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Estimação da eficiência técnica do SUS nos estados brasileiros na presença de insumos não-discricionários

Resumos

O propósito deste trabalho é estimar a eficiência técnica do SUS utilizando dados de 2006, referentes às UF's no Brasil. Utiliza-se o modelo DEA com inclusão de insumos não-discricionários para analisar o impacto que certas características locais podem ter sobre a eficiência na oferta de saúde. Adicionalmente, é utilizado um método de seleção de variáveis a fim de melhorar o poder discricionário do modelo. Os resultados mostram que o modelo reduzido melhora o poder discriminatório sem haver perda significativa de informação, e que, população é a única variável contextual que efetivamente promove um ambiente favorável na oferta de saúde pública.

Eficiência Técnica; DEA; Saúde Pública


This paper estimates the technical efficiency of SUS of Brazilian states with data from 2006. The DEA model is used with nondiscricionary imputs to analyze how some demographics and socio-economics characteristics can be change technical efficiency of public health offer. In addition the paper introduces a selection variable method that reduces the original set of variable improving the discrimination power of DEA model. The results shown that the reduced model improves discrimination without loss information. Beside, the results suggest that the population is the only nondiscricionary imput that creates actually a more favorable environment to offers public health.


Estimação da eficiência técnica do SUS nos estados brasileiros na presença de insumos não-discricionários

Mauricio BenegasI; Francisco Gildemir Ferreira da SilvaII

IUniversidade Federal do Ceará (CAEN/UFC). E-mail: mauricio_benegas@caen.ufc.br

IIUniversidade Federal do Ceará (CAEN/UFC e ANTT). E-mail: gildemir@gmail.com

RESUMO

O propósito deste trabalho é estimar a eficiência técnica do SUS utilizando dados de 2006, referentes às UF's no Brasil. Utiliza-se o modelo DEA com inclusão de insumos não-discricionários para analisar o impacto que certas características locais podem ter sobre a eficiência na oferta de saúde. Adicionalmente, é utilizado um método de seleção de variáveis a fim de melhorar o poder discricionário do modelo. Os resultados mostram que o modelo reduzido melhora o poder discriminatório sem haver perda significativa de informação, e que, população é a única variável contextual que efetivamente promove um ambiente favorável na oferta de saúde pública.

Palavras-chave: Eficiência Técnica, DEA, Saúde Pública.

Códigos JEL: C6, D2, I12.

ABSTRACT

This paper estimates the technical efficiency of SUS of Brazilian states with data from 2006. The DEA model is used with nondiscricionary imputs to analyze how some demographics and socio-economics characteristics can be change technical efficiency of public health offer. In addition the paper introduces a selection variable method that reduces the original set of variable improving the discrimination power of DEA model. The results shown that the reduced model improves discrimination without loss information. Beside, the results suggest that the population is the only nondiscricionary imput that creates actually a more favorable environment to offers public health.

1. INTRODUÇÃO

Nos últimos dez anos tem havido um crescimento considerável no volume de trabalhos com a finalidade de avaliar a eficiência técnica dos gastos públicos no Brasil. Esse fenômeno pode ter duas justificativas a princípio. A primeira é o interesse per se no assunto, haja vista a importância do estado na economia brasileira com respeito a oferta de certos serviços como educação, saúde e segurança. A segunda justificativa é a disponibilidade de técnicas relativamente simples e bem fundamentadas para avaliação da eficiência técnica, que têm como exemplos imediatos o modelo de fronteira estocástica de produção (FEP) e o modelo de análise de envoltória de dados (DEA - Data Envelopment Analysis).

No caso específico da saúde pública, uma rápida busca na rede mundial de computadores, retornou mais de duzentos trabalhos (entre textos para discussão e artigos publicados em periódicos indexados) que em alguma instância se propõe a avaliar a eficiência técnica de serviços de saúde pública no Brasil. Com raríssimas exceções, esses trabalhos utilizam o modelo DEA para tal propósito.

O interesse nessa rubrica específica não pode ser considerado circunstancial. Os serviços de saúde pública no Brasil responderam por mais de 99% do total de atendimentos entre janeiro de 2008 e julho de 2010, conforme dados disponibilizados pelo DATASUS.1 1 Vide o sítio www2.datasus.gov.br. Os serviços considerados foram os procedimentos hospitalares (que incluí internações) e serviços ambulatoriais. Este fato revela a grande responsabilidade que o estado carrega no atendimento desse serviço. Alie-se a isso o fato de que saúde constitui um dos componentes essenciais no cômputo do bem-estar social e do crescimento econômico de longo-prazo.2 2 No trabalho de Bloom et al (2004), os autores utilizam dados da Penn World Table e constatam que saúde é estatisticamente siginificante para o crescimento econômico. Especificamente, os autores estimam que o aumento de um ano na expectativa de vida da população aumenta o produto em 4%. Não obstante a relevância desse serviço, o Brasil ainda apresenta indicadores de saúde aquém de países em condições socio-econômicas semelhantes. Segundo o anuário estatístico da CEPAL de 2006, em 2000 o Brasil apresentou a quarta maior taxa de mortalidade entre a grande maioria dos países da América Latina e Caribe, ficando atrás apenas do Haíti, Bolívia e Peru.

O Brasil não pode ser considerado um país que investe muito em saúde, mas também não está entre os que investem pouco. Ainda com relação ao ano de 2000, segundo dados disponibilizados pela Organização Mundial da Saúde, numa lista de 192 países, o Brasil ocupa a 49ª posição no tocante ao gasto com saúde como proporção do PIB. Os dados revelam ainda que o Brasil alocou 7,2% do Produto Interno Bruto em serviços de saúde em 2000 e que 40% desse volume corresponde aos gastos da União nessa rubrica.3 3 A mesma fonte revela que em 2007, o Brasil alocou 8,8% do PIB em saúde tendo o estado sido resposável por 41,6% desse volume.

Outra justificativa importante para o estudo da eficiência na saúde pública reside na própria concepção do Sistema Único de Saúde (SUS). A Lei Orgânica de Saúde de 1990, estabelece como um dos princípios do SUS, ser eficiente e eficaz.4 4 Vide Lei nº 8.080 de 19 de Setembro de 1990, itens XI, XII e XIII. Noutros termos a saúde pública deve ser gerida de modo a alocar racionalmente os recursos e gerar responsividade no atendimento à sociedade.

