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Manobras de hiperinflação manual podem causar aspiração de secreções orofaríngeas em paciente sob ventilação mecânica?

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVO: Avaliar se manobra de hiperinsuflação manual (HM) pode propiciar aspiração das secreções orofaríngeas em paciente sob ventilação mecânica. MÉTODOS: Participaram do estudo pacientes adultos sob ventilação mecânica nos quais foi injetado corante na cavidade orofaríngea e aspirada secreção traqueal após 30 minutos (min). Na ocorrência de deslizamento do corante, o paciente foi eliminado. Os demais foram alocados em Grupo Controle: pacientes em que se aspiravam secreções traqueais após 30, 60, 120 e 180 min e Grupo Experimental: após 30 min, foram realizadas manobras de HM e aspirada secreção nos intervalos estabelecidos. RESULTADOS: Estudaram-se 43 pacientes. Em 13, ocorreu deslizamento do corante após 30 min antes da alocação dos grupos. Os demais 29 pacientes forneceram 226 amostras de secreções. Houve presença de secreções coradas em apenas duas amostras, após realização de HM, em pacientes do grupo experimental. CONCLUSÃO: A manobra de hiperinflação manual não propiciou aspiração de secreções orofaríngeas em paciente sob ventilação mecânica.

CIRURGIA; COMPLICAÇÕES; INTUBAÇÃO TRAQUEAL


BACKGROUND AND OBJECTIVES: To evaluate whether manual hyperinflation maneuvers can cause aspiration of oropharyngeal secretions in patients under mechanical ventilation. METHODS: Adult patients under mechanical ventilation in whom a dye was injected in the oropharyngeal cavity and had their tracheal secretion aspirated after 30 minutes (min) participated in this study. In the event of dye slid, the patient was eliminated. The other patients were divided in Control Group: patients in whom tracheal secretions were aspirated after 30, 60, 120, and 180 min, and Experimental Group: after 30 min, manual hyperventilation maneuvers were performed and secretions were aspirated on the established intervals. RESULTS: Forty-three patients were enrolled in this study. In 13, dye slippage was observed after 30 min, before allocating them into two groups. In the remaining 29 patients, 226 secretion samples were collected. In only two samples the presence of dye in the secretion was observed after manual hyperinflation maneuvers in the experimental group. CONCLUSION: Manual hyperinflation maneuvers did not cause aspiration of oropharyngeal secretions in patients under mechanical ventilation.

Respiratory Aspiration; Respiration, Artificial; Intensive Care; Critical Care; Physical Therapy (Specialty)


JUSTIFICATIVA Y OBJETIVO: Evaluar si la maniobra de hiperinsuflación manual (HM), puede propiciar la aspiración de las secreciones orofaríngeas en el paciente que está bajo ventilación mecánica. MÉTODOS: Participaron en el estudio pacientes adultos bajo ventilación mecánica, en los cuales se inyectó un colorante en la cavidad orofaríngea y se aspiró la secreción traqueal después de 30 minutos (min). Al ocurrir el deslizamiento del colorante, el paciente fue eliminado. Los demás pacientes fueron derivados al Grupo Control: pacientes en que se aspiraban secreciones traqueales después de 30, 60, 120 y 180 min y un Grupo Experimental: después de 30', en que fueron realizadas las maniobras de HM y aspirada la secreción en los intervalos establecidos. RESULTADOS: Fueron estudiados 43 pacientes. En 13 de ellos, ocurrió deslizamiento del colorante después de 30 min antes de la ubicación de los grupos. Los demás 29 pacientes suministraron 226 muestras de secreciones. Se registró la presencia de secreciones de colorante en solamente dos muestras después de la realización de HM, en pacientes del grupo experimental. CONCLUSIONES: La maniobra de hiperinflación manual no generó la aspiración de secreciones orofaríngeas en el paciente bajo ventilación mecánica.

CIRUGÍA; COMPLICACIONES; INTUBACIÓN TRAQUEAL


ARTIGO CIENTÍFICO

Manobras de hiperinflação manual podem causar aspiração de secreções orofaríngeas em paciente sob ventilação mecânica?

Armando Carlos Franco de GodoyI; Carla de Oliveira YokotaII; Izilda Ismênia Muglia AraújoIII; Maria Isabel Pedreira de FreitasIII

IProfessor Doutor; Fisioterapeuta responsável pelas Enfermaria de Emergência Clínica e Enfermaria de Cirurgia do Trauma do Hospital das Clínicas da Unicamp

IIProfessora; Fisioterapeuta, Hospital das Clínicas da Unicamp

IIIProfessora Doutora; Departamento de Enfermagem, Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp

Correspondência para Correspondência para: Dr. Armando Carlos Franco de Godoy Rua Hercules Florence, 100 ap 23 13020-170 - Campinas, SP E-mail: armandogodoy@ig.com.br

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVO: Avaliar se manobra de hiperinsuflação manual (HM) pode propiciar aspiração das secreções orofaríngeas em paciente sob ventilação mecânica.

