Acessibilidade / Reportar erro

O Fundeb e a questão da equidade* * Os autores gostariam de agradecer a Ricardo Cavalcanti (editor), Talita Silva e um parecerista anônimo por sugestões e comentários. Agradecem ainda a Casemiro Campos e Isabella Helter pela excelente assistência dada a esta pesquisa.

Resumo

O artigo trata sobre o Fundeb e a equidade dos gastos em educação no Brasil. Simula-se estaticamente o gasto por aluno ao nível municipal em um cenário onde não existe Fundeb com o objetivo de estimar o efeito do Fundo sobre a desigualdade de gastos e sobre o desempenho acadêmico dos alunos nas redes municipais. Encontra-se que o Fundo reduz substancialmente a desigualdade do gasto por aluno, mas parece pouco alterar indicadores de qualidade da educação.Em seguida dois fundos contrafactuais com novas regras exploram a possibilidade de reduzir ainda mais a desigualdade dos gastos. As simulações estáticas de novas regras de distribuição apontam a existência de possibilidades concretas de reduzir ainda mais desigualdade dos gastos.

Palavras-chave
Fundeb; equidade; educação pública; financiamento da educação

1. Introdução

Ao longo do século XX, o Brasil alternou o modo de financiamento da educação pública, ora vinculando receitas, ora desvinculando (J. B. A. Oliveira, 2019Oliveira, J. B. A. (2019). Financiamento da educação: Breve histórico. In J. B. A. e Oliveira, T. Silva, N. M. Filho, & R. B. Politi (Orgs.), Financiamento da educação no Brasil (pp. 21–39). Brasília, DF: Instituto Alfa e Beto. https://www.alfaebeto.org.br/wp-content/uploads/2020/02/Ciclo-de-semin%C3%A1rios-volume-I.pdf
https://www.alfaebeto.org.br/wp-content/...
). O crescimento do gasto em educação como porcentagem do PIB, de menos de 1% no início do século XX a cerca de 6% no início do século XXI,1 1 Dados compilados a partir de Maduro (2007), FINBRA, SIOPE, Siga Brasil, Portal Transparência, Inep, e IBGE. era inevitável devido à expansão do público atendido, independentemente do ritmo de crescimento e do nível de gasto atingido. Inicialmente, a frequência escolar era voltada para uma estreita faixa etária da população, em torno de 7 a 10 anos de idade. A partir de 2013, tornou-se obrigatória a matrícula a partir dos 4 anos de idade até que se complete 17 anos.

Em meio a um grande volume de matrículas e reduzida capacidade de geração de renda por parte de boa parte dos municípios, surgiu a ideia da criação de um fundo para financiar a educação pública. O fundo seria composto basicamente por receitas vinculadas de impostos, com o volume arrecadado sendo redistribuído às redes estaduais e municipais de ensino de acordo com o número de matrículas. O Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) e, posteriormente, o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) modificaram substancialmente o modo de financiamento da educação pública no Brasil, principalmente pelo fato de incorporar um mecanismo de redistribuição de recursos (detalhado na seção 2).

No momento em que este artigo é elaborado, está em discussão no Congresso Nacional o que fazer após o vencimento do Fundeb, cujo prazo de validade é dezembro de 2020. Há propostas para torná-lo permanente, para aumentar a contribuição da União, para aumentar a porcentagem mínima gasta com remuneração dos professores. Independentemente da decisão final, espera-se que a mesma seja também baseada em evidências.

Com o objetivo de contribuir para o debate do “Novo Fundeb”, este artigo analisa o papel do fundo na promoção da equidade do gasto em educação no Brasil e em que medida isso resultou em avanços na qualidade da educação no país. Especificamente, por meio de simulações contrafactuais em uma análise estática, o artigo explora: i) o efeito da existência do Fundeb sobre a desigualdade de gasto por aluno entre municípios; ii) a relação entre a redistribuição e o desempenho dos alunos na Prova Brasil, uma proxy para qualidade da educação; e iii) dois cenários em que se propõe novas regras de distribuição de recursos do Fundeb, baseadas na constituição de um fundo único para todo o país em substituição aos 27 fundos hoje existentes.