Em vista da discussão acima, o objetivo do presente trabalho, é avaliar a eficiência técnica do gasto público em saúde entre as Unidades da Federação (UF's) no Brasil utilizando dados de 2006. Para este fim, o modelo DEA é empregado utilizando-se tanto sua versão com retornos constantes quanto a com retornos variáveis de escala. Neste particular, o trabalho não se constitui em novidade.5 5 Os trabalhos de Calvo (2004), Marinho (2002) e Trompieri-Neto et alii (2009) são excelentes referências sobre a aplicação do modelo DEA para a determinação da eficiência técnica em serviços de saúde. Existem, entretanto, duas extensões do modelo básico que representam contribuições importantes do ponto de vista metodológico.

Em primeiro lugar, os modelos utilizados (DEA com retornos constantes e retornos variáveis de escala) incluem insumos não-discricionários.6 6 Em Marinho et alii (2009), os autores utilizam esse tipo de variável para avaliação de eficiência do gasto em saúde. Mas, o enfoque é diferente. Especificamente, Marinho et alii (2009) avaliam a eficiência técnica do gasto com saúde em geral (não apenas o gasto público) e comparam a performance do Brasil em relação aos países da OCDE. A utilização desse tipo de variável em modelos DEA, foi originalmente proposto por Banker e Morey (1986) e, posteriormente, Ruggiero (1994) sugeriu refinamentos importantes na metodologia. O uso desse tipo de variável na avaliação de eficiência técnica do gasto público em saúde, tem o propósito de identificar como certas características da UF podem influenciar sua performance no atendimento à saúde. Como será visto na seção que discute os resultados, a inclusão de insumos não discricionários promove uma melhora siginificativa de eficiência para quase todas as UF's na amostra.

A segunda contribuição proposta neste trabalho é a utilização de um método de seleção de variáveis baseada em técnicas de estatística multivariada. O método consiste em utilizar uma medida de correlação matricial, conhecida como Coeficiente de Determinação Generalizado de Yanai, com o propósito de reduzir o conjunto original de variáveis (insumos, produtos e variáveis contextuais) a um subconjunto que promova uma melhora no poder discriminatório dos modelos DEA utilizados, sem que haja perda significativa de informação. De fato, como será visto mais adiante, a redução do conjunto de produtos de 12 para 5 destes, geram resultados que melhoram o poder discriminatório dos modelos com uma perda de informação desprezível do ponto de vista estatístico.

No que segue, além desta introdução, o trabalho está dividido da seguinte forma: a Seção 2 apresenta os dados utilizados no trabalho; a Seção 3 discute a seleção de variáveis em modelos DEA bem como apresenta o método proposto; a Seção 4 discute os insumos não discricionários utilizados no trabalho; a Seção 5 apresenta e discute os resultados; por fim a Seção 6 apresenta as principais conclusões obtidas no estudo.

2. DADOS

As informações referentes aos insumos e produtos que serviram de base de dados para aplicação dos modelos, foram obtidas nos Indicadores e Dados Básicos para Saúde - IDB 2008, dispostos no DATASUS, órgão pertencente à Secretaria Executiva do Ministério da Saúde responsável pela coleta, processamento e disseminação das informações sobre saúde.

Tendo em vista a dificuldade de obtenção de dados mais atuais, todos os indicadores utilizados neste trabalho referem-se ao ano de 2006.

Em se tratando de insumo foi utilizado o gasto total anual per capita com saúde que reflete os desembolsos realizados pelas três esferas públicas. Este indicador é muito usado para subsidiar processos de planejamento, gestão e avaliação de políticas públicas de saúde.

Os indicadores de produtos refletem a capacidade de cada Estado gerar resultados na área de saúde. Portanto foi utilizado um amplo conjunto de indicadores que permitissem mensurar o grau de eficiência obtido por cada UF a partir da utilização do insumo gasto per capita. Para tanto, selecionou-se os indicadores que medem a esperança de vida ao nascer para homens, esperança de vida ao nascer para mulheres, esperança de vida ao nascer para ambos os sexos, taxa de sobrevida infantil, médicos por habitante, leitos por habitante, cobertura vacinal tríplice viral, cobertura vacinal tetravalente, cobertura vacinal BCG, cobertura vacinal poliomielite, cobertura de esgotamento sanitário e cobertura de coleta lixo. No caso específico da taxa de mortalidade infantil a variável considerada foi o seu inverso, ou seja, a taxa de sobrevida infantil. A apresentação posterior dos resultados, considera a notação mostrada no Quadro 1.


3. SELEÇÃO DE VARIÁVEIS NO MODELO DEA

No trabalho de Dyson et alii (2001), os autores procuraram reunir, tanto quanto possível, os problemas mais frequentes na utilização do modelo CCR e suas variantes. Adicionalmente os autores propõe algumas soluções a tais problemas, mas deixam claro que tais soluções dependem mais do contexto do que do modelo propriamente dito.7 7 Dito de outra forma, os autores não oferecem respostas que sejam gerais. De fato, são "dicas" que deveriam ser implementadas de acordo com uma orientação mais empírica do que analítica.

Uma das questões levantadas no trabalho é o problema da dimensionalidade dos espaços de insumos e produtos. A consequência quase imediata do uso de uma grande quantidade dessas variáveis é a perda do poder discriminatório dos modelos, uma vez que os resultados geram uma quantidade muito grande de DMU's eficientes. Assim, todo esforço em conceber técnicas de seleção de variáveis é justificável.

A maneira mais popular de seleção de variáveis em DEA é utilizar a matriz de correlação dos insumos e dos produtos separadamente. Quando duas variáveis (insumos ou produtos) exibem uma correlação alta, uma delas é descartada, geralmente utilizando critérios ad hoc. Ocorre que a eliminação de uma ou outra variável pode ter um impacto dramático sobre as eficiências estimadas.8 8 Dyson et alii (2001) oferecem um exemplo que esclarece esse ponto.

