Acessibilidade / Reportar erro

Raquianestesia total após bloqueio do plexo lombar: relato de caso

Resumos

O bloqueio do plexo lombar (BPL) é um método adequado para uso em pacientes idosos e cirurgias na extremidade inferior. Muitas complicações podem ser observadas durante o BPL, mas não tanto quanto no bloqueio central. Neste relato de caso, nosso objetivo foi relatar uma raquianestesia total, uma complicação incomum. BPL com bloqueio ciático foi planejado para um paciente do sexo masculino, 76 anos, programado para artroplastia total do joelho por causa de gonartrose. O paciente ficou inconsciente após o bloqueio do compartimento do psoas com a técnica de Chayen para BPL. A operação terminou em 145 minutos. O paciente foi internado em unidade de terapia intensiva até o segundo dia pós-operatório e recebeu alta hospitalar no quinto dia pós-cirúrgico. A principal preocupação da monitoração do paciente deve ser a presença do anestesiologista. Dessa forma, conclui-se que o contato com o paciente deve ser garantido durante esses procedimentos.

Raquianestesia total; Bloqueio do plexo lombar; Bloqueio de nervo periférico; Monitoração; Artroplastia total do joelho


Lumbar plexus block (LPB) is a suitable method for elder patients for lower extremity surgery. Many complications could be seen during LPB, but not as many as central block. In this case report, we aimed to report a total spinal block, an unusual complication. LPB with sciatic block was planned for a male patient, 76 years old, scheduled for total knee replacement due to gonarthrosis. The patient became unconscious after psoas compartment block with Chayen technique for LPB. The operation ended at 145th minute. The patient was admitted to intensive care unit until postoperative second day and discharged to home on fifth day of surgery. Main concern of patient monitorization should be an anesthesiologist. In this manner, we conclude that contacting to the patient should be ensured during these procedures.

Total spinal block; Lumbar plexus block; Peripheral nerve block; Monitorization; Total knee replacement


El bloqueo del plexo lumbar (BPL) es un método adecuado para usarlo en pacientes ancianos sometidos a cirugía de la extremidad inferior. Durante el BPL pueden observarse muchas complicaciones, pero no tantas como en el bloqueo central. En este relato de caso, nuestro objetivo fue exponer una raquianestesia total, una complicación no común. Se planificó un BPL con bloqueo ciático para un paciente del sexo masculino, de 76 años de edad, programado para artroplastia total de la rodilla debida a gonartrosis. El paciente quedó inconsciente después del bloqueo del compartimento del psoas con la técnica de Chayen para BPL. La operación terminó en 145 min. El paciente fue ingresado en la unidad de cuidados intensivos hasta el segundo día del postoperatorio y tuvo alta hospitalaria al quinto día poscirugía. La principal preocupación de la monitorización del paciente debe ser la presencia del anestesiólogo. Así se concluye que el contacto con el paciente debe estar garantizado durante esos procedimientos.

Raquianestesia total; Bloqueo del plexolumbar; Bloqueo de nervio periférico; Monitorización; Artroplastia total de la rodilla


O bloqueio do plexo lombar (BPL) é um método de anestesia intraoperatória11. Gamli M, Sacan O, Baskan S, et al. Combined lumbar plexus and sciatic nerve block for hip fracture surgery in a patient with severe aortic stenosis. J Anesth. 2011;25:784-5.,22. Sertoz N, Eris FO, Ayanoglu HÖ. Intertorakanterik femur fraktürlü yüksek riskli bir hastada lumbar pleksus ve siyatik sinir bloğu uygulamasi. Anestezi Dergisi. 2009;17:101-4. e analgesia pós-operatória33. lfeld BM, Mariano ER, Madison SJ, et al. Continuous femoral versus posterior lumbar plexus nerve blocks for analgesia after hip arthroplasty: a randomized, controlled study. Anesth Analg. 2011;113:897-903.,44. Duarte LT, Paes FC, Fernandes Mdo C, et al. Posterior lumbar plexus block in postoperative analgesia for total hip arthroplasty: a comparative study between 0.5% Bupivacaine with Epinephrine and 0.5% Ropivacaine. Rev Bras Anestesiol. 2009;59:273-85. para cirurgia de membros inferiores em pacientes idosos com estado geral debilitado ou outras doenças. Esse bloqueio foi primeiramente usado pela técnica de bloqueio paravascular inguinal descrita por Winnie55. Winnie AP, Ramamurthy S, Durrani Z. The inguinal paravascular technic of lumbar plexus anesthesia: the ''3-in-1 block''. Anesth Analg. 1973;52:989-96. e depois modificada para bloqueio do compartimento do psoas por Chayen. 66. Chayen D, Nathan H, Chayen M. The psoas compartment block. Anesthesiology. 1976;45:95-9. Várias complicações podem ocorrer durante o BPL, mas não tanto quanto durante o bloqueio central. As complicações incluem bloqueio peridural com difusão para ambos os lados, hipotensão, náusea e vómito, toxicidade do anestésico local, hematoma retroperitoneal. 77. Touray ST, de Leeuw MA, Zuurmond WW, et al. Psoas compartment block for lower extremity surgery: a meta-analysis. Br J Anaesth. 2008;101:750-60.