Os resultados apontam que o Fundeb está associado a uma grande redução da desigualdade de gasto por aluno entreosmunicípios. O índicede Gini apresenta uma queda média de 74% na presença do Fundeb no período analisado. A desigualdade poderia diminuir ainda mais caso houvesse um fundo único em substituição aos 27 fundos existentes atualmente.

As simulações implementadas são limitadas no sentido de não capturar um possível ajuste na alocação de recursos por parte do município caso o Fundeb deixasse de existir. Além disso, como argumentam Mattos, Politi, e Yamaguchi (2018)Mattos, E., Politi, R., & Yamaguchi, A. (2018). Grants and dispersion of local education spending in Brazil. Regional Studies, 52(2), 239–249. http://dx.doi.org/10.1080/00343404.2017.1287891
http://dx.doi.org/10.1080/00343404.2017....
e T. Cruz e Silva (2020)Cruz, T., & Silva, T. (2020). Minimum spending in education and the fypaper effect. Economics of Education Review, 77(102012). http://dx.doi.org/10.1016/j.econedurev.2020.102012
http://dx.doi.org/10.1016/j.econedurev.2...
, a origem dos recursos pode ser importante na alocação dos gastos (Flypaper effect). As simulações não lidam com possíveis efeitos de uma eliminação do Fundeb, que modificaria a fonte de receitas da educação. Finalmente, vale notar que o cenário contrafactual (eliminação do Fundeb) resultaria de uma reforma fiscal, que certamente teria impactos não triviais em diversos setores da economia, podendo afetar inclusive a determinação do Produto Interno Bruto. As simulações realizadas não levam em conta esses efeitos e, portanto, todos os resultados reportados e discutidos devem ser interpretados com a devida cautela.

Os resultados mostram ainda que a existência do Fundeb não parece estar associada a grandes mudanças em indicadores de qualidade da educação (desempenho, distorção idade-série e aprovação). Separando a análise para municípios que perderiam receita daqueles que ganhariam caso o Fundeb deixasse de existir, observa-se que os primeiros tenderiam a piorar, enquanto os últimos tenderiam a melhorar; porém, em ambos os casos, a diferença do cenário contrafactual para o cenário observado seria modesta. Ressalta-se que tais exercícios contrafactuais não possuem interpretação causal, pois não controlam para possíveis variáveis omitidas que afetam gasto e desempenho.

Este artigo insere-se na literatura de financiamento da educação no Brasil e no mundo. Os temas abordados são diversos, tais como distribuição de recursos e equidade (Hoxby, 2001Hoxby, C.M. (2001). All school finance equalizations are not created equal. Quarterly Journal of Economics, 116(4), 1189–1231. http://dx.doi.org/10.1162/003355301753265552
http://dx.doi.org/10.1162/00335530175326...
;Mattos et al., 2018Mattos, E., Politi, R., & Yamaguchi, A. (2018). Grants and dispersion of local education spending in Brazil. Regional Studies, 52(2), 239–249. http://dx.doi.org/10.1080/00343404.2017.1287891
http://dx.doi.org/10.1080/00343404.2017....
), efeito de regras de financiamento (Ulyssea, Fernandes, & Gremaud, 2006Ulyssea, G., Fernandes, R., & Gremaud, A.P. (2006). O impacto do Fundef na alocação de recursos para a educação básica. Pesquisa e Planejamento Econômico, 36(1), 109–136. https://ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe/article/view/25
https://ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe/ar...
; T. Cruz & Silva, 2020Cruz, T., & Silva, T. (2020). Minimum spending in education and the fypaper effect. Economics of Education Review, 77(102012). http://dx.doi.org/10.1016/j.econedurev.2020.102012
http://dx.doi.org/10.1016/j.econedurev.2...
), e efeito de gasto sobre os resultados dos alunos (Card & Payne, 2002Card, D., & Payne, A.A. (2002). School finance reform, the distribution of school spending and the distribution of student test scores. Journal of Public Economics, 83, 49–82. http://dx.doi.org/10.1016/S0047-2727(00)00177-8
http://dx.doi.org/10.1016/S0047-2727(00)...
; Menezes-Filho & Pazello, 2007Menezes-Filho, N. A., & Pazello, E. (2007). Do teachers wages matter for proficiency? Evidence from a funding reform in Brazil. Economics of Education Review, 26(6), 660–672. http://dx.doi.org/10.1016/j.econedurev.2007.08.003
http://dx.doi.org/10.1016/j.econedurev.2...
; G.F.d. Cruz & Rocha, 2018Cruz, G. F. d., & Rocha, R. (2018). Efeitos do FUNDEF/B sobre frequência escolar, fuxo escolar e trabalho infantil: Uma análise com base nos censos de 2000 e 2010. Estudos Econômicos, 48(1), 39–75. http://dx.doi.org/10.1590/0101-4161481239gcr
http://dx.doi.org/10.1590/0101-416148123...
).