Nos últimos anos, a aplicação de métodos de estatística multivariada, principalmente a análise de componentes principais (CP), têm se popularizado entre os pesquisadores por se mostrar uma alternativa satisfatória para seleção de variáveis. A formulação de um modelo DEA, com insumos e produtos agregados através de componentes principais, é o foco dos trabalhos Ueda e Hoshiai (1997) e Adler e Golany (2002). Uma dificuldade na utilização de CP's em substituição de insumos e produtos, é que as "novas" variáveis podem ser negativas. Em geral é necessário promover alguma transformação sobre as CP's o que pode impactar os resultados. Uma forma de contornar o problema é utilizar o modelo DEA aditivo que, segundo Ali e Seiford (1990), é invariante à translações de insumos e produtos.9 9 Em Pastor (1996) o autor mostra que o modelo BCC orientado pelo produto (insumo) é invariante à tranlação em insumos (produtos). Adler e Golany (2001) utilizam essa propriedade para aplicar DEA combinado com CP's na avaliação da ET de aeroportos na Europa.

Existem ainda uma complicação de ordem computacional. Mesmo que a negatividade das CP's não seja um problema, resta a questão de como interpretar os resultados, no tocante à projeção de insumos e produtos. O fato é que, a única forma satisfatória de fazê-lo é retornar às variáveis originais, o que pode exigir um esforço comptacional considerável. Alguns autores selecionam as variáveis baseado em sua contribuição para as componentes principais. Especificamente, são selecionadas as variáveis com o maior valor absoluto dentre os coeficientes da combinação linear que compõe as componentes. Como em geral as primeiras poucas componentes explicam a quase totalidade da variância dos dados

o resultado é um subconjunto de variáveis considerávelmente reduzido. Jenkins e Anderson (2003) utilizam o método de covariância parcial condicionada para não apenas determinar a correlação entre variáveis, mas também identificar que variáveis contribuem mais ou menos para essa correlação. Com essa técnica os autores mostram que a remoção de variáveis com baixa contribuição para as correlações não altera os resultados de forma significativa.

A abordagem adotada no presente trabalho procura combinar o método de Jenkins e Anderson (2003) com a análise de componentes principais. O método proposto é baseado no trabalho de Cadima e Jollife (2001), e consiste em utlizar uma medida de correlação matricial entre a projeção ortogonal dos dados sobre o subespaço gerado por um subconjunto de CP's e a projeção ortogononal dos dados sobre o subespaço gerado por um subconjunto das variáveis originais. Essa medida de correlação matricial é conhecida como Coeficiente de Determinação Generalizado de Yanai (CDGY daqui por diante). Fixado o subconjunto de CP's selecionadas (geralmente as que explicam entre oitenta e noventa por cento da variância dos dados), o subconjunto de variáveis selecionadas corresponde àquelas que maximizam o CDGY. Utilizando os testes de Mann-Witney e de Kolmogorov-Smirnov, verificou-se que, com a seleção de menos de 50% dos produtos originais através do máximo CDGY, as eficiências estimadas no modelo reduzido praticamente replicam os resultados do modelo completo.

A seção seguinte apresenta o método proposto. Com o propósito de tornar a apresentação tão acessível quanto possível, faz-se uma breve discussão sobre a análise de componentes principais e em seguida é definido o CDGY. Por fim a seção é encerrada com a apresentação e discussão da metodologia de seleção de variáveis sugerida.

3.1. Análise de Componentes Principais e o Coeficiente de Determinação Generalizado de Yanai10 10 Essa seção é baseada em Jollife (1986) e Cadima e Jollife (2001).

Seja A uma matriz de dados com dimensão (n × p), em que p indica o número de variáveis e n o número de observações de cada variável. Como existe apenas um insumo no modelo a ser estimado, não existe necessidade de seleção. Neste caso, a matriz A se refere à matriz de produtos ou à matriz de insumos não discricionários.11 11 Insumos não discricionários são discutidos na seção seguinte. É importante lembrar que o número de observações no caso da formulação dos modelos DEA, indica número de colunas nas matrizes pertinentes. Assim, para a aplicação do método proposto, a matriz A deve ser considerada como a tranposta da matriz de produtos (ou de insumos não discricionários).

Dada a matriz de covariância dos dados S = (1/n)A'A, sejam Λ e P a matriz diagonal de autovalores (dispostos em ordem decrescente) e a matriz de autovetores normalizados de S, respectivamente. As p CP's são as colunas da matriz (n × p) dada por C = AP. Usando a decomposição espectral de S, é fácil mostrar que a matriz de covariância de C é exatamente Λ, de forma que, as variáveis em C são não correlacionadas. Por essa razão a transformação AP é às vezes chamada de descorrelação dos dados.

Denote por G um subconjunto de índices associados a q < p CP's dispostas em ordem decrescente de autovalores (em geral as q primeiras). Semelhantemente defina K um subconjunto de índices associado a k < p variávei originais. Os conjuntos G e K são os subespaços gerados pelos vetores com índices em G e K respectivamente. No que segue definem-se as seguintes matrizes:

• ΛG submatriz de autovalores com índices em G;

• PG submatriz de autovetores associados a ΛG;

• SG = AGΛGA'G denota a matriz de covariância associada as componentes principais com índices em G.

Define-se PG como sendo a matriz de projeção ortogonal sobre o subespaço G tal que

onde é a inversa generalizada de Moore-Penrose de SG. Selhantemente PK é a matriz de projeção ortogonal sobre o subespaço K definada como

onde IK é a submatriz da matriz identidade obtida pela seleção das k colunas com índices em K e SK = n-1I'K A' AIK.

Dadas as definições acima o coeficiente de determinação generalizado de Yanai (CDGY) entre os subespaços G e K é definido como

Suponha que G seja mantido fixado, neste caso a seleção de variáveis que exibem a maior contribuição às componentes principais selecionadas é o conjunto de índices tal que

Os modelos reduzidos, ou seja, aqueles em que houve seleção de variáveis, podem ser representados alterando-se os modelos de tecnologia CCR e BCC, como abaixo.

onde x é o vetor de insumo e y é o subvetor de produtos de uma dada DMU, que resulta da manutenção das linhas com índices em e Y a submatriz de produtos com as mesmas linhas com índice em .

Por fim X a matriz que reune todos os vetores de insumos e λ é o vetor de intensidades.

