Acessibilidade / Reportar erro

Lesão brônquica e pneumotórax após reintubação usando um cateter para troca da via aérea

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Relatamos um caso de pneumotórax causado por perfuração brônquica durante uma reintubação usando um cateter para troca da via aérea (CTVA) em um paciente com câncer de cabeça e pescoço. RELATO DE CASO: Paciente do sexo masculino, 53 anos, com carcinoma de orofaringe, foi internado na UTI com pneumonia grave e síndrome da angústia respiratória aguda (SARA). O paciente foi identificado como sendo de difícil intubação e uma sonda endotraqueal (SET) foi inserida através de um broncoscópio. Após uma semana de tratamento, observou-se ruptura do manguito endotraqueal. A troca da sonda endotraqueal foi necessária para obter uma ventilação pulmonar satisfatória. Um cateter para troca da via aérea (Cook, tamanho 14) foi usado para realizar a reintubação. Depois da reintubação, o paciente apresentou piora na saturação de oxigênio e uma radiografia revelou um grande pneumotórax. Um dreno torácico foi inserido e uma melhora imediata na saturação de oxigênio foi observada. A repetição da radiografia confirmou o posicionamento correto do dreno torácico e a reexpansão do pulmão direito. A broncoscopia realizada mostrou uma laceração posterior do brônquio principal direito. O paciente foi extubado no dia seguinte. Depois de quatro dias, o dreno torácico foi removido. A radiografia realizada um dia depois da retirada do dreno revelou um pequeno pneumotórax no lobo superior direito, mas o paciente permaneceu assintomático. CONCLUSÕES: O cateter para troca da via aérea é uma ferramenta valiosa para lidar com pacientes difíceis de intubar. Embora os médicos geralmente concentrem sua atenção em evitar um barotrauma causado pelo suplemento de oxigênio ou ventilação a jato através do CTVA, a preocupação com a técnica de inserção pode minimizar as complicações que ameaçam a vida e aumentar a segurança do CTVA.

ANESTESIA; INTUBAÇÃO TRAQUEAL; Manuseio das Vias Aéreas; TERAPIA INTENSIVA


BACKGROUND AND OBJECTIVES: We report a case of pneumothorax caused by a bronchial perforation during a reintubation using an airway exchange catheter (AEC) in a patient with a head and neck cancer. CASE REPORT: A 53 year old man with oropharynx carcinoma was admitted to ICU for severe pneumonia and severe acute respiratory distress syndrome (ARDS). The patient was recognized as a difficult-to-intubate patient and an endotracheal tube (ETT) was inserted through a bronchoscope. After one week of treatment, it was observed an endotracheal cuff perforation. Exchanging the endotracheal tube was necessary to achieve satisfactory pulmonary ventilation. An AEC Cook 14 was used to perform the reintubation. After reintubation, the patient presented a worsening in oxygen saturation and a chest radiography (CXR) revealed a large pneumothorax. A chest tube was inserted and we observed immediate improvement in oxygen saturation. A repeat CXR confirmed correct positioning of the chest tube and reexpansion of the right lung. A bronchoscopy performed showed a posterior laceration in the right main bronchus. The patient was extubated the following day. After four days, the chest tube was removed. A CXR performed a day after chest tube removal revealed a small right upper pneumothorax, but the patient remained asymptomatic. CONCLUSIONS: Airway exchange catheter is a valuable tool to handle with difficult-to-intubate patients. Although the physicians generally focus their attention in avoid barotrauma - caused by oxygen supplement or jet ventilation through AEC - concern for insertion technique can minimize life threatening complications and increase the safety of AEC.

