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Efeitos das Intervenções Cambiais Sobre a Taxa de Câmbio Futura no Brasil* * Os autores agradecem aos comentários e sugestões do editor e do parecerista anônimo que ajudaram a melhorar a presente versão do trabalho. As opiniões expressas neste trabalho são exclusivamente dos autores e não refletem, necessariamente, a visão do Banco Central do Brasil.

Resumos

Este artigo estima os efeitos das intervenções cambiais do Banco Central do Brasil sobre o retorno e volatilidade da taxa de câmbio futura BRL/USD usando dados intradiários de outubro de 2011 a março de 2015. Os resultados mostram que as intervenções não antecipadas pelo mercado impactam de modo persistente o nível da taxa de câmbio e os efeitos variam com o tamanho das intervenções. Volumes negociados mais elevados impactam a taxa de câmbio mais fortemente que intervenções menores. Por fim, não encontramos evidências de que as intervenções cambiais reduzem de maneira significativa a volatilidade cambial no curto prazo.

Palavras-chave:
Intervenções Cambiais; Taxa de Câmbio Futura; Volatilidade


This paper estimates the effects of Brazilian Central Bank (BCB) interventions on the return and volatility of the BRL/USD future exchange rate using intraday data from October 2011 to March 2015. The results show that interventions not anticipated by the market affect the level of exchange rate persistently and the effects vary with the size of the intervention. Higher volumes affect the exchange rate more strongly than minor interventions. Finally, we didn't find evidence that foreign exchange interventions reduce significantly the exchange rate volatility in the short run.


1. INTRODUÇÃO

Nos últimos anos o Banco Central do Brasil (BCB) tem feito intervenções frequentes no mercado de câmbio, realizando compra e venda de dólares à vista e a termo, e de derivativos vinculados à moeda americana (swaps cambiais). A atuação dos bancos centrais nos mercados de câmbio é uma prática comum ao redor do mundo e, por isso, os efeitos de suas intervenções têm sido largamente discutidos na literatura, principalmente em estudos voltados para países desenvolvidos.1 1 Para uma análise abrangente da literatura sobre os efeitos das intervenções cambiais, ver Sarno & Taylor (2001) e Neely (2005).

Os artigos voltados para países emergentes, e para o Brasil em particular, são bem mais escassos, principalmente quando utilizada frequência intradiária da variação da taxa de câmbio. Como os países desenvolvidos não são mais os maiores detentores de reservas internacionais e praticamente não têm realizado intervenções cambiais, o estudo de seus efeitos passa a ser uma questão que se refere principal mente aos mercados emergentes, onde as intervenções ocorrem regularmente, como aponta Menkhoff (2012)Menkhoff, L. (2012, April). Foreign exchange intervention in emerging markets: A survey of empirical studies (Diskussionspapiere Nº 498). Wirtschaftswissenschaftliche Fakultät der Leibniz Universität Hannover. Disponível em: http://diskussionspapiere.wiwi.uni-hannover.de/index.php?number=498
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. Desta forma, são necessários mais estudos sobre intervenções cambiais em países emergentes que busquem analisar questões como: as intervenções cambiais dos bancos centrais afetam os retornos e a volatilidade da taxa de câmbio? Em caso positivo, esses efeitos são persistentes ou temporários? O tamanho das intervenções cambiais é importante ou a sinalização dada pelas intervenções já é suficiente? As intervenções não esperadas pelo mercado são mais eficazes para afetar o comportamento do nível e da volatilidade da taxa de câmbio? O mercado consegue se antecipar às intervenções cambiais não anunciadas?

Neste trabalho, tentaremos responder a essas perguntas avaliando os efeitos imediatos e diários das intervenções do BCB sobre o retorno e a volatilidade da taxa de câmbio BRL/USD. Adicionalmente, testaremos se intervenções com volumes mais elevados impactam a taxa de câmbio mais fortemente que intervenções menores. E por fim, analisaremos se intervenções não esperadas pelo mercado afetam mais o mercado de câmbio que intervenções anunciadas.

Para isso, utilizaremos uma metodologia de estudo de eventos com uma base de dados intradiária construída com intervalos regulares de 5 minutos para a taxa de câmbio futura BRL/USD negociado na BM&FBovespa e para as intervenções cambiais. Optamos pelo uso da cotação do dólar futuro ao invés da taxa de câmbio à vista pela maior liquidez e disponibilidade dos dados no site da BM&FBovespa. Analisaremos as intervenções realizadas pelo BCB no mercado à vista e através de leilões de swaps cambiais no período amostral de 3 de outubro de 2011 e 31 de março de 2015.

Para tentar isolar o máximo possível os efeitos causados pelas intervenções cambiais sobre a taxa de câmbio futura, incorporamos na análise os efeitos intradiários das surpresas oriundas da divulgação de indicadores macroeconômicos brasileiros e dos Estados Unidos (EUA).

Alguns dos principais resultados encontrados foram:

  1. As intervenções do BCB, quando feitas de maneira inesperada pelo mercado, impactam o nível da taxa de câmbio mais fortemente do que as intervenções antecipadas, e de modo persistente;

  2. Não há antecipação do mercado em relação às intervenções não anunciadas pelo BCB;

  3. As intervenções parecem ser uma resposta do BCB a um determinado movimento da taxa de câmbio (compras de dólar ocorrem após um período de apreciação do real e vendas de dólar ocorrem após um período de depreciação do real);

  4. O tamanho das intervenções importa, onde volumes negociados mais elevados impactam a taxa de câmbio mais fortemente que intervenções menores, porém de forma não linear; e

  5. Não há evidências concretas de que a atuação do BC contribui de maneira clara para a redução da volatilidade cambial no curto prazo.