4. MODELO DEA COM INSUMOS NÃO DISCRICIONÁRIOS

Na análise da eficiência técnica de serviços públicos localmente ofertados, é importante considerar o impacto que as características da localidade podem exercer sobre as estimativas de eficiência. Em termos mais gerais, todo processo produtivo pode sofrer influência de fatores externos que não podem ser controlados pelo gestor. O impacto que esses fatores exercem sobre a perfomance do processo produtivo varia conforme o contexto. Mas é fato que, desconsiderar a presença de tais fatores externos pode levar à estimativas enviesadas das eficiências técnicas (ET's). Usando dados simulados, Ruggiero (1994) mostra que em geral a ET é subestimada se, o que autor chama de "variáveis ambientais",12 12 A terminologia utilizada para esse tipo de variável não é padrão. Banker e Morey (1986) usam o termo "variáveis exógenamente fixadas" e Cooper et alii (2006) referem-se a esse tipo de variável como "não-discricionária". Neste trabalho é utilizado o termo "insumos não-discricionários" para o conjunto de fatores que influenciam o processo produtivo mas não podem ser controlados, especificamente, fatores geográficos, sociais e econômicos da UF sob análise. não forem levadas em consideração.

Para esclarecer esse ponto considere o seguinte exemplo. Tome duas localidades, A e B, e suponha que essas localidades são idênticas em tudo exceto que a localidade A apresenta um percentual de pessoas pobres maior do que a localidade B. Neste termos, os serviços de saúde pública seriam "favorecidos" na localidade A, pois, em considerando que ambas alocam as memas quantidades de recursos, a produção em A deveria ser maior, já que a quantidade de usuários é potencialmente maior. Veja que, essa maior quantidade de produto nada tem a ver com uma melhor gestão de recursos na localidade A, isso é uma consequência de uma dada característica dessa localidade.13 13 Ruggiero (1994) oferece outros exemplos interessantes.

O reconhecimento de que, em se tratanto de serviços públicos locais, é importante considerar variáveis não discricionárias na avaliação de performance, é encontrado no trabalho de Bradford e Oates (1969). A incorporação destas em modelos de fronteira para estimação de eficiência técnica, entretanto, é recente. O primeiro trabalho a considerar esta possibilidade é o de Banker e Morey (1986). Como apontado por Ruggiero (1994), o trabalho de Banker e Morey (1986) apresenta certas incosistências quando se trata de estimação de eficiência técnica do setor público, especificamente o modelo sugerido não satisfaz o postulado de "efeito ambiental" que estabelece que, ceteris paribus, se determinada localidade se depara com um ambiente mais favorável, esta deveria produzir tanto quanto outra localidade num ambiente menos favorável. O autor argumenta que sem esse postulado as ET's podem ser subestimadas.

A seguir, é apresentado formalmente o modelo DEA com insumos não discricionários.14 14 São apresentados apenas os modelos com orientação pelo produto. Supõe-se que existem K DMU's utilizando um vetor de insumos x para a produção do vetor de produtos y. Adicionalmente é suposto que cada DMU na amostra se depara com um vetor z de insumos não-discricionários. Utilizando a notação introduzida na seção prévia, X e Y são as matrizes de insumos e produtos na amostra e Z é a matriz de insumos não discricionários. As tecnologias TCCR e TBCC na presença de insumos não discricionários serão denotadas por TCCR(z) e TBCC(z), respectivamente, e são definidas como

Para qualquer DMU k, ETk(zk) representa a eficiência técnica orientada pelo produto considerando o vetor de insumos não-discricionários. Utliza-se a mesma notação para eficiência técnica pura e eficiência de escala. Assim tem-se que

A eficiência de escala também é calculada nos moldes dos modelos tradicionais, tal que, EEk(zk)= ETk(zk)/ET Pk(zk).

A Figura 1 ilustra o cálculo da eficiência técnica na presença de insumos não-discricionários. Na parte (a) da figura está representado um processo de produção em que um insumo discricionário é utilizado para a produção de um produto e, adicionalmente admite-se que existe um insumo não-discricionário com influência efetiva no nível de produção. No ponto (0,x) supõe-se que não há insumo discricionário tal que a produção total é dada por y. No ponto (z,x) uma quantidade não nula de insumo não-discricionário promove um ambiente favorável fazendo com que a produção aumente de y para y(z) sem que se altere a quantiade de insumo discricionário. A parte (b) da figura representa a projeção dos pontos (0,x) e (z,x) no plano. Com essa projeção é possível obter o cálculo da eficiência técnica nos dois cenários.


Usando a definição de eficiência técnica nota-se que ET = y/y* e ET (z)= y(z)/y* = ET [y(z)/y]. Assim, se o insumo não discricionário promove um ambiente favorável à DMU analisada, tem-se que ET <ET (z).

4.1. Insumos Não Discricionários na Saúde Pública

Essa seção tem por finalidade apresentar o conjunto de variáveis que foram selecionadas para representar os insumos não discricionários pertinentes à produção de serviços de saúde pública. Cada uma dessas variáveis busca caracterizar o contexto particular a cada UF. Algumas dessa variáveis possuem essencialmente a mesma informação, mas como será visto mais adiante, a aplicação do método de seleção de variáveis baseado no CDGY reduz o conjunto original a um subconjunto formado por variáveis que captam característica contextuais distintas entre si.

O conjunto de insumos não discricionários previamente selecionados é composto por: população (total), área geográfica (Km2), densidade populacional (população dividida pela área), razão dos genêros (população feminina divida pela população masculina), grau de urbanização (percentual de população urbana), população idosa (percentual da população com mais de 60 anos), taxa de analfabetismo (percentual da populção), percentual da população com menos de 1 ano de estudo, percentual da população com mais de 1 e menos de 3 anos de estudo, percentual da população com mais de 4 e menos de 7 anos de estudo, percentual da população com mais de 7 anos de estudo e população de pobres (percentual da população com renda média inferior à 1/2 salário mínimo).

A inclusão das variáveis população, área geográfica e densidade populacional, objetiva captar os efeitos demográficos sobre a eficiência técnica. Uma maior população respresenta um maior contingente de usuários potenciais, o que, ceteris paribus, poderia fazer com que a produção de serviços de saúde fosse maior. Estados com grande extensão territorial tendem a concentrar o atendimento dos serviços de saúde, uma vez que, a distância média entre uma unidade de atendimento e outra tende a ser maior. Assim espera-se que quanto maior a área geográfica maior a concentração do atendimento o que pode promover aumento na produção. Por fim, a variável densidade foi incluída com o propósito de combinar os efeitos de populção e área numa única medida, entretanto, como será visto na seção seguinte o método de seleção de variáveis excluiu essa variável, o que indica que importam mais os efeitos isolados.

