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Efeitos da pressão do pneumoperitôneo artificial elevada sobre a pressão arterial invasiva e os níveis dos gases sanguíneos

Resumos

Justificativa e objetivo:

avaliar as repercussões clínicas, hemodinâmicas, gasométricas e metabólicas das altas pressões transitórias do pneumoperitônio por curto período de tempo que garantem maior segurança para a introdução do primeiro trocarte.

Métodos:

foram estudados 67 pacientes submetidos a procedimentos videolaparoscópicos e aleatoriamente distribuídos em grupo P12: n = 30 (pressão intraperitoneal [PIP] de 12 mmHg) e grupo P20: n = 37 (PIP de 20 mmHg). Foram avaliados a pressão arterial média (PAM), por cateterismo da artéria radial; e, mediante gasometria, o pH, a pressão parcial de oxigênio arterial (PaO2), a pressão parcial de CO2 arterial (PaCO2), o bicarbonato (HCO3) e a reserva alcalina (BE). Esses parâmetros foram avaliados em ambos os grupos no tempo zero, antes do pneumoperitônio (TP0); no tempo um (TP1), quando a PIP atinge 12 mmHg em ambos os grupos; no tempo dois (TP2), após cinco minutos com PIP de 12 mmHg em P12 e após cinco minutos com PIP de 20 mmHg em P20; e no tempo três (TP3), após 10 minutos com PIP de 12 mmHg em P12 e com PIP retornada de 20 mmHg para 12 mmHg, contados 10 minutos após TP1 em P20. Os valores diferentes dos considerados normais para os parâmetros aquilatados ou o surgimento de fenômenos orgânicos atípicos foram considerados alteracões clínicas.

Resultados:

ocorreram diferenças estatísticas significantes no grupo P20 na PAM, no pH, no HCO3 e na BE, mas dentro dos limites da normalidade. Não foram evidenciadas alterações clínicas e patológicas.

Conclusões:

pressão intra-abdominal alta e transitória causa alterações da PAM, do pH, do HCO3 e da BE sem que haja repercussão clínica no paciente.

Pneumoperitônio artificial; Laparoscopia; Instrumentos cirúrgicos; Monitoracão; Intraoperatório


Background and objective:

to evaluate the clinical, hemodynamic, gas analysis and metabolic repercussions of high transient pressures of pneumoperitoneum for a short period of time to ensure greater security for introduction of the first trocar.

Methods:

sixty-seven patients undergoing laparoscopic procedures were studied and randomly distributed in P12 group: n = 30 (intraperitoneal pressure [IPP] 12 mmHg) and P20 group: n = 37 (IPP of 20 mmHg). Mean arterial pressure (MAP) was evaluated by catheterization of the radial artery; and through gas analysis, pH, partial pressure of oxygen (PaO2), partial pressure of CO2 (PaCO2), bicarbonate (HCO3) and alkalinity (BE) were evaluated. These parameters were measured in both groups at time zero before pneumoperitoneum (TP0); at time 1 (TP1) when IPP reaches 12mmHg in both groups; at time 2 (TP2) after five min with IPP = 12mmHg in P12 and after 5 min with IPP = 20mmHg at P20; and at time 3 (TP3) after 10 min with IPP = 12mmHg in P12 and with return of IPP from 20 to 12mmHg, starting 10min after TP1 in P20. Different values from those considered normal for all parameters assessed, or the appearance of atypical organic phenomena, were considered as clinical changes.

Results:

there were statistically significant differences in P20 group in MAP, pH, HCO3 and BE, but within normal limits. No clinical and pathological changes were observed.

Conclusions:

high and transient intra-abdominal pressure causes changes in MAP, pH, HCO3 and BE, but without any clinical impact on the patient.

Artificial pneumoperitoneum; Laparoscopy; Surgical instruments; Monitoring; Intraoperative


Justificación y objetivo:

evaluar las repercusiones clínicas, hemodinámicas, gasométricas y metabólicas de las altas presiones transitorias del neumoperitoneo durante un corto período de tiempo para garantizar una mayor seguridad en la introducción del primer trocar.

Métodos:

fueron estudiados 67 pacientes sometidos a procedimientos videolaparoscópicos y distribuidos aleatoriamente en grupo P12: n = 30 (presión intraperitoneal [PIP] de 12 mmHg), y grupo P20: n = 37 (PIP de 20 mmHg). Se evaluó la presión arterial media por cateterismo de la arteria radial; y mediante gasometría, el pH, la presión parcial de oxígeno arterial, la presión parcial de CO2 arterial, el bicarbonato y la reserva alcalina. Esos parámetros fueron evaluados en ambos grupos en el tiempo cero, antes del neumoperitoneo (TP0); en el tiempo uno (TP1), cuando la PIP alcanza 12 mmHg en ambos grupos; en el tiempo 2 (TP2), después de 5 min con PIP de 12 mmHg en P12 y después de 5 min con PIP de 20 mmHg en P20; y en el tiempo 3 (TP3), después de 10 min con PIP de 12 mmHg en P12 y con PIP de retorno desde 20 mmHg a 12 mmHg, contados 10 min después de TP1 en P20. Los valores diferentes de los considerados normales para los parámetros medidos o el surgimiento de fenómenos orgánicos atípicos fueron considerados alteraciones clínicas.

