao normal após intubação traqueal sem necessidade do uso de vasopressores. Não se encontrou na literatura consultada descrição a respeito da utilização de remifentanil em ablação de feixes anômalos, embora a utilização de outros opioides, como o alfentanil, encontre respaldo 5. A escolha da técnica anestésica deve ser criteriosa a fim de evitar alterações nos padrões elétricos dos feixes de condução intracardíacos. A anestesia venosa total possibilitou avaliação neurológica precoce. As baixas doses de infusão de propofol e, principalmente, de remifentanil chamaram a atenção, pois ficaram abaixo das doses descritas na literatura para a realização de anestesia geral 7. Diversos fatores podem ser responsáveis por essas diminuições de gastos de remifentanil, tais como a natureza do procedimento, características da paciente, pré-anestésico e uso de IAC. A escolha do propofol e do remifentanil ocorreu porque esses agentes parecem não alterar os resultados do mapeamento intracardíaco, podendo constituir boa escolha para o procedimento proposto. Quanto aos aspectos de monitorização, a utilização de BIS, a despeito dos demais, foi importante, pois possibilitou a titulação adequada de propofol com segurança e talvez esse monitor tenha sido determinante para possibilitar a diminuição das doses de infusão de propofol para vazões abaixo de 6 mg.kg.h-1. Da mesma forma, a utilização de fármacos por via venosa em IAC possibilitou titulação mais criteriosa, através das alterações nas concentrações plasmáticas realizadas de forma constante, de acordo com as variações do BIS e da PAM, uma vez que a monitorização da FC fica prejudicada devido à natureza do procedimento. Características pessoais, bem como o pré-anestésico com midazolam, também podem ter contribuído para as baixas doses de anestésicos utilizados, o que impossibilita afirmar que apenas a utilização do BIS possa ter contribuído para isso. Importante ressaltar a necessidade de analgesia pós-operatória, pois a incidência de dor associada ao procedimento é de intensidade variável, podendo ser alta nos períodos iniciais devido à irritação pericárdica. A ablação de FA é um procedimento realizado fora do bloco cirúrgico e poderá ser feita com segurança sob anestesia geral venosa total e intubação traqueal. A literatura é escassa em publicações mais conclusivas a respeito da modalidade de anestesia mais segura nessa situação, embora a maioria tenha citado a importância de utilizar medicamentos que n ão alterem a eletrofisiologia do tecido de condução cardíaco e das vias acessórias envolvidas no processo de manutenção da FA. Qualquer medicamento que altere a expressão eletrofisiológica das vias acessórias poderá interferir na localização e posterior avaliação do resultado da ablação. A IAC de fármacos venosos, monitorizados através do BIS e da PAM, facilitou a manutenção de plano anestésico satisfatório e influenciou, entre outros aspectos, nas doses utilizadas podendo gerar economia. A IAC em anestesia venosa total para ablação de FA poderá se tornar alternativa atraente na medida em que possibilita rápido retorno da consciência, facilitando a avaliação neurológica imediata. A publicação de ensaios clínicos de maior abrangência poderá ou não ratificar essa escolha anestésica.

Apresentado em 23 de dezembro de 2008

Aceito para publicação em 17 de agosto de 2009

  • 01. Cohen IT, Furbush N, Moak J - Propofol infusions for radio-frequency catheter ablation for supraventricular tachycardia in children. Anesth Analg, 1999;88(2/suppl):s291.
  • 02. Hermann R, Vettermann J - Change of ectopic supraventricular tachycardia to sinus rhythm during administration of propofol - Anesth Analg, 1992;75:1030-1032.
  • 03. Sharpe MD, Dobkowski WB, Murkin JM et al. - The electrophysiologic effects of volatile anesthetics and sufentanil on the normal atrioventricular conduction system and accessory pathways in Wolff-Parkinson-White syndrome. Anesthesiology, 1994; 80:63-70.
  • 04. Sharpe MD, Cuillerier DJ, Lee JK et al. Sevoflurane has no effect on sinoatrial node function or on normal atrioventricular and accessory pathway conduction in Wolff-Parkinson-White syndrome during alfentanil/midazolam anesthesia. Anesthesiology, 1999;90:60-65.
  • 05. Sharpe MD, Dobkowski WB, Murkin JM et al. - Alfentanil-midazolam anaesthesia has no electrophysiological effects upon the normal conduction system or accessory pathways in patients with Wolff-Parkinson-White syndrome. Can J Anaesth, 1992;39:816-821.
  • 06. Sharpe MD, Dobkowski WB, Murkin JM et al. - Propofol has no direct effect on sinoatrial node function or on normal atrioventricular and accessory pathway conduction in Wolff-Parkinson-White syndrome during alfentanil/midazolam anesthesia. Anesthesiology, 1995;82:888-895.
  • 07. Nora FS - Anestesia venosa total em regime de infusão alvo controlada. Uma análise evolutiva. Rev Bras Anestesiol, 2008;58:179-192.
  • 08. Nora FS, Klipel R, Ayala G et al. - Remifentanil: o regime de infusão faz diferença na prevenção das respostas circulatórias à intubação traqueal? Rev Bras Anestesiol, 2007;57:247-260.
  • Endereço para correspondência:
    Dr. Fernando Squeff Nora
    Rua Almirante Abreu, 235 - Rio Branco
    90420-010 Porto Alegre, RS
    E-mail:
  • *
    Recebido da Hospital das Clínicas de Porto Alegre
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Dez 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Recebido
      23 Dez 2008
    • Aceito
      17 Ago 2009
    Sociedade Brasileira de Anestesiologia R. Professor Alfredo Gomes, 36, 22251-080 Botafogo RJ Brasil, Tel: +55 21 2537-8100, Fax: +55 21 2537-8188 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: bjan@sbahq.org