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Uma análise da dinâmica inflacionária brasileira

Resumos

O objetivo central do presente artigo é analisar a dinâmica inflacionária brasileira e medir o grau de inércia em tal dinâmica. De início, nós apresentamos resultados de simulação de Monte Carlo sobre o desempenho em amostras finitas de diferentes variantes da razão de variâncias, uma medida comumente utilizada para a mensuração de persistência de choques no longo prazo. As simulações são realizadas sob inovações normais e não-normais e também com e sem outliers e inliers. Os resultados favorecem uma particular variante robusta da razão de variâncias proposta neste artigo. Os resultados empíricos para o Brasil indicam que o grau de inércia inflacionária neste país é substancialmente maior do que aquele encontrado por Campêlo e Cribari-Neto (Revista Brasileira de Economia, 57, 713-739, 2003); de fato, em alguns períodos da história econômica brasileira recente nós encontramos inércia plena. Todavia, o grau de inércia inflacionária após a implementação do Plano Real é de segunda ordem. Nós analisamos também as dinâmicas inflacionárias da Argentina, Chile e México.

inflação inercial; medidas de persistência; razão de variâncias


The chief goal of this paper is to analyze the Brazilian inflationary dynamics, and to measure the degree of inertia in such dynamics. To that end, we start by reporting Monte Carlo simulation results on the finite-sample performance of different variants of the variance ratio, a well know measure of long-run persistence of shocks. The simulations are performed under normal and nonnormal innovations, and also with and without outliers and inliers. Overall, the results favor a robust variant of the variance ratio we propose. The empirical results for Brazil suggest that the degree of inertia in this country is substantially larger than what was found by Campêlo and Cribari-Neto (Revista Brasileira de Economia 57, 713-739, 2003); indeed, in several periods of the recent economic history we find full inertia. However, the degree of inertia since the implementation of the Real Plan is small. We also present empirical results for Argentina, Chile and Mexico.


Uma análise da dinâmica inflacionária brasileira* * Os autores agradecem a um parecerista anônimo por comentários e sugestões e ao CNPq pelo auxílio financeiro.

Francisco Cribari-NetoI; Keila M. CassianoII

IDepartamento de Estatística, Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: cribari@de.ufpe.br

IIDepartamento de Estatística, Universidade Federal Fluminense. E-mail: keilamath@hotmail.com

RESUMO

O objetivo central do presente artigo é analisar a dinâmica inflacionária brasileira e medir o grau de inércia em tal dinâmica. De início, nós apresentamos resultados de simulação de Monte Carlo sobre o desempenho em amostras finitas de diferentes variantes da razão de variâncias, uma medida comumente utilizada para a mensuração de persistência de choques no longo prazo. As simulações são realizadas sob inovações normais e não-normais e também com e sem outliers e inliers. Os resultados favorecem uma particular variante robusta da razão de variâncias proposta neste artigo. Os resultados empíricos para o Brasil indicam que o grau de inércia inflacionária neste país é substancialmente maior do que aquele encontrado por Campêlo e Cribari-Neto (Revista Brasileira de Economia, 57, 713-739, 2003); de fato, em alguns períodos da história econômica brasileira recente nós encontramos inércia plena. Todavia, o grau de inércia inflacionária após a implementação do Plano Real é de segunda ordem. Nós analisamos também as dinâmicas inflacionárias da Argentina, Chile e México.

Palavras-chave: inflação inercial; medidas de persistência; razão de variâncias.

Códigos JEL: C22; C12; C15.

ABSTRACT

The chief goal of this paper is to analyze the Brazilian inflationary dynamics, and to measure the degree of inertia in such dynamics. To that end, we start by reporting Monte Carlo simulation results on the finite-sample performance of different variants of the variance ratio, a well know measure of long-run persistence of shocks. The simulations are performed under normal and nonnormal innovations, and also with and without outliers and inliers. Overall, the results favor a robust variant of the variance ratio we propose. The empirical results for Brazil suggest that the degree of inertia in this country is substantially larger than what was found by Campêlo and Cribari-Neto (Revista Brasileira de Economia 57, 713-739, 2003); indeed, in several periods of the recent economic history we find full inertia. However, the degree of inertia since the implementation of the Real Plan is small. We also present empirical results for Argentina, Chile and Mexico.

1. Introdução

A história econômica brasileira recente é marcada por períodos de inflação elevada e por várias tentativas fracassadas de estabilização. Em particular, vários planos de choque foram implementados na tentativa de reduzir ou estabilizar a inflação, como, por exemplo, os planos Cruzado (março, 1986), Collor (março, 1990) e Real (junho, 1994). Quase todos os planos de choque baixaram as taxas de inflação por poucos meses e depois falharam. Argumentava-se que o sistema econômico ficava preso na armadilha de uma inflação que se auto-sustentava e que se tornava cada vez mais resistente às terapias gradualistas convencionais, ficando ainda cada vez mais propensa à aceleração diante de choques inflacionários. Nos últimos vinte anos, a convicção de que a inflação brasileira permaneceu fundamentalmente inercial gerou uma discussão intensa entre especialistas.

O uso generalizado da expressão e do conceito de inflação inercial tomou grande impulso no Brasil no segundo semestre de 1984, a partir da proposta de combate à inflação inercial de feita pelo economista Francisco Lopes (Lopes, 1984). O auge da teoria da inflação inercial foi atingido com o trabalho Bresser Pereira e Nakano (1983). A construção do modelo de inflação teve como justificativa a coexistência inédita de inflação crônica e recessão.