8. de Leeuw MA, Zuurmond WW, Perez RS. The psoas compartment block fo hip surgery: the past, present, and future. Anesthesiol Res Pract. 2011;2011:159541.
-99. Auroy Y, Benhamou D, Bargues L, et al. Major complications of regional anesthesia in France: the SOS Regional Anesthesia Hotline Service. Anesthesiology. 2002;97:1274-80. Neste relato de caso, o nosso objetivo foi relatar uma raquianestesia total, uma complicação incomum do BPL. 1010. Pousman RM, Mansoor Z, Sciard D. Total spinal anesthetic after continuous posterior lumbar plexus block. Anesthesiology. 2003;98:1281-2.

Relato de caso

Paciente do sexo masculino, 76 anos, programado para artroplastia total do joelho por causa de gonartrose. O paciente apresentava doença arterial coronariana, hipertensão e insuficiência renal crônica e não tinha histórico de alergia, tabagismo e álcool. O paciente não tinha história de anestesia, mas fora submetido uma vez a anestesia local para excisão de carcinoma basocelular. O exame das vias aéreas do paciente com o teste de Mallampati foi classe II. O paciente apresentava pulmões com crepitações basais; hemograma pré-operatório: Hgb: 12,0; Htc: 37,3; Plt: 344.000; BUN: 40; creatinina: 1,98; AST: 35; ALT: 9; Na: 138; K: 4,7; Ca: 9,9. Os exames pré-operatórios (cardíaco, clínico e pulmonar) foram feitos.

BPL (40 cc) com bloqueio ciático (10 cc), com 50 cc de prilocaína a 1% e bupivacaína a 0,25%, foi planejado por causa da condição cardíaca e pulmonar do paciente. O paciente foi monitorado, na sala de cirurgia, com FC: 60/bpm; PA: 120/72 mmHg e SpO2: 94%. O paciente foi sedado com 2 mg de midazolam. O paciente recebeu oxigênio por máscara facial (4 L/min). Após a esterilização e cobertura, os processos espinhosos de L4-L5 e a espinha ilíaca ântero-superior foram identificados. Anestesia local com prilocaína a 1% foi administrada superficial e profundamente no ponto determinado. Em seguida, uma agulha Stimuplex de 10 cm (1,5 mA de estímulo) foi inserida no ponto especificado para o bloqueio do compartimento do psoas. Comunicação verbal foi mantida com o paciente. Depois, o músculo quadríceps foi estimulado e o estímulo foi reduzido em 0,2 mA. Depois que a falha na estimulação do músculo foi observada no nível de 0,5 mA e aspiração, a solução de anestésico local foi injetada. Nesse momento, a comunicação verbal e a aspiração foram mantidas com injeção de 5 cc e perguntou-se ao paciente: “Você está bem, você sente alguma dor?” A administração do fármaco foi de 40 cc para o BPL e, em seguida, repetimos a pergunta, mas o paciente disse: “Eu estou bem, mas sinto um pouco de náusea”. Então, o bloqueio ciático previsto foi abandonado; o paciente foi colocado em decúbito dorsal e os sinais vitais foram reavaliados: FC: 55-58/bpm, PA: 113/63 mmHg, SpO2: 100%. Em seguida, perguntamos ao paciente: “Você está bem?” e o paciente respondeu alto: “Eu estou bem” até dois minutos de injeção e depois disse: “Eu estou bem, mas não posso falar”, com movimentos labiais. Em seguida, o paciente não respondeu mais verbalmente e a resposta com o abrir dos olhos durou apenas cerca de três minutos da injeção. Depois disso, nenhuma resposta foi recebida e a respiração do paciente tornou-se ineficaz em cerca de cinco minutos da injeção. Decidimos por inserir uma máscara laríngea (ML) e, em seguida, administramos 2 mg de midazolam. Após a inserção da ML, o paciente foi ligado ao ventilador mecânico. Os parâmetros vitais do paciente eram: FC: 53-62 m, PA: 115-93/78-56 mmHg, SpO2: 98-100%.