Resultados:

hubo diferencias estadísticas significativas en el grupo P20 en la presión arterial media, en el pH, en el bicarbonato y en la reserva alcalina, pero dentro de los límites de la normalidad. No se evidenciaron alteraciones clínicas ni patológicas.

Conclusiones:

la presión intraabdominal alta y transitoria causa alteraciones de la presión arterial media, del pH, del bicarbonato y de la reserva alcalina sin repercusiones clínicas para el paciente.

Neumoperitoneo artificial; Laparoscopia; Instrumentos quirúrgicos; Monitorización; Intraoperatorio


Introdução

Métodos minimamente invasivos usados para acessar os órgãos e as estruturas da cavidade abdominal promovem uma redução da resposta metabólica ao trauma e mais benefícios para os pacientes. Isso se aplica particularmente à videolaparoscopia.11. Schippers E, Ottinger AP, Anurov M, et al. Laparoscopic cholecystectomy: a minor abdominal trauma? World J Surg. 1993;17:539-42.

2. Roll S, Azevedo JLMC, Campos F,et al. Two-ports technique of laparoscopic cholecystectomy. Endoscopy. 1997;29:S43.
-33. Novitsky YW, Kercher KW, Czerniach DR, et al. Advantages of mini-laparoscopic vs conventional laparoscopic cholecystectomy: results of a prospective randomized trial. Arch Surg. 2005;140:1178-83. Entretanto, por ser relativamente recentes, as técnicas operatórias laparoscópicas ainda mostram controvérsias. Uma delas diz respeito à melhor forma de criação do pneumoperitônio artificial. Apesar de não existir consenso quanto ao melhor método para o acesso à cavidade peritoneal com vistas à instauração do pneumoperitônio, a punção com agulha de Veress é a técnica mais frequentemente usada.44. Neudecker J, Sauerland S, Neugebauer EB, et al. The European Association for Endoscopic Surgery clinical practice guideline on the pneumoperitoneum for laparoscopic surgery. Surg Endosc. 2002;16:1121-43.,55. Molloy D, Kaloo PD, Cooper M, et al. Laparoscopic entry: a literature review and analysis of techniques and complications of primary port entry. Aust N Z J Obstet Gynaecol. 2002;42:246-53. As complicações durante a introdução do primeiro trocarte também ainda são discutidas.

Grande parte das complicações que ocorrem nas laparoscopias (em cerca de 50% delas) acontece no início do procedimento, no período da introdução da agulha de Veress e do primeiro trocarte, o que faz da laparoscopia um procedimento cirúrgico peculiar, no qual o acesso operatório é mais perigoso do que a intervenção cirúrgica propriamente dita.66. Neves JFNP, Monteiro GA, Almeida JR, et al. Lesão vascular grave em colecistectomia videolaparoscópica. Relato de dois casos. Rev Bras Anestesiol. 2000;50(4):294-6. Em recente revisão da literatura referente às lesões causadas por agulha de Veress e pelo primeiro trocarte em 357.257 pacientes, constatou-se prevalência de 0,04% de lesões gastrointestinais e de 0,02% de lesões vasculares.77. Azevedo JL, Azevedo OC, Miyahira SA, et al. Injuries caused by Veress needle insertion for creation of pneumoperitoneum: a systematic literature review. Surg Endosc. 2009;23:1428-32. DOI 10.1007/s00464-009-0383-9.
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Essas iatrogenias são relativamente raras, mas suas consequências são de suma gravidade. Nessas circunstâncias, podem ocorrer hemorragias, peritonites, falência de múltiplos órgãos, morte e implicações médico-legais.

Dessa forma, é essencial buscar opções técnicas mais seguras do que o método mais comumente usado, que consiste na punção com agulha de Veress na linha mediana do abdome, nas cercanias da cicatriz umbilical, insuflação do abdome até a obtenção de pressão intraperitoneal entre 10 mmHg e 12 mmHg e introdução às cegas do primeiro trocarte, no mesmo local usado para a introdução da agulha.44. Neudecker J, Sauerland S, Neugebauer EB, et al. The European Association for Endoscopic Surgery clinical practice guideline on the pneumoperitoneum for laparoscopic surgery. Surg Endosc. 2002;16:1121-43.,55. Molloy D, Kaloo PD, Cooper M, et al. Laparoscopic entry: a literature review and analysis of techniques and complications of primary port entry. Aust N Z J Obstet Gynaecol. 2002;42:246-53.