Intubation, Intratracheal; Airway Management; Intensive Care; Anesthesia


JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: Relatamos aquí un caso de neumotórax causado por perforación brónquica durante una reintubación usando un catéter para el cambio de la vía aérea (CTVA) en una paciente con cáncer de cabeza y cuello. RELATO DE CASO: Paciente del sexo masculino, 53 años, con carcinoma de orofaringe, que fue ingresado en la UTI con neumonía grave y el síndrome de la angustia respiratoria aguda (SARA). El paciente fue identificado como siendo de difícil intubación y con un broncoscopio se le insertó una sonda endotraqueal (SET). Después de una semana de tratamiento, vimos una ruptura del manguito endotraqueal. El cambio de la sonda endotraqueal se hizo necesario para obtener una ventilación pulmonar satisfactoria. Un catéter para el cambio de la vía aérea (Cook, tamaño 14) se usó para realizar la reintubación. Después de la reintubación, el paciente tuvo un empeoramiento en la saturación de oxígeno y una radiografía reveló un fuerte neumotórax. Un dreno torácico se insertó observando una mejoría inmediata en la saturación de oxígeno. La repetición de la radiografía confirmó el posicionamiento correcto del dreno torácico y la re-expansión del pulmón derecho. La broncoscopia realizada arrojó una laceración posterior del bronquio principal derecho. El paciente se desentubó al día siguiente. Después de cuatro días, el dreno torácico se retiró. La radiografía realizada un día después de la retirada del dreno reveló un pequeño neumotórax en el lóbulo superior derecho, pero el paciente permaneció asintomático. CONCLUSIONES: El catéter para el cambio de la vía aérea es una herramienta valiosa para lidiar con los pacientes difíciles de intubar. Aunque los médicos generalmente concentren su atención en evitar un barotrauma causado por el suplemento de oxígeno o ventilación a chorro por medio del CTVA, la preocupación con la técnica de inserción puede minimizar las complicaciones que amenazan la vida y aumentar la seguridad del CTVA.

ANESTESIA; Manejo de Vía Aérea; CUIDADOS INTENSIVOS; INTUBACIÓN TRAQUEAL


INFORMAÇÃO CLÍNICA

Lesão brônquica e pneumotórax após reintubação usando um cateter para troca da via aérea

Juliano P. de Almeida; Ludhmila A. Hajjar; Júlia T. Fukushima; Rosana E. Nakamura; Rodolfo Albertini; Filomena R. B. G. Galas

Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), Departamento de Anestesiologia e Terapia Intensiva, São Paulo, SP, Brasil

Correspondência para Correspondência para: Juliano P. de Almeida Departamento de Anestesiologia e Terapia Intensiva Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Av. Dr. Arnaldo 251, São Paulo, SP, Brasil E-mail: doctorjuliano@yahoo.com.br

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Relatamos um caso de pneumotórax causado por perfuração brônquica durante uma reintubação usando um cateter para troca da via aérea (CTVA) em um paciente com câncer de cabeça e pescoço.

RELATO DE CASO: Paciente do sexo masculino, 53 anos, com carcinoma de orofaringe, foi internado na UTI com pneumonia grave e síndrome da angústia respiratória aguda (SARA). O paciente foi identificado como sendo de difícil intubação e uma sonda endotraqueal (SET) foi inserida através de um broncoscópio. Após uma semana de tratamento, observou-se ruptura do manguito endotraqueal. A troca da sonda endotraqueal foi necessária para obter uma ventilação pulmonar satisfatória. Um cateter para troca da via aérea (Cook, tamanho 14) foi usado para realizar a reintubação. Depois da reintubação, o paciente apresentou piora na saturação de oxigênio e uma radiografia revelou um grande pneumotórax. Um dreno torácico foi inserido e uma melhora imediata na saturação de oxigênio foi observada. A repetição da radiografia confirmou o posicionamento correto do dreno torácico e a reexpansão do pulmão direito. A broncoscopia realizada mostrou uma laceração posterior do brônquio principal direito. O paciente foi extubado no dia seguinte. Depois de quatro dias, o dreno torácico foi removido. A radiografia realizada um dia depois da retirada do dreno revelou um pequeno pneumotórax no lobo superior direito, mas o paciente permaneceu assintomático.

CONCLUSÕES: O cateter para troca da via aérea é uma ferramenta valiosa para lidar com pacientes difíceis de intubar. Embora os médicos geralmente concentrem sua atenção em evitar um barotrauma causado pelo suplemento de oxigênio ou ventilação a jato através do CTVA, a preocupação com a técnica de inserção pode minimizar as complicações que ameaçam a vida e aumentar a segurança do CTVA.

