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Além do PIB per capita: Ensaio sobre medidas de bem-estar para os estados brasileiros* * O presente trabalho foi realizado com apoio do CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Brasil.

Resumo

Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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propuseram um modelo para medir o bem-estar econômico, que suprisse as deficiências reconhecidas do PIB per capita, usando consumo, lazer e expectativa de vida. Esse método foi replicado para os estados brasileiros e os resultados demonstram que praticamente todas as regiões, em relação ao estado de São Paulo, possuem bem-estar inferior ao representado pela renda por habitante, devido, principalmente, a baixa expectativa de vida. Além disso, o indicador de bem-estar é altamente correlacionado com o PIB per capita e os resultados são robustos quanto a alteração nos parâmetros estruturais, consumo individual, tipo de renda e lazer.

Palavras-chave
Economia do bem-estar; crescimento econômico; consumo equivalente

Abstract

Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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proposed a model to measure economic welfare using data on consumption, leisure and life expectancy in order to meet the well known deficiencies in GDP per capita. This method was replicated for the Brazilian states and the results show that almost all regions have a lower welfare than that represented by per capita income in relation to São Paulo state, mainly due to the low life expectancy. Moreover, the welfare indicator is highly correlated with GDP per capita and the results are robust regarding changes in individual consumption, income measure and leisure.

1. Introduction

O Produto Interno Bruto (PIB) per capita é amplamente utilizado na literatura econômica como medida de bem-estar. Nordhaus e Tobin (1972)Nordhaus, W. D., & Tobin, J. (1972). Is growth obsolete? In Economic research: Retrospect and prospect, volume 5, economic growth (pp. 1-80). National Bureau of Economic Research (NBER). https://www.nber.org/chapters/c7620
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fizeram duras críticas a esta relação, enfatizando o papel do consumo como responsável, em última instância, pelo bem-estar. Desde então, observou-se crescimento nos estudos voltados para a construção de métricas mais adequadas para mensurar o bem-estar em uma espécie de agenda denominada de “projeto de correção do PIB”. Esse projeto gerou inúmeros tipos de indicadores que vão desde desdobramentos dos níveis de produção, que consideram aspectos como a sustentabilidade (Lawn, 2007Lawn, P. (2007). A stock-take of green national accounting initiatives. Social Indicators Research, 80(2), 427-460. http://www.jstor.org/stable/27734544
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), medidas de consumo e renda equivalente, em especial a disposição a pagar ou a receber por determinadas mudanças no ambiente econômico (Becker, Philipson, & Soares, 2005Becker, G. S., Philipson, T. J., & Soares, R. R. (2005). The quantity and quality of life and the evolution of world inequality. American Economic Review, 95(1), 277-291. http://dx.doi.org/10.1257/0002828053828563
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; Jones & Klenow, 2016Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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), medidas de bem-estar subjetivo em que se avaliam questões relativas a satisfação pessoal e a felicidade (Kahneman & Krueger, 2006Kahneman, D., & Krueger, A. B. (2006). Developments in the measurement of subjective well-being. The Journal of Economic Perspectives, 20(1), 3-24. http://www.jstor.org/stable/30033631
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), e até indicadores sintéticos que são agrupamentos de diferentes dimensões, cada uma com peso específico, cujo principal representante é Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Medidas de bem-estar são utilizadas para avaliar as condições econômicas das pessoas, políticas públicas e estabelecer metas que sejam socialmente desejáveis, tais como a redução da desigualdade, o aumento da expectativa de vida e da escolaridade, entre outros. Fleurbaey (2009)Fleurbaey, M. (2009). Beyond GDP: The quest for a measure of social welfare. Journal of Economic Literature, 47(4), 1029-1075. http://www.jstor.org/stable/40651532
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faz uma extensa revisão a respeito do tema, apontando as principais limitações, os pontos de complementariedade e de possíveis convergências entre as principais correntes teóricas que fundamentam os índices de bem-estar. É importante mencionar que o bem-estar sempre esteve presente na discussão econômica, mas ganhou notoriedade como um ramo da economia a partir do artigo seminal de Bergson (1938)Bergson, A. (1938). A reformulation of certain aspects of welfare economics. The Quarterly Journal of Economics, 52(2), 310-334. http://www.jstor.org/stable/1881737
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com a introdução da função de bem-estar social.

Apesar da existência desta função ter sido categoricamente rejeitada, no que ficou conhecido como Teorema da Impossibilidade de Arrow,1 1 Kenneth Arrow no livro Social Choice and Individual Values apud Rothenberg (1953). essa abordagem continua sendo estudada como fazem Pollak (1981)Pollak, R. A. (1981). The social cost of living index. Journal of Public Economics, 15(3), 311-336. http://dx.doi.org/https://doi.org/10.1016/0047-2727(81)90014-1
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e Zank (2007)Zank, H. (2007). Social welfare functions with a reference income. Social Choice and Welfare, 28(4), 609-636. http://www.jstor.org/stable/41106908
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. Uma alternativa à função de bem-estar social consiste na utilização de um indivíduo capaz de representar toda sociedade, esse indivíduo é denominado de agente representativo. Carroll (2000)Carroll, C. D. (2000). Requiem for the representative consumer? Aggregate implications of microeconomic consumption behavior. The American Economic Review, 90(2), 110-115. http://www.jstor.org/stable/117202
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afirma que essa abordagem, atualmente, desempenha papel importante na microfundamentação dos resultados macroeconômicos. De todo modo, o uso do agente representativo não está livre de críticas, uma vez que é difícil de entender a sua real natureza, isto é, “se ele representa um indivíduo médio ou qualquer outra coisa” (Hartley, 1996Hartley, J. E. (1996). Retrospectives: The origins of the representative agent. The Journal of Economic Perspectives, 10(2), 169-177. http://www.jstor.org/stable/2138488
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). Além disso, subjacente ao agente representativo, encontra-se a hipótese de homogeneidade das preferências. Atualmente, há um debate sobre formas de se lidar com esta limitação, objetivando a agregação de preferências heterogêneas (Kaplan & Violante, 2018Kaplan, G., & Violante, G. L. (2018). Microeconomic heterogeneity and macroeconomic shocks. The Journal of Economic Perspectives, 32(3), 167-194. https://www.jstor.org/stable/26473069
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).