Tais resultados estão em linha com os encontrados na literatura. Assim como o BCB, o Banco Nacional da Suíça (SNB, sigla em inglês) também disponibiliza para o público uma longa base de dados com algumas informações das intervenções, como data, horário, tamanho, entre outras. Por isso, existem diversos estudos sobre os impactos das intervenções do SNB sobre a taxa de câmbio CHF/USD. Payne & Vitale (2003)Payne, R., & Vitale, P. (2003). A transaction level study of the effects of central bank intervention on exchange rates. Journal of International Economics, 61(2), 331-352. doi: 10.1016/S0022-1996(03)00012-6
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testaram os efeitos imediatamente antes e depois das intervenções do SNB e ao compará-los com os efeitos dos negócios dos demais participantes do mercado chegaram à conclusão que a atuação do SNB tem um efeito persistente sobre a taxa de câmbio e quanto maior o tamanho da intervenção, maior o impacto. Já Pasquariello (2007)Pasquariello, P. (2007). Informative trading or just costly noise? An analysis of central bank interventions. Journal of Financial Markets, 10(2), 107-143. doi: 10.1016/j.finmar.2006.11.001
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analisou adicionalmente os efeitos das intervenções do SNB sobre outras medidas da taxa de câmbio CHF/USD e mostrou que houve um aumento da volatilidade cambial após as intervenções.

Apesar de muitos outros bancos centrais de países desenvolvidos não divulgarem informações precisas sobre as intervenções, existem estudos sobre os efeitos das intervenções cambiais em alguns desses países. Por exemplo, Dominguez (2003Dominguez, K. M. E. (2003). The market microstructure of central bank intervention. Journal of International Economics, 59(1), 25-45. doi: 10.1016/S0022-1996(02)00091-0
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, 2006)Dominguez, K. M. E. (2006). When do central bank interventions influence intra-daily and longer-term exchange rate movements? Journal of International Money and Finance, 25(7), 1051-1071. doi: 10.1016/j.jimonfin.2006.08.009
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verificou o impacto das intervenções dos bancos centrais dos países do G3 (EUA, Alemanha e Japão) sobre as taxas de câmbio DEM/USD e JPY/USD, utilizando reportagens da Reuters como uma aproximação para o horário das intervenções. Os resultados apontaram que as intervenções geram um aumento da volatilidade cambial no curto prazo e que há poucas evidências de que afetam a volatilidade no longo prazo.

A literatura empírica que estuda o caso brasileiro ainda é bastante escassa e não conclusiva. Usando dados diários para testar os efeitos das intervenções cambiais do BCB sobre a volatilidade cambial, Araujo (2004)Araujo, J. D. P. d. (2004). Suavizando movimentos na taxa de câmbio ou adicionando volatilidade? Um estudo empírico sobre intervenções do banco central no mercado de câmbio (dissertação de mestrado, PUC-Rio, Rio de Janeiro). Disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/biblioteca.php/trabalhos/show/967
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e Oliveira & Plaga (2011)Oliveira, F. N., & Plaga, A. R. (2011). Eficácia das intervenções do Banco Central do Brasil sobre a volatilidade da taxa de câmbio nominal. Revista Brasileira de Economia, 65(1), 71-92. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/1469
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mostram que as intervenções podem adicionar ou reduzir a volatilidade da taxa de câmbio dependendo da metodologia adotada e do período analisado. Já Novaes & Oliveira (2007)Novaes, W., & Oliveira, F. N. d. (2007, July). Interventions in the foreign exchange market: Effectiveness of derivatives and other instruments [research paper]. ResearchGate. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/5104904_Interventions_in_the_Foreign_Exchange_Market_Effectiveness_of_Derivatives_and_Other_Instruments
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e Meurer, Teixeira & Tomazzia (2010)Meurer, R., Teixeira, F. W. & Tomazzia, E. C. (2010). Effects of intervention in the spot currency market on the BRL/USD exchange rate from 1999 to 2008: An event study. Revista Brasileira de Finanças, 8(2), 229-254. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbfin/article/view/1496
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mostram que as intervenções cambiais são capazes de afetar a dinâmica da taxa de câmbio, porém essas possuem maior efetividade em períodos de baixa volatilidade cambial. Vervloet (2010)Vervloet, W. T. d. F. (2010). Efeitos de intervenções esterilizadas do Banco Central do Brasil sobre a taxa de câmbio (dissertação de mestrado, PUC-Rio, Rio de Janeiro). Disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/biblioteca.php/trabalhos/show/1009
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, por sua vez, mostra que os efeitos das intervenções cambiais esterilizadas sobre a taxa de câmbio são de magnitude muito reduzida e de curta duração. Já Borges & Rossi (2010)Borges, R. d. R., & Rossi, J. L., Jr. (2010). Intervenções do Banco Central do Brasil (BCB) e previsibilidade da taxa de câmbio: Evidências a partir da utilização de regras de negociação baseadas em análise técnica. Pesquisa e Planejamento Econômico, 40(3), 349-366. Disponível em: http://ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe/article/view/1281
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analisaram se as intervenções do BCB no mercado cambial introduzem algum tipo de previsibilidade no comportamento da taxa de câmbio e concluíram que há indícios significativos de que o BCB tende a intervir no mercado contra uma tendência em curso da taxa de câmbio, gerando assim lucros para os agentes privados.

Mais recentemente, alguns estudos fizeram uso de dados intradiários para testar os efeitos das intervenções cambiais. Nakashima (2012)Nakashima, P. M. F. (2012). Análise empírica das intervenções cambiais do Banco Central do Brasil usando dados de alta frequência (dissertação de mestrado, PUC-Rio, Rio de Janeiro). Disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/biblioteca.php/trabalhos/show/1120
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mostrou a existência de retornos anormais no contrato de dólar futuro nos momentos próximos à realização dos leilões de câmbio pelo BCB. Já Kohlscheen & Andrade (2014)Kohlscheen, E., & Andrade, S. C. (2014). Official FX interventions through derivatives. Journal of International Money and Finance, 47, 202-216. doi: 10.1016/j.jimonfin.2014.05.023
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encontraram que os leilões de swaps cambiais realizados pelo BCB entre julho de 2011 e dezembro de 2012 afetaram o nível da taxa de câmbio à vista, embora não tenham alterado diretamente a oferta de moeda estrangeira no mercado. Nogueira (2014)Nogueira, L. R. (2014). As intervenções do Banco do Central do Brasil no mercado de câmbio e seus efeitos no nível intradiário da taxa de câmbio (dissertação de mestrado, EPGE/FGV, Rio de Janeiro). Disponível em: http://hdl.handle.net/10438/12051
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, por sua vez, encontrou que as intervenções do BCB impactaram a taxa de câmbio futura apenas quando realizadas de maneira inesperada.