Uma revisão de literatura revelou que as mais graves lesões ocorrem quando a agulha de Veress é introduzida na linha mediana do abdome, ao nível da cicatriz umbilical.77. Azevedo JL, Azevedo OC, Miyahira SA, et al. Injuries caused by Veress needle insertion for creation of pneumoperitoneum: a systematic literature review. Surg Endosc. 2009;23:1428-32. DOI 10.1007/s00464-009-0383-9.
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A inserção da agulha de Veress na região do hipocôndrio esquerdo, entretanto, é segura e eficaz88. Azevedo OC, Azevedo JLMC, Sorbello AA, et al. Veress needle insertion in the left hypochondrium in creation of the pneumoperitoneum. Acta Cir Bras. 2006;21:296-303. e a probabilidade de lesões graves é menor, porque o local não envolve estruturas vitais, como os vasos retroperitoneais.77. Azevedo JL, Azevedo OC, Miyahira SA, et al. Injuries caused by Veress needle insertion for creation of pneumoperitoneum: a systematic literature review. Surg Endosc. 2009;23:1428-32. DOI 10.1007/s00464-009-0383-9.
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Todavia, a inserção do primeiro trocarte deve ser na linha mediana ao nível da cicatriz umbilical, e não no hipocôndrio esquerdo, como recomendado para a agulha de Veress.88. Azevedo OC, Azevedo JLMC, Sorbello AA, et al. Veress needle insertion in the left hypochondrium in creation of the pneumoperitoneum. Acta Cir Bras. 2006;21:296-303. Essa recomendação é baseada no fato de que o trocarte é o local onde a cânula do laparoscópio será inserida.44. Neudecker J, Sauerland S, Neugebauer EB, et al. The European Association for Endoscopic Surgery clinical practice guideline on the pneumoperitoneum for laparoscopic surgery. Surg Endosc. 2002;16:1121-43.,55. Molloy D, Kaloo PD, Cooper M, et al. Laparoscopic entry: a literature review and analysis of techniques and complications of primary port entry. Aust N Z J Obstet Gynaecol. 2002;42:246-53. Quando o laparoscópio é introduzido na linha média na cicatriz umbilical, obtêm-se melhor claridade, melhores imagens dos órgãos e das estruturas intra-abdominais e uma visão mais ampla durante a introdução dos outros trocartes.

O estabelecimento de um regime de pressão de pneumoperitônio artificial muito elevada, em período de tempo apenas suficiente para a introdução do primeiro trocarte, feita às cegas no método fechado, pode contribuir para proteger as estruturas intra-abdominais de lesões sem, entretanto, determinar repercussões orgânicas sob a forma de complicações clínicas.99. Reich H, Rasmussen C, Vidali A. Peritoneal hypertension for trocar insertion. Gynaecol Endosc. 1999;8:375-7.,1010. Tsaltas J, Pearce S, Lawrence A, et al. Safer laparoscopic trocar entry: it's all about pressure. Aust N Z J Obstet Gynaecol. 2004;44:349-50. Nenhuma lesão vascular foi relatada em um estudo que investigou 3.041 pacientes submetidos a introdução do primeiro trocarte às cegas na linha mediana com uma pressão intra-abdominal abaixo de 25-30 mmHg.1111. Reich H, Ribeiro SC, Rasmussen C, et al. High-pressure trocar insertion technique. J Soc Laparoendosc Surg. 1999;3:45-8.

Um estudo investigou o efeito protetor de pressões intraperitoneais elevadas sobre as estruturas intra-abdominais frente à agressão representada pela introdução às cegas do primeiro trocarte na cavidade peritoneal.1212. Phillips G, Garry R, Kumar C, et al. How much gas is required for initial insufflation at laparoscopy. Gynaecol Endosc. 1999;8:369-74. Os autores correlacionaram a distância entre a parede abdominal anterior e as vísceras intra-abdominais com diferentes pressões e volumes intraperitoneais, assim como as distâncias observadas com a força requerida para a introdução do primeiro trocarte na cavidade abdominal, e puderam constatar que altas pressões intraperitoneais determinam importante aumento das referidas distâncias e do volume da bolha de gás e propiciam também um melhor deslizamento do trocarte para o interior da cavidade. Também foi demonstrado que, com o uso de altas pressões intraperitoneais, a parede abdominal torna-se mais tensa e diminui a sua deformação elástica causada pela força aplicada sobre o trocarte.1212. Phillips G, Garry R, Kumar C, et al. How much gas is required for initial insufflation at laparoscopy. Gynaecol Endosc. 1999;8:369-74.

Não obstante a inexistência de sinais clínicos inequívocos de complicações, o pneumoperitônio artificial com pressões muito elevadas durante período prolongado de tempo pode causar alterações hemodinâmicas e estruturais no hospedeiro, diretamente relacionadas com a magnitude dos níveis tensionais e detectáveis pela monitoração de parâmetros hemodinâmicos e gasométricos. Assim, sob altas pressões intraperitoneais foi demonstrada diminuição do débito cardíaco, queda do retorno venoso, aumento na pressão arterial média, incremento na resistência vascular sistêmica, alteração de perfusão renal e da filtração glomerular, além de lesão de isquemia e reperfusão dos órgãos intra-abdominais.1313. Koivusalo AM, Lindgren L. Effects of carbon dioxide pneumoperitoneum for laparoscopic cholecystectomy. Acta Anaesthesiol Scand. 2000;44:834-41.

14. Safran DB, Orlando R. Physiologic effects of pneumoperitoneum. Am J Surg. 1994;167:281-6.

15. Indberg F, Bergqvist D, Bjorck M, et al. Renal hemodynamics during carbon dioxide pneumoperitoneum. Surg Endosc. 2003;17:480-4.

16. MacDougall EM, Monk TG, Wolf JS, et al. The effect of prolonged pneumoperitoneum on renal function in an animal model. J Am Coll Surg. 1996;182:317-28.

17. Akbulut G, Polat C, Aktepe F. The oxidative effect of prolonged CO2 pneumoperitoneum on renal tissue of rats. Surg Endosc. 2004;18:1384-8.