Além das formas da mensuração, faz-se necessário compreender quais fatores constituem o bem-estar, isto é, quais aspectos econômicos que as pessoas atribuem valor e tem potencial de gerar bem-estar. O candidato natural é o consumo, como mencionado anteriormente. Entretanto, Sen (1976)Sen, A. (1976). Real national income. The Review of Economic Studies, 43(1), 19-39. http://www.jstor.org/stable/2296597
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defende que a desigualdade de renda tem um papel central nesse debate. Estudos atuais corroboram para a importância da desigualdade no bem estar como em Gruen e Klasen (2008)Gruen, C., & Klasen, S. (2008). Growth, inequality, and welfare: Comparisons across space and time. Oxford Economic Papers, 60(2), 212-236. http://www.jstor.org/stable/25167686
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. Outras pesquisas aprofundam a discussão sobre a desigualdade ao avaliar a distribuição da “renda estendida”, isto é, incorporam à renda monetária as atividades domésticas não ofertadas no mercado (“produção doméstica”)2 2 Os termos entre aspas referem-se à, respectivamente, extended income e home production. (Frazis & Stewart, 2011Frazis, H., & Stewart, J. (2011). How does household production affect measured income inequality? Journal of Population Economics, 24(1), 3-22. http://www.jstor.org/stable/41488714
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). Em particular, esse tipo de renda apresenta um quadro mais completo a respeito do nível de desigualdade, pois torna comparável a renda entre famílias mais pobres, que gastam parte do seu tempo com a produção doméstica, com a de famílias mais ricas, que contratam essas horas no mercado. Outros autores, como Becker et al. (2005)Becker, G. S., Philipson, T. J., & Soares, R. R. (2005). The quantity and quality of life and the evolution of world inequality. American Economic Review, 95(1), 277-291. http://dx.doi.org/10.1257/0002828053828563
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, incorporam à renda os ganhos do aumento da expectativa de vida. Já Krueger e Perri (2006)Krueger, D., & Perri, F. (2006). Does income inequality lead to consumption inequality? Evidence and theory. The Review of Economic Studies, 73(1), 163-193. http://www.jstor.org/stable/3700621
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e Attanasio e Pistaferri (2016)Attanasio, O. P., & Pistaferri, L. (2016). Consumption inequality. The Journal of Economic Perspectives, 30(2), 3-28. http://www.jstor.org/stable/43783705
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fazem uma distinção entre a desigualdade de renda e a desigualdade do consumo afirmando que não há, necessariamente, relação direta entre estes dois conceitos e que o impacto sobre o bem-estar também pode ocorrer de forma distinta.

Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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juntam todos esses aspectos em uma medida de consumo equivalente, utilizando a abordagem do agente representativo. O ponto de partida consiste em uma economia que já se encontra em estado estacionário (equilíbrio). Adicionalmente, os microdados representam toda a população, servindo para o cómputo do “ajustamento demográfico”.3 3 As variáveis ajustadas demograficamente estão formalmente definidas no Apêndice. Aspectos distributivos do consumo e do lazer afetam a utilidade na medida em que o agente tem preferência por suavização no fluxo destas variáveis ao longo da sua vida. Em outras palavras, o agente é avesso à mudanças bruscas no consumo e no lazer intertemporal. A renda utilizada é a soma da renda monetária e não monetária do domicílio. O lazer incorpora a definição de “produção doméstica”. Esse é o modelo usado para medir o nível de bem-estar entre os estados brasileiros.

No Brasil, as pesquisas sobre o bem-estar aparecem, normalmente, relacionadas ao nível e à distribuição de renda - assunto bastante explorado na literatura econômica. São exemplos, nessa linha de pesquisa, os trabalhos de Mendonça e Barros (1995)Mendonça, R. S. P. d., & Barros, R. P. d. (1995). A evolução do bem-estar e da desigualdade no Brasil desde 1960. Revista Brasileira de Economia, 49(2), 329-352. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/637
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, Marinho, Soares, e Benegas (2004)Marinho, E., Soares, F., & Benegas, M. (2004). Desigualdade de renda e eficiência técnica na geração de bem-estar entre os estados brasileiros. Revista Brasileira de Economia, 58(4), 583-608. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/889
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, Soares (2006)Soares, S. S. D. (2006). Análise de bem-estar e decomposição por fatores da queda na desigualdade entre 1995 e 2004. Revista Econômica, 19(1), 83-115. http://dx.doi.org/10.22409/economica.8i1.p159
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, Figueiredo e Ziegelmann (2009aFigueiredo, E. A. d., & Ziegelmann, F. A. (2009a). Mobilidade de renda e bem-estar econômico no Brasil. Revista Brasileira de Economia, 63(4), 183-194. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/1071
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, 2009b)Figueiredo, E. A. d., & Ziegelmann, F. A. (2009b). Mudança na distribuição de renda brasileira: Significância estatística e bem-estar econômico. Economia Aplicada, 13(2), 257-277. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-80502009000200004
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, Medeiros e Souza (2014)Medeiros, M., & Souza, P H. G. F (2014, janeiro). The state and income inequality in Brazil (Texto para Discussão No 1844a). Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=21241
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e Oliveira e Jacinto (2015)Oliveira, V R. d., & Jacinto, P d. A. (2015). Crescimento pró-pobre ou empobrecedor? Uma análise para os estados brasileiros, no período 1995-2011. Nova Economia, 25(1), 161-180. https://revistas.face.ufmg.br/index.php/novaeconomia/article/view/2028
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. Alguns autores ainda se valem de métodos computacionais para estimar o impacto de reformas e de políticas públicas na distribuição de renda e de bem-estar, como em Ferreira e Araújo (1999)Ferreira, P. C. G., & Araújo, C. H. V. (1999). Reforma tributária, efeitos alocativos e impactos de bem-estar. Revista Brasileira de Economia, 53(2), 133-166. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/753
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, Paes e Bugarin (2006)Paes, N. L., & Bugarin, M. N. S. (2006). Reforma tributária: Impactos distributivos, sobre o bem-estar e a progressividade. Revista Brasileira deEconomia, 60(1), 33-56. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/985
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e Ferreira e Pereira (2008)Ferreira, P. C. G., & Pereira, R. A. d. C. (2008). Efeitos de crescimento e bem-estar da lei de parceria público-privada no Brasil. Revista Brasileira de Economia, 62(2), 207-219. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/1027
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. Méndez e Waltenberg (2016)Méndez, Y. S., & Waltenberg, F. D. (2016). Aversão à desigualdade e preferências por redistribuição: A percepção de mobilidade econômica as afeta no Brasil? Estudos Econômicos, 46(1), 91-125. http://dx.doi.org/10.1590/0101-416146193ymf
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, por sua vez, apresentam algumas evidências de que existe aversão à desigualdade em todos os estratos sociais. Isto torna a abordagem do agente representativo mais próxima da realidade, pois os diferentes estratos sociais apresentam a preferência pela suavização do consumo e do lazer. Em estudo recente, Araujo e Martinez (2019)Araujo, A., & Martinez, T. S. (2019, dezembro). Productivity and welfare. In 41° Encontro da Sociedade Brasileira deEconometria (SBE), São Paulo, SP. utilizam um modelo de gerações sobrepostas para inferir ganho de bem-estar a partir de mudanças na longevidade e no nível de escolaridade. Esses autores desenvolveram uma medida de produtividade total dos fatores equivalente e os resultados indicam convergência de bem-estar das economias da América Latina com a economia americana.