Especificamente em relação aos fundos brasileiros e o tema da redistribuição de recursos, Soares (1998)Soares, S. (1998). The financing of education in Brazil: With special reference to the North, Northeast and Center-West regions (LCSHD Paper Series Nº 17). Washington, D.C.: World Bank Group. https://documents.worldbank.org/curated/en/428101468769838171/The-financing-of-education-in-Brazil-with-special-reference-to-the-North-Northeast-and-Center-West-regions
https://documents.worldbank.org/curated/...
argumenta que o Fundef está associado a uma significativa redução da desigualdade na capacidade de financiamento dos entes federativos, enquanto K. P. Castro (2019)Castro, K. P. (2019). Fundeb: Ampliando o horizonte do debate sobre o financiamento da educação básica. In J. B. A. e Oliveira, T. Silva, N. M. Filho, & R. B. Politi (Orgs.), Financiamento da educação no Brasil (Vol. 2, pp. 9–27). Brasília, DF: Instituto Alfa e Beto. https://www.alfaebeto.org.br/wp-content/uploads/2020/02/Ciclo-de-Semin%C3%A1rios-volume-II.pdf
https://www.alfaebeto.org.br/wp-content/...
faz o mesmo argumento em relação ao Fundeb. O presente artigo complementa a literatura ao utilizar a abordagem de simulações contrafactuais para analisar a equidade do gasto em educação no Brasil.

Este artigo possui mais quatros seções além desta introdução e das considerações finais. A próxima seção discorre sobre o Fundeb. A seção 3 apresenta a fonte de dados e realiza uma análise descritiva dos mesmos. A seção 4 discute os efeitos redistributivos do Fundeb ao analisar um cenário contrafactual em que o Fundeb não existe. Finalmente, a seção 5 apresenta e discute duas propostas para criação de um fundo nacional.

2. O Fundeb em detalhe

Atualmente, os recursos para educação nas redes municipais da educação básica advêm de receitas próprias, transferências intergovernamentais e o Fundeb.2 2 Para uma análise do sistema de financiamento brasileiro, ver J. A. d. Castro e Sadeck (2003). O Fundeb foi precedido pelo Fundef, o primeiro fundo específico para financiamento da educação criado pela Lei 9.424 de 1996, cujo foco era o ensino fundamental.3 3 De acordo com a lei, o fundo seria composto por 15% do ICMS e IPI e 15% do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e IPI. Segundo Vieira e Vidal (2015)Vieira, S. L., & Vidal, E. M. (2015). Política de financiamento da educação no Brasil: Uma (re)construção histórica. Em Aberto, 28(93), 17–42. http://dx.doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.28i93.2456
http://dx.doi.org/10.24109/2176-6673.ema...
, o Fundef foi criado para assegurar a vinculação de 60% dos recursos das despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE) exclusivamente para o ensino fundamental e o pagamento de seus professores.

De caráter temporário (10 anos), o Fundef teve continuidade nos anos 2000 com a proposição de um segundo instrumento de natureza parecida, o Fundeb (criado pela Lei 11.494), o qual ampliava a destinação dos recursos para todas as etapas do ensino básico, ao invés de focar apenas no ensino fundamental.