A inclusão das variáveis razão dos genêros, população idosa, taxa de analfabetismo, população com menos de 1 ano de estudo, população com mais de 1 e menos de 3 anos de estudo, população com mais de 4 e menos de 7 anos de estudo, população com mais de 7 anos de estudo e população de pobres, busca captar o efeito das características socioeconômicas da população sobre os serviços de saúde. No trabalho de Ribeiro et alii (2006), os autores mostram que os usuários mais prováveis do SUS são mulheres, pessoas de baixa escolaridade e renda. Desta forma espera-se que localidades com predominância de mulheres bem como de pessoas com baixa escolaridade e renda, haja uma maior utilização dos serviços públicos de saúde, promovendo, do ponto de vista da eficiência técnica, um ambiente mais favorável.

Finalmente a inclusão da variável grau de urbanização visa captar o efeito de acessibilidade ao sistema de saúde pública. Utilizando técnicas de escala geográfica, Guimarães (2007), mostra que existe maior acesso aos serviços de saúde em regiões onde o grau de urbanização é maior. O autor argumenta que o acesso é fortemente relacionado à dispersão espacial das unidades de saúde. O maior acesso aos serviços de saúde em regiões mais urbanizadas é assim consequência da menor dispersão das unidades de saúde nessas localidades.

Por questões de praticidade, os resultados com a inclusão de insumos não-discricionários são apresentados obedecendo a notação apresentada no Quadro 2.


5. RESULTADOS

Os resultados a serem apresentados referem-se à vários modelos que variam conforme a tecnologia especificada,se ou não houve seleção de variáveis e se ou não consideram-se insumos não discricionários. Para facilitar a leitura, os modelos foram nomeados conforme o Quadro 3.


Os resultados apresentados nesta seção referem-se aos modelos MG0CCR/MG0BCC e MR0CCR/MR0BCC. Os resultados dos modelos que consideram insumos não discricionários são discutidos na subseção seguinte. A Tabela 1 mostra os resultados dos modelo MG0CCR/MG0BCC bem como a eficiência de escala. No final da mesma tabela são informadas algumas estatísticas úteis à análise, como média aritimética, desvio padrão e quartís.

Os resultados na Tabela 1 mostram que sete DMU's definem a fronteira de produção, quais sejam: Pará, Maranhão, Piauí, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Goiás. Todas as regiões do país possuem algum respresentante operando eficientemente na amostra. No geral 25.93% das DMU's se mostraram eficientes. Em termos percentuais a Região Sudeste é a que apresentou mais UF's na fronteira, 50%. O menor nível de Eficiência Técnica foi de 0.475180, referente ao estado de Roraima, no Norte do País. A ET média foi de 0.830503 com pouca variabilidade como pode ser comprovado pelo desvio padrão de 0.174304. O primeiro quartil do rol de ET's corresponde a 0.706781, o segundo (a mediana) 0.892326 e o terceiro quartil refere-se a um nível de eficiência de 0.994250. Esse resultados sugerem uma grande concentração de altos níveis de ET na amostra, já que 75% desta possue ET acima de 0.7. Isso pode ser uma consequência do baixo poder discriminatório do modelo já que existe uma grande quantidade de produtos.

Com relação à ETP e EE, os resultados sugerem que as ineficiências estimadas se devem em grande parte a problemas de escala. De fato, nota-se que os resultados de estatística descritiva para ET e EE são basicamente os mesmos. Por outro lado, a maior parte das DMU's opera com ETP máxima, e o restante com ETP superior a 0.9. A ETP média foi de 0.988874 e para essa medida de eficiência, o desvio padrão foi o menor, 0.017618. Por fim, nota-se ainda que o primeiro quartil da ETP é de 0.986262, tal que 75% da amostra opera com ETP acima de 0.98.

Ainda com relação a Tabela 1, é possível obter algumas conclusões com respeito a distribuição espacial das medidas de eficiência. Na Figura 2 foram construídos gráficos do tipo radar para ET, ETP e EE, nos quais a borda de cada circunferência representa eficiência máxima. As UF's foram agrupadas em suas respectivas regiões a fim de possibilitar uma visão mais agregada dos resultados. Com respeito a ET e EE, nota-se que a disribuição espacial entre as regiões foi basicamente as mesmas para essa duas medidas. Os piores resultados foram obtidos pelas regiões Norte e Centro-Oeste do país e a região Sul teve o melhor resultado na amostra. A região Nordeste obteve o pior desempenho em termos de ETP, o que sugere que esta é a única região em que os problemas de escala não são preponderantes na determinação da ET. Ainda com respeito à ETP, observa-se que as regiões Sul e Sudeste obtiveram os melhores resultados na amostra, com todas as UF's componentes operando com eficiência máxima, tal que, nessas regiões as ineficiências se devem exclusivamente a problemas de escala.


Em suma, o que se pode concluir dessa análise preliminar é que, à excessão de alguns estados da região nordeste, as demais UF's apresentam deficiências quanto à escala de produção dos serviços de saúde. Dois argumentos podem ajudar a entender tal ocorrência.

O primeiro argumento baseia-se no congestionamento de produtos, uma ocorrência muito comum em serviços públicos. De um modo geral o congestionamento de produtos é caracterizado pela redução na quantidade de alguns produtos ainda que mediante a um incremento de insumos. Isso pode acarretar deficiências de escala na medida em que incrementos de insumos podem conduzir a incrementos menos do que proporcionais na produção global.

O segundo argumento é baseado no congestionamento do insumo gasto público. Isso significa que um aumento nos recursos pode conduzir à redução de ao menos um produto. Apesar de pouco razoável esse fenômeno não pode ser descartado no caso específico da saúde pública. A justificativa para tal possibilidade pode ser explicada através do conceito de flypaper effect utilizado na teoria das finanças públicas. Um aumento nos repasses à saúde pública pode levar a um aumento menos do que proporcional nos serviços prestados. Isso pode ser consequeência de uma série de fatores como piora na gestão da saúde na UF onde os recursos foram majorados ou sobrealocação de recursos com propósitos políticos, por exemplo.

A fim de obter uma análise mais detalhada sobre a relação entre as três medidas de eficiência, foram construídas distribuições de frequências acumuladas (função distribuição acumulada (fda) empírica) para ET, ETP e EE. Os resultados são mostrados na Figura 3.