Unitermo: ANESTESIA; INTUBAÇÃO TRAQUEAL; Manuseio das Vias Aéreas; TERAPIA INTENSIVA.

Introdução

A troca da sonda endotraqueal (SET) em pacientes difíceis de intubar é geralmente um desafio para os médicos. Uma forma de aumentar a segurança desse procedimento é o uso de um cateter para troca da via aérea (CTVA). Porém, é extremamente importante que os médicos tenham conhecimento das possíveis complicações relacionadas ao uso do CTVA.

Existem muitas complicações relacionadas a esse procedimento. Duas categorias são descritas: barotrauma e falha em passar a nova sonda endotraqueal pelo CTVA. Há relatos de pneumotórax, pneumomediastino, pneumoperitônio e até de morte1. O objetivo deste relato de caso é alertar os médicos sobre uma complicação que pode ser fatal com o uso do CTVA: perfuração da árvore traqueobrônquica.

Relato de caso

Relatamos um caso ocorrido na unidade de terapia intensiva do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), Brasil.

Um homem de 53 anos, com carcinoma de orofaringe, foi internado na UTI com pneumonia e insuficiência respiratória graves. O paciente desenvolveu a síndrome da angústia respiratória aguda (SARA) e precisou de ventilação mecânica invasiva. O paciente foi identificado como sendo difícil de intubar e uma sonda endotraqueal (SET) foi inserida através de um broncoscópio de fibra óptica. Após uma semana de tratamento, a ruptura do manguito endotraqueal foi observada, provavelmente devida a uma alteração na anatomia das vias aéreas e fatores da técnica. A troca da sonda endotraqueal foi necessária para obter uma ventilação pulmonar satisfatória. O paciente foi sedado com fentanil e midazolam e paralisado com cisatracúrio. Um CTVA (Cook, tamanho 14) foi usado para realizar a reintubação. Não houve necessidade de complementar o oxigênio através do CTVA. Após a reintubação, o paciente apresentou piora aguda da saturação de oxigênio e foi detectada durante a ausculta diminuição da entrada de ar no hemitórax direito. Uma radiografia de tórax foi realizada e revelou um grande pneumotórax (Figura 1). Um dreno de tórax foi inserido e melhora imediata na saturação de oxigênio foi observada. A repetição da radiografia confirmou a posição correta do dreno e a reexpansão do pulmão direito. Broncoscopia foi realizada e mostrou uma laceração posterior do brônquio principal direito. O paciente foi extubado no dia seguinte. Depois de quatro dias, o dreno foi removido. A radiografia realizada um dia depois da retirada do dreno revelou um pequeno pneumotórax no lobo superior direito, mas o paciente permaneceu assintomático.


Discussão

A reintubação é um procedimento comum em pacientes internados em UTI. Complicações graves como hipoxemia, lesão das vias aéreas, hemorragia, edema de laringe e manejo difícil das vias aéreas podem surgir 2. Os pacientes com câncer, principalmente de cabeça e pescoço, representam o grupo com maior incidência de intubação difícil, em comparação com a população em geral 3. O uso de cateter para troca da via aérea (CTVA) é uma abordagem eficaz e segura para reintubar pacientes com via aérea difícil.

Barotrauma e outras complicações provenientes da tentativa de ventilar pacientes com o uso de CTVA são bem conhecidos e amplamente descritos na literatura. De fato, há relatos de que até 11% dos pacientes desenvolvem barotrauma quando o CTVA é usado com ventilação a jato de 50 psi 4.

Nosso paciente desenvolveu um efeito adverso raro e grave relacionado ao uso do CTVA, a perfuração da árvore traqueobrônquica, e não o barotrauma. Pelo que sabemos, existem apenas dois relatórios anteriores sobre essa complicação 5,6. Isso talvez se deva a erros de diagnóstico ou, em outros casos, a perfuração da árvore traqueobrônquica pode ter sido erroneamente atribuída a fatores de risco do paciente. Na população específica de pacientes com câncer, as complicações devido ao CTVA podem ser mais frequentes do que o já relatado e até relacionadas a uma taxa maior de morbidade e mortalidade.