Há muitas diferenças entre o Fundef e o Fundeb. Eles diferem em período de validade (10 vs. 14 anos), percentual sobre a fonte de recursos (15% vs. 20%) e a complementação da União. No caso da complementação, no Fundef, não havia definição que assegurasse o montante de recursos da União, ao passo que, no Fundeb, há a garantia de complementação da União de 10% do montante resultante da contribuição dos Estados e Municípios, a partir do quarto ano de sua criação (MEC, 2007MEC – Ministério da Educação. (2007). Quadro comparativo entre Fundef e Fundeb. Acessado em 02/02/2020: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Fundebef/quad_comp.pdf
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pd...
). Desde então, o Fundeb passou a ser a principal fonte de financiamento da educação para muitos municípios brasileiros. Em média, 55% dos recursos despendidos em educação são provenientes do Fundeb, e seu prazo de validade terminaria em dezembro de 2020.

O Fundeb é composto por 27 Fundos, um para cada estado e Distrito Federal. Todos os municípios transferem um percentual fixo de suas receitas4 4 20% do FPM, ITR, IPVA e ITCMD. para o fundo do respectivo estado. Além disso, os estados também transferem um percentual fixo das receitas de impostos estaduais5 5 20% do ITR, ICMS, ITCMD e de transferências do FPE. para o seu próprio Fundo. Vale ressaltar, como o faz K.P. Castro (2019)Castro, K. P. (2019). Fundeb: Ampliando o horizonte do debate sobre o financiamento da educação básica. In J. B. A. e Oliveira, T. Silva, N. M. Filho, & R. B. Politi (Orgs.), Financiamento da educação no Brasil (Vol. 2, pp. 9–27). Brasília, DF: Instituto Alfa e Beto. https://www.alfaebeto.org.br/wp-content/uploads/2020/02/Ciclo-de-Semin%C3%A1rios-volume-II.pdf
https://www.alfaebeto.org.br/wp-content/...
, que a base de financiamento é estreita, uma vez que ICMS e FPM/FPE respondem por aproximadamente 75% dos recursos do Fundeb.

Há basicamente dois mecanismos de redistribuição desses recursos. Primeiramente, o Fundo redistribui recursos para os municípios dentro de cada estado proporcionalmente ao número de matrículas na educação básica das redes municipais.6 6 Matrículas em diferentes etapas de ensino recebem pesos diferentes. A lista completa de pesos é reportada na Lei 11.494. O mesmo vale para as redes estaduais. O segundo mecanismo é a complementação da União, que corresponde a 10% da soma de todo o valor dos 27 Fundos estaduais. A complementação é direcionada para os Estados que não atingiram um valor mínimo por aluno definido nacionalmente a cada ano. O mínimo é definido de forma que a União equalize os recursos por aluno dos estados que tiveram a menor receita advinda do Fundeb por aluno.

Apesar de o Fundo ser muito importante para redistribuir recursos públicos em geral, conforme será visto adiante, há uma limitação quando se refere à distribuição de recursos da União para os estados e municípios. A limitação da redistribuição da complementação da União surge na medida em que apenas os municípios de Estados que tiveram um gasto médio abaixo do mínimo definido nacionalmente recebem esta parcela do Fundeb. Os municípios ricos que estão acima do mínimo, mas dentro de Estados pobres que estão com a média de gastos abaixo do mínimo recebem a complementação da União. Por outro lado, os municípios pobres de Estados ricos não recebem a complementação da União.

3. Dados e Análise Descritiva

Este artigo utiliza diferentes bases de dados para obter os gastos públicos em educação. Atualmente, esse material pode ser obtido através do SIOPE (Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação) e do FINBRA (Finanças do Brasil).

