Acessibilidade / Reportar erro

Ainda se pode fazer a compressão na cartilagem cricoide?

CARTA AO EDITOR

Ainda se pode fazer a compressão na cartilagem cricoide?

Fabiano Timbó Barbosa

MD, Universidade Federal de Alagoas

Prezado Editor-chefe,

A compressão na cartilagem cricoide foi descrita pela primeira vez por Sellick em 1961 e consiste em aplicar pressão sobre a cartilagem cricoide contra a vértebra cervical para ocluir a parte superior do esôfago e assim prevenir a regurgitação do conteúdo gástrico ao pulmão1.

O sucesso inicial da manobra começou a ser questionado quando alguns casos foram relatados demonstrando aspiração do conteúdo gástrico seguido de óbito apesar do seu uso2. Alguns fatores podem ser citados para justificar a falha da manobra: tempo incorreto de aplicação da compressão, uso excessivo da força no momento da compressão e compressão de local inadequado1.

Smith e col.3 estudaram indivíduos normais por meio da tomografia computadorizada e concluíram que o esôfago foi deslocado lateralmente em 49% dos participantes. Rice e col.4 fizeram outro estudo com ressonância magnética e concluíram que a manobra criada por Sellick pode comprimir a hipofaringe e que a posição do esôfago seria irrelevante na execução da manobra. Os resultados desses estudos são conflitantes, chamando a atenção para que novas pesquisas sejam feitas para confirmar um ou outro resultado. A controvérsia continuará por muitos anos, pois a realização de um estudo prospectivo e controlado nesse cenário não seria ética e o estudo inicial publicado por Sellick foi feito em cadáveres1,5,6.

A compressão na cartilagem cricoide pode auxiliar no momento da intubação orotraqueal por ter potencial para facilitar a visualização das cordas vocais, porém esse efeito não é unânime em todas as pesquisas e algumas relatam ainda prejuízo para o sucesso da intubação1,7.

Em suma, ainda é possível fazer a compressão da cartilagem cricoide com a finalidade de prevenção da regurgitação do conteúdo gástrico, uma vez que não está confirmada a ausência total de sua eficácia na prática clínica. Outro fato marcante é que a regurgitação seguida de pneumonia é um evento raro, dificultando a percepção de ter sido eficaz ou não o uso da manobra na prática cotidiana1. O bom senso, o treinamento prévio e a prática de cada profissional nortearão a melhor conduta clínica perante cada caso em particular até que novos estudos demonstrem ausência de eficácia.

  • 1. El-Orbany M, Connolly LA - Rapid sequence induction and intubation: current controversy. Anesth Analg, 2010;110:1318-1325.
  • 2. Robinson JS, Thompson JM - Fatal aspiration (Mendelson's) syndrome despite antacids and cricoid pressure. Lancet, 1979;2:228-230.
  • 3. Smith KJ, Ladak S, Choi PT, Dobranowski J - The cricoid cartilage and the esophagus are not aligned in close to half of adult patients. Can J Anaesth, 2002;49:503-507.
  • 4. Rice MJ, Mancuso AA, Gibbs C, Morey TE, Gravenstein N, Deitte LA - Cricoid pressure results in compression of the postcricoid hypopharynx: the esophageal position is irrelevant. Anesth Analg, 2009;109:1546-1552.
  • 5. Ovassapian A, Salem MR - Sellick's maneuver: to do or not do. Anesth Analg, 2009;109:1360-1362.
  • 6. Benhamou D - Cricoid pressure is unnecessary in obstetric general anaesthesia. Proposer. Int J Obstet Anesth, 1995;4:30-431.
  • 7. Turgeon AF, Nicole PC, Trepanier CA - Cricoid pressure does not increase the rate of failed intubation by direct laryngoscopy in adults. Anesthesiology, 2005;102:315-319.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Set 2012
  • Data do Fascículo
    Out 2012
Sociedade Brasileira de Anestesiologia R. Professor Alfredo Gomes, 36, 22251-080 Botafogo RJ Brasil, Tel: +55 21 2537-8100, Fax: +55 21 2537-8188 - Campinas - SP - Brazil
E-mail: bjan@sbahq.org