MÉTODOS: Participaram do estudo pacientes adultos sob ventilação mecânica nos quais foi injetado corante na cavidade orofaríngea e aspirada secreção traqueal após 30 minutos (min). Na ocorrência de deslizamento do corante, o paciente foi eliminado. Os demais foram alocados em Grupo Controle: pacientes em que se aspiravam secreções traqueais após 30, 60, 120 e 180 min e Grupo Experimental: após 30 min, foram realizadas manobras de HM e aspirada secreção nos intervalos estabelecidos.

RESULTADOS: Estudaram-se 43 pacientes. Em 13, ocorreu deslizamento do corante após 30 min antes da alocação dos grupos. Os demais 29 pacientes forneceram 226 amostras de secreções. Houve presença de secreções coradas em apenas duas amostras, após realização de HM, em pacientes do grupo experimental.

CONCLUSÃO: A manobra de hiperinflação manual não propiciou aspiração de secreções orofaríngeas em paciente sob ventilação mecânica.

Unitermos: CIRURGIA: Cuidados pós-operatórios; COMPLICAÇÕES: Aspiração pulmonar; INTUBAÇÃO TRAQUEAL.

INTRODUÇÃO

A aspiração de secreções orofaríngeas contaminadas está entre as causas de pneumonia associada ao ventilador mecânico, fato que aumenta os custos, a mortalidade e prolonga a permanência dos pacientes na unidade de terapia intensiva 1.

O fisioterapeuta respiratório é um profissional integrado na equipe multiprofissional das Unidades de Terapia Intensivas (UTI) em diversos países. Esses profissionais dispõem de vários recursos para ajudar na recuperação de paciente, entre os quais é citada a manobra de hiperinsuflação manual (HM) ou bag-squeezing 2. Essa manobra consiste no princípio fisiológico das fases da tosse. Para realizá-la, o fisioterapeuta desconecta o paciente do ventilador mecânico e, por meio de um reanimador manual autoinflável (AMBU®), faz uma lenta insuflação dos pulmões, produz uma pausa inspiratória em torno de dois segundos e, em seguida, realiza uma brusca descompressão da bolsa do reanimador. Essa técnica tem o objetivo de prevenir e/ou reexpandir alvéolos colapsados, melhorar a oxigenação sanguínea e a complacência do pulmão, além de causar o fluxo das secreções pulmonares para as vias aéreas superiores, para que possam ser aspiradas 3.

Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi avaliar se a manobra de hiperinsuflação manual pode propiciar a aspiração das secreções da cavidade orofaríngea em paciente sob ventilação mecânica invasiva.

MÉTODOS

Estudo realizado nas Unidades de Internação de Emergência Clínica e Cirurgia do Trauma de Hospital Universitário do interior do estado de São Paulo, no período de outubro de 2003 a fevereiro de 2004, após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição (CEP nº 323/02).

Participaram deste estudo pacientes maiores de 18 anos sob ventilação mecânica, os quais podiam ter seus parâmetros adaptados durante a coleta dos dados no seguinte modo: ventilação controlada a volume (8 mL.kg-1 de peso), pressão expiratória positiva final de 5 cmH2O e relação inspiração/expiração de 1:2; além disso, os pacientes deveriam estar sedados, em níveis da escala de RAMSAY de 4, 5 ou 6, e permanecer em posição de Fowler 35º durante todo o estudo.

Os pacientes selecionados foram colocados em posição de Fowler 35º, ajustada a pressão intra-cuff em 20 mmHg e realizada a aspiração das secreções brônquica nasal e oral. Em seguida, foi instilada na cavidade orofaríngea, por visão direta, uma mistura de 2,0 mL do corante pasta de cobre de clorofilina e 2,0 mL de água destilada (total de 4,0 mL) por meio de uma seringa de 5,0 mL. O corante pasta de cobre de clorofila foi utilizado conforme Resolução nº 44 - CNNPA (Comissão Nacional de Normas e Padrões para Alimentos) do Ministério da Saúde, de 1977.

Após trinta minutos de instilação do corante, foram aspiradas as secreções traqueais dos pacientes, e, na ocorrência da presença de corante nas secreções traqueais, o paciente era descartado do estudo. Caso contrário, os pacientes eram alocados aleatoriamente como grupo ou experimental, sendo estes controles de si mesmos. A partir do momento que o paciente pertencia ao grupo controle, tinha suas secreções traqueais aspiradas após 30, 60, 120 e 180 minutos. Se não houvesse a presença de corante nas secreções aspiradas, o paciente passava a pertencer ao grupo experimental. Nesse grupo, eram realizadas seis manobras de HM com um reanimador manual autoinflável (AMBU®). Finalizadas as manobras, realizou-se a aspiração das secreções traqueais após 30, 60, 120 e 180 minutos, para verificar a presença de corante nas secreções traqueais.

A presença do corante nas secreções aspiradas era avaliada por um profissional que desconhecia a que grupo o paciente pertencia, e em caso de visualização do corante, o paciente era retirado do estudo.

Para a análise estatística utilizou-se o programa BioEstat, versão 3.0 para Windows (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Brasília, Brasil). Foi considerado o valor de p < 0,05 para o Teste χ2.