Depois de informar a equipe cirúrgica sobre a situação, o procedimento cirúrgico foi permitido. Uma mistura de 50% de oxigênio e 50% de N2O com 0,5-1% de sevoflurano em 4 L/min de fluxo fresco foi usada para a manutenção da anestesia. Agente bloqueador neuromuscular não foi usado. Em aproximadamente 50 minutos desde a incisão da pele (68 minutos da injeção), a frequência cardíaca reduziu-se para 45; portanto, atropina (0,5 mg) foi administrada. Não houve ocorrência de outros problemas associados à anestesia. Em cerca de 130 minutos desde a incisão (148 minutos da injeção), a respiração espontânea retornou. A cirurgia terminou aos 145 minutos desde a incisão (163 minutos da injeção). No fim da operação, o volume corrente do paciente era de 300-450 mL. A ML foi retirada após o paciente recobrar a consciência e, em seguida, o paciente foi levado para a unidade de recuperação.

No período perioperatório, 2.000 cc de cristaloides e 1.000 cc de coloides foram administrados. Débito urinário era de aproximadamente 200 cc no fim da cirurgia. O paciente estava confuso, desorientado e não cooperativo. Na sala de recuperação, recebeu apenas 4 L/min de oxigênio via máscara facial e foi monitorado por 30 min. Foi internado em unidade de terapia intensiva porque a SpO2 foi reduzida para 74% em ar ambiente. Outras conclusões importantes foram PA: 102/63 mmHg, FC: 64/bpm.

Após a cirurgia, o paciente apresentou melhoria. Na quinta hora pós-cirurgia, estava totalmente consciente, orientado e cooperativo. Ao exame neurológico cinco horas após a cirurgia, apresentou perda difusa de sensibilidade. A potência muscular era de 5/5 na extremidade superior direita e de 4/5 na extremidade superior esquerda, com leve tremor. A força muscular era de 3/5 na extremidade inferior direita. O lado esquerdo, lado operado, não pôde ser avaliado com precisão. Ao exame neurológico 24 horas após a cirurgia, embora o lado esquerdo não tenha sido completamente avaliado, o paciente não apresentou qualquer anormalidade referente à atividade sensorial e motora. O tremor na extremidade superior desapareceu. O paciente recebeu alta da UTI para a clínica de ortopedia. No quinto dia de pós-operatório, recebeu alta da clínica.

Discussão

O bloqueio de nervos periféricos pode ser preferido em pacientes com outras comorbidades, especialmente doenças cardiovasculares, e/ou em pacientes com estado geral precário, porque não desestabiliza o balanço hemodinâmico. 1111. de Leeuw MA, Slagt C, Hoeksema M, et al. Hemodynamic changes during a combined psoas compartment-sciatic nerve block for elective orthopedic surgery. Anesth Analg. 2011;112:719-24. Planejamos fazer o bloqueio de nervos periféricos em nosso paciente por causa de comorbidades e do achado físico dos pulmões.

Considerando os eventos após o BPL com o uso do método de Chayen, com o rápido início e os sintomas, presumimos tratar-se de injeção subaracnoide involuntária. No entanto, é notável que não tenha havido identificação de líquido na aspiração antes da injeção. Em uma série de 100, Chayen et al. relataram apenas um paciente que apresentou uma grande deformidade lombar - os autores notaram a presença de líquido cerebrospinal na aspiração e interromperam a injeção. Em nosso caso, não houve aspiração de líquido nem o paciente apresentou anomalia lombar. Contudo, também é notável que nosso paciente não tenha apresentado uma grande instabilidade hemodinâmica, mas bradicardia moderada. A estabilidade hemodinâmica de nosso paciente não fazia sentido diante de raquianestesia total. Por outro lado, considerando a idade avançada e a reserva cardíaca limitada, esperava-se que o paciente fosse mais gravemente afetado. Porém, a intensa reposição volêmica pode ter evitado a instabilidade hemodinâmica esperada.