18. Ozmen MM, Kessaf Alsar A, Besler HT. Does splanchnic ischemia occur during laparoscopic cholecystectomy? Surg Endosc. 2002;16:468-71.
-1919. Zulfikaroglu B, Koc M, Soran A. Evaluation of oxidative stress in laparoscopic cholecystectomy. Surg Today. 2002;32:869-74. Em razão desses efeitos deletérios das altas pressões intraperitoneais durante procedimentos laparoscópicos, a maioria dos autores preconiza a manutenção da pressão ao nível de 12 mmHg, (nunca além de 15 mmHg, quando são consideradas altas).55. Molloy D, Kaloo PD, Cooper M, et al. Laparoscopic entry: a literature review and analysis of techniques and complications of primary port entry. Aust N Z J Obstet Gynaecol. 2002;42:246-53.,2020. Dexter SP, Vucevic M, Gibson J, et al. Hemodynamic consequences of high and low pressure capnoperitoneum during laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc. 1999;13:376-81.

21. Rosen DMB, Lam AM, Chapman M, et al. Methods of creating pneumoperitoneum: a review of techniques and complications. Obstet Gynecol Surv. 1998;53:167-74.

22. Motew M, Ivankovich AD, Bieniarz J, et al. Cardiovascular effects and acid-base and blood gas changes during laparoscopy. Am J Obstet Gynecol. 1973;115:1002-12.

23. Greim CA, Broscheit J, Kortlander J, et al. Effects of intra-abdominal CO2-insuflation on normal impaired myocardial function: an experimental study. Acta Anaesthesiol Scand. 2003;47:751-60.

24. Ivankovich AD, Albrech RF, Zahed B, et al. Cardiovascular collapse during gynecological laparoscopy. Ill Med J. 1974;145:58-61.

25. Gutt CN, Oniu T, Mehrabi A. Circulatory and respiratory complications of carbon dioxide insuflation. Dig Surg. 2004;21:95-105.
-2626. Barczynski M, Herman RM. A prospective randomized trial on comparison of low-pressure (LP) and standard-pressure (SP) pneumoperitoneum for laparoscopic cholecystectomy. Surg Endos. 2003;17:533-8.

Apesar do acima citado, mudanças hemodinâmicas, metabólicas e estruturais podem ocorrer com pressão intra-abdominal elevada e por período prolongado de tempo. Informações importantes sobre as repercussões gasométricas e metabólicas no paciente submetido a altas pressões intraperitoneais transitórias não estão disponíveis na literatura. Isso significa que uma estratégia segura para a introdução do primeiro trocarte talvez tenha sido relevada por cirurgiões videolaparoscópicos.

O objetivo do presente estudo é melhorar a segurança da introdução do primeiro trocarte e avaliar as repercussões clínicas, hemodinâmicas, gasométricas e metabólicas das altas pressões transitórias do pneumoperitônio por curto período de tempo.

Materiais e método

Para este ensaio clínico prospectivo e aleatório foi obtida autorização do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), sob o número 1.219/07, e do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Taubaté (Unitau), com o número 007/2.007, e todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. O estudo foi desenvolvido no Hospital Municipal Dr. José de Carvalho Florence (HMJCF), em São José dos Campos (SP).

Entre outubro de 2007 e maio de 2008 foram estudados 67 pacientes, agendados para intervenções cirúrgicas laparoscópicas eletivas, entre 20 e 79 anos, classificados em ASA I ou ASA II segundo seu estado físico, sem história de cirurgia abdominal em órgãos situados no andar supramesocólico do abdome, sem peritonite previamente diagnosticada e com índice de massa corporal (IMC) menor do que 35.

Mediante obtenção de números ímpares e pares na face superior de dado lançado, os pacientes foram aleatoriamente distribuídos em grupo P12: n = 30 (pressão intraperitoneal de 12 mmHg) e grupo P20: n = 37 (pressão intraperitoneal de 20 mmHg). O grupo P12 era composto por 25 mulheres e cinco homens, entre 22 e 72 anos (média de 47,2 +/- 14,5), com IMC entre 20,2 e 33,4 kg.m-2 (média de 26,3 +/- 4 kg.m-2). O grupo P20 era composto por 30 mulheres e sete homens, entre 20 e 79 anos (média de 46,5 +/- 15), com IMC entre 17,5 e 34,6 kgm-2 (média de 26,2 +/- 3,8 kg.m-2). Nenhuma diferença significante estatística foi observada entre os grupos quando os dados demográficos foram comparados (p ≤ 0,05).

Os pacientes receberam avaliação pré-anestésica no ambulatório em data anterior à intervenção cirúrgica. Nenhum paciente recebeu medicação pré-anestésica.

Antes do início do procedimento anestésico foi feito o teste de Allen modificado.2727. Asif M, Sarkar PK. Three-digit Allen's test. Ann Thorac Sur. 2007;84:686-7. A hidratação dos pacientes foi feita com Ringer Lactato após venóclise com cateter 18G. Para a monitoração foram instaladas linhas no sentido de aferir dados provenientes de cardioscopia, oximetria de pulso,2828. Amaral JLG, Ferreira ACP, Ferez D, et al. Monitorizacção da respiração: oximetria e capnografia. Rev Bras Anestesiol. 1992;42:51-8. pressão arterial não invasiva, capnometria e pressão intratraqueal.