RESULTADOS

Obteve-se uma amostra de 43 pacientes. As idades dos pacientes variaram de 19 a 85 anos (média 52 ± 19 anos), sendo 33 (78%) do sexo masculino e 10 (22%) do feminino. Os diagnósticos dos pacientes admitidos no estudo foram: abdome agudo (n = 18, 42%); ferimento por arma de fogo (n = 3, 7%); intoxicações exógenas por carbamato (n = 2, 5%); por organofosforado (n = 2, 5%) e por medicação (n = 4, 9%); ferimento por arma branca (n = 5, 11%); traumatismo cranio-encefálico (n = 4, 9%); insuficiência respiratória aguda (n = 3, 7%); insuficiência cardíaca congestiva (n = 1, 2%); e lúpus eritematoso sistêmico (n = 1, 2%).

O período de tempo de intubação dos pacientes, anterior ao início do estudo, variou de 24 a 120 horas. No momento da coleta dos dados, os níveis de sedação dos pacientes, segundo a escala de Ramsay, foram de 18 (41%) em grau quatro, 13 (31%) em grau cinco e 12 (28%) em grau seis.

Dos 43 pacientes estudados, 13 (30%) apresentaram aspiração do corante após trinta minutos da instilação desde o primeiro momento, demonstrando o deslizamento de corante pelas paredes externas da cânula endotraqueal, sendo retirados do estudo sem serem alocados como grupo experimental ou controle. Os outros 30 (70%) pacientes que participaram dos dois momentos do estudo forneceram 226 amostras de secreções traqueais, sendo 116 do grupo controle e 110 do grupo experimental. Observou-se que apenas em dois pacientes (2%) do grupo experimental houve a presença de amostras contendo secreções coradas, o que revela a presença do corante instilado na cavidade orofaríngea. Em ambos os pacientes, a secreção foi colhida após a realização da HM (Tabela I).

DISCUSSÃO

Ao ser planejado este estudo, levantou-se a hipótese de que as HM, quando realizadas em pacientes adultos, sedados e assistidos por ventilação mecânica, poderiam causar movimentação do tubo endotraqueal e alterar a vedação do cuff, fato que permitiria o fluxo de secreções da cavidade orofaríngea para os pulmões. Em virtude de essas secreções serem potencialmente contaminadas, como resultado do refluxo gastroenteral e/ou pelas condições da cavidade orofaríngea do paciente, se aspiradas elas podem ocasionar as pneumonias nosocomiais, o que pode aumentar entre quatro a 15 dias o número de dias de hospitalização e elevar os custos a valores entre US$ 3 mil a US$ 6 mil 4.

Nas literaturas pesquisadas não foram encontradas referências sobre a influência das técnicas de fisioterapia respiratória na aspiração de fluidos da cavidade orofaríngea em paciente sob ventilação mecânica.

Neste estudo, optou-se pela utilização do corante pasta de cobre de clorofilina como marcador de aspiração por ser um método de baixo custo, não tóxico e de fácil manuseio. Isso porque os corantes azuis como o de metileno não têm seu uso aprovado pelo United States Food and Drug Administration (FDA), por conta de efeitos colaterais como hiperbilirrubinemia, anemia recorrente, dismorfia de células vermelhas e absorção sistêmica do corante azul 5,6.

Todas as variáveis intervenientes que pudessem interferir nos resultados foram controladas, tais como: idade, sexo, tempo de intubação, pressão intra-cuff, diâmetro e marca do tubo endotraqueal.

A grande incidência de pacientes (30%) com aspiração espontânea de secreções da cavidade orofaríngea encontrada na amostra corrobora com outros estudos que apontam altos índices de aspiração em pacientes que estavam nas mesmas condições, ou seja, sedados sob ventilação mecânica 5,6.

A ocorrência dessas aspirações espontâneas pode ser explicada pela existência de várias formas de traqueia, o que impede a vedação adequada pelo cuff 7. Além disso, pode ocorrer formação de dobras na parede do cuff, que se comportam como sulcos, facilitando a aspiração das secreções orofaríngeas 8.

Embora não se tenha verificado diferença estatística entre os grupos, dois pacientes (2%) do grupo experimental apresentaram aspiração de secreções após a realização das manobras de HM, sugerindo, assim, necessidade de aspiração da cavidade orofaríngea antes do tratamento fisioterápico, uma vez que nesse compartimento pode ocorrer acúmulo de 5 a 15 mL de secreções 9.

Considerando os resultados, verificou-se que a manobra de hiperinflação manual não propiciou a aspiração das secreções da cavidade orofaríngea em paciente sob ventilação mecânica invasiva.

Submetido em 20 de julho de 2010.

Aprovado para publicação em 31 de janeiro de 2011.

Recebido do Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Brasil.

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  • Correspondência para:

    Dr. Armando Carlos Franco de Godoy
    Rua Hercules Florence, 100 ap 23
    13020-170 - Campinas, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Out 2011

    Histórico

    • Aceito
      31 Jan 2011
    • Recebido
      20 Jul 2010
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