O SIOPE, criado em 2007, é responsável pelo acompanhamento do financiamento da educação brasileira. Neste banco de dados, estão arquivadas declarações orçamentárias dos estados e municípios, com detalhamento de receita total e despesas em educação. Além disso, também são encontradas declarações de despesas empenhadas, liquidadas e pagas dos municípios e estados desde 2005. O preenchimento do relatório é obrigatório e o não envio compromete o recebimento de transferências do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) para o ente. Já o FINBRA, organizado pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), contém o balanço orçamentário dos municípios desde 1986 e, portanto, não se limita ao orçamento da educação.

Em relação ao SIOPE, o presente trabalho usou para calcular a despesa em Educação o total declarado com despesas pagas da função Educação, todas as receitas recebidas do Fundeb e as despesas pagas com recursos do Fundeb de 2007 a 2017. Em algumas análises, restringe-se ao ano de 2017 por este ter sido o último ano com dados disponíveis da Prova Brasil. Além disso, o ano de 2018, durante a elaboração deste artigo, possuía muitos municípios e estados com declarações atrasadas e, por isso, foi omitido em algumas análises.

Para manter um conjunto fixo de municípios ao longo do tempo, em alguns casos excluem-se todos os municípios para os quais não fora possível inferir a despesa em educação em pelo menos um ano da amostra (2007–2017). Desta forma, o número de municípios varia de acordo com o exercício. Quando se faz comparações intertemporais — a evolução do índice de Gini, por exemplo —, utilizase a amostra de observações presentes em todos os anos. Por outro lado, quando a análise é feita para um determinado ano, usamos todas as observações presentes naquele ano.

As duas bases, SIOPE e FINBRA, foram utilizadas com objetivos diferentes, como veremos a seguir. No entanto, em ambas as bases, a despesa é contabilizada referente ao ente que usou o recurso na última etapa do orçamento. Por exemplo, se um estado transferir recursos vinculados à educação a um de seus municípios, esta transferência não será contabilizada como despesa do estado,7 7 A transferência também será contabilizada como uma dedução de receita do respectivo Estado. apenas como receita do município que, naturalmente, terá uma contrapartida em despesas do município. P. R. Oliveira e Silva (2019)Oliveira, P. R., & Silva, T. (2019). Despesas municipais em educação no Brasil: Uma avaliação dos dados do SIOPE e FINBRA. fazem uma análise comparando FINBRA e SIOPE e concluem que as duas bases de dados têm qualidade semelhantes. Os autores salientam que resultados agregados, como os utilizados nesta seção, são mais confáveis em comparação a resultados desagregados por subfunção.

A Tabela 1 reporta a composição do Fundeb em 2007 e 2017 após a redistribuição dos recursos e da complementação da União. Os valores estão em R$ bilhões a preços de 2018. O total de verbas recebido do Fundeb (colunas 4 e 9) pelos municípios de cada estado incorpora a complementação da União (colunas 3 e 8). Isso vale para os estados também: o valor transferido para o fundo (colunas 2 e 7) incorpora a complementação da União (colunas 2 e 7). O total geral (colunas 5 e 10) é a soma do total dos estados e dos municípios.

Tabela 1
Verbas do Fundeb em R$ bilhões. Preços constantes de 2018 (IGP-DI)

A Tabela 1 permite analisar as dimensões de cada fundo estadual para os anos de 2007 e 2017. Em 2007, o Fundeb correspondeu a 90,73 bilhões de reais. Nota-se que o Fundo cresceu 60% entre 2007 e 2017, um crescimento de 4,3% ao ano, chegando à casa dos R$150 bilhões. Em 2007, sete estados do Nordeste e o Pará receberam complementação; já em 2017, sete estados do Nordeste, e dois do Norte receberam a complementação.