Em outro estudo recente usando dados semanais, Chamon, Garcia & Souza (2015)Chamon, M., Garcia, M. & Souza, L. (2015, Fevereiro). Fx interventions in Brazil: A synthetic control approach (Texto para Discussão Nº 630). Rio de Janeiro: PUC-Rio. Disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/uploads/adm/trabalhos/files/td630.pdf
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estimaram os efeitos do anúncio do programa de swaps cambiais de 22 de agosto de 2013 e de sua extensão em 19 de dezembro de 2013. A conclusão que chegaram foi que o anúncio inicial gerou uma apreciação cambial persistente nas primeiras semanas, contudo as vendas diárias que ocorreram no período restante não geraram impactos adicionais sobre a taxa de câmbio. Além disso, documentaram que ambos os programas não tiveram impacto significativo sobre a volatilidade cambial.

Como cada instrumento de intervenção utilizado pelo BCB pode ter uma finalidade específica e distinta dos demais, seus efeitos sobre o mercado de câmbio podem ser diferentes. Desta forma, optamos por fazer uma análise segmentada das intervenções cambiais realizadas pelo BCB nos mercados à vista e de swaps cambiais, com os swaps sendo analisados por tipos: leilões surpresas, programa de venda diária de contratos de swaps cambiais por meio de leilões de oferta pública e rolagens de posições existentes.

Pelo nosso conhecimento, este é o primeiro artigo a testar os efeitos intradiários e diários de cada tipo de intervenção cambial sobre o retorno e volatilidade da taxa de câmbio futura, analisando se o tamanho ou o fato da intervenção ter surpreendido o mercado importam.

Na seção 2, será explicado como a base de dados foi construída, os diferentes instrumentos de intervenções utilizados pelo Banco Central e quais surpresas de indicadores macroeconômicos serão consideradas no trabalho. A seção 3 está dividida em três partes, onde serão verificados inicialmente os impactos intradiários das intervenções, em seguida se o volume das intervenções importa e, por fim, os impactos diários. Em todas as etapas desta seção serão apresentadas a metodologia utilizada e os resultados encontrados. Na seção 4 serão apresentadas as conclusões do trabalho.

2. BASE DE DADOS

2.1. Dólar futuro BM&F

Para avaliar os efeitos intradiários das intervenções do BCB é necessária a construção de uma base de dados que contenha as cotações da taxa de câmbio BRL/USD em alta frequência. Optamos pela utilização da cotação do dólar futuro negociado na BM&F por ser um mercado que apresenta maior liquidez que as negociações com dólar à vista e também que a cotação da taxa de câmbio se forma primeiro no mercado futuro, sendo então transmitida por arbitragem para o mercado à vista (Ventura & Garcia, 2012Ventura, A., & Garcia, M. G. P. (2012). Mercados futuro e à vista de câmbio no Brasil: O rabo balança o cachorro. Revista Brasileira de Economia, 66(1), 21-48. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/1907
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).

A BM&F disponibiliza em seu site arquivos com todas as ofertas de compra (bid) e de venda (ask) com intervalos inferiores a um segundo desde outubro de 2011.2 2 ftp://ftp.bmf.com.br/MarketData/bmf/ Desta forma, o período amostral compreende variações do dólar futuro entre 3 de outubro de 2011 e 31 de março de 2015. O contrato de dólar futuro utilizado é aquele com vencimento no primeiro dia útil do mês seguinte ao mês corrente (o primeiro vencimento negociado), por ser o único com elevada liquidez.

Para lidar com o fato do intervalo entre cada cotação fornecida pela BM&F não ser uniforme, geramos novas séries para os bid's e asks's com intervalos de 5 minutos, sendo que a cotação do dólar futuro nessas novas séries é a média das cotações do minuto anterior ao horário de referência. Por exemplo, o preço referente ao horário de 09:05 é a média de todas as cotações entre 09:04 e 09:05 da série original. Por fim, construímos as séries dos preços e retornos intradiários do dólar futuro que serão utilizadas no trabalho:

(1)

(2)

onde pt é o preço médio do dólar futuro para cada 5 minutos; Pt,bid é o preço médio dos bid's do dólar futuro para cada 5 minutos; Pt,ask é o preço médio dos ask's do dólar futuro para cada 5 minutos; rt é o retorno intradiário da taxa de câmbio; e Rd é o retorno diário da taxa de câmbio calculado pelo somatório de rt no dia d.

A Tabela 1 apresenta o resumo das estatísticas descritivas para a série de retorno (rt) e retorno ao quadrado (r2t) em intervalos regulares de 5 minutos e diário (Rd e R2d). As propriedades estatísticas desses dados já são bem conhecidas na literatura. A distribuição dos retornos da taxa de câmbio é quase que simetricamente centrada ao redor de zero e possui caudas gordas.

Tabela 1
Resumo das estatísticas descritivas da taxa de câmbio futura.

2.2. Intervenções cambiais

Ao longo do período analisado, o BCB realizou intervenções diretas no mercado de câmbio através dos seguintes instrumentos:

  1. Leilão de dólar no mercado à vista. Operação de compra ou venda de dólares em troca de reais. No período contemplado pela base de dados todas as intervenções deste tipo ocorreram entre fevereiro e abril de 2012, em um momento em que o BCB tentava conter um movimento de apreciação do real, inclusive com ajuda do Governo que adotou algumas medidas regulatórias como, por exemplo, a imposição de impostos sobre posição vendida de derivativos e sobre a entrada de capital estrangeiro no país para alguns tipos de aplicações.

  2. Leilão de dólar a termo. Operação equivalente ao leilão de dólar à vista, porém com liquidação em uma data futura definida pelo BCB. No período amostral foram apenas dois leilões de compra em fevereiro de 2012.