O paciente fora avaliado para complicações do bloqueio de nervos periféricos, incluindo bloqueio bilateral por difusão epidural, hipotensão, náusea, vômito e toxicidade por anestésico local.

A difusão através da medula espinhal via espaço epidural é possível. Em tais condições, a anestesia bilateral ocorre e os parâmetros hemodinâmicos do paciente podem ser mais seriamente afetados. Porém, não pensamos que houve tal difusão em nosso paciente, pois o progresso foi muito rápido.

A náusea em nosso paciente pode estar relacionada à hipotensão ou toxicidade por anestésico local. Se a náusea fosse por causa da toxicidade do anestésico local, um gosto metálico e zumbido teriam sido esperados em primeiro lugar. Além disso, não houve hipotensão profunda em nosso paciente. Considerando raquianestesia total, pode-se pensar que a náusea ocorreu por causa da dominância do nervo vago.

Em conclusão, a raquianestesia total, uma complicação rara do bloqueio de nervos periféricos, deve ser considerada mesmo quando a aspiração for negativa.

Referências

  • 1
    Gamli M, Sacan O, Baskan S, et al. Combined lumbar plexus and sciatic nerve block for hip fracture surgery in a patient with severe aortic stenosis. J Anesth. 2011;25:784-5.
  • 2
    Sertoz N, Eris FO, Ayanoglu HÖ. Intertorakanterik femur fraktürlü yüksek riskli bir hastada lumbar pleksus ve siyatik sinir bloğu uygulamasi. Anestezi Dergisi. 2009;17:101-4.
  • 3
    lfeld BM, Mariano ER, Madison SJ, et al. Continuous femoral versus posterior lumbar plexus nerve blocks for analgesia after hip arthroplasty: a randomized, controlled study. Anesth Analg. 2011;113:897-903.
  • 4
    Duarte LT, Paes FC, Fernandes Mdo C, et al. Posterior lumbar plexus block in postoperative analgesia for total hip arthroplasty: a comparative study between 0.5% Bupivacaine with Epinephrine and 0.5% Ropivacaine. Rev Bras Anestesiol. 2009;59:273-85.
  • 5
    Winnie AP, Ramamurthy S, Durrani Z. The inguinal paravascular technic of lumbar plexus anesthesia: the ''3-in-1 block''. Anesth Analg. 1973;52:989-96.
  • 6
    Chayen D, Nathan H, Chayen M. The psoas compartment block. Anesthesiology. 1976;45:95-9.
  • 7
    Touray ST, de Leeuw MA, Zuurmond WW, et al. Psoas compartment block for lower extremity surgery: a meta-analysis. Br J Anaesth. 2008;101:750-60.
  • 8
    de Leeuw MA, Zuurmond WW, Perez RS. The psoas compartment block fo hip surgery: the past, present, and future. Anesthesiol Res Pract. 2011;2011:159541.
  • 9
    Auroy Y, Benhamou D, Bargues L, et al. Major complications of regional anesthesia in France: the SOS Regional Anesthesia Hotline Service. Anesthesiology. 2002;97:1274-80.
  • 10
    Pousman RM, Mansoor Z, Sciard D. Total spinal anesthetic after continuous posterior lumbar plexus block. Anesthesiology. 2003;98:1281-2.
  • 11
    de Leeuw MA, Slagt C, Hoeksema M, et al. Hemodynamic changes during a combined psoas compartment-sciatic nerve block for elective orthopedic surgery. Anesth Analg. 2011;112:719-24.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2014

Histórico

  • Recebido
    05 Dez 2012
  • Aceito
    20 Mar 2013
Sociedade Brasileira de Anestesiologia R. Professor Alfredo Gomes, 36, 22251-080 Botafogo RJ Brasil, Tel: +55 21 2537-8100, Fax: +55 21 2537-8188 - Campinas - SP - Brazil
E-mail: bjan@sbahq.org