O conceito de inflação inercial ou inércia inflacionária refere-se à inflação decorrente do conflito distributivo e da capacidade dos agentes repassarem automaticamente para os preços os aumentos de custos efetivos e presumidos, reproduzindo assim a inflação passada no presente e fazendo-a permanecer num patamar relativamente estável até que um novo choque imponha novo ritmo ao processo, fazendo com que um novo patamar seja alcançado. Ficava assim explicada a persistência de altos níveis na inflação. Vários economistas argumentavam que este era o panorama econômico em vigor desde o primeiro choque nos preços internacionais do petróleo. A partir de então, a taxa de inflação anual passou a aumentar a cada novo choque e a não mais diminuir após a dissipação do choque. Entre 1974 e 1985, a inflação brasileira percorreu cinco patamares distintos, conforme as seguintes taxas médias anuais de inflação: i) 30% no biênio 1974-1975; ii) 40% no triênio 1976-1978; iii) 77% em 1979; iv) 100% no triênio 1980-1982; e v) 220% no triênio 1983-1985.

Desde então, o Brasil tem sido amplamente citado como o maior exemplo de um país com uma grande componente inercial na inflação. Simonsen (1988) reconheceu a existência de inércia na inflação brasileira, reconhecendo que choques negativos, tal como o choque do petróleo em 1974, elevaram a inflação para novos níveis, onde ela permaneceu até a ocorrência de novos choques. Novaes (1993), através de uma medida paramétrica de funções de resposta cumulativas para modelos ARIMA, estimou grau de inércia na inflação brasileira em 1/3, i.e., um terço da dinâmica inflacionária brasileira seria devida à existência de inércia. Durevall (1998), usando uma formulação de correção de erros, estimou o nível de inflação inercial no Brasil em 0.41. Cati et alii (1999), usando a função de densidade espectral da primeira diferença da série normalizada na freqüência zero, encontraram inércia quase completa na inflação brasileira, 0.97. Já os resultados de Campêlo e Cribari-Neto (2003) indicaram que a inércia na inflação brasileria é de segunda ordem.

Os planos de choque mencionados anteriormente são planos econômicos implementados para frear a inflação ou, em outros contextos, qualquer outra ocorrência externa que afete diretamente a economia e que reduza as taxas inflacionárias por alguns meses. As observações atípicas correspondentes a esses meses em que a inflação permanece artificialmente baixa têm sido chamadas "inliers" e alguns autores alegam que elas tendem a viesar os testes usuais de raiz unitária, como o teste aumentado de Dickey e Fuller.

Nosso objetivo neste artigo é avaliar o uso de postos e sinais de séries econômicas para gerar medidas de persistência a longo prazo, verificando, via simulação de Monte Carlo, seu comportamento na presença de inliers e outliers na série. As medidas propostas de persistência são robustas e foram construídas a partir dos testes da hipótese de passeio aletório formulados por Wright (2000). Contrariamente às estatísticas de teste em Wright (2000), as medidas pontuais de persistência não são normalizadas para que possuam distribuição limite normal quando os dados seguem um passeio aleatório. Estas medidas pontuais podem, assim, ser usadas para mensurar o grau de persistência no longo prazo de uma inovação presente. O desempenho das medidas propostas e também da razão de variâncias usual é avaliado através de simulações de Monte Carlo, onde são considerados processos geradores de dados gaussianos e não-gaussianos. A motivação para o uso de processos não-gaussianos é a avaliação do desempenho em amostras finitas das diferentes medidas em situações de inovações assimétricas e de inovações oriundas de distribuições de caudas pesadas. São considerados também processos geradores de dados contaminados por observações atípicas (outliers e inliers), de forma a reproduzir a realidade brasileira. Os resultados de simulação favorecem, em particular, uma das medidas propostas. Após a avaliação numérica das diferentes medidas de persistência, elas são utilizadas na avaliação da dinâmica inflacionária brasileira. Os resultados sugerem que o grau de inércia neste processo inflacionário é superior ao encontrado por Campêlo e Cribari-Neto (2003). Todavia, os resultados também indicam que no período pós-Real esta inércia inflacionária é de segunda ordem. São apresentadas também aplicações empíricas para outros três países (Argentina, Chile e México).

2. Mensuração de Inércia

Inércia é uma persistência de longa duração. Na análise de séries temporais, o caso inteiramente inercial corresponde ao processo passeio aleatório, onde um choque de um por cento torna-se completamente persistente no sentido que ele transforma as previsões a longo prazo em exatamente um por cento. Isto pode ser facilmente visto quando o processo passeio aleatório dado por yt = yt–1 + ut = y0 + uj é reescrito, sem perda de generalidade, com a suposição de que o processo inicia em zero (isto é, y0 = 0): yt = uj. Ou seja, a taxa de inflação no tempo t não é mais que a acumulação de inovações passadas. Quando ut não é um ruído branco mas tem alguma representação ARMA(p, q), o grau de persistência a longo prazo assume algum valor no intervalo (0, ¥). Ao contrário, quando yt é integrado de ordem zero, choques na série não têm impacto no longo prazo e não há inércia.

Uma ferramenta para a mensuração do grau de persistência de inovações no longo prazo é a razão de variâncias. Campbell e Mankiw (1987), Campêlo e Cribari-Neto (2003), Cochrane (1988), Huizinga (1987), Kim et alii (1991), Liu e He (1991), Wright (2000) usaram a razão de variâncias em diferentes aplicações. Nestes trabalhos, a razão de variâncias é usada como uma medida de persistência, fornecendo assim uma estimativa do nível de inércia em processos econômicos e inflacionários. O grau de inércia pode ser medido também através da estimação de modelos ARIMA (Campbell e Mankiw, 1987), de funções baseadas na densidade espectral da série (Cati et alii, 1999) ou, ainda, utilizando o filtro de Kalman (Tejada e Portugal, 2001).