Estudos sobre a relação do consumo e do bem-estar aparecem de forma menos frequente; ainda mais raro se considerado o nível do consumo e sua distribuição. Nessa linha encontra-se o trabalho de Carvalho e Siqueira (2013)Carvalho, D. B., & Siqueira, J. R. B. N., Rozane Bezerra de. (2013). Características distributivas e impacto de reformas tributárias sobre o bem-estar das famílias no Brasil. Revista Brasileira de Economia, 67(3), 263-282. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/6159
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, que utilizam uma medida de consumo equivalente para avaliar como mudanças tributárias, que incidem sobre os bens de consumo, podem afetar o bem-estar. Afastando-se da questão distributiva, mas dentro do escopo dos determinantes do bem-estar brasileiro, tem-se a pesquisa de Motta, Perobelli, e Domingues (2017)Motta, G. P d., Perobelli, F. S., & Domingues, E. P. (2017). Avaliação do padrão de consumo de bens e serviços de saúde: Uma abordagem de equilíbrio geral computável para a economia brasileira. Revista Brasileira de Economia, 71(4), 463-487. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/4061
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. Esses autores analisam como a expectativa de vida afeta o padrão de consumo das famílias, aumentando o consumo dos bens e serviços relacionados à saúde, e estimam a “disposição a receber” decorrente de eventuais mudanças nos preços desses itens. Contudo, esses autores não avaliam como o aumento da expectativa de vida, na prática, aumenta a demanda por todos os bens e serviços pelo simples aumento na quantidade de períodos em que o indivíduo pode consumir. Esse aumento do fluxo de consumo foi levantado por Becker et al. (2005)Becker, G. S., Philipson, T. J., & Soares, R. R. (2005). The quantity and quality of life and the evolution of world inequality. American Economic Review, 95(1), 277-291. http://dx.doi.org/10.1257/0002828053828563
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como justificativa do aumento do bem-estar associado a maior expectativa de vida.4 4 Aspecto levantado por Rosen (1988) via alterações no Valor Estatístico da Vida (VSL).

O Brasil apresenta algumas particularidades, em função do seu estágio de desenvolvimento econômico, que devem ser consideradas ao se analisar o bem-estar. A primeira delas é o impacto do trabalho infantil na composição da renda familiar. Esse assunto é explorado por Kassouf, Dorman, e Almeida (2005)Kassouf, A. L., Dorman, P., & Almeida, A. N. d. (2005). Costs and benefits of eliminating child labour in Brazil. Economia Aplicada, 9(3), 343-368. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-80502005000300001
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que analisam os ganhos econômicos da eliminação dessa modalidade de trabalho. Suliano e Jesus Filho (2017)Suliano, D. C., & Jesus Filho, J. (2017). Um estudo emprídico utilizando o índice de opoartunidade humana para o Brasil. Análise Econômica, 35(68), 149-171. http://dx.doi.org/10.22456/2176-5456.44300
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, por sua vez, propuseram um indicador sintético de bem-estar infantil que visa avaliar as oportunidades das crianças e adolescentes. Os efeitos do trabalho infantil sobre o nível de bem-estar, são abordados na seção que trata a questão da robustez do indicador onde são atribuídos somente horas de lazer às crianças e jovens entre 1 e 20 anos.5 5 Diferentemente de Jones e Klenow (2016), neste artigo considera-se as horas trabalhadas a partir dos 10 anos. A segunda particularidade da economia brasileira refere-se às transferências do governo para famílias, notadamente o Bolsa Família cujo programa se configura como um dos maiores do mundo e que se expandiu muito durante os anos de 2002 a 2008 (Loureiro & Holanda, 2013Loureiro, A. O. F., & Holanda, M. C. (2013). The impact on consumption of more cash in conditional cash transfer programs. Economia Aplicada, 17(4), 557-577. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-80502013000400002
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).

É possível encontrar estudos interessados na multidimensionalidade dos determinantes do bem-estar, como em Vidigal, Kassouf, e Vidigal (2017)Vidigal, C. B. R., Kassouf, A. L., & Vidigal, V. G. (2017). Índice de Bem-Estar Econômico: uma proposta para os estados brasileiros. Análise Econômica, 35(68), 199-229. http://dx.doi.org/10.22456/2176-5456.43547
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. Nesse artigo, os autores propõem um indicador sintético de bem-estar econômico que engloba as dimensões relacionadas ao “fluxo de consumo” (privado e público), “riqueza real” (capital humano, capital físico, pesquisa e desenvolvimento e déficit público), “equidade” (desigualdade e pobreza) e “seguridade econômica” (desemprego, riscos financeiros, de saúde e de violência). Entretanto, os indicadores sintéticos são alvos de críticas pela arbitrariedade dos pesos utilizados para cada componente e pela manipulação aritmética necessária para agrupar as diferentes dimensões do indicador, pois muitas variáveis são de natureza distintas, como no caso da expectativa de vida e da escolaridade (variáveis de estoque) e da renda (variável de fluxo), de maneira que esse agrupamento torna difícil a leitura e a compreensão dos resultados obtidos (Jannuzzi & Guimarães, 2004Jannuzzi, P d. M., & Guimarães, J. R. S. (2004). Indicadores sintéticos no processo de formulação e avaliação de políticas públicas: Limites e legitimidades. In XIVEncontro Nacional de Estudos Populacionais, Caxambu, MG.).

Tendo em vista esses aspectos, o presente artigo investiga a mudança no grau de bem-estar (relativo) dos estados brasileiros, em relação ao PIB per capita, ao se utilizar o indicador desenvolvido por Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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. Adicionalmente, faz-se uma análise de robustez desse indicador. De maneira geral, os resultados indicam que os estados estão relativamente piores em termos de bem-estar, pois a distância em relação ao estado de São Paulo é maior nesse indicador do que em relação à renda; exceção feita ao Espírito Santo e Rio Grande do Norte, devido à diferença na expectativa de vida. Rio de Janeiro e Santa Catarina perdem algumas posições no ranking de bem-estar, devido, respectivamente, à expectativa de vida e ao share de consumo. O segundo estado, em termos de bem-estar, é o Espírito Santo com um nível equivalente a 4/5 ao de São Paulo e a última colocação pertence ao Piauí com 1/6. Note que a dispersão do indicador de bem-estar é superior ao da renda, pois o Piauí (último colocado em termos de renda) possui PIB per capita equivalente a 1/5 ao de São Paulo. Em todos os casos, a expectativa de vida é o principal componente que reduz o bem-estar.

Além desta introdução, o artigo está organizado da seguinte forma: a seção 2.1 apresenta, em linhas gerais, o modelo; na seção 2.2 são apresentadas as bases de dados e as principais variáveis utilizadas; os resultados são discutidos na seção 3; a seção 4 é reservada para a avaliação de robustez do indicador; a seção 5 traz algumas considerações finais.6 6 Informações complementares a respeito das bases de dados, dos parâmetros usados no modelo e as demonstrações para obtenção da solução analítica encontram-se no Apêndice.