Todos os pacientes receberam anestesia geral. A indução foi feita com sufentanil 0,5 mcg.kg-1, rocurônio 0,6 mg.kg-1 e propofol 2 mg.kg-1. A manutenção foi feita com sevoflurano em uma mistura de oxigênio e ar comprimido. Todos os pacientes foram ventilados mecanicamente mediante fluxo constante, em ventilador com ciclagem por tempo. Foram usados os equipamentos de anestesia e monitoração Ergo System PC 2700 - Shogum Takaoka e o aparelho de anestesia Fabius GS Dräger, com monitores da marca Dixtal, modelo DX 2010. A ventilação inicial foi feita com fração de oxigênio inspirado de 60%, pressão positiva expirada final de 4 cm H2O, volume corrente de 7 mLkg-1, frequência respiratória de 15 incursões por minuto e relação inspiração/expiração de 1:2.

Com o estabelecimento do plano anestésico apropriado e o teste de Allen modificado por Asif negativo,2626. Barczynski M, Herman RM. A prospective randomized trial on comparison of low-pressure (LP) and standard-pressure (SP) pneumoperitoneum for laparoscopic cholecystectomy. Surg Endos. 2003;17:533-8. a artéria radial foi cateterizada no membro não dominante. Para tal foram feitas, no máximo, três tentativas, com exclusão dos pacientes nos quais não houve sucesso.

Foram excluídos do trabalho seis pacientes: um apresentou broncoespasmo após a indução; outro, intubação orotraqueal difícil e foram necessários procedimentos adicionais não incluídos no protocolo da pesquisa; em mais dois, a terceira tentativa de cateterização da artéria radial foi falha; nos dois restantes, houve perda da amostra de sangue por formação de coágulo.

A criação do pneumoperitônio foi feita pela técnica fechada com punção abdominal por meio da agulha de Veress e fluxo de CO2 de 1L/minuto.

Durante o procedimento, eram analisados a PAM e a gasometria arterial - pH, PaO2 - em mmHg, PaCO2 - em mmHg, HCO3 - em mmol/L, BE - em mmol/L - com o aparelho Rapidlab 348 Bayer Health Care, modelo 348 pH/blood gases Analyzer SN 6678. Esses parâmetros foram avaliados em ambos os grupos no tempo zero, antes do pneumoperitônio; no tempo um (TP1), quando a PIP atinge 12 mmHg em ambos os grupos; no tempo dois (TP2), após cinco minutos com PIP de 12 mmHg em P12 e após cinco minutos com PIP de 20 mmHg em P20; e no tempo três (TP3), após 10 minutos com PIP de 12 mmHg em P12 e com PIP retornada de 20 mmHg para 12 mmHg, contados 10 minutos após TP1 em P20.

Os pacientes foram acompanhados durante o procedimento anestésico-cirúrgico por meio dos parâmetros frequência cardíaca, ritmo cardíaco, oximetria de pulso, capnometria (EtCO2) e pressão arterial média. Na sala de recuperação pós-anestésica foram observados até a alta para a enfermaria os parâmetros frequência cardíaca, ritmo cardíaco, pressão arterial média, oximetria de pulso, nível de consciência e atividade muscular.

Foram consideradas alterações clínicas os valores mensurados dos diversos parâmetros que extrapolassem os limites considerados normais para a população saudável ou o surgimento de fenômenos atípicos, indicativos da presença de doença orgânica. Foram considerados valores normais FC menor do que 75 batimentos por minuto; PAM entre 70 mmHg e 120 mmHg; SaO2 maior do que 93%; EtCO2 entre 30 mmHg e 45 mmHg; PIT abaixo de 35 cm H2O; pH entre 7,35 e 7,45; PaCO2 entre 30 mmHg e 45 mmHg; PaO2 acima de 80 mmHg; BE entre -2 e + 2; e HCO3 22 a 26 mEq.L-1.

Quanto ao tratamento estatístico, para a análise descritiva foram usadas as medidas de posição para as variáveis contínuas e frequência para as variáveis categóricas. Para comparar o sexo entre os grupos foi usado o teste qui-quadrado e para comparar a idade e o IMC entre os grupos foi usado o teste não paramétrico de Mann-Whitney. Para comparação entre tempos das variáveis de interesse, foi usada a análise de variância (Anova) para medidas repetidas com transformação por postos. Foi considerado um nível de significância de 5% (p = 0,05).

Resultados

Pressão arterial média (PAM em mmHg)

A PAM apresentou no grupo P12 os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 68,57 ± 10,18; 88,10 ± 17,68; 90,10 ± 19,03 e 99,07 ± 18,58, e mostrou diferença estatística (p = 0,0000). No grupo P20 os valores da média e desvio-padrão da PAM nos momentos M0, M1, M2 e M3 foram respectivamente 70,57 ± 14,58; 83,57 ± 12,86; 89,30 ± 15,33 e 92,43 ± 14,42 e mostraram diferença estatística (p = 0,0000) (fig. 1). A diferença estatística no grupo P12 ocorreu na relação do momento M0 com M1, M2 e M3; entre M1 e M3 e entre M2 e M3. No grupo P20 houve diferença entre M0 com M1, M2 e M3 e entre M1 com M2 e M3.

Figura 1
Pressão arterial média (PAM em mmHg).