3. Razão de Variâncias

Seja yt uma série temporal arbitrária com T + 1 observações (y0, y1, ...yT). A série xt = Dyt, t > 1, possui, assim, T observações. A razão de variâncias indexada pelo índice k é definida por

Podemos estimar Vk substituindo Var(yt+k – yt) e Var(yt+1 – yt) por seus correspondentes estimadores e, assim, obtemos

onde . Este estimador será denotado por .

Se yt segue um passeio aleatório, a razão acima é aproximadamente igual a um. Por outro lado, se a série yt é estacionária, a razão em (2) se aproxima de zero quando k cresce. Cochrane (1988), estudando as propriedades assintóticas de Vk, forneceu uma aproximação para a expressão (1):

onde rj é a j-ésima autocorrelação de Dyt. O valor esperado de Vk sob a hipótese nula de independência serial de retornos é obtido notando que a j-ésima autocorrelação amostral tem valor esperado –1/(T – j), como é mostrado em Kendall e Stuart (1976), e assim

Podemos estimar Vk substituindo as autocorrelações populacionais rj em (3) pelas correspondentes autocorrelações amostrais . Obtemos, assim,

Este estimador será denotado por . Temos de (4) que é uma combinação linear das primeiras k autocorrelações amostrais da primeira diferença da série com pesos decaindo aritmeticamente. Por construção, é não-negativa e não-limitada superiormente, sendo sua distribuição assimétrica em amostras finitas. Existe um severo viés em . Por exemplo, para o passeio aleatório a média de é aproximadamente (T – k + 1)/T ao invés do valor esperado 1. Por isso, é comum multiplicar a razão de variâncias estimada por T/(T – k + 1) para correção deste viés negativo.

Convém notar que o uso de tem muitas vantagens. Em particular, apresenta desvio-padrão assintótico menor que alguns outros estimadores mais simples de Vk, por exemplo, algum estimador que atribua pesos iguais para todas as k autocorrelações amostrais.

Um resultado de análise espectral (Priestley, 1982) fornece o erro-padrão assintótico de , que pode também ser obtido da fórmula de Bartlett (1946):

4. Medidas Alternativas Usando Postos e Sinais

Ao ordenarmos as observações de uma série temporal xt de forma crescente, o número natural correspondente à ordem da observação xt é chamado posto de xt entre x1, x2, ..., xT e é denotado por r(xt). Definimos

onde F é a função de distribuição cumulativa normal padrão. Observe que a série r1t é uma simples transformação linear dos postos, padronizada para ter média amostral zero e variância um. A série r2t (conhecida como normal inversa ou escore van der Waerden) tem média amostral zero e variância amostral aproximadamente igual a um.

Usando r1t e r2t no lugar de xt na definição da razão de variâncias , equação (2), obtemos as seguintes medidas de persistência baseadas em postos:

Usando sinais de retornos construímos duas outras medidas de persistência. Para alguma série xt definamos a função f(xt, q) = 1/2 se xt > q e f(xt, q) = –1/2 caso contrário. Seja s1t = 2f(xt, 0). Claramente, s1t é independente e identicamente distribuída com média 0 e variância 1. Cada s1t é igual a 1 com probabilidade 1/2 e é igual a –1 com probabilidade 1/2. Consideremos também s2t = 2f(xt, ), onde .

Substituindo s1t e s2t no lugar de xt na definição da razão de variâncias , equação (2), temos as seguintes medidas de persistência baseadas em sinais:

onde .

5. Simulações de Monte Carlo

Nesta seção nós investigamos numericamente o comportamento das diferentes versões da razão de variâncias através de simulações de Monte Carlo implementadas na linguagem de programação matricial 0x (Cribari-Neto e Zarkos (2003), Doornik (2001)). A série yt é obtida considerando três processos geradores de dados distintos:

i) processo estacionário, yt = y0 + ut, u0 = 0;

ii) passeio aleatório com drift, yt = y0 + µt + uj, u0 = 0;

iii) modelo ARIMA(0,1,1), yt = yt–1 + ut + 0.5ut–1, u0 = 0.

Em todos os casos o tamanho da amostra é igual a T + 1. Assim, t = 1, ..., T + 1. Nas simulações realizadas utilizamos para cada especificação 10000 réplicas e tamanho da amostra igual a 501 (a série Dyt = xt possui T = 500 observações) e, para compararmos os resultados das diferentes especificações, utilizamos a mesma semente inicial.

Os erros ut são ruído branco, possuindo média zero (quando existente) e variância constante (quando finita). Consideramos quatro distribuições distintas para ut: normal padrão, t3 (t-Student com três graus de liberdade), Cauchy e Exp(1) – 1. A motivação para se considerar inovações não-gaussianas é analisar o comportamento das diferentes especicações da razão de variâncias quando estas inovações apresentam assimetria (choques exponenciais) e são oriundas de distribuições de caudas grossas (t3 e, mais marcantemente, Cauchy).