2. Metodologia

2.1 O modelo

O modelo assume a existência de um único agente representativo em cada região pré-determinada. Esse agente conta com um conjunto de preferências que pode ser representado por uma função utilidade. Além disso, o agente está sujeito (e desconhece) às condições econômicas da localidade em que ele se encontra. Existe incerteza no modelo uma vez que o agente “não sabe se ele será rico ou pobre, irá trabalhar mais ou terá mais horas de lazer, ou ainda, se terá uma vida plena ou sofrerá de alguma doença precoce” (Jones & Klenow, 2016Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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), pois existe uma distribuição de probabilidades para cada um desses estados da natureza. Sob essas condições a utilidade intertemporal é representada pela equação

(1) U i = 𝔼 a = 1 100 β ai u C ai , l ai S i a ,

onde U representa a utilidade intertemporal, í designa a localidade do agente representativo, 𝔼 o operador esperança, u a utilidade instantânea, β ∈ (0,1) o fator de desconto intertemporal, C o consumo do agente (público e privado), o tempo dedicado ao lazer, e S(a) a probabilidade de sobrevivência do agente na idade a ∈ [1; 100]. Suponha que o consumo cresça a uma taxa constante g, logo ca = ceag é o consumo do agente representativo em uma determinada idade a e c representa um consumo em um ano base qualquer.

Em cada localidade i há apenas um agente representativo, sendo que o agente de uma dessas localidades será usado como referência. Eles possuem as mesmas preferências e, portanto, as mesmas funções de utilidade intertemporal e instantânea, parâmetros de desconto intertemporal e todos os demais aspectos que compõem a função de utilidade (exceto os valores observados de consumo, lazer e taxa de sobrevivência). Além disso, o modelo pressupõe a separabilidade aditiva7 7 É possível relaxar essa hipótese utilizando uma forma funcional da utilidade mais geral, caso as informações de consumo e lazer fossem coletadas na mesma pesquisa o que, na prática, não ocorre no Brasil. entre os termos de consumo e lazer, sendo dada pela equação

(2) u C , l = u ¯ + log C θ ɛ 1 + ɛ 1 l 1 + ɛ ɛ ,

onde o termo u representa o intercepto do fluxo de utilidade do agente ao longo da vida, cujo montante refere-se ao “valor monetário da vida remanescente” de um indivíduo médio com 40 anos residente na localidade referência; (1 - ) representa a oferta de trabalho; θ o peso dado a desutilidade do trabalho; a elasticidade da oferta de trabalho (elasticidade de Frisch), isto é, a elasticidade das horas trabalhadas em relação ao salário. A estimativa do u é obtida a partir do Valor Estatístico da Vida (VSL, na sigla em inglês). O VSL representa a disposição a pagar das pessoas por uma redução do risco de morte, de acordo com a definição apresentada por Ortiz, Markandya, e Hunt (2009)Ortiz, R. A., Markandya, A., & Hunt, A. (2009). Willingness to pay for mortality risk reduction associated with air pollution in Sao Paulo. Revista Brasileira de Economia, 63(1), 3-22. http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/view/913
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.

A partir da utilidade intertemporal é possível mensurar o nível de bem-estar por meio do indicador de consumo equivalente. Para isso, basta introduzir o termo λ ao consumo de cada período. Esse parâmetro deve ser ajustado até que o agente representativo usufrua da mesma utilidade entre viver em duas localidades quaisquer. A equação (3) apresenta a forma funcional da utilidade intertemporal do estado de São Paulo, usado como referência, com a introdução do termo λ no consumo e a equação (4) representa a condição sob a qual o agente se torna indiferente entre viver no referido estado ou em qualquer outro ente federativo denotado por i:

(3) u SP λ i = 𝔼 a = 1 100 β a u λ i C a SP , l a SP S SP a ,

(4) u SP λ i = u i 1 .

Vale notar que o lado esquerdo da equação (4) representa a utilidade do agente na localidade de referência SP ajustado ao fator λf, isto é, ajusta-se a utilidade de se viver no estado de São Paulo via alteração do consumo até que ela se iguale a de um outro estado qualquer. Quando essa igualdade é atingida, o agente representativo torna-se indiferente entre viver em qualquer um desses locais. O parâmetro λ é a essência do indicador de bem-estar e, por meio dele, será possível avaliar níveis equivalentes de consumo em localidades diferentes, ou seja, λ é a medida de consumo equivalente.

Por exemplo, suponha que os paulistas e os paranaenses possuam os mesmos níveis de consumo e de horas de lazer. A única diferença entre os estados é a taxa de sobrevivência. Suponha que no Paraná (PR) as pessoas vivam menos que no estado de São Paulo (SP). Logo, a partir da equação (3), tem-se que a utilidade do agente representativo paulistano é maior que a do paranaense. Portanto, existe um λPR ≤ 1 tal que o agente representativo paulistano é indiferente entre viver no seu estado de origem ou no PR atendendo a condição de equivalência determinada por uSP(λPR) = uPR(1).

Com base na condição de equivalência definida pela equação (4) e na hipótese de utilidade separável, é possível estabelecer uma solução analítica (“forma fechada”) para o indicador de bem-estar trazendo os componentes de expectativa de vida, consumo e lazer separadamente tal como apresentado na equação a seguir:8 8 As etapas para obtenção da solução analítica estão no Apêndice.

(5) log λ i y ˜ i = a Δ s a i u a i Expectativa de vida + log c ¯ i y i log c ¯ SP y SP Share do consumo + υ l ¯ i υ l ¯ SP Lazer + 𝔼 log c i log c ¯ i 𝔼 log c SP log c ¯ SP Desigualdade int ertemporal no consumo + 𝔼 υ l i υ l ¯ i 𝔼 υ l SP υ l ¯ SP . Desigualdade int ertemporal no lazer

Como é possível observar na equação (5), o indicador de consumo equivalente é composto por cinco componentes: i) expectativa de vida; ii) share do consumo; iii) lazer; iv) desigualdade intertemporal do consumo; v) desigualdade intertemporal do lazer. Vale notar que todos esses termos são relativos a uma localidade de referência de maneira que deve-se interpretar cada um dos componentes como a “diferença” (ou a proporção), respectivamente, entre o tempo de vida, consumo e desutilidade do trabalho em relação ao estado de São Paulo. De agora em diante, utiliza-se o termo bem-estar para designar a medida de consumo equivalente representada pelo λ.

Em linhas gerais, o aumento da expectativa de vida eleva o número de períodos nos quais o indivíduo desfruta de consumo e lazer. Já o termo referente ao share aponta quanto da renda se transforma em consumo e, portanto, em utilidade. O componente do lazer, por sua vez, advém da desutilidade do trabalho e é computado indiretamente pela função v(). É importante destacar que os termos de desigualdade no consumo e lazer medem a dispersão dessas variáveis ao longo da vida do agente representativo. Diferentemente das medidas tradicionais de desigualdade, que avaliam a distribuição de uma variável entre os indivíduos nas distintas faixas etárias, a desigualdade no presente trabalho é uma medida “intertemporal”. Logo, oscilações no nível de consumo ou de lazer ao longo da vida geram impacto negativo no bem-estar do agente representativo, uma vez que esse tem preferência por suavização na trajetória de consumo (ou lazer). A partir de agora será utilizado o termo desigualdade para referir-se à “desigualdade intertemporal”.