Potencial hidrogeniônico (pH)

O pH apresentou no grupo P12 os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 7,47 ± 0,05; 7,47 ± 0,06; 7,46 ± 0,06 e 7,44 ± 0,06, e mostrou diferenças estatísticas (p = 0,0000). O pH apresentou no grupo P20 os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 7,48 ± 0,06; 7,48 ± 0,06; 7,46 ± 0,06 e 7,45 ± 0,07, com diferença estatística (p = 0,0000) (fig. 2). O pH mostrou alterações significativas no grupo P12 entre M0 e M3, de M1 em relação a M2 e M3 e entre M2 e M3. No grupo P20 as diferenças apareceram entre M0 em relação a M2 e M3 e de M1 em relação a M2 e M3.

Figura 2
Potencial hidrogeniônico (pH).

Pressão parcial arterial de oxigênio (PaO2 - em mmHg)

A PaO2 apresentou no grupo P12 os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 216,80 ± 51,60; 192,15 ± 52,73; 191,88 ± 51,74 e 196,77 ± 46,66, e mostrou diferença estatística (p = 0,0057). A PaO2 apresentou no grupo P20 os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 212,07 ± 72,37; 197,73 ± 52,74; 202,35 ± 52,46 e 203,41 ± 49,20, e não mostrou diferença estatística (p = 0,4239) (fig. 3). No grupo P12 a diferença estatística ocorreu entre os momentos M0 e M1.

Figura 3
Pressão parcial arterial de oxigênio (PaO2 - emmmHg).

Pressão parcial de gás carbônico arterial (PaCO2 em mmHg)

Os valores da média e desvio-padrão da PaCO2 no grupo P12 nos momentos M0, M1, M2 e M3 foram respectivamente 31,96 ± 5,20; 31,48 ± 6,67; 32,68 ± 6,82 e 32,63 ± 8,30 e não apresentaram diferença estatística (p = 0,3557). A PaCO2 no grupo P20 apresentou os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 32,47 ± 5,36; 32,43 ± 4,84; 33,19 ± 5,08 e 34,09 ± 6,20, e não mostrou diferença estatística (p = 0,0887) (fig. 4).

Figura 4
Pressão parcial de gás carbônico arterial (PaCO2 emmmHg).

Bicarbonato (HCO3 - em mmol.L-1)

O HCO3 apresentou no grupo P12 os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 22,85 ± 3,11; 22,50 ± 3,85; 22,42 ± 3,34 e 21,96 ± 4,38, e não apresentou diferença estatística (p = 0,3629). No grupo P20 o HCO3 apresentou os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 23,75 ± 3,45; 23,48 ± 2,64; 23,06 ± 3,04 e 23,20 ± 3,17, e mostrou diferença estatística (p = 0,0126) (fig. 5). No grupo P20 houve diferença estatística entre M0 e M2.

Figura 5
Bicarbonato (HCO3 - em mmol.L-1).

Reserva alcalina (base excess - BE - em mmol.L-1)

A BE apresentou no grupo P12 os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 0,15 ± 3,00; -0,08 ± 3,55; -0,53 ± 3,14 e -1,27 ± 3,92, e mostrou diferença estatística (p = 0,0001). O BE apresentou no grupo P20 os seguintes valores da média e desvio-padrão nos momentos M0, M1, M2 e M3, respectivamente 1,10 ± 3,27; 0,82 ± 2,74; 0,05 ± 3,22 e -0,03 ± 3,12, com diferença estatística (p = 0,0000) (fig. 6). O BE apresentou diferenças estatísticas no grupo P12 quando comparados os momentos M0 com M3 e entre M1 em relação a M2 e M3. No grupo P20 as diferenças apareceram entre M0 em relação a M2 e M3 e na relação de M1 com M2 e M3.

Figura 6
Reserva alcalina (base excess - BE - em mmol.L-1).

Os valores mensurados nos diversos parâmetros avaliados não extrapolaram aqueles considerados como normais em populações saudáveis durante os procedimentos cirúrgicos e em sua permanência até a alta da recuperação pós-anestésica.

Discussão

Neste estudo foram analisadas as alterações orgânicas e as trocas gasosas em procedimentos laparoscópicos com altas pressões transitórias do pneumoperitônio artificial em tempo suficiente para a introdução do primeiro trocarte.

Os pacientes foram distribuídos em dois grupos, P12 (pressão intraperitoneal de 12 mmHg) e P20 (pressão intraperitoneal de 20 mmHg).

O grupo P12 foi o grupo controle positivo, em que todos os eventos e todas as possíveis alterações durante o procedimento cirúrgico com pressão intraperitoneal padrão (12 mmHg) em nossa população de interesse foram analisados. O objetivo da inclusão do grupo P12 nesta pesquisa foi dirimir o papel isolado de pressões altas (20 mmHg) em eventuais alterações que viessem a ser observadas no grupo P20, mediante a comparação entre os momentos de cada grupo estudado. O comportamento dos parâmetros foi avaliado no grupo P12 no sentido de excluir o fator “tempo de exposição ao pneumoperitônio” como determinante de alterações orgânicas passíveis de ocorrer no grupo P20. Dessa forma, pode-se atribuir exclusivamente à alta pressão intraperitoneal essas eventuais alterações encontradas em P20.