Quando os dados contêm planos de choque, os processos citados anteriormente são interrompidos por ocasionais inliers. Neste caso temos

yt = a para t Î {ti,j} (j = 1, ..., p; i = 1, ...,nj)

Aqui {ti, j} é o índice referente à i-ésima observação do plano j. Existem p planos de choque e cada um contém nj observações. Utilizamos as seguintes especificações para os parâmetros: a = 4, o qual consideramos igual ao nível inicial da série (y0); existem p = 3 planos de choque, cada um contendo nj = 7 (j = 1, 2, 3) observações, as datas iniciais destes planos sendo t Î {250, 350, 450}. Avaliamos também a influência de um outlier no comportamento das medidas analisadas. Para simular a presença de um outlier introduzimos na metade da série uma observação cujo valor é 10 vezes a maior observação da série original.

a) Processo gerador de dados estacionário

Uma vez que processos estacionários não têm componente inercial, esperamos decaimento para zero das medidas de persistência quando k cresce. A tabela 1 contém as médias das razões de variâncias obtidas quando a série não contém outlier ou inliers e os erros são normais.1 1 As simulações foram realizadas considerando também as outras distribuições mencionadas para os erros. Os resultados são omitidos porque não observamos variabilidade entre resultados de distribuições distintas para este processo gerador de dados.

As medidas e apresentam valores idênticos para todo k e se aproximam de zero à medida que k cresce. Os valores de e fornecem para o mesmo k estimativas quase iguais e maiores que aquelas fornecidas pela razão de variâncias tradicional. Podemos dizer, grosseiramente, que os valores de e são k vezes o valor ideal para o processo estacionário. As medidas baseadas em sinais fornecem estimativas sempre maiores que a razão de variâncias tradicional e menores que aquelas baseadas em postos e também tendem a zero quando k cresce.

Como vemos na tabela 1, a presença de um outlier no processo estacionário não afeta o comportamento das medidas de persistência, que apresentam valores similares aos da especificação anterior. Contudo, com a introdução de inliers nos dados (tabela 1) somente as versões tradicionais não são afetadas. As medidas baseadas em postos apresentam valores sempre oscilando em torno de um e sugerem inércia completa. Os valores de e também aumentam e sugerem inércia moderada.

b) Processo gerador de dados passeio aleatório com drift

Neste processo gerador de dados, o parâmetro µ especifica a rapidez com que a componente de tendência determinística cresce. Realizamos simulações considerando µ = 0.1, representando crescimento suave desta componente. A especificação deste parâmetro é importante porque ele dita a magnitude do decrescimento da série que ocorre com a implantação de um plano de choque, ou seja, com a introdução de inliers.

Os resultados obtidos para as diferentes versões da razão de variâncias para o processo gerador de dados passeio aleatório com drift µ = 0.1 sem outlier e sem inliers estão apresentados na tabela 2. Como o passeio aleatório representa um processo completamente inercial esperamos que as medidas sejam iguais a 1 para todo valor de k. A razão de variâncias exibe este padrão para todo valor de k. Contudo, a razão de variâncias tradicional apresenta valores menores que 1 para k > 4 e = 0.83. Valores aproximadamente iguais são obtidos para , e . Contudo, a medida baseada em sinais apresenta comportamento errático quando k cresce, principalmente para a distribuição assimétrica Exp(1) – 1, onde as estimativas são explosivas.2 2 Os resultados para as distribuições t 3 e Cauchy são semelhantes àqueles obtidos para erros normais.

A tabela 3 apresenta os resultados obtidos quando há um outlier na série yt. Vemos que e são fortemente afetadas pela presença de um outlier pois tendem a zero, como seria esperado sob estacionariedade. Cumpre notar, contudo, que a presença de um outlier na série não alterou o comportamento das medidas robustas.

O mau desempenho da razão de variâncias permanece quando há inliers nos dados. Mesmo exibindo valores um pouco maiores que aqueles obtidos no caso anterior, as estimativas também tendem a zero quando k cresce. Contudo, como mostra a tabela 4, o comportamento das medidas robustas não é afetado pela presença de inliers. Pelo contrário, e têm seus resultados melhorados e revelam inércia completa na série passeio aleatório com drift com inliers. Como vemos na tabela 4, o problema de valores explosivos com para erros exponencialmente distribuídos permanece.

Os resultados obtidos para e são relevantes para aplicações empíricas, pois se a série de interesse possuir outlier e/ou inliers e a razão de variâncias tradicional (ou a apoximação dada por Cochrane) exibir valores baixos, tendendo a zero, afirmar que a série possui inércia de segunda ordem pode ser uma conclusão equivocada sobre a verdadeira dinâmica da série. É aconselhável, neste caso, avaliar também o resultado das medidas robustas, que em nossas simulações não tiveram desempenho alterado com a introdução de outlier ou inliers.

c) Processo gerador de dados ARIMA(0,1,1)

Campbell e Mankiw (1987) usaram, para medir a persistência de inovações em um processo ARIMA(p,d,q), a medida dada por

onde

f(1) = 1 – f1 – f2 – ... – fp

q(1) = 1 + q1 + q2 – ... – qq

os fi's e os qi's sendo os parâmetros auto-regressivos e de médias móveis, respectivamente, da especificação ARIMA(p,d,q). Adionalmente, estes autores mostraram que

onde:

V é a aproximação da razão de variâncias dada por Cochrane (1988);

é a variância das inovações ut; e

s2 é a variância do processo diferenciado.