2.2 Base de dados

Os microdados utilizados no estudo são oriundos da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) e a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), ambas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Da primeira pesquisa são extraídas as horas de lazer calculadas a partir da diferença do total de horas anuais e as horas de trabalho declaradas dos entrevistados9 9 Horas declaradas de trabalho nas atividades principal, secundária e, eventualmente, terciária. descontando 8 horas diárias de sono.10 10 Em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro parte importante das horas contabilizadas como lazer são usadas no deslocamento ao trabalho (provável fonte de desutilidade) o que pode gerar uma medida de bem-estar maior que aquela percebida pelos agentes visto que esse tempo é computado como lazer. Esse aspecto é um ponto importante para ser considerado em estudos futuros. Da segunda pesquisa, obtém-se o consumo individual por meio da média simples do consumo domiciliar. Isto é, divide-se o consumo domiciliar total pelo número de integrantes. A construção da cesta de consumo seguiu a mesma estrutura utilizada por Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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, assim como no modelo principal (“caso base”) foram utilizados os mesmos valores dos parâmetros estruturais da economia.11 11 Os parâmetros estruturais e as metodologias de atribuição de consumo são apresentação na seção 4. O ano base da presente pesquisa limitou-se a 2008, pois trata-se do último ano disponível da POF que estava previsto para 2014, mas foi adiada para 2019 por questões orçamentárias.

A taxa de sobrevivência foi obtida por meio de duas interpolações dos dados extraídos da Tábua de Mortalidade do IBGE, sendo a primeira interpolação “intra ano” para estimar as taxas de sobrevivência para cada idade. A segunda interpolação foi feita “entre anos” para se obter as taxa de sobrevivência do ano de 2008, pois a POF e a Tábua de Mortalidade são calculadas em anos distintos. Outras informações, como PIB, população e transferências do governos em nível estadual, foram obtidas do Instituto de Pesquisa de Economia Aplicada (IPEA).12 12 Ver Tabela A-1 no Apêndice para mais detalhes sobre as bases de dados utilizadas.

3. Resultados

Em 2008, a expectativa de vida ao nascer dos brasileiros era de 72,6 anos, com desvio-padrão de 2,4 anos. A menor expectativa de vida pertencia ao Maranhão (MA), com 68,7 anos, enquanto a maior pertencia a Santa Catarina (SC), com 76,8 anos. A Figura 1(a) indica que há uma correlação positiva entre renda e expectativa de vida, porém essa correlação assume dois comportamentos distintos (inclinações) para estados mais pobres e para os estados mais ricos.13 13 Estados com renda inferior 1/2 em relação estado de São Paulo (SP) foram considerados como pobres. A participação do consumo na renda (share), utilizando a renda total, que considera o consumo anual de alimentos, utensílios domésticos, aluguel e todos os demais itens que compõe a cesta de consumo das famílias14 14 Exceto os gastos com aquisição de imóvel e compra de veículos de transporte que foram desconsiderados. é apresentada na Figura 1(b). É possível observar que os estados mais pobres consomem, em média, uma parcela maior da renda em relação aos estados mais ricos. Este aspecto fica ainda mais evidente ao se considerar somente a renda monetária, como apresentado na Figura 1(c). A média das horas trabalhadas por estado é apresentado na Figura 1(d) sendo que a média e o desvio-padrão, considerando todos os estados, é de 934 horas e 69 horas, respectivamente. A expectativa de vida e o share do consumo afetam positivamente o bem-estar do agente representativo, enquanto as horas trabalhadas, negativamente (desutilidade do trabalho).

Figura 1
Componentes do bem-estar.

Nota: Distrito Federal (DF) foi excluído das figuras.


A Figura 1(e) apresenta a desigualdade intertemporal do consumo para cada um dos estados. Diferentemente do observado nas figuras anteriores, pode-se constatar que os estados mais ricos, isto é, com renda superior a 0,5 em relação a do estado de São Paulo, tendem a ser mais desiguais em relação ao estado de São Paulo (SP). Entretanto, essa desigualdade é, razoavelmente, a mesma entre eles já que a dispersão é menor quando comparada com o grupo de estados mais pobres. Em relação a desigualdade intertemporal do lazer, é possível observar na Figura 1(f) que as magnitudes dos valores do desvio-padrão são relativamente menores nessa variável e que a “distribuição” da desigualdade intertemporal entre os estados não é tão grande quanto aquela observada no consumo. Vale ressaltar que a desigualdade intertemporal afeta negativamente o bem-estar do agente representativo uma vez que esse tem preferência pela suavização do fluxo de consumo e de lazer ao longo de sua vida.

Os componentes do bem-estar discutidos nos dois últimos parágrafos dão suporte aos resultados apresentados nas figuras 1(g) e 1(h). A partir da primeira figura, pode-se concluir que os estados estão relativamente piores em termos de bem-estar do que seria observado pelo nível de renda (em relação ao estado de São Paulo), pois todos estão abaixo da linha pontilhada que representa a situação em que o nível de renda e de bem-estar são equivalentes - exceção feita aos estados do Rio Grande do Norte (RN) e Espírito Santo (ES). Esse aspecto fica mais claro na segunda figura onde se apresenta a razão renda e bem-estar, pois é possível verificar a magnitude dessa piora relativa do bem-estar, como, por exemplo, em Pernambuco (PE), onde o bem-estar equivale a 70% do representado pelo PIB per capita. De maneira geral, a expectativa é o principal redutor do bem-estar seguido pela desigualdade intertemporal do consumo como se pode observar pela decomposição do bem-estar apresentada na Tabela 1.

Tabela 1
Decomposição bem-estar (λnível).

Note ainda, nessa mesma tabela, que os estados do Espírito Santo (ES) e Rio Grande Norte (RN) são os únicos em que o PIB per capita subestima o bem-estar, isto é, o agente representativo vive melhor nesses estados do que a renda parece indicar. Entretanto, somente no ES a melhora do bem-estar é suficientemente importante para alterar a posição relativa em termos de bem-estar, já que, pela ótica da renda, o estado ocupa a quinta posição, mas pela ótica do bem-estar, o estado ocupa a terceira posição. Esse fato é particularmente importante, pois o ES ultrapassa estados mais ricos como Rio de Janeiro (RJ) e Santa Catarina (SC). No ES, a diferença entre o PIB per capita e o indicador de bem-estar é de, aproximadamente, 2,9%, sendo que o share de consumo é o componente com a maior contribuição positiva (aproximadamente, +22,3%) e a desigualdade do consumo a maior contribuição negativa (aproximadamente, -14,3%). Note que, dentre os estados mais ricos, o impacto negativo da expectativa de vida no ES é relativamente baixo, representando uma queda de bem-estar de, aproximadamente, 4,3%.

No caso dos estados mais pobres, como Alagoas (AL), Maranhão (MA) e Piauí (PI), a expectativa de vida chega a ser responsável por uma queda de 50% a 60% em relação ao bem-estar medido pelo PIB per capita. Nesses estados, o share do consumo e o lazer contribuem positivamente para o indicador, mas a desigualdade do consumo, por outro lado, afeta o bem-estar negativamente (exceto no PI onde a desigualdade do consumo afeta positivamente). Esse aspecto descreve, de maneira razoavelmente adequada, a situação de todos os estados com faixa de renda inferior a 0,5 do estado de referência. Em linhas gerais, para todos os estados, o lazer e a sua desigualdade exercem um papel secundário na determinação do bem-estar, podendo influenciar de maneira positiva ou negativa o indicador a depender do estado analisado.