Uma análise informal da Figura 3 sugere que existe uma ordenação estocástica entre as distribuições acumuladas de ET, ETP e EE. Como esperado, a distribuição de ETP domina estocasticamente em primeira ordem a distribuições de ET, isto é uma consequência da definição das medidas de eficiência já que ET = EE × ETP < ETP. a distribuição de ee parece dominar a distribuição de et, entretanto, um teste de kolmogorov-smirnov com a hipótese alternativa de que a distribuição de et é maior do que a distribuição de ee não rejeitou a hipótese nula de que as distribuições são idênticas com valor p de aproximadamente 0,7 e nível de significância de 0.05. o mesmo teste revela que a hipótese nula de distribuições idênticas é rejeitada no caso de ee e etp contra a hipótese alternativa de que a distribuição de ee é maior do que a distribuição de etp.15 15 O valor p neste caso é próximo de zero e o nível de significância também é de 0.05. Esses fatos revelam que as ineficiências estimadas se devem quase exclusivamente à ineficiências de escala, tal como sugerido nos parágrafos anteriores.

Dando sequência à apresentação dos resultados, a Tabela 2 mostra as projeções (em termos de aumento percentual) dos produtos observados sobre a fronteira estimada, para as DMU's ineficientes. A tabela também traz o conjunto de referências (ou peer group) para cada DMU bem como informa em que regime de retornos à escala cada unidade opera.

O método de seleção de variáveis apresentado na seção anterior, foi aplicado para determinar um subconjunto de produtos que melhor representasse os resultados do modelo completo. O método foi aplicado fixando-se as sete primeiras componetes principais da matriz de produtos, as quais responderam por aproximadamente 97% da variabilidade dos dados. Foram selecionados subconjuntos com 1 a 6 produtos com base no máximo CDGY. Os resultados do procedimentos são reportados na Tabela 3.

Na Tabela 3, a primeira coluna reporta a cardinalidade do subconjunto a ser selecionado. Para k < 12 variáveis existem um total de subconjuntos possíveis, dentre os quais é selecionado aquele que resulta no maior CDGY, fixadas as sete primeiras componentes principais da matriz de produtos. A segunda e a terceira colunas da Tabela 3 reportam, respectivamente, o subconjunto selecionado e o CDGY calculado. Note que o mesmo subconjunto com dois produtos é selecionado para as cardinalidades 2 e 3. Isso ocorre em função do poder explicativo que essas duas variáveis possuem na amostra, tal que, a adição de mais uma variável em nada contribuí para o aumento do CDGY.

Serão apresentados apenas os resultados do modelo com 5 produtos. Como será visto, esse modelo reduzido praticamente replica o modelo geral, de maneira que, com apenas 5 produtos em 12, é possível obter maior discricionaridade entre as DMU's sem, praticamente, perder informação. A Tabela 4 mostra os resultados de ET, ETP e EE para o modelo reduzido bem como algumas estatísticas de interesse.

Uma comparação entre os resultados nas Tabelas 1 e 4, mostra que as estatísticas descritivas são praticamente as mesmas. A diferença importante entre os dois modelos está no número de DMU's na fronteira. No modelo geral 7 DMU's tiveram ET e EE máxima contra 4 no modelo reduzido e com respeito a ETP, 14 DMU's definem a fronteira no modelo geral contra 11 no modelo reduzido. Assim, observa-se um ganho considerável no poder discricionário, quando utilizado o modelo reduzido. Resta saber se houve perda considerável de informação com a exclusão de 7 produtos.

Na Tabela 5, são reportados os resultados dos testes de Kolmogorov-Smirnov (KS) e de Mann-Witney16 16 Para detalhes sobre os testes utilizados nesse trabalho, consulte Gibbons e Chakraborti (2003). (MW) para os subconjuntos selecionados com cardinalidades de 1 a 6 produtos. Os testes foram aplicados para as três medidas de eficiência e em todos os casos foi admitido nível de significância de 0.05. Com a notação utilizada, ETr, ETPr e EEr, representam, respectivamente, as medidas de ET, ETP e EE no modelo reduzido.

Como pode ser observado, todos os testes aceitam a hipótese nula para os subconjuntos selecionados com 4 ou mais produtos. No caso do teste KS isso significa que não há evidências de que as distribuições de probabilidade das medidas de eficiência nos modelos geral e reduzido, sejam significativamente (do ponto de vista estatístico) distintas. No caso do modelo com 5 produtos, nota-se que a aceitação da hipótese nula se dá com um valor p acima de 0.9 para ET e EE e de aproxidamente 0.28 para ETP. Esses fatos sugerem que a igualdade entre as distribuições nos dois modelos é altamente provável.17 17 Embora o valor p não seja universalmente aceito como medida de suporte a hipótese nula, alguns autores como DeGroot (1973) e Casella e Berger (1987), mostram que o valor p pode ser considerado como a probabilidade posterior do ponto de nulidade do teste. O que se conclui da análise é que, a perda de informação com o uso do modelo reduzido com 5 produtos, inexiste do ponto de vista estatístico, no sentido de que, a probabilidade de uma dada realização num ou noutro modelo é praticamente a mesma.

Embora o teste KS possa ser considerado suficiente para verificar perda de informação (ou não) com o uso do modelo reduzido, as estimativas de eficiência nos dois modelos também foram submetidas ao teste MW. O propósito é avaliar se houve ou não mudança significativa de ranqueamento entre os dois modelos.18 18 O teste MW é um dos vários testes não-paramétricos de localização. Existe várias maneiras de estabelecer a hipótese nula. As mais usuais são: (a) as medianas são iguais; (b) as distribuições dos ranks são iguais. No caso do modelo com 5 produtos, a hipótese nula é aceita para as três medidas de eficiência. Isso significa que, não existem evidências de que os dois modelos geram rols de eficiência significativamente diferentes. Novamente, a conclusão da análise é que não existe perda substancial de informação quando o modelo reduzido é utilizado.

Com o propósito de reforçar as conclusões obtidas com os resultados na Tabela 5, a Figura 4 mostra as densidades estimadas19 19 O procedimento para estimação das densidades utilizou o kernel Gaussiano com a escolha da amplitude através da minimização do erro quadrado integrado médio. Para mais detalhes consulte Silverman (1986). para MG0 e MR0 com 5 produtos. A parte (a) da figura traz as densidades estimadas para ET e ETr. Como pode ser observado, as densidades são praticamente idênticas, com uma ligeira redução da assimetria negativa no caso do modelo reduzido, o que reforça o argumento a favor do maior poder discricionário do modelo com 5 produtos. Na parte (b), chega-se às mesmas conclusões com respeito as densidades de EE e EEr. Por fim na parte (c) da Figura 4, são comparadas as densidades de ETP e ETPr. Nota-se neste caso uma distinção maior entre as densidades, especificamente, há uma redução mais acentuada na assimetria no caso do modelo reduzido.