  3. Leilão de swap cambial (SCC ou SCS - ativos negociados na BM&F) Operação que consiste na troca da variação cambial do período de vigência do swap somado ao cupom cambial (taxa de juros em dólar no Brasil) acordado no início da operação pela taxa de juros doméstica.3 3 Até maio de 2013 o BCB utilizava nos leilões de swap cambial os contratos de SCC (Contrato de Swap Cambial com Ajuste Periódico) em que a taxa de juros doméstica utilizada para precificação do contrato é o CDI. Em maio de 2013 a BM&F criou os contratos de SCS (Contrato de Swap Cambial com Ajuste Periódico Baseado em Operações Compromissadas de Um Dia) em que a taxa de juros utilizada é a SELIC. Nesse tipo de operação não há troca de principal, apenas a liquidação em reais do resultado dos swaps. Esse tipo de intervenção foi o mais utilizado pelo BCB no período recente cujo objetivo principal era o de fornecer hedge cambial. Os leilões de swap cambial ocorreram em diversos momentos ao longo dos últimos anos. Tem como diferencial não impactarem diretamente as reservas cambiais já que não há troca financeira das moedas, apenas a liquidação, em reais, do resultado da operação. Até 22 de agosto de 2013, os anúncios de intervenção do BCB através deste instrumento costumavam surpreender o mercado. A partir deste dia, foi anunciado um programa de venda diária de dólares através de swaps cambiais que durou até 31 de março de 2015, após ter sido prorrogado algumas vezes. Por isso, as intervenções que ocorreram de forma inesperada, serão avaliadas de maneira segmentada às intervenções do programa, visando verificar o impacto do efeito surpresa. Além disso, também serão avaliadas separadamente as intervenções que são rolagens de posições já existentes. Ao realizar a rolagem, apesar de não haver uma compra/venda efetiva de dólares no momento da intervenção, o BCB neutraliza o impacto do vencimento dos swaps vigentes. Durante o período analisado, as operações de rolagem raramente ocorriam até o anúncio do programa, a partir do qual passaram a ocorrer quase que diariamente.

  4. Leilão de linha Consiste em um leilão de dólar no mercado à vista em conjunto com um leilão de dólar a termo na ponta inversa. Dessa forma, esse tipo de leilão não afeta a exposição cambial das instituições envolvidas. É utilizado pelo BCB principalmente em momentos de falta de liquidez no mercado de dólar à vista. Desde 2012, o BCB tem sempre realizado esse tipo de intervenção no final do ano, além de em alguns outros momentos, quando necessário.

A Tabela 2 mostra as estatísticas descritivas com informações sobre o número e volume das intervenções realizadas pelo BCB entre os dias 3 de outubro de 2011 e 31 de março de 2015. Valores positivos (negativos) representam compra (venda) de dólares. Nos leilões de linha uma compra (venda) de dólar significa uma compra (venda) de dólar à vista e venda (compra) de dólar a termo.

Tabela 2
Intervenções cambiais do Banco Central do Brasil.

Pode-se notar que, ao longo do período amostral, sempre que o BCB interveio no mercado à vista foi na ponta de compra de dólares. Para os leilões de linha, sempre interveio fornecendo dólares à vista para o mercado. Quando interveio através de leilões de swap cambial, na maioria das vezes, foi na ponta de venda de dólares. Desde que começou o programa de venda de dólares através de swaps cambiais até o fim do período analisado, o BCB não interveio nenhuma vez comprando dólares.

Entre outubro de 2011 e agosto de 2013, mês do início do programa, o número de intervenções de venda de dólares foi bem próximo ao de compra, porém com volume superior para as vendas. Além disso, nota-se que o volume das intervenções no mercado à vista foi bem inferior ao volume das intervenções surpresas de swap cambial, com os leilões de dólar à vista apresentando um maior desvio padrão em relação à média e mediana quando o tamanho das intervenções é considerado em módulo.

Neste trabalho vamos focar apenas as intervenções nos mercados à vista e de swaps cambiais. Os leilões de dólar a termo foram usados apenas duas vezes pelo BCB no período amostral e os leilões de linha não são intervenções direcionais e, portanto, assume-se que tenha pouco impacto sobre a taxa de câmbio. Coletamos a data e horário dos comunicados anunciando a realização dos leilões e o volume de cada um deles. Todas as informações são públicas e foram retiradas dos sistemas SISBCB, BC Correio e Selic RTM, utilizados pelo BCB para comunicação com os participantes do mercado.

2.3. Indicadores macroeconômicos

Indicadores macroeconômicos que refletem a situação da economia são periodicamente divulgados e, consequentemente, podem vir a impactar a taxa de câmbio. Com o intuito de isolar o máximo possível os efeitos das intervenções sobre a dinâmica do dólar futuro, adicionamos as surpresas na divulgação de alguns indicadores macroeconômicos do Brasil e dos EUA como variáveis de controle nas regressões.

As surpresas macroeconômicas são calculadas pela diferença entre o valor realizado da variável e a mediana das expectativas de mercado. Para que os coeficientes estimados possam ser comparados entre os indicadores, as surpresas foram padronizadas pelo desvio-padrão da amostra para cada série macroeconômica. Nos momentos em que não ocorre divulgação de dados, é atribuído o valor 0 para a variável macroeconômica macui,t.

Os indicadores controlados na análise empírica são: inflação (IPCA e CPI Core), Produção (PIB, Produção Industrial Mensal brasileira e GDP), meta da taxa Selic, taxa de desemprego (Pesquisa Mensal de Emprego no Brasil e U-3 nos EUA) e Nonfarm Payrolls, que é um dado de criação de empregos dos EUA de grande relevância para os participantes do mercado financeiro. Todos os indicadores são divulgados mensalmente, a exceção do PIB dos dois países, que são divulgados trimestralmente, e da meta da taxa Selic, que é divulgada pelo BC após as reuniões do COPOM em intervalo entre 1 e 2 meses. Como o Banco Central americano (FED) não alterou a taxa de juros durante o período analisado e em nenhum momento houve divergência na decisão do FED em relação às expectativas do mercado, a taxa de juros americana não será incorporada no trabalho, por não haver surpresa nesta variável.

Além das variáveis macroeconômicas citadas, também consideraremos no estudo o impacto da comunicação do FED e do BCB, através da divulgação dos statements e das minutas das reuniões do FED, assim como dos relatórios de inflação e atas divulgadas pelo COPOM.

Todas as informações (data e horário da divulgação, valor efetivo e mediana das expectativas dos participantes do mercado) referentes aos indicadores macroeconômicos e aos comunicados do FED e do BCB foram obtidas na Bloomberg.