Outro aspecto importante, a correlação simples entre a renda e o bem-estar, para os estados brasileiros, foi de ρ = 0,977. Este resultado está linha com o obtido por Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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para os países. A alta correlação foi mantida ao se analisar o ranking dos estados. Para isto utilizou-se o método de correlação de Spearman. Neste caso, obteve-se um ρ = 0,970 e estatística de teste que rejeita a hipótese nula de não correlação dos rankings a 5% no nível de significância. Portanto, o nível de renda por pessoa está bastante correlacionado com o nível de bem-estar, ou seja, o PIB per capita é, de fato, uma boa proxy para se medir o bem-estar em nível estadual. Entretanto, existem diferenças importantes como a mudança da posição relativa dos estados do Espírito Santo (ES), Rio de Janeiro (RJ), Santa Catarina (SC) e Rio Grande do Sul (RS). Além disso, o indicador permite a decomposição do bem-estar em componentes que podem auxiliar no desenvolvimento de políticas públicas e/ou reformas econômicas que visem aumentar o bem-estar.

4. Robustez

Os resultados foram submetidos à avaliação de robustez em duas etapas. Na primeira etapa, os valores dos parâmetros estruturais do modelo foram substituídos por valores encontrados na literatura acadêmica nacional. Os novos parâmetros referem-se à impaciência do agente representativo (β), à elasticidade de Frisch (), ao crescimento do consumo (g) e ao valor estatístico da vida (VSL), como mostra a Tabela A-2 do Apêndice. Na segunda etapa, são alteradas as formas de atribuição do consumo individual (da média simples para o método de equivalência proposto pela OCDE15 15 Esse método consiste na equação Ci=Cd/n, onde i refere-se a um indivíduo qualquer pertencente ao domicílio, Cd refere-se ao consumo domiciliar total, e n à quantidade de indivíduos no domicílio em questão. ), a renda utilizada para o cômputo do share do consumo (da renda total para a renda monetária somente) e na quantidade de lazer dos jovens,16 16 O lazer das crianças e jovens entre 1 e 20 anos são analisados sob 3 perspectivas: i) crianças e jovens não trabalham (100% das horas de lazer); ii) crianças e jovens usufruem do lazer médio dos adultos entre 25 e 55 anos; iii) crianças e jovens usufruem do lazer médio entre os cenários (i) e (ii). totalizando 16 cenários, conforme apresentado na A-1 do Apêndice. Os cenários referentes à atribuição de consumo individual e das horas de lazer estão no artigo de Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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, enquanto a questão da renda utilizada para compor o share constitui uma contribuição dos autores deste artigo.

Em relação à robustez dos resultados às mudanças nos parâmetros estruturais, é possível depreender, a partir da Tabela 2, que somente o VSL é capaz de alterar de maneira consistente a posição relativa de bem-estar entre os estados. Isso acontece porque as alterações promovidas por esse parâmetro superam, em muitos casos, a diferença em nível do bem-estar entre os estados. Por exemplo, no Rio de Janeiro (RJ) tem-se ΔVSL = 10 de maneira que o bem-estar, neste novo cenário, torna-se λRJ = 86,2. Este novo nível de bem-estar faz com que o RJ ultrapasse os estados do Rio Grande do Sul (RS) e Espírito Santo (ES). Há uma questão econômica por trás desse aspecto que se reflete no indicador. O novo valor do VSL é substancialmente menor que o original; isso implica que as pessoas atribuem valor menor à vida. Dessa forma, a diferença de expectativa de vida com relação ao estado de São Paulo (SP) passa a ser menos relevante na determinação do bem-estar, o que garantiria melhora significativa em termos de bem-estar para os estados com menores índices de expectativa de vida. O caso mais emblemático dessa situação ocorre no estado do Amazonas onde ΔVSL = 21,2.

Tabela 2
Robustez nos parâmetros estruturais (λnivel).

Os demais parâmetros apresentam alterações relevantes de forma isolada, como é o caso do bem-estar do Distrito Federal (DF), quando alterado o fator de impaciência do agente representativo (denotado por Δβ). No caso da diminuição da elasticidade de Frisch (Δ), tem-se a redução da desutilidade do trabalho. Neste quesito, o estado de Santa Catarina (SC) é um dos mais beneficiados por apresentar a maior média de horas trabalhadas no ano (ver Figura 1(d)). Já o cenário ΔC, no qual o consumo cresce a uma taxa em linha com o crescimento do produto, tem potencial de gerar um fluxo de utilidade maior aos estados com maior share de consumo e de penalizar o bem-estar em estados com maiores níveis de desigualdade “intertemporal” do consumo. Destaque para o Amazonas (AM) onde essa alteração gerou um ΔCAM = 18,6.

Os resultados da análise de robustez, em nível, referente aos 16 cenários mencionados anteriormente, pode ser observada na Tabela 3. Neste caso, todos os cenários indicam que a distância entre o resultado modelo principal (“caso base”) e a média de cada estado é superior a 1σMAD para 14 estados:17 17 Para a caracterização da dispersão, utilizou-se o desvio absoluto médio (MAD, na sigla em inglês), pois, em comparação com o desvio padrão, o MAD tem a vantagem de ser mais robusto na presença de outliers já que a distância em relação à média não é elevada ao quadrado. Minas Gerais (MG), Amazonas (AM), Roraima (RR), Acre (AC), Sergipe (SE), Bahia (BA), Pará (PA), Ceará (CE), Pernambuco (PE), Alagoas (AL), Maranhão (MA), Piauí (PI), Paraíba (PB) e Tocantins (TO). É importante notar que, apesar da quantidade de estados com um σMAD > 1, tem-se que a grande parte desta variância foi introduzida pelos cenários que consideram somente a “Renda Monetária” que são representados pelas notações R4 a R7 e R12 a R15. Esta afirmação pode ser verificada ao se analisar a diferença absoluta entre os indicadores de bem-estar de cada cenário com o “caso base”, definida pela equação si=UFλRiUFλR0UF para i ≠ 0, e apresentada na última linha da Tabela 3. Ou seja, si mede a soma dos valores absolutos da distância do bem-estar entre um determinado cenário e o “caso base”. Por exemplo, no cenário R4 obtém-se sR4 = 132,4 que é bem superior a todos os cenários que consideram a renda total, dos quais a maior diferença ocorre no cenário R10 onde sR10 = 20,5.

Tabela 3
Robustez no consumo, renda e lazer (λnivel).

A análise por conjuntos de cenários que pertencem a um mesmo nó, isto é, considerando, os conjuntos {R0, R1, R2, R3}, {R4, R5, R6, R7}, {R8, R9, R10, R11} ou {R12, R13, R14, R15}, permite concluir que a mudança nas horas de lazer das crianças e dos jovens entre 0 a 20 anos não é fonte de grande variabilidade no indicador de bem-estar em qualquer um dos conjuntos analisados. Mesmo em estados pobres, como no Piauí (PI), o indicador de bem-estar fica relativamente estável nos cenários R1, R2 e R3, pois apresenta, respectivamente, os valores 16,4,16,8 e 16,5, enquanto no “caso base” o indicador foi de 16,6. Esse é o mesmo padrão seguido em todos os estados.