5.1. Impacto dos Insumos Não Discricionários

Nessa seção são reportados e analisados os resultados sobre o impacto dos insumos não discrocionários sobre as estimativas de ET, ETP e EE. As variáveis utilizadas correspondem àquelas descritas no Quadro 2. Utilizando a técnica de selação de variáveis apresentada na Seção 4, o conjunto original foi reduzido a um subconjunto com 6 variáveis, que retornou um GDCY de 0.9.

A Tabela 6, reporta o impacto de cada variável do subconjunto com 6 insumos discricionários (modelo MR2) sobre os resultados do modelo MR0. As estatísticas descritivas indicam que a ETP é sempre maior, em média, do que a ET e EE. Os desvios padrões também são menores em ETP do que em ET e EE, indicando uma maior homegeneidade dos resultados, sendo confirmado com os valores de mínimo, máximo e os quartis. Complementarmente, o percentual de DMU's eficientes indica muitas DMU's sobre a fronteira para ETP e menores percentuais para ET e EE. Esses fatos sugerem que a hipótese de que os problemas de ineficiência se devem em grande parte à problemas de escala, é robusta relativamente à condições demográficas e socio-econômicas.

Olhando estado a estado, os estados do Pará, Maranhão, Piauí, Minas Gerais e Goiás apresentaram eficiências invariantes com a adição dos insumos não discricionários. Vale a pena observar casos isolados e o efeito de cada variável na sua eficiência. Roraima, por exemplo passa de uma eficiência técnica de 0,47 para 1 com a adição de z1 (população) ou para 0,97 com a adição de z5 (Grau de Urbanização). Acre, por seu turno, varia sua ET de 0,5 no modelo original para 1 com adição de z1 ou de z5.

A adição de insumos não discricionários impactou aumentando o número de estados eficientes em todas as medidas de eficiência da seguinte forma: a variável z4 (Razão dos Sexos) acresce ET e EE por estado, elevando o número de quantidades de unidades eficientes em 2,5 vezes, mas com impacto de apenas 1,18 na ETP; z1 aumenta significativamente ET e EE em 3,5 vezes e ETP em 1,91 vezes; as variáveis z9 (% da população com mais de 1 e menos de 3 anos de estudo) e z11 (% da população com renda per capita inferior a 1/2 salário) não impactam significativamente em ET e EE (aumentando em 2,25 e 1,75 vezes, respectivamente) e em ETP igualmente em 1,27 vezes; z2 tem efeito semelhante a z4, mas com menor redução das diferenças entre os estados.

A Tabela 7, traz os resultados dos testes de MW e KS para as três medidas de eficiência. Nos teste são confrontados os resultados de MR0 e MR2, neste último os resultados são analisados individualmente, ou seja, para cada insumo não discricionário. Em ambos os testes, aceita-se a hipótese nula quando confrontados os modelos MR0 e MR2 com z11, donde se pode inferir que maiores níveis de educação não necessariamente conduzem a uma maior procura por serviços de saúde.20 20 Existem uma variedade de possíveis explicações para este fato. Pode-se conjecturar, por exemplo, que pessoas mais educadas são mais precavidas quanto a saúde, alimentando-se melhor, sendo mais cuidadosas quanto a exposição a fatores de risco, etc. Por outro lado, a hipótese nula é rejeitada, para as três medidas de eficiência, quando MR2 é estimado com a variável z1. Vale lembrar que, no teste KS tem-se a comparação entre as distribuições das eficiências sem e com a adição do insumo não discricionário, já para o teste de MW, tem-se o teste de ranking indicando a manutenção na ordem das eficiências.

A Figura 5 apresenta as densidades estimadas para os resultados de MR0 e MR2, apenas com os insumos não discricionários z1 e z11 da Tabela 7 , os quais correspondem as variáveis de maior e menor impacto, respectivamente. Os resultados indicam que as distribuições de ET, ETP e EE com a adição das variáveis z1 e z11, aumentam a assimetria negativa relativamente ao modelo MR0, tal que, de fato ambas promovem um ambiente mais favorável. Entretanto, essa assimetria é muito mais evidente no caso da variável z1 o que sugere que população tem um impacto muito mais efetivo do que escolaridade acima de 7 anos. O que se conclui da análise é que, as variáveis que representam características demográficas da UF importam mais no favorecimento aos serviços de saúde pública do que as variáveis socio-econômicas.


6. CONCLUSÕES

Neste trabalho foram estimadas as eficiências técnicas da saúde pública no Brasil utilizando dados de 2006. As DMU's consideradas no trabalho foram as Unidades da Federação, vistas como provedoras dos serviços de saúde pública no país. Os modelos DEA-CCR e DEA-BCC foram utilizados para este objetivo. Foram incorporadas duas extensões ao modelo básico com o propósito de melhorar tanto as estimativas quanto as interpretações das eficiências técnicas.

A primeira extensão foi a utilização de um método de seleção de variáveis baseada no trabalho de Cadima e Jollife (2001) que corresponde a selecionar um subconjunto de variáveis (produtos discricionários e insumos não discricionários) com o propósito de melhorar o poder discriminatório dos modelos. Com a aplicação do método, o modelo reduzido com menos de 50% dos produtos originais aumentou o poder discriminatório dos modelos sem perda siginificante de informação. Esses fatos foram constatados notando-se que houve uma redução de aproximadamente 43% no número de DMU's com ET e EE máximas e de 21% quanto a ETP, quando comparandos os modelos geral com 12 produtos e reduzido com apenas 5. Com relação à perda informacional, os testes de Kolmogorov-Smirnov e de Mann-Witiney mostraram que o modelos geral e reduzido são indistinguíveis com relação às distribuições de probabilidade e de ranqueamento.

Os fatos acima sugerem que os indicadores de saúde que efetivamente promovem melhorias da eficiência técnica são: esperança de vida para ambos os sexos, número de leitos por mil habitantes, cobertura da vacina tetravalente (preventiva contra difiteria, coqueluche, tétano e meningite), cobertura da vacina BCG (preventiva contra tuberculose) e cobertura de esgotamento sanitário.