3. EFEITOS DAS INTERVENÇÕES CAMBIAIS SOBRE A TAXA DE CÂMBIO FUTURA

Grande parte da discussão na literatura sobre as intervenções cambiais dos bancos centrais é se seus efeitos são permanentes ou transitórios e se os participantes do mercado se antecipam a atuação dos bancos centrais. Para tentar responder a essas perguntas, vamos analisar como a taxa de câmbio se comporta imediatamente antes e depois das intervenções para verificar se, de fato, o mercado se antecipa à atuação do BCB e se existe persistência dos movimentos após as mesmas. Para isso, será utilizada uma abordagem padrão de estudo de eventos, semelhante à adotada por Payne & Vitale (2003)Payne, R., & Vitale, P. (2003). A transaction level study of the effects of central bank intervention on exchange rates. Journal of International Economics, 61(2), 331-352. doi: 10.1016/S0022-1996(03)00012-6
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e Pasquariello (2007)Pasquariello, P. (2007). Informative trading or just costly noise? An analysis of central bank interventions. Journal of Financial Markets, 10(2), 107-143. doi: 10.1016/j.finmar.2006.11.001
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.

Apesar da metodologia de estudo de eventos ter a limitação da simultaneidade, ou seja, a possibilidade das intervenções e das taxas de câmbio serem definidas ao mesmo tempo, esse problema pode ser atenuado sob duas condições, de acordo com Neely (2005)Neely, C. J. (2005). An analysis of recent studies of the effect of foreign exchange intervention. Federal Reserve Bank of St. Louis Review, 87(6), 685-717. doi: https://research.stlouisfed.org/publications/review/2005/11/01/an-analysis-of-recent-studies-of-the-effect-of-foreign-exchange-intervention/
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: se o momento exato das intervenções for conhecido e se a frequência de decisão dos bancos centrais for menor que a frequência dos dados usados. Em outras palavras, usando um intervalo de 5 minutos, o banco central deve demorar pelo menos 5 minutos para reagir ao desenvolvimento do mercado e tomar a decisão de intervir. Como as autoridades monetárias tendem a basear suas decisões em objetivos de médio e longo prazo e não nos movimentos intradiários, a simultaneidade não parece ser um problema relevante em nosso estudo.

Como o retorno e a volatilidade do câmbio são calculados a partir da taxa do contrato futuro com vencimento no primeiro dia útil do mês seguinte, é plausível supor que o risco embutido nessa cotação seja maior no início do mês em comparação ao final. Além disso, o valor da taxa futura de câmbio é afetado por outros elementos além da taxa de câmbio à vista, como variações da taxa de juros futura e do cupom cambial, e quanto maior for o prazo até o vencimento, maior será o impacto dessas alterações sobre os retornos. É possível que a utilização de dados com alta frequência possa reduzir a influência desse efeito sobre os retornos.

A análise empírica será feita em três etapas. Primeiramente, será avaliado o impacto intradiário da sinalização de intervir, sem considerar os volumes das intervenções. Em um segundo momento, será feita uma análise similar à primeira, porém considerando os volumes. Por último, serão analisados os efeitos diários das intervenções.

3.1. Efeitos intradiários das intervenções cambiais na taxa de câmbio futura

Nesta primeira etapa do estudo serão avaliados os efeitos das intervenções cambiais sobre o retorno do dólar futuro (rt) e sobre o quadrado do retorno (r2t), com o objetivo de verificar o impacto intradiário da atuação do BCB sobre o nível e a volatilidade da taxa de câmbio, respectivamente. De modo a tentar isolar esses efeitos, foram incluídas no modelo variáveis para capturar o efeito de surpresas na divulgação de indicadores econômicos. Além disso, acrescentamos à equação a ser estimada uma variável dummy para indicar se a variável dependente é referente à abertura do dia. O motivo é que como não há negociações na BM&F entre os horários de 18:00 às 9:00 do dia útil seguinte, o retorno referente a abertura reflete um período maior de informações. Por fim, incluímos três lags da variável dependente e uma constante, que pode capturar uma eventual tendência. Todas as equações do trabalho foram estimadas por mínimos quadrados ordinários e as estimativas são baseadas em erro padrão robusto à heterocedasticidade e autocorrelação pelo método Newey-West (HAC).

A equação (3) a seguir descreve o modelo padrão a ser estimado. Os efeitos das intervenções são estimados no intervalo de 10 minutos antes delas ocorrerem até 25 minutos depois.4 4 Os resultados obtidos foram qualitativamente similares quando considerado um número maior de lags e leads nas regressões. Foram testados os impactos até uma hora antes e uma hora depois das intervenções, porém a maioria dos coeficientes não foi estatisticamente significante.

(3)

(4)

onde

Xt é o retorno ou quadrado do retorno da taxa de câmbio no instante t.

α é uma constante.

It+i é uma variável dummy que assume os valores −1 para intervenções de venda, 1 para intervenções de compra e 0 na ausência de intervenções, no instante t + i.

Mk,t+j é um vetor de surpresas macroeconômicas padronizadas k no instante t + j, medida pela equação (4).

Dk,t+j é o valor divulgado para o indicador macroeconômico k no instante t + j.

Ek,t+j é a expectativa do mercado para o valor do indicador macroeconômico k divulgado no instante t + j.

σk é o desvio padrão da série Dk,t+j − Ek,t+j.

At é uma variável dummy que assume os valores 1 ou −1, dependendo do sinal de rt, se o instante t é a abertura do dia.5 5 Quando a variável dependente for o quadrado do retorno (r2t), as variáveis It+i, Mk,t+j e At serão utilizadas em módulo.

εt é o resíduo da regressão no instante t.

A equação (3) pode ser interpretada da seguinte forma:

  1. se i > 0, o coeficiente βi é uma medida de antecipação, ou seja, mede o impacto da intervenção na variável Xt, i intervalos de 5 minutos antes que ela ocorra.

  2. se i = 0, o coeficiente βi é uma medida do impacto contemporâneo da intervenção na variável Xt.

  3. se i < 0, o coeficiente βi é uma medida de persistência, ou seja, mede o impacto da intervenção na variável Xt, i intervalos de 5 minutos depois que ela ocorra.

A Tabela 3 apresenta os coeficientes βi estimados da equação (3) para o retorno e o retorno ao quadrado da taxa de câmbio futura BRL/USD em termos percentuais. Apesar de vários coeficientes serem estatisticamente significantes, inclusive ao nível de 1%, a maioria deles possui valores pouco representativos. A exceção foram os coeficientes referentes aos 15 minutos posteriores aos anúncios surpresa de swap cambial cujos impactos foram mais relevantes.

Tabela 3
Efeitos intradiários das intervenções na taxa de câmbio futura.