O grupo P20 foi o grupo experimento com controle dele mesmo, pois os pacientes foram submetidos a diferentes pressões intraperitoneais, da ausência de pneumoperitônio até a pressão intraperitoneal de 20 mmHg.

Foram usados os agentes anestésicos propofol, rocurônio, sufentanil e sevoflurano por manter os parâmetros cardiopulmonares estáveis, propiciar rápido acesso às vias aéreas e diminuir no pós-operatório a incidência de náuseas, vômitos e processos álgicos.2929. Turazzi JC, Bedin A. Sevoflurano em cirurgia videolaparoscópica. Rev Bras Anestesiol. 1999;49(5):299-303.

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-3434. Thomson IR, Harding G, Hudson RJ. A comparison of fentanyl and sufentanil in patients undergoing coronary artery bypass graft surgery. J Cardiothorac Vasc Anesth. 2000;14:652-6.

Os parâmetros ventilatórios iniciais foram fluxo constante, fração de oxigênio inspirado de 60%, pressão positiva expirada final de 4cmH2O, volume corrente de 7 Ml.kg-1, frequência respiratória de 15 incursões por minuto, relação inspiração/expiração de 1:2 e ciclagem a volume, com a intenção de promover um volume-minuto adequado para compensar a exposição do paciente ao aumento da pressão intraperitoneal com CO2.3535. Kaba A, Joris J. Anaesthesia for laparoscopic surgery. Curr Anaesth Crit Care. 2001;12:159-65.

Um estudo conduzido por Abu-Rafea et al.3636. Abu-Rafea B, Vilos GA, Ahmad R, et al. High-pressure laparoscopic entry does not adversely affect cardiopulmonary function in healthy women. J Minim Invasive Gynecol. 2005;12:475-9. não demonstrou complicações cardiopulmonares em 100 mulheres saudáveis submetidas a pressão intra-abdominal elevada (entre 10 e 30 mmHg) durante a introdução do primeiro trocarte. Os autores analisaram o volume de CO2 efetivamente insuflado na cavidade peritoneal, a frequência cardíaca, a saturação arterial de oxigênio, a pressão arterial média e a complacência pulmonar e observaram mudanças estatisticamente significativas na PAM e na complacência pulmonar, mas essas mudanças não foram clinicamente significativas. Entretanto, Abu-Rafea et al.3636. Abu-Rafea B, Vilos GA, Ahmad R, et al. High-pressure laparoscopic entry does not adversely affect cardiopulmonary function in healthy women. J Minim Invasive Gynecol. 2005;12:475-9. não estabeleceram parâmetros para avaliar as mudanças na função respiratória e nas trocas gasosas. Além disso, o efeito de cada nível de pressão (10, 15, 20, 25 e 30 mmHg) foi avaliado no exato momento em que foi alcançado, sem levar em consideração o efeito cumulativo da duração do pneumoperitônio para inserção do primeiro trocarte, o que dificulta a avaliação dos efeitos clínicos resultantes a partir da duração do pneumoperitônio em vez de a partir do nível de pressão intra-abdominal alcançado. Ademais, os parâmetros cardiovasculares foram monitorados com métodos não invasivos e a gasometria arterial não foi analisada. Outro estudo mostrou que a pressão intra-abdominal elevada é segura e nenhum efeito clínico adverso foi observado pela análise de monitoramento não invasivo.3737. Hypólito O, Azevedo J, Caldeira FLA, et al. Creation of pneumoperitoneum: noninvasive monitoring of clinical effects of elevated intraperitoneal pressure for the insertion of the first trocar. Surg Endosc. 2010;24:1663-9.

Nos resultados obtidos foi observada alteração estatisticamente significante na PAM em ambos os grupos e em todos os momentos do pneumoperitônio artificial. O fato de essa alteração ter sido também observada no grupo P12 permite supor que a causa foi a presença da exposição do organismo ao pneumoperitônio artificial, mesmo com PIP padrão. Mesmo em pressões consideradas baixas (12 mmHg) o reflexo de vasoconstrição é deflagrado, com consequente aumento da pressão arterial. Entretanto, essas alterações não representam problemas clínicos para os pacientes (fig. 1). Ressalte-se que em nenhum dos grupos foi instalado regime de hipertensão arterial.

Os procedimentos laparoscópicos com pneumoperitônio e o uso de CO2 são associados com risco de hipercapnia pelo aumento na PIP e absorção do CO2 através do peritônio,3838. Gándara V, Vega de DS, Escriú A, et al. Acid-base balance alterations in laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc. 1997;11:707-10.

39. Iwasaka H, Miyakawa H, Yamamoto H. Respiratory mechanics and arterial blood gases during and after laparoscopic cholecystectomy. Can J Anaesth. 1996;43:129-33.
-4040. Pearce DJ. Respiratory acidosis and subcutaneous emphysema during laparoscopic cholecystectomy. Can J Anaesth. 1994;41:314-6. o que pode levar a uma acidose respiratória. Alguns estudos mostram que a absorção de CO2 depende da pressão intraperitoneal e da integridade da serosa peritoneal para absorver o CO2. Na presente pesquisa não foram observadas alterações estatisticamente significantes nos valores da PaCO2, em ambos os grupos. Como os parâmetros ventilatórios não foram alterados durante o estudo, os fatos sugerem que não ocorre aumento da absorção de CO2 pelo peritônio em decorrência do aumento da PIP de 12 mmHg para 20 mmHg por cinco minutos, na vigência de uma ventilação pulmonar consistente. Isso pode dever-se ao fato de o aumento da pressão intra-abdominal causar compressão dos capilares, o que limita a absorção de CO24141. Ishizaki Y, Bandai Y, Shimomura K, et al. Changes in splanchnic blood flow and cardiovascular effects following peritoneal insufflation of carbon dioxide. Surg Endosc. 1993;7:420-3.