A outra extensão dos modelos básicos foi a inclusão de insumos não discricionários com o propósito de identificar como características demográficas e sócio-econômicas podem impactar os resultados de eficiência. A metodologia utilizada para tanto baseia-se no trabalho de Ruggiero (1994) em que o modelo proposto satisfaz a importante propriedade de "efeito ambiental". O método de seleção de variáveis também foi aplicado para o conjunto de insumos não discricionários previamente selecionados. Do subconjunto selecionado com 6 das 12 variáveis originais, o tamanho da população foi a única variável para a qual os resultados de eficiência sofreram alteração significativa. Novamente os teste de Kolmogorov-Simmirnov e de Mann-Witiney foram utilizados para dar suporte a essa conclusão. Como foi observado, na comparação dos modelos reduzidos com e sem a variável população, a hipótese nula é rejeitada para as três medidas de eficiência nos teste ora citados. Isso siginifica que com a inclusão da variável população as distribuições das medidas de eficiências de seus ranqueamentos sofrem mudanças significativas. De fato, comparando-se as densidades estimadas para ambos os modelos, nota-se que com a inclusão da variável população ocorre um aumento da assimetria negativa da distribuição sugerindo maior densidade de probabilidade em torno da eficiência máxima. Noutros termos, a variável população promove, efetivamente, um ambiente mais favorável à eficiência na oferta de saúde pública.

Do ponto de vista normativo, o que se pode concluir desse trabalho, é que gestores da saúde pública, com o propósito único de melhorar a eficiência técnica do sistema,21 21 Note que eficiência técnica como definida nesse trabalho, não tem relação com questões assistenciais. Noutros termos, os resultados aqui de forma alguma devem servir como único suporte às decisões alocativas no setor. Outras questões como a universalização do atendimento, devem estar presentes nas tomadas de decisão. devem priorizar regiões com as seguintes características:

a) baixa população;

b) baixa esperança de vida;

c) baixo número de leitos (por mil habitantes);

d) baixa cobertura da vacina tetravalente;

e) baixa cobertura da vacina BCG;

f) baixa cobertura de esgotamento sanitário.

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  • 1
    Vide o sítio
    www2.datasus.gov.br. Os serviços considerados foram os procedimentos hospitalares (que incluí internações) e serviços ambulatoriais.
  • 2
    No trabalho de Bloom et al (2004), os autores utilizam dados da Penn World Table e constatam que saúde é estatisticamente siginificante para o crescimento econômico. Especificamente, os autores estimam que o aumento de um ano na expectativa de vida da população aumenta o produto em 4%.
  • 3
    A mesma fonte revela que em 2007, o Brasil alocou 8,8% do PIB em saúde tendo o estado sido resposável por 41,6% desse volume.
  • 4
    Vide Lei nº 8.080 de 19 de Setembro de 1990, itens XI, XII e XIII.
  • 5
    Os trabalhos de Calvo (2004), Marinho (2002) e Trompieri-Neto et alii (2009) são excelentes referências sobre a aplicação do modelo DEA para a determinação da eficiência técnica em serviços de saúde.
  • 6
    Em Marinho et alii (2009), os autores utilizam esse tipo de variável para avaliação de eficiência do gasto em saúde. Mas, o enfoque é diferente. Especificamente, Marinho et alii (2009) avaliam a eficiência técnica do gasto com saúde em geral (não apenas o gasto público) e comparam a performance do Brasil em relação aos países da OCDE.
  • 7
    Dito de outra forma, os autores não oferecem respostas que sejam gerais. De fato, são "dicas" que deveriam ser implementadas de acordo com uma orientação mais empírica do que analítica.
  • 8
    Dyson et alii (2001) oferecem um exemplo que esclarece esse ponto.
  • 9
    Em Pastor (1996) o autor mostra que o modelo BCC orientado pelo produto (insumo) é invariante à tranlação em insumos (produtos).
  • 10
    Essa seção é baseada em Jollife (1986) e Cadima e Jollife (2001).
  • 11
    Insumos não discricionários são discutidos na seção seguinte.
  • 12
    A terminologia utilizada para esse tipo de variável não é padrão. Banker e Morey (1986) usam o termo "variáveis exógenamente fixadas" e Cooper et alii (2006) referem-se a esse tipo de variável como "não-discricionária". Neste trabalho é utilizado o termo "insumos não-discricionários" para o conjunto de fatores que influenciam o processo produtivo mas não podem ser controlados, especificamente, fatores geográficos, sociais e econômicos da UF sob análise.
  • 13
    Ruggiero (1994) oferece outros exemplos interessantes.
  • 14
    São apresentados apenas os modelos com orientação pelo produto.
  • 15
    O valor p neste caso é próximo de zero e o nível de significância também é de 0.05.
  • 16
    Para detalhes sobre os testes utilizados nesse trabalho, consulte Gibbons e Chakraborti (2003).
  • 17
    Embora o valor p não seja universalmente aceito como medida de suporte a hipótese nula, alguns autores como DeGroot (1973) e Casella e Berger (1987), mostram que o valor p pode ser considerado como a probabilidade posterior do ponto de nulidade do teste.
  • 18
    O teste MW é um dos vários testes não-paramétricos de localização. Existe várias maneiras de estabelecer a hipótese nula. As mais usuais são: (a) as medianas são iguais; (b) as distribuições dos ranks são iguais.
  • 19
    O procedimento para estimação das densidades utilizou o kernel Gaussiano com a escolha da amplitude através da minimização do erro quadrado integrado médio. Para mais detalhes consulte Silverman (1986).
  • 20
    Existem uma variedade de possíveis explicações para este fato. Pode-se conjecturar, por exemplo, que pessoas mais educadas são mais precavidas quanto a saúde, alimentando-se melhor, sendo mais cuidadosas quanto a exposição a fatores de risco, etc.
  • 21
    Note que eficiência técnica como definida nesse trabalho, não tem relação com questões assistenciais. Noutros termos, os resultados aqui de forma alguma devem servir como único suporte às decisões alocativas no setor. Outras questões como a universalização do atendimento, devem estar presentes nas tomadas de decisão.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jul 2014
    • Data do Fascículo
      Jun 2014
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