O somatório dos coeficientes βi pode ser interpretado como o impacto acumulado das intervenções cambiais na variável Xt. A Figura 1 mostra o efeito acumulado sobre o retorno do dólar futuro 10 minutos antes até 25 minutos após cada tipo de intervenção cambial.

Figura 1
Efeitos acumulados intradiários das intervenções no retorno da Taxa de Câmbio Futura.

O pequeno impacto das intervenções através do programa de swap cambial e de sua rolagem sobre o retorno da taxa de câmbio - inferior a 0,10% - está alinhado com as expectativas. Como o BCB já havia comunicado anteriormente a realização destes leilões de swap cambial, não houve surpresas nestes leilões.

Nos casos de anúncios surpresas de leilões de swap cambial observou-se um impacto próximo a 0,5% sobre os retornos. Esse resultado era esperado, já que o BCB surpreendeu o mercado ao realizar estes leilões, e com tamanhos relevantes.

Já o pequeno efeito dos leilões no mercado à vista sobre o retorno da taxa de câmbio - inferior a 0,2% - é surpreendente quando comparado ao impacto dos leilões surpresas de swap cambial. Como esses dois tipos de intervenção ocorreram de maneira inesperada, esperava-se que ambos tivessem um impacto relevante sobre o mercado. Porém, o tamanho das intervenções é algo que pode justificar essa diferença. Enquanto o primeiro tipo teve um volume médio aproximado de 300 milhões de dólares, o segundo teve um volume em módulo médio de 1,4 bilhões de dólares. Ou seja, o volume das intervenções no mercado à vista pode não ter sido grande o suficiente para gerar grandes impactos na taxa de câmbio. Na próxima seção, testaremos se o tamanho das intervenções de fato importa.

Outro ponto que pode explicar o pequeno impacto dos leilões no mercado à vista quando comparado ao swap cambial é que, possivelmente, as intervenções no mercado de dólar à vista não surpreenderam o mercado. No período compreendido pela base de dados, todos os leilões de dólar à vista ocorreram no início de 2012 em um período curto de tempo, inferior a 3 meses, com intervalo entre cada intervenção inferior a 2 dias na média. Apesar de não ter havido nenhuma comunicação com antecedência do BCB de que realizaria os leilões, eles ocorreram em um momento em que o governo tentava evitar uma apreciação adicional do real. Naquela ocasião, o Ministério da Fazenda já havia anunciado impostos sobre posição vendida de derivativos e sobre a entrada de capital estrangeiro no país para alguns tipos de aplicações.

Uma das principais justificativas dadas pelos bancos centrais para intervir nos mercados é tentar reduzir a volatilidade da taxa de câmbio em momentos de estresse. Mas nem sempre os bancos centrais são explícitos quanto a seus objetivos e horizonte da política de intervenções. Com o intuito de avaliar os efeitos intradiários das intervenções cambiais do BCB sobre a volatilidade, mostramos na Figura 2 o efeito acumulado das intervenções sobre o retorno ao quadrado da taxa de câmbio futura 10 minutos antes até 25 minutos após cada tipo de intervenção cambial.

Figura 2
Efeitos acumulados intradiários das intervenções no quadrado do retorno da Taxa de Câmbio Futura.

Para os leilões no mercado à vista houve uma pequena redução da volatilidade, quase nula, no momento das intervenções. Esse resultado também pode ser explicado pelo fato de que essas intervenções não tinham volumes relevantes e possivelmente eram esperadas pelo mercado. No caso das intervenções do programa e da rolagem de swaps cambiais, observaram-se variações pequenas ou sem significância da volatilidade cambial, resultado alinhado com as expectativas já que estas intervenções já eram esperadas pelo mercado. Já para as intervenções surpresas do BCB através de swaps cambiais nota-se um aumento significativo da volatilidade no período imediato após a intervenção cujos valores variam de 0,1 a 0,4% considerando um intervalo de confiança de 95%. Esse resultado de que as intervenções geram no curto prazo o efeito inverso ao desejado pelo BC também foi encontrado por Dominguez (2003)Dominguez, K. M. E. (2003). The market microstructure of central bank intervention. Journal of International Economics, 59(1), 25-45. doi: 10.1016/S0022-1996(02)00091-0
https://doi.org/10.1016/S0022-1996(02)00...
. Portanto, não encontramos evidências de que a atuação do BCB reduz a volatilidade da taxa de câmbio e acalma mercados disfuncionais no curto prazo, embora deva ser ressaltado que as intervenções do BCB através de swaps cambiais tiveram por objetivo fornecer hedge para o mercado e não especificamente reduzir a volatilidade da taxa de câmbio.

3.2. Efeitos Intradiários do Volume das Intervenções Cambiais na Taxa de Câmbio Futura

Nesta subseção analisaremos se o volume das intervenções tem impacto na taxa de câmbio ou se apenas a sinalização que o BCB passa para o mercado ao intervir já é suficiente para gerar alterações significativas na cotação do dólar futuro. Também será avaliado se o impacto do volume sobre o câmbio é linear ou não, ou seja, se as intervenções com volumes mais elevados impactam a taxa de câmbio mais fortemente que as intervenções menores. A nova equação a ser estimada está descrita a seguir. As únicas duas mudanças em relação ao modelo descrito na seção anterior são a substituição da variável indicadora de intervenção por uma variável que mede o volume da intervenção e a inclusão do quadrado do volume para testar a não linearidade dos efeitos sobre o câmbio:

(5)

onde:

Xt é o retorno ou quadrado do retorno da taxa de câmbio no instante t.

α é uma constante.

Vt+n é uma variável que mede o volume da intervenção em milhões de dólares no instante t + n. Possui o mesmo sinal que a intervenção e o seu valor é 0 se não houver intervenção no instante t + n.

|Vt+n|Vt+n é o quadrado do volume com sinal de positivo ou negativo, dependendo do sinal da intervenção. Este termo testa os efeitos não lineares do volume sobre o câmbio.

Mk,t+j é um vetor de surpresas macroeconômicas padronizadas k no instante t + j, medida pela equação (4).

At é uma variável dummy que assume os valores 1 ou −1, dependendo do sinal de rt, se o instante t é a abertura do dia.

εt é o resíduo da regressão no instante t.