Desta forma, para o processo ARIMA(0,1,1) considerado em nossas simulações, o valor esperado de A(1), a medida proposta por Campbell e Mankiw (1987), é 1.5 e o valor de , a aproximação da razão de variâncias dada por Cochrane (1988), é 1.8. Não sabemos exatamente os valores limite exatos das demais razões de variâncias, mas estes devem ser superiores à unidade. Assim, é interessante verificar, através de avaliações numéricas, se as diferentes variantes da razão de variâncias apontam corretamente para um nível de persistência superior a um.

Como vemos na tabela 5, para erros normais, quando os dados não contêm outlier ou inliers, é aproximadamente igual a 1.8. A razão de variâncias tradicional exibe, para este valor de k, valores mais próximos a 1.5, o valor esperado de A(1). As versões baseadas em postos e exibem estimativas sempre menores que as outras medidas para esta especificação; temos = = 0.93. A medida , como a razão de variâncias tradicional, exibe valores mais próximos ao valor esperado para a medida A(1); temos = 1.51 e » 1.30.

Os resultados para as outras distribuições não são apresentados pois, assim como ocorreu para o processo passeio aleatório, os resultados para erros t3 e Cauchy são similares àqueles obtidos para a distribuição normal e os valores de tornam-se explosivos com erros assimétricos. Para investigarmos o comportamento explosivo da medida , realizamos simulações adicionais considerando as distribuições – 1 e – 2, também assimétricas, para os erros e os resultados encontrados para esta medida, para ambas as distribuições, foram semelhantes àqueles obtidos com a distribuição Exp(1) – 1. Concluímos, portanto, que o uso da estatística S1 é inadequado quando os dados seguem um processo integrado de ordem um e os erros são provenientes de uma distribuição assimétrica.

Como podemos ver na tabela 5, o comportamento das medidas de persistência no processo gerador de dados ARIMA(0,1,1) é o mesmo comportamento do processo passeio aleatório com drift. Com a introdução de um outlier nos dados, e tendem a zero quando k cresce e as versões robustas não são afetadas. As medidas robustas também são pouco sensíveis à presença de inliers nos dados (tabela 5), mas e sugerem grau de persistência moderado; temos = 0.49 e = 0.40.

As principais conclusões que podem ser extraídas das simulações de Monte apresentadas acima são: (i) a razão de variâncias usual não é robusta à presença de observações atípicas nos dados, em particular esta medida não possui comportamento confiável na presença de inliers; (ii) dentre as medidas robustas propostas na Seção 4, aquelas baseadas em postos se mostraram menos confiáveis do que as baseadas em sinais; (iii) no agregado, a medida de persistência que conduziu às inferências mais precisas nos diferentes cenários considerados foi .

As especificações tradicionais (não-robustas) da razão de variâncias não funcionam adequadamente na presença de inliers e/ou outliers, como evidenciado pelas simulações apresentadas acima. Isto se deve ao fato de tomarem a dinâmica introduzida por estas observações atípicas como evidência de retorno à média. Considere, por exemplo, um grupo de inliers, i.e., observações consecutivas artificialmente baixas. Quando acaba o regime de artificialidade e a série retorma seu padrão dinâmico natural, após a realização de tais observações, há um aparente movimento de 'retorno à média', movimento este que é apenas aparente caso a série seja integrada de ordem um. Esta aparência de comportamento estacionário introduz um viés negativo nas especificações não-robustas da razão de variâncias. A versão robusta proposta na Seção 4, contudo, não sofre de tal deficiência, como evidenciado pelas simulações. Acreditamos, assim, que ela seja mais adequada do que as especificações usualmente adotadas para mensuração de inércia inflacionária em países como o Brasil, que apresentam observações atípicas na realização dos padrões dinâmicos de seus processos inflacionários.

6. Análise da Dinâmica Inflacionária Brasileira

A série analisada consiste de 713 observações de um índice de preços calculado mensalmente pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), o IGP-DI (Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna), abrangendo o período de fevereiro de 1944 a junho de 2003. A fonte dos dados são várias edições da publicação Conjuntura Econômica.

Como vemos na figura 1, a série é caracterizada por crescimentos acentuados iniciados no início dos anos 80, que levaram o país à hiperinflação em 1989. Desde 1979 a história econômica brasileira foi marcada por muitas intervenções governamentais repentinas destinadas a controlar a inflação. Porém, alguns destes planos de choque não obtiveram o efeito esperado, nem mesmo a curto prazo, e por isso não introduziram inliers significativos na série, uma vez que não conseguiram baixar o nível das taxas inflacionárias. Este foi o caso dos planos de choque Delfim I, Delfim II, Delfim III, Dornelles, Arroz com Feijão, Éris, Marcílio e o Programa de Ação Imediata. Portanto, analisamos a inércia na inflação brasileira na presença de potenciais inliers conseqüentes principalmente dos planos Cruzado (março, 1986), Bresser (junho, 1987), Verão (janeiro, 1989), Collor I (abril, 1990), Collor II (fevereiro, 1991) e Real (junho, 1994).


A estratégia adotada foi calcular , , , , e para amostras contendo ou não observações que potencialmente podem ser inliers:

BR1) 1944:02 a 2003:06, 713 observações;

BR2) 1944:02 a 1985:12, 503 observações;

BR3) 1980:01 a 1989:12, 120 observações;

BR4) 1980:01 a 1993:12, 168 observações;

BR5) 1994:01 a 2003:06, 114 observações;

BR6) 1994:08 a 2003:06, 107 observações.