Há algumas recomendações simples, mas eficazes, para evitar essa complicação grave. Primeiro, devemos ficar atentos à profundidade de inserção do CTVA, que não deve exceder 26 cm em paciente adulto, e, caso haja resistência ao avanço, o cateter não deve ser forçado. Um laringoscópio deve ser usado para ajudar a passagem da nova sonda endotraqueal pelas estruturas supraglóticas e pregas vocais. Se a resistência continuar, a sonda endotraqueal deve ser girada 90 graus em sentido anti-horário, porque a ponta da sonda pode bater na prega vocal direita ou nas cartilagens aritenoides e, com essa manobra, passar sobre elas 7.

Outra forma de aumentar a segurança do CTVA é o uso de um broncoscópio de fibra óptica (BFO). O uso de BFO junto com o CTVA pode reduzir a incidência de trauma das vias aéreas inferiores. A visualização da ponta do CTVA pelo BFO pode evitar uma inserção excessiva do CTVA e aumentar as intubações traqueais bem-sucedidas 8.

Em conclusão, o cateter para troca da via aérea (CTVA) é uma ferramenta valiosa para o manejo de pacientes difíceis de intubar. Embora os médicos geralmente concentrem sua atenção em evitar um barotrauma causado pelo suplemento de oxigênio ou ventilação a jato através do CTVA, a preocupação com a técnica de inserção pode minimizar as complicações que ameaçam a vida, como a perfuração da árvore traqueobrônquica, e aumentar a segurança do CTVA. O presente relato também ilustra uma estratégia eficaz de manejo das vias aéreas em pacientes com câncer.

Submetido em 15 de junho de 2011.

Aprovado para publicação em 18 de fevereiro de 2012.

Recebido do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), Departamento de Anestesiologia e Terapia Intensiva, São Paulo, SP, Brasil

  • 1. Duggan LV, Law JA, Murphy MF - Brief review: supplementing oxygen through an airway exchange catheter: efficacy, complications, and recommendations. Can J Anaesth, 2011;58:560-568.
  • 2. Navalesi P, Frigerio P, Moretti MP et al. - Rate of reintubation in mechanically ventilated neurosurgical and neurologic patients: evaluation of a systematic approach to weaning and extubation. Crit Care Med, 2008;36(11):2986-2992.
  • 3. Huitink JM, Buitelaar DR, Schutte PF - Awake fibrecapnic intubation: a novel technique for intubation in head and neck cancer patients with a difficult airway. Anaesthesia, 2006;61(5):449-452.
  • 4. Cooper RM - The use of an endotracheal ventilation catheter in the management of difficult extubations. Can J Anaesth, 1996;43:90-93.
  • 5. DeLima I, Bishop M - Lung laceration after tracheal extubation over a plastic tube changer. Anesth Analg, 1991;73:350-351.
  • 6. Seita PA, Gravenstein N - Endobronchial rupture from endotracheal reintubation with an endotracheal tube guide. J Clin Anesth, 1989;1:214-217.
  • 7. Benumof JL - Airway exchange catheters: simple concept, potentially great danger. Anesthesiology, 1999;91(2):342-344.
  • 8. Ayoub CM, Lteif AM, Rizk MS, Abu-Jalad NM, Hadi U, Baraka AS - Facilitation of passing the endotracheal tube over the flexible fiberoptic bronchoscope using a Cook airway exchange catheter. Anesthesiology, 2002;96(6):1517-1518.
  • Correspondência para:

    Juliano P. de Almeida
    Departamento de Anestesiologia e Terapia Intensiva Instituto do Câncer do Estado de São Paulo
    Av. Dr. Arnaldo 251, São Paulo, SP, Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Fev 2013
    • Data do Fascículo
      Fev 2013

    Histórico

    • Recebido
      15 Jun 2011
    • Aceito
      18 Fev 2012
    Sociedade Brasileira de Anestesiologia R. Professor Alfredo Gomes, 36, 22251-080 Botafogo RJ Brasil, Tel: +55 21 2537-8100, Fax: +55 21 2537-8188 - Campinas - SP - Brazil
    E-mail: bjan@sbahq.org