A Tabela 4 apresenta os coeficientes θi e λi estimados da equação (5) para o retorno e o retorno ao quadrado percentual da taxa de câmbio futura. Nota-se que, no caso dos leilões de dólar no mercado à vista e dos swaps cambiais surpresas, uma intervenção com volume maior amplificou o impacto na taxa de retorno do dólar futuro. No entanto, o fato dos sinais dos coeficientes λi serem opostos aos sinais dos coeficientes θi indica que essa relação é não linear.

Tabela 4
Efeitos intradiários do volume das intervenções na taxa de câmbio futura.

A Figura 3 mostra o efeito acumulado do volume das intervenções cambiais sobre o retorno em até 25 minutos após a intervenção. Foram considerados os valores dos percentis 25%, 50% e 75% da distribuição do volume das intervenções em módulo. A exceção foi o programa de swaps cambiais cujos valores dos volumes descritos na figura foram os únicos três tamanhos das intervenções feitas.

Figura 3
Efeitos acumulados intradiários do volume das intervenções no retorno da taxa de câmbio futura.

Percebe-se que há um aumento relevante do impacto acumulado dos swaps cambiais surpresas ao compararmos as intervenções com volumes de USD 800 milhões e USD 1.350 milhões. Porém, quando aumentado ainda mais o tamanho, para USD 1.850 milhões, o impacto fica praticamente inalterado. Esse resultado corrobora a ideia de que a diferença encontrada anteriormente entre a relevância do impacto entre os leilões de dólar no mercado à vista e de swaps cambias surpresa pode ser explicada em parte pelo fato de o volume das intervenções no mercado à vista ter sido bem inferior ao volume das intervenções surpresas de swap cambial no período analisado.

Para os leilões do programa e da rolagem de swaps cambiais, o volume das intervenções teve muito pouca influência sobre o retorno da taxa de câmbio. Esse resultado era esperado, já que os resultados da subseção anterior mostraram um pequeno impacto desses tipos de intervenção.

Esses resultados sugerem que a autoridade monetária tem condições de afetar o retorno da taxa de câmbio e alterar o sentimento dos participantes com as intervenções. Porém, para isso é necessário realizar intervenções não esperadas com tamanhos significantes para convencer o mercado a seguir na mesma direção. No entanto, vale ser ressaltado que se não houver reservas internacionais grande o suficiente para lastrear as intervenções de venda de moeda estrangeira através de derivativos, estas podem não ter o efeito esperado, dado que o tamanho das reservas serve para dar credibilidade a essas intervenções. Por exemplo, se um banco central vendesse através de swaps cambiais uma quantidade de dólares maior que as reservas internacionais, os agentes poderiam pensar que o banco central não teria recursos suficientes para honrar seus compromissos no caso de uma desvalorização acentuada da moeda e com isso passariam a ficar desacreditados em relação à atuação do banco central. Segundo Volpon & Garcia (2014)Volpon, T., & Garcia, M. G. P. (2014, May). DNDFs: A more efficient way to intervene in FX markets? (Texto para Discussão Nº 621). Rio de Janeiro: PUC-Rio. Disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/biblioteca.php/trabalhos/show/1421
http://www.econ.puc-rio.br/biblioteca.ph...
, as intervenções através de swaps cambiais funcionam enquanto os participantes do mercado acreditarem que o risco de conversibilidade é desprezível, ou seja, enquanto acreditarem que podem trocar a posição de derivativos por dólar à vista.

Em relação ao impacto sobre a volatilidade, a Figura 4 mostra que o volume das intervenções a impactou mais fortemente apenas no caso dos leilões surpresas de swap cambial e de forma não linear. O resultado encontrado para as intervenções no mercado à vista ou através do programa ou rolagem de swaps cambiais corrobora a ideia de que estas eram esperadas pelo mercado ou que o tamanho delas não era grande o suficiente para gerar impactos relevantes.

Figura 4
Efeitos acumulados intradiários do volume das intervenções no quadrado do retorno da taxa de câmbio futura.

3.3. Efeitos diários das intervenções na taxa de câmbio futura

Nesta parte do estudo será avaliado o impacto das intervenções sobre o retorno e a volatilidade diária da taxa de câmbio futura. O objetivo é verificar o comportamento da taxa de câmbio um dia antes, no dia e um dia após as atuações do BCB.6 6 Testamos até 5 lags e 2 leads e os resultados obtidos das estimações do modelo foram qualitativamente similares e os coeficientes dos lags e leads adicionais incluídos não tiveram significância. A equação a ser estimada descrita a seguir é análoga à equação (3), exceto que as variáveis dependentes serão Rd e Rd2, que são os somatórios de rt e r2t no dia d. Também foram incluídas no modelo variáveis para capturar o efeito de surpresas na divulgação de indicadores econômicos no dia da intervenção e um lag da variável dependente:

(6)

onde:

Xd é o retorno ou o quadrado do retorno da taxa de câmbio no dia d.

α é uma constante.

Id+i é uma variável dummy que assume os valores −1 para intervenções de venda, 1 para intervenções de compra e 0 na ausência de intervenções, no dia d + i.

Mk,d é um vetor de surpresas macroeconômicas padronizadas k que ocorreram no dia d, medida pela diferença entre o valor realizado da variável e a mediana das expectativas de mercado, dividida pelo desvio-padrão da amostra.7 7 Quando a variável dependente for o quadrado do retorno (R2 d), as variáveis Id+i e Mk,d são utilizadas em módulo.

εd é o resíduo da regressão no dia d.

A Tabela 5 apresenta os coeficientes βi estimados da equação (6) para o retorno e o retorno ao quadrado percentual diário da taxa de câmbio futura. Os resultados mostram que apenas os efeitos das intervenções no mercado à vista de dólar e dos anúncios surpresa de swap cambial apresentam alguma persistência sobre o retorno da taxa de câmbio, sendo que o impacto significativo dos leilões no mercado à vista se deu apenas no dia seguinte à realização destes. Isso pode ter ocorrido pelo fato das intervenções deste tipo terem ocorrido em um pequeno intervalo de tempo, inclusive em dias subsequentes. Como utilizamos um lag e um lead, pode acontecer que o retorno diário da taxa de câmbio esteja sendo afetado simultaneamente pela intervenção do dia e do dia anterior.