A amostra BR1 é a série completa com todas as observações disponíveis. Como o primeiro plano de choque significativo para o Brasil foi o Plano Cruzado, implementado em março de 1986, a amostra BR2 não contém inliers. A amostra BR3 abrange o crescimento expansivo das taxas inflacionárias na década de 80 e termina antes da implementação do Plano Collor I. BR4 inicia também em 1980, mas abrange os efeitos de todos os planos anteriores ao Plano Real terminando antes de sua implementação. As amostras BR5 e BR6 incluem os efeitos do Plano Real. A diferença entre elas é que a série BR5 possui 7 observações a mais que a série BR6. Estas observações, com valores entre 24% e 47%, referem-se às taxas mensais de inflação de janeiro a julho de 1994. Tais observações não podem ser consideradas outliers para a amostra BR5, mas são observações distoantes, já que a partir de agosto de 1994 a maior taxa registrada foi 4.4% em fevereiro de 1999, tendo sido sempre menor que 3% nos outros meses.

Para a amostra BR1 (tabela 6) e decrescem à medida que o valor de k aumenta e apresentam valores muito próximos, quase sempre iguais, como esperado. Para k = 2 e k = 3, estas medidas sugerem efeitos acentuados do choque ocorrido, mas as estimativas decaem de forma que para k = 84 (isto é, 84 meses ou 7 anos após o choque inicial) temos = = 0.16. Apoiados neste resultado, Campêlo e Cribari-Neto (2003) afirmam que a inércia na dinâmica inflacionária brasileira é de segunda ordem, em contraste às conclusões de Cati et alii (1999). Campêlo e Cribari-Neto (2003) lembram que no início do ano 1999, com a repentina e acentuada desvalorização da moeda brasileira, a taxa inflacionária saltou de 1.2% em janeiro para 4.4% no mês seguinte e logo em abril a taxa de inflação foi aproximadamente nula. Os efeitos do choque foram, portanto, rapidamente dissipados, o que evidencia dinâmica estacionária.

Os resultados obtidos a partir das versões robustas da razão de variâncias não concordam com aqueles obtidos usando a razão de variâncias tradicional. e aumentam substancialmente à medida que k cresce, indicando comportamento explosivo na dinâmica inflacionária; temos = 3.94 e = 4.39. Os valores de e para k > 6 aumentam à medida que k cresce e, mesmo não sendo explosivos, = 1.95 e = 1.11, este sugerindo inércia completa. Estes resultados podem ser justificados com base no comportamento da série no período de janeiro de 1993 a junho de 1994, cerca de 84 meses após a implementação do plano Cruzado. Estes meses registraram taxas de inflação altas, quase sempre crescentes e imunes à intervenção do Programa de Ação Imediata (junho de 1993) e que só foram reduzidos quando o Plano Real impôs novo ritmo ao processo, baixando as taxas a partir de agosto de 1994. Ou seja, neste período a inflação apresentou comportamento inercial. Houve persistência das altas taxas inflacionárias e isto é revelado pelas medidas robustas baseadas em sinais.

Para a série truncada BR2 os resultados, para todas as versões, revelam grau de inércia sempre menor do que a respectiva estimativa obtida com a série completa. Temos = 0.08 (metade do valor encontrado para a amostra BR1) e = 0.05. Os resultados obtidos a partir de e indicam que a inflação brasileira seguiu uma dinâmica inflacionária aproximadamente estacionária até a introdução do primeiro plano de choque no início de 1986. De acordo com este resultado, o plano Cruzado pode ter sido baseado num diagnóstico equivocado da inflação brasileira. Por outro lado, = 0.68 sugere inércia moderada no período anterior aos planos de choque.

Para as séries BR3, BR4, BR5 e BR6 diminuímos o valor máximo de k, uma vez que estas amostras têm tamanhos menores. Como vemos na tabela 6, para a amostra BR3 existe uma forte discrepância entre os resultados de e . A razão de variâncias tradicional fornece = 0.25 para o grau de inércia neste período. A aproximação de Cochrane fornece uma estimativa quase o triplo do valor de e, assim, sugere inércia moderada neste período, que envolve o crescimento explosivo das taxas inflacionárias brasileiras e precede a implementação do plano Collor I. As versões robustas da razão de variâncias fornecem valores ainda maiores e sugerem inércia completa neste período. De fato, o comportamento de não condiz com o comportamento da inflação neste período, em que as taxas se mostraram sempre crescentes e resistentes aos planos Cruzado, Bresser, Arroz com Feijão e Verão. As estimativas elevadas obtidas são consistentes com este comportamento.

Com os efeitos do Plano Collor I e dos outros planos anteriores ao Plano Real (tabela 6, BR4), as estimativas concordam com os valores de e indicam baixa persistência no período anterior ao Plano Real. Por sua vez, as medidas robustas sugerem inércia completa na série brasileira. Esta amostra contém um outlier significativo referente à taxa do mês de março de 1990, 81.3%. As simulações realizadas indicaram que a razão de variâncias tradicional é bastante viesada na presença de outliers. Em contraste, a presença de outliers não afeta a inferência baseada em sinais. Assim, a estimativa é mais confiável e concluímos que o período anterior ao Plano Real foi completamente inercial. Isto é comprovado pelo comportamento da série neste período: taxas crescentes e propensas à aceleração diante de todos os choques governamentais.