5. Considerações finais

Medir o bem-estar não é uma tarefa simples. A proposta de Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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trouxe algumas inovações nesta área ao considerar a expectativa de vida, o lazer e o consumo no processo de mensuração do bem-estar. Foi possível observar que, em relação ao estado de São Paulo (SP), praticamente todos os estados estão piores em bem-estar em relação à métrica do PIB per capita. A aplicação desse modelo para os estados brasileiros gerou resultados alinhados com a literatura internacional como, por exemplo, a importância da expectativa de vida no bem-estar e alta correlação deste último com a renda - tanto na correlação simples quanto na correlação de rank de Spearman. Este fato traz algumas evidências de que o PIB per capita é um indicador adequado para se medir o bem-estar. Entretanto, o PIB per capita apresenta, sistematicamente, um bem-estar superior ao apurado em relação ao estado de São Paulo (SP) no modelo usado neste artigo. Apesar disso, foram encontrados casos como, por exemplo, Espírito Santo (ES) Rio de Janeiro (RJ), em que há uma mudança relativa importante no ranking e no nível de bem-estar do estado. Além disso, o PIB per capita não permite identificar as origens das diferenças de bem-estar entre os estados.

O modelo é robusto à utilização de parâmetros estruturais mais adequados à economia brasileira e às mudanças nas variáveis de renda, lazer e de atribuição de consumo individual. Contudo, observou-se que a retirada da renda não monetária reduz o bem-estar relativo e introduz uma grande variabilidade ao indicador. Isso permite concluir que este tipo de renda exerce papel fundamental na geração de bem-estar nos estados menos desenvolvidos e merece ser investigada de forma mais detalhada em pesquisas futuras sobre o tema. De todo modo, os resultados apresentam algumas limitações. A primeira delas refere-se à homogeneidade das preferências, uma vez que o mesmo agente representativo é utilizado em diferentes estados brasileiros. Este aspecto torna-se ainda mais importante ao considerar as dimensões continentais do Brasil. Outra limitação foi a questão temporal, pois não foi possível replicar os resultados para anos mais recentes. Isso ocorreu, em grande parte, pelo atraso na realização da POF prevista para 2014. Uma possível introdução de agente heterogêneos ao modelo e a atualização dos indicadores para anos mais recentes ficam, portanto, como sugestões futuras de pesquisa.

  • *
    O presente trabalho foi realizado com apoio do CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Brasil.
  • 1
    Kenneth Arrow no livro Social Choice and Individual Values apud Rothenberg (1953)Rothenberg, J. (1953). Conditions for asocial welfare function. JournalofPoliticalEconomy, 61(5), 389-405. http://www.jstor.org/stable/1827286
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    .
  • 2
    Os termos entre aspas referem-se à, respectivamente, extended income e home production.
  • 3
    As variáveis ajustadas demograficamente estão formalmente definidas no Apêndice.
  • 4
    Aspecto levantado por Rosen (1988)Rosen, S. (1988). The value of changes in life expectancy. Journal of Risk and Uncertainty, 1(3), 285-304. http://www.jstor.org/stable/41760544
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    via alterações no Valor Estatístico da Vida (VSL).
  • 5
    Diferentemente de Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
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    , neste artigo considera-se as horas trabalhadas a partir dos 10 anos.
  • 6
    Informações complementares a respeito das bases de dados, dos parâmetros usados no modelo e as demonstrações para obtenção da solução analítica encontram-se no Apêndice.
  • 7
    É possível relaxar essa hipótese utilizando uma forma funcional da utilidade mais geral, caso as informações de consumo e lazer fossem coletadas na mesma pesquisa o que, na prática, não ocorre no Brasil.
  • 8
    As etapas para obtenção da solução analítica estão no Apêndice.
  • 9
    Horas declaradas de trabalho nas atividades principal, secundária e, eventualmente, terciária.
  • 10
    Em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro parte importante das horas contabilizadas como lazer são usadas no deslocamento ao trabalho (provável fonte de desutilidade) o que pode gerar uma medida de bem-estar maior que aquela percebida pelos agentes visto que esse tempo é computado como lazer. Esse aspecto é um ponto importante para ser considerado em estudos futuros.
  • 11
    Os parâmetros estruturais e as metodologias de atribuição de consumo são apresentação na seção 4.
  • 12
    Ver Tabela A-1 no Apêndice para mais detalhes sobre as bases de dados utilizadas.
  • 13
    Estados com renda inferior 1/2 em relação estado de São Paulo (SP) foram considerados como pobres.
  • 14
    Exceto os gastos com aquisição de imóvel e compra de veículos de transporte que foram desconsiderados.
  • 15
    Esse método consiste na equação Ci=Cd/n, onde i refere-se a um indivíduo qualquer pertencente ao domicílio, Cd refere-se ao consumo domiciliar total, e n à quantidade de indivíduos no domicílio em questão.
  • 16
    O lazer das crianças e jovens entre 1 e 20 anos são analisados sob 3 perspectivas: i) crianças e jovens não trabalham (100% das horas de lazer); ii) crianças e jovens usufruem do lazer médio dos adultos entre 25 e 55 anos; iii) crianças e jovens usufruem do lazer médio entre os cenários (i) e (ii).
  • 17
    Para a caracterização da dispersão, utilizou-se o desvio absoluto médio (MAD, na sigla em inglês), pois, em comparação com o desvio padrão, o MAD tem a vantagem de ser mais robusto na presença de outliers já que a distância em relação à média não é elevada ao quadrado.
  • 18
    As mesmas manipulações algébricas são usadas para obter a equação intertemporal da outra localidade (representada pela notação i) e foram, portanto, omitidas.

Apêndice.

Tabelas e figuras adicionais

Figura A-1
Cenários de avaliação do nível.

Nota: denota o cenário de robustez para = 0,1,2,…,15 descrito no diagrama.


Tabela A-1
As principais variáveis e as fontes de informação.
Tabela A-2
Parâmetros do modelo.

Demonstrações

Considere as funções de utilidade intertemporal e utilidade instantânea (separável) do agente representativo definidas pelas equações (1) e (2), respectivamente. Tome a condição de equivalência dada pela equação (4) e considere a tripla {j, a, í} onde j refere-se ao indivíduo da amostra (microdados coletados pelas pesquisas), a a sua idade e i o local onde o indivíduo vive. Assuma, adicionalmente, que as amostras populacionais, obtidas nas pesquisas domiciliares, representam a população, isto é, o agente representativo está sujeito às distribuições do consumo, do lazer e às taxas de sobrevivência contidas nessas amostras.