Tabela 5
Efeitos diários das intervenções na taxa de câmbio futura

Já nos leilões de swap cambial surpresa, o coeficiente referente ao dia anterior possui um valor negativo estatisticamente significante ao nível de 1%, ou seja, não há evidências de que o mercado tenha se antecipado ao anúncio das intervenções, que parecem mais uma reação do BCB para tentar conter uma trajetória de valorização ou desvalorização cambial. Por exemplo, o real estava desvalorizando (valorizando) no dia anterior e para conter esse movimento o BC entra no mercado vendendo (comprando) dólares com o intuito de frear ou reverter o movimento anterior, ou seja, que o real se valorize (desvalorize).

Avaliando os coeficientes referentes ao quadrado do retorno, mais uma vez o impacto dos anúncios surpresa de swap cambial são os de maior relevância. Nos dias com intervenções deste tipo há um aumento da volatilidade, resultado em linha com o encontrado nas seções anteriores. Já para as intervenções no mercado à vista, nota-se uma redução da volatilidade no dia seguinte à realização dos leilões, resultado em linha com os objetivos de um banco central.

Em relação aos leilões do programa e de rolagem de swap cambial, faz mais sentido olhar apenas para os efeitos acumulados até o dia seguinte da intervenção ao invés de olhar para os coeficientes individuais. O motivo é que esses tipos de intervenção ocorreram de maneira diária a partir do anúncio do programa em 23 de agosto de 2013, de modo que a variável dummy de intervenção terá o valor igual a 1 após essa data e 0 antes disso. As figuras 5 e 6 mostram, respectivamente, que esses tipos de intervenção não impactaram significativamente o retorno acumulado, mas provocaram um pequeno aumento da volatilidade dos retornos no acumulado até o dia seguinte da intervenção.

Figura 5
Impacto acumulado diário das intervenções no retorno da taxa de câmbio futura.

Figura 6
Acumulado das intervenções no quadrado do retorno diário da taxa de câmbio futura.

Os resultados acumulados para as intervenções no mercado à vista e através dos leilões de swap cambial surpresa se mantiveram em linha com os observados na Tabela 5. O impacto significativo dos leilões no mercado à vista sobre o retorno e a volatilidade se deu apenas no dia seguinte à realização destes e as atuações do BCB de forma não anunciada através de leilões de swaps cambiais conseguiram reduzir o movimento de valorização ou desvalorização cambial do dia anterior, mas provocaram um aumento persistente da volatilidade cambial.

4. CONCLUSÃO

Este trabalho apresentou uma análise sobre os impactos das intervenções do BCB sobre o nível e a volatilidade dos retornos da taxa de câmbio BRL/USD usando dados intradiários. O objetivo foi verificar se a sinalização passada pelo BCB ao intervir e o tamanho das intervenções afetam a dinâmica do mercado de câmbio. Para isso também se levou em consideração o impacto da surpresa na divulgação de indicadores macroeconômicos.

Os resultados encontrados sobre os efeitos das intervenções cambiais do BCB sobre a dinâmica da taxa de câmbio podem ser resumidos em:

  1. As intervenções, quando feitas de maneira inesperada pelo mercado, impactam o nível da taxa de câmbio mais fortemente do que as intervenções antecipadas, e de maneira persistente;

  2. Não há evidências de antecipação do mercado em relação às intervenções não anunciadas;

  3. As intervenções parecem ser uma resposta do BCB a um determinado movimento da taxa de câmbio (compras de dólar ocorrem após um período de apreciação do real e vendas de dólar ocorrem após um período de depreciação do real);

  4. Não há evidência de que a atuação do BCB reduz a volatilidade cambial no curto prazo; e

  5. O tamanho das intervenções afeta a amplitude dos impactos, porém essa relação não é linear.

Baseado nestes resultados, podemos concluir que o BCB tem capacidade de afetar as condições do mercado e o sentimento dos participantes quando as intervenções são realizadas surpreendendo o mercado e com tamanho adequado, ou seja, intervenções muito grandes ou muito pequenas podem não ter o efeito esperado.

Um tema relevante a ser abordado em trabalhos futuros é analisar se as condições do mercado no momento das intervenções cambiais do BCB influenciam a eficácia destas operações, ou seja, se intervenções que ocorrem em horários de elevado volume de negócios tendem a impactar mais o mercado de câmbio.

  • *
    Os autores agradecem aos comentários e sugestões do editor e do parecerista anônimo que ajudaram a melhorar a presente versão do trabalho. As opiniões expressas neste trabalho são exclusivamente dos autores e não refletem, necessariamente, a visão do Banco Central do Brasil.
  • 1
    Para uma análise abrangente da literatura sobre os efeitos das intervenções cambiais, ver Sarno & Taylor (2001)Sarno, L., & Taylor, M. P. (2001). Official intervention in the foreign exchange market: Is it effective and, if so, how does it work? Journal of Economic Literature, 39(3), 839-868. doi: 10.1257/jel.39.3.83
    https://doi.org/10.1257/jel.39.3.83...
    e Neely (2005)Neely, C. J. (2005). An analysis of recent studies of the effect of foreign exchange intervention. Federal Reserve Bank of St. Louis Review, 87(6), 685-717. doi: https://research.stlouisfed.org/publications/review/2005/11/01/an-analysis-of-recent-studies-of-the-effect-of-foreign-exchange-intervention/
    https://research.stlouisfed.org/publicat...
    .
  • 2
  • 3
    Até maio de 2013 o BCB utilizava nos leilões de swap cambial os contratos de SCC (Contrato de Swap Cambial com Ajuste Periódico) em que a taxa de juros doméstica utilizada para precificação do contrato é o CDI. Em maio de 2013 a BM&F criou os contratos de SCS (Contrato de Swap Cambial com Ajuste Periódico Baseado em Operações Compromissadas de Um Dia) em que a taxa de juros utilizada é a SELIC.
  • 4
    Os resultados obtidos foram qualitativamente similares quando considerado um número maior de lags e leads nas regressões. Foram testados os impactos até uma hora antes e uma hora depois das intervenções, porém a maioria dos coeficientes não foi estatisticamente significante.
  • 5
    Quando a variável dependente for o quadrado do retorno (r2t), as variáveis It+i, Mk,t+j e At serão utilizadas em módulo.
  • 6
    Testamos até 5 lags e 2 leads e os resultados obtidos das estimações do modelo foram qualitativamente similares e os coeficientes dos lags e leads adicionais incluídos não tiveram significância.
  • 7
    Quando a variável dependente for o quadrado do retorno (R2 d), as variáveis Id+i e Mk,d são utilizadas em módulo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016
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