Comparando os resultados das amostras BR5 e BR6 na tabela 6, vemos que a medida é insensível à presença das observações distoantes referentes ao período de janeiro a julho de 1994. Em contraste, para as outras medidas as estimativas são bem mais elevadas na presença destas observações, sugerindo persistência de inovações a longo prazo. Quando são retiradas as observações distoantes, todas as medidas indicam um grau bem reduzido de persistência. Ambos os resultados podem ser justificados. A série BR5 inicia com taxas altas, referentes ao período de janeiro a julho de 1994. A economia, estagnada desde 1989, fechava o ano anterior com uma inflação anual de 2103.7%. De janeiro a junho de 1994 houve hiperinflação, com as taxas ultrapassando 41%. Em março de 1994 era implementado o Plano Real e seus efeitos surgiram em julho, quando as taxas caíram abruptamente para 24.7%. Foram as últimas variações mensais de dois dígitos na história inflacionária brasileira. De agosto de 1994 em diante as taxas não retornaram aos níveis altos anteriores. Em outras palavras, a inovação causada pelo Plano Real foi altamente persistente.

A série BR6 inicia em agosto de 1994 e por isso representa uma fase mais estável da economia brasileira. Inovações nesta série referem-se a esporádicas elevações, por exemplo, em fevereiro de 1999 e em outubro de 2002. Contudo, a persistência destas inovações é pequena. Como já foi mencionado, em 1999 a inflação saltou de 1.2% em janeiro para 4.4% em fevereiro, em abril a taxa foi 0.0% e em maio baixou mais ainda para –0.3%, ou seja, a elevação de fevereiro de 1999 não persistiu. Algo semelhante ocorreu em 2002. Impulsionada pela alta do dólar no final do ano, a inflação saltou de 2.6% em setembro para 4.2% em outubro. O crescimento persistiu apenas até novembro, quando a inflação registrada foi 5.8%. Em dezembro a inflação já caiu para 2.7%. Daí em diante as taxas de inflação se mantiveram em patamares baixos.

7. Breve Análise da Experiência de Outros Países

A fim de comparar a experiência brasileira com as de outros países, realizamos análise semelhante para o Chile, Argentina e México. Para o México dispomos de uma série com 413 observações envolvendo o período de fevereiro de 1969 a junho de 2003, composta de variações mensais do INPC (Indice Nacional de Precios al Consumidor). O INPC é calculado pelo Banco do México (Banxico). A série é formada pelas variações mensais do IPC (Indice de Precios al Consumidor) calculadas pelo Instituto Nacional de Estadísticas (INE). Para a Argentina dispomos de variações mensais do IPC fornecidas pelo Instituto Nacional de Estadística y Censos de la República Argentina. A abrangência e o tamanho das séries da inflação no Chile e na Argentina são os mesmos da série brasileira.3 3 Aqui, reportamos apenas as medidas de persistência para as séries completas, mas uma análise de séries truncadas destes países pode ser encontrada em Cassiano (2003).

O comportamento da série inflacionária do Chile é bem distinto do comportamento da série brasileira. Se ignorarmos o período 1972-1978, que registra a crise do governo de Salvador Allende e os primeiros anos da ditadura Pinochet, podemos afirmar que flutuações nesta série representam desvios temporários de uma tendência e o comportamento da série é de reversão para a média. Como vemos na figura 2, de acordo com o IPC, desde 1980 a inflação não tem sido um problema sério para o país. Com a implementação de um regime de metas inflacionárias em 1990, o Chile tem alcançado taxas anuais próximas às de países desenvolvidos, entre 2% e 4%.


A Argentina é um país mais afetado pela inflação e, assim como o Brasil, na década de 80 foi submetido a planos de choque para conter surtos inflacionários, como o Plano Austral (1985) e o Plano Primavera (1988), chegando à hiperinflação no final da década de 80, quando foi registrada, em junho de 1989, a marca recorde de 196.6% ao mês. Em 1991, o presidente Carlos Menem, juntamente com Domingo Cavallo (Ministro das Finanças), introduziu o regime de "currency board", um sistema monetário onde o peso (a moeda corrente argentina) foi rigidamente fixado ao dólar. A economia argentina prosperou até 1995, quando o país entrou em recessão devido ao contágio da crise econômica do México, também conhecida como Efeito Tequila. Desde então o país, agravado por outras crises, passa por forte recessão econômica. Como podemos ver na figura 3, desde 1992 há uma estabilidade considerável nas taxas de inflação.


O México tem uma história de inflação bem diferente dos demais países analisados. A série não possui outliers porque o país nunca passou por hiperinflações. As crises enfrentadas por este país tiveram forte repercussão política, social, econômica, às vezes internacional, mas não afetaram os preços internos com a mesma intensidade. As maiores variações registradas neste país foram decorrentes de uma forte queda no preço do petróleo e referem-se aos meses de dezembro de 1987 e janeiro de 1988, 14.8% e 15.5%, respectivamente.

No final de 1994, a fuga de investimentos de curto prazo se intensificou no país. Com déficit na balança comercial e com a forte queda das reservas, o governo desvalorizou o câmbio, congelou salários e cortou gastos públicos. Em janeiro de 1995, em apenas 15 dias o peso mexicano desvalorizou-se em 60%, provocando uma fuga em massa de divisas do país e desencadeando uma onda de desconfiança nos mercados financeiros de países em desenvolvimento. Numa reação em cadeia, conhecida como Efeito Tequila, caíram em todo o mundo as cotações dos títulos de países emergentes. A tendência inflacionária tem sido, ainda, decrescente.

Os resultados sugerem uma dinâmica estacionária na inflação chilena. Como vemos na tabela 7, = = 0.03. Temos, ainda, que = 0.44. As medidas baseadas em postos fornecem estimativas explosivas e, portanto, não são consideradas.