Defina o termo ωija como o peso amostral, normalizado no intervalo [0; 1],

(A-1) ω ¯ ja i ω ja i j = 1 N a i ω ja ,

onde ωija é o peso amostral do indivíduo j com idade a que reside em í; e Nia como número de indivíduos com a mesma faixa etária a residentes em í. Logo, a utilidade esperada do agente representativo passa a ser definida pela equação

(A-2) U i = a = 1 100 β a S a i j = 1 N a i ω ¯ ja i u c ja i e ga , l ja i ,

onde Sia é a taxa de sobrevivência do agente na idade a no local í. Note que a taxa de sobrevivência depende da idade do agente.

Para o estado de referência a equação (4) pode ser reescrita como

u SP λ i C , l = u ¯ + log λ i C + υ l = u ¯ + log λ i + log C + υ l = u SP C , l + log λ i ,

onde

υ l = θ ɛ 1 + ɛ 1 l 1 + ɛ ɛ .

Logo, a utilidade instantânea do lado esquerdo da equação (4) pode ser obtida por meio dos seguintes passos:

u a SP C , l = u ¯ + j = 1 N a SP ω ¯ ja SP log c ja SP e ga + υ l ja SP = u ¯ + j = 1 N a SP ω ¯ ja SP log e ag = ag , j + log c ja SP + υ l ja SP = u ¯ + ag + j = 1 N a SP ω ¯ ja SP log c ja SP + υ l ja SP .

Portanto, a utilidade intertemporal da localidade de referência é dada por:18 18 As mesmas manipulações algébricas são usadas para obter a equação intertemporal da outra localidade (representada pela notação i) e foram, portanto, omitidas.

(A-3) U SP λ i = a = 1 100 β a S a SP u a SP + log λ i ,

onde:

(A-4) u a SP u ¯ + ga + j = 1 N a SP ω ¯ ja SP log c ja SP + υ l ja SP .

Equalizando a utilidade intertemporal, como descrito pela equação (4), pode-se isolar o termo log (λi) do local de referência, conforme demonstrado a seguir (para facilitar a notação considere Σa100 = Σa):

a β a S a SP u a SP + log λ i = a β a S a i u a i reescrevendo a equa ç ã o 4 a β a S a SP u a SP + a β a S a SP log λ i = a β a S a i u a i distribui ç ã o do termo a β a S a SP a β a S a SP log λ i = a β a S a i u a i a β a S a SP u a SP isola se o termo log λ i log λ i = 1 a β a S a SP a β a S a i u a i a β a S a SP u a SP dividir ambos os lados por 1 Σ a β a S a SP log λ i = 1 a β a S a SP a β a S a i u a i S a SP u a SP β em evid ê ncia log λ i = 1 a β a S a SP a β a S a i u a i S a SP u a SP ± S a SP u a i = 0 adi ç ã o de termo de soma zero log λ i = 1 a β a S a SP a β a S a i u a i S a SP u a i + S a SP u a i S a SP u a SP rearranjando

Portanto,

(A-5) log λ i = 1 a β a S a SP a β a S a i S a SP u a i + S a SP u a i u a SP .

Para facilitar a notação, defina a taxa de sobrevivência em nível e a diferença entre as taxas de sobrevivência da seguinte forma:

(A-6) S a SP β a S a SP a β a S a SP

(A-7) Δ s a i β a S a i S a SP a β a S a SP .

Adotando-se as mesmas definições de Jones e Klenow (2016)Jones, C. I., & Klenow, P J. (2016). Beyond GDP? Welfare across countries and time. American Economic Review, 106(9), 2426-2457. http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236
http://dx.doi.org/10.1257/aer.20110236...
para as variáveis ajustadas demograficamente, tem-se o seguinte:

• Consumo médio ajustado demograficamente:

(A-8) c ¯ i a s a SP j = 1 N a i ω ¯ ja i c ja i e ga .

• Lazer médio ajustado demograficamente:

(A-9) l ¯ i a s a SP j = 1 N a i ω ¯ ja i l ja i .

• Utilidade média do consumo ajustada demograficamente:

(A-10) 𝔼 log c i a s a SP j = 1 N a i ω ¯ ja i log c ja i e ga .

• Lazer médio ajustado demograficamente:

(A-11) 𝔼 υ l i a s a SP j = 1 N a i ω ¯ ja i υ l ja i .

• Renda da região í em relação ao local de referência (per capita):

y ˜ i y i y SP .

Partindo-se da equação (A-5), pode-se obter a decomposição (“solução fechada”) do indicador de bem-estar utilizando algumas operações matemáticas e das propriedades do log, conforme demonstrado a seguir:

log λ i = 1 a β a S a SP a β a S a i S a SP u a i + S a SP u a i u a SP = a β a S a i S a SP a β a S a SP u a i + a β a S a SP a β a S a SP u a i a β a S a SP a β a S a SP u a SP = a Δ s a i u a i + a β a S a SP a β a S a SP u a i A a β a S a SP a β a S a SP u a SP B .

Resolvendo o termo A usando a utilidade definida na equação (A-4) tem-se que

A = a β a S a SP a β a S a SP u ¯ + j = 1 N a i ω ¯ ja i log c ja i e ga + υ l ja i = a s a SP u ¯ + j = 1 N a i ω ¯ ja i log c ja i e ga + υ l ja i = a s a SP u ¯ + a s a SP j = 1 N a i ω ¯ ja i log c ja i e ga + a s a SP j = 1 N a i ω ¯ ja i υ l ja i = a s a SP u ¯ + 𝔼 log c i + 𝔼 υ l i .

De forma análoga para o termo tem-se o seguinte:

B = a s a SP u ¯ + 𝔼 log c SP + 𝔼 υ l SP .

Portanto,

log λ i = a Δ s a i u a i + a s a SP u ¯ cancela + 𝔼 log c i + 𝔼 υ l i a s a SP u ¯ cancela 𝔼 log c SP 𝔼 υ l SP = a Δ s a i u a i + 𝔼 log c i + 𝔼 υ l i 𝔼 log c SP 𝔼 υ l SP .

Somando e subtraindo os termos log ci, log cSP, v(i) e v(SP) chega-se a

log λ i = a Δ s a i u a i + log c ¯ i log c ¯ SP + υ l ¯ i υ l ¯ SP + 𝔼 log c i log c ¯ i 𝔼 log c SP log c ¯ SP + 𝔼 υ l i υ l ¯ i 𝔼 υ l SP υ l ¯ SP .

Subtraindo dos dois lados da equação o termo

logy˜i=logyi/ySP
tem-se que:

lhs log λ i log y ˜ i = log λ i y ˜ i rhs : log c ¯ i log c ¯ SP log y ˜ i = log c ¯ i log c ¯ SP log y i y SP = log c ¯ i log c ¯ SP log y i + log y SP = log c ¯ i y i log c ¯ SP y SP .

Portanto,

log λ i y ˜ i = a Δ s a i u a i Expectativa de vida + log c ¯ i y i log c ¯ SP y SP Share do consumo + υ l ¯ i υ l ¯ SP Lazer + 𝔼 log c i log c ¯ i 𝔼 log c SP log c ¯ SP Desigualdade int ertemporal no consumo + 𝔼 υ l i υ l ¯ i 𝔼 υ l SP υ l ¯ SP . Desigualdade int ertemporal no lazer

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    14 Fev 2019
  • Aceito
    31 Jan 2020
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