42. Lister DV, Rudston-Brown B, Wriner B. Carbon dioxide absorption is not linearly related to intraperitoneal carbon dioxide insufflation pressure in pigs. Anesthesiology 1994;80:129-36.
-4343. Mullet CE, Viale JP, Sagnard PE. Pulmonary CO2 elimination during surgical procedures using intra or extraperitoneal CO2 insufflation. Anesth Analg. 1993;76:622-6. e diminui o fluxo sanguíneo da região esplâncnica.

Neste estudo foi observado que os pacientes, inicialmente, desenvolveram uma discreta alcalose do tipo respiratória como consequência dos parâmetros ventilatórios determinados para o procedimento. Como esses parâmetros não foram alterados no decorrer do estudo e os valores mensurados dos produtos respiratórios (PaCO2) não se alteraram significativamente, a queda dos valores do pH - imediatamente após a referida alcalose inicial - em valores estatisticamente significantes pode ter ocorrido pela discreta elevação dos valores da PaCO2 e pela acidose metabólica gerada em função da diminuição de perfusão dos órgãos intra-abdominais. Observa-se que, na vigência da pressão intraperitoneal de 20 mmHg, a diminuição do pH ocorre de forma mais acentuada do que na pressão intraperitoneal de 12 mmHg. Isso vem corroborar a explicação fisiopatológica de que a diminuição da perfusão de estruturas intra-abdominais tem papel preponderante na alteração nos valores do pH observada nesta pesquisa, uma vez que o outro fator de acidose (a absorção de CO2) foi semelhante nos grupos P20 e P12, conforme pode ser constatado pelos valores de PaCO2 informados pela gasometria (fig. 4). Alguns autores4444. Sefr R, Puszkailer K, Jagos F. Randomized trial of different intraabdominal pressure and acid-base balance alterations during laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc. 2003;17:947-50. mostraram aumento do pH em pressão intraperitoneal de 15 mmHg nos primeiros 30 minutos, com posterior diminuição desses valores. Esse resultado foi semelhante ao encontrado na presente pesquisa na vigência de pressões intraperitoneais maiores (20 mmHg) e menores (12 mmHg). As alterações encontradas na presente pesquisa não apresentaram significado clínico (fig. 2).

Em relação ao HCO3 ocorreu redução estatisticamente significante no grupo P20 após a exposição do paciente a uma PIP de 20 mmHg, fato não observado em outros momentos desse grupo com PIP menores e que também não ocorreu no grupo P12. Isso mostra que o fator pressão de 20 mmHg é o responsável pelas alterações. Associado ao fato de o pH ter apresentado diminuição mais acentuada em regime de PIP de 20 mmHg sem elevação significativa da PaCO2, tudo isso pode apontar para um maior consumo do bicarbonato no sentido de atenuar a acidose metabólica por meio da diminuição da irrigação dos órgãos esplâncnicos. No estudo de Sefr et al.4444. Sefr R, Puszkailer K, Jagos F. Randomized trial of different intraabdominal pressure and acid-base balance alterations during laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc. 2003;17:947-50. não houve diferença entre as pressões de 10 mmHg e 15 mmHg quanto à produção de HCO3, enquanto na presente pesquisa a pressão de 20 mmHg mostrou diminuição estatisticamente significante desse parâmetro. Entretanto, essa alteração não mostrou significado clínico (fig. 5).

Em relação à reserva alcalina (BE), ocorreu diminuição estatisticamente significante em ambos os grupos. As alterações encontradas relacionam-se com o fator tempo de exposição do organismo ao pneumoperitônio. Em vigência de um regime de pressão intraperitoneal de 20 mmHg, essas alterações aparecem mais precocemente. A queda nos valores da BE em PIP de 20 mmHg, associada aos fatores diminuição do pH e diminuição do HCO3 sem alteração significativa da PaCO2, pode apontar novamente para o consumo da reserva alcalina (BE) no sentido de compensar a isquemia de órgãos esplâncnicos. Sefr et al.4444. Sefr R, Puszkailer K, Jagos F. Randomized trial of different intraabdominal pressure and acid-base balance alterations during laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc. 2003;17:947-50. relataram uma diminuição do BE em PIP de 10 mmHg e um aumento dos valores de BE em pressão de 15 mmHg. No presente estudo foi observada diminuição da BE em PIP de 12 mmHg e 20 mmHg. Essas alterações não apresentaram um significado clínico (fig. 6).

A pressão intra-abdominal alta (20 mmHg) e transitória (cinco minutos) para inserção do primeiro trocarte causa alterações da PAM, do pH, do HCO3 e da BE sem repercussões clínicas para o paciente e deve ser usada para prevenir a ocorrência de lesões iatrogênicas na introdução do primeiro trocarte.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2014

Histórico

  • Recebido
    25 Set 2012
  • Aceito
    20 Mar 2013
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