Para a série argentina, e exibem os mesmos resultados para todo k e revelam baixo grau de inércia na dinâmica inflacionária; temos = = 0.04. Uma vez que esta série possui outlier e inliers, o comportamento destas medidas não é confiável e preferimos concluir que a inércia nesta série é moderada, com base nas medidas = 0.74 e = 0.59.

No caso do México, vemos na tabela 8 que = = 0.12, havendo inércia de segunda ordem na inflação. Ao contrário, as medidas baseadas em postos fornecem estimativas elevadas, embora não explosivas: = 1.06 e = 0.75. O comportamento de é errático, uma vez que as estimativas aumentam à medida que k cresce. tem este mesmo comportamento e temos = 2.94. Porém, os resultados fornecidos por concordam com aqueles da razão de variâncias tradicional, sendo a estimativa para k = 84 igual a 0.30, aproximadamente igual ao respectivo valor obtido em nossas simulações para o processo estacionário. Este resultado é consistente com a dinâmica da série, onde inovações nas taxas inflacionárias não têm sido persistentes.

8. Conclusão

Por muito tempo conjecturou-se que a inflação brasileira era de cunho eminentemente inercial. Vários autores mensuraram o grau de inércia na dinâmica inflacionária brasileira usando diferentes metodologias. Dois resultados contrastantes, em particular, foram obtidos por Cati et alii (1999), que encontraram inércia plena, e Campêlo e Cribari-Neto (2003), para quem a componente inercial é negligível. No presente artigo, nós propusemos quatro medidas robustas do impacto de choques econômicos no longo prazo. Estas medidas foram obtidas a partir de modificações nas estatísticas de teste propostas por Wright (2000), para quem o interesse residia no teste da hipótese nula de passeio aleatório. As medidas pontuais propostas são versões robustas da razão de variâncias. Resultados de simulação apresentados na Seção 5 mostraram que uma das estatísticas propostas é particularmete robusta à presença de observações distoantes, sejam estas outliers ou inliers. Uma vez que há outliers e inliers na taxa de inflação no Brasil, esta medida parece ser a mais indicada para a mensuração do grau de inércia inflacionária neste país.

Os resultados empíricos sugerem que a componente inercial na dinâmica da inflação no Brasil é maior do que aquela encontrada por Campêlo e Cribari-Neto (2003), estando em concordância com os resultados de Cati et alii (1999). A razão de variâncias usual (usada por Campêlo e Cribari-Neto (2003)) aponta um grau de persistência de 0.16, ao passo que a medida robusta baseada em sinais fornece uma estimativa que sugere inércia completa, 1.11. Convém notar, contudo, que a série do IGP-DI analisada possui outlier e inliers significativos e, nas simulações realizadas na Seção 5, vimos que o comportamento de não é confiável na presença de tais observações atípicas. Assim, preferimos concluir que existe inércia quase completa na dinâmica inflacionária brasileira, como encontrado por Cati et alii (1999). Cumpre notar que a medida de persistência proposta no presente artigo é consideravelmente mais simples do que a sugerida por estes autores, não requer a especificação de variáveis dummy marcando o início e o final de planos de choque e é robusta à presença de inovações não-gaussianas. Ou seja, nós obtemos o mesmo resultado qualitativo sobre a dinâmica inflacionária brasileira obtido por Cati et alii (1999), mas utilizando um método mais simples e mais robusto.

Outro resultado importante acerca do processo inflacionário brasileiro é que o Plano Real, além de reduzir a taxa de inflação a níveis baixos, conseguiu reduzir consistentemente o grau de inércia inflacionária da economia. No período pós-Real, mesmo com o comportamento instável do sistema cambial, agravado no ano de 2002, e mesmo havendo algumas observações atípicas, ocorreu uma mudança estrutural na dinâmica da inflação, que adquiriu um caráter quase estacionário. Ou seja, no período pós-Real, a componente inercial do processo inflacionário brasileiro parece ser, de fato, de segunda ordem.

Conclusões análogas também foram obtidas por Tejada e Portugal (2001). Para avaliar a inércia inflacionária no Brasil, estes autores adotaram um procedimento econométrico constituído de dois estágios: primeiramente, estimaram uma variável proxy da credibilidade; depois, estimaram o grau de inércia da taxa de inflação mediante o uso do filtro de Kalman, levando em consideração o efeito da variável proxy de credibilidade sobre a inércia da taxa de inflação. Assim como Cati et alii (1999), Tejada e Portugal (2001) usaram um método mais trabalhoso do que o adotado no presente artigo.

Foram ainda analisadas as experiências de três outros países, a saber: Argentina, Chile e México. O país com a maior componente inercial na inflação é o Brasil, seguido da Argentina, Chile e México, este último sendo um país com baixa persistência de inovações nas taxas inflacionárias que apresenta dinâmica estacionária.

Artigo recebido em nov. 2003 e aprovado em mai. 2005.

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  • *
    Os autores agradecem a um parecerista anônimo por comentários e sugestões e ao CNPq pelo auxílio financeiro.
  • 1
    As simulações foram realizadas considerando também as outras distribuições mencionadas para os erros. Os resultados são omitidos porque não observamos variabilidade entre resultados de distribuições distintas para este processo gerador de dados.
  • 2
    Os resultados para as distribuições
    t
    3 e Cauchy são semelhantes àqueles obtidos para erros normais.
  • 3
    Aqui, reportamos apenas as medidas de persistência para as séries completas, mas uma análise de séries truncadas destes países pode ser encontrada em Cassiano (2003).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jul 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2005

    Histórico

    • Aceito
      Maio 2005
    • Recebido
      Nov 2003
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