O artigo também utiliza dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) realizado pelo Inep.8 8 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. O Saeb é uma avaliação bianual de Língua Portuguesa e Matemática aplicada a alunos do 5º e 9º anos do ensino fundamental de forma censitáriana rede pública de ensino edeforma amostral narede privada desde 2005.9 9 O exame também é aplicado a alunos do 3º ano do ensino médio. De 2005 a 2015, o exame ocorreu de forma amostra. A partir de 2017, tornou-se censitário. De 1995 a 2003, o Saeb foi aplicado de forma amostral nas mesmas séries. No entanto, os resultados não são válidos a nível municipal, por isso não são utilizados neste artigo. A avaliação da rede pública é comumente denominada de Prova Brasil. O artigo utiliza as notas de matemática, as taxas de aprovação e a taxa de distorção idade-série para as respectivas séries no nível municipal de 2007 a 2017 disponibilizadas pelo Inep. O ano de 2005 não é utilizado por dois motivos. Primeiro, porque houve uma mudança no critério de elegibilidade das escolas em 2007 (redução do número mínimo de alunos em cada série e inclusão de escolas rurais), fato que aumentou o número escolas elegíveis. E segundo, porque em 2005 não há dados no nível do aluno que permita estimar se o mesmo está na série indicada para a idade.10 10 O artigo foca no papel redistributivo do Fundeb e não em seus possíveis efeitos sobre acesso à educação. De acordo com G. F. d. Cruz e Rocha (2018), o efeito sobre frequência escolar é pequeno.

4. O gasto em educação sem o Fundeb

4.1 Metodologia

As regras de redistribuição dos recursos do Fundeb geram estados e municípios “ganhadores” e “perdedores” a cada ano. Há estados e municípios que recebem um valor maior em relação ao que injetaram no fundo, e há os que recebem um valor menor. São definidos como ganhadores os entes enquadrados no primeiro caso. Em tese, sem o Fundeb, os ganhadores teriam menos recursos para despender em educação. Por outro lado, os perdedores teriam mais recursos para gastar tanto em educação como em qualquer outra área, já que estes recursos não seriam vinculados.

Para sistematizar a análise, define-se como ganhador o município com transferência líquida positiva com o Fundeb em todos os anos no período de 2007 a 2017. Analogamente, os municípios com transferências líquidas negativas com o Fundeb entre 2007 e 2017 serão denotados como Perdedores. Finalmente, os municípios que tiveram saldo positivo em alguns anos e negativo em outros são classificados como Indefinidos. De acordo com essa classificação, 15% (901) do total de municípios brasileiros são Perdedores, 55% (3.141) são Ganhadores e os 30% (1.669) restantes são Indefinidos.

A proposta do artigo, de analisar equidade e sua relação com qualidade da educação, será implementada utilizando o gasto por aluno para municípios. O gasto por aluno é calculado pela razão entre o gasto total em educação e total de matrículas em cada ano. Vale lembrar que o gasto em educação é contabilmente equivalente à soma dos recursos próprios e transferências despendidas em educação e os gastos com recursos do Fundeb. Como regra geral, os gastos dos recursos do Fundeb devem ser feitos no mesmo ano de exercício de seu recebimento.

O gasto por aluno na educação básica é estimado em dois cenários: a) o cenário com o Fundeb, ou seja, o gasto por aluno realmente despendido por cada município; e b) o cenário sem o Fundeb: o gasto hipotético por aluno caso não houvesse o Fundeb. No caso (b), descontam-se do gasto por aluno as transferências líquidas entre o município e o Fundeb. Ou seja, para municípios ganhadores, o gasto por aluno será menor no cenário contrafactual, enquanto para municípios perdedores, o gasto por aluno será maior.

A simulação acima é limitada no sentido de não capturar possíveis ajustes na alocação do orçamento dos municípios frente à inexistência do Fundeb. Não há garantias de que perdedores iriam alocar os recursos perdidos com o Fundeb em educação (uma vez que estes estariam livres de vinculação) nem que ganhadores não iriam retirar recursos de outras áreas para substituir o que for perdido na ausência do Fundeb. Vale notar também que o cenário contrafactual (eliminação do Fundeb) resultaria de uma reforma fiscal, que certamente teria impactos não triviais em diversos setores da economia por conta da alteração dos incentivos aos agentes econômicos, o que poderia alterar a determinação do Produto Interno Bruto. Dessa forma, a própria receita dos impostos vinculados ao Fundeb poderia ser alterada, não por conta da reforma em si, mas por conta de seus efeitos. Além disso, Mattos et al. (2018)Mattos, E., Politi, R., & Yamaguchi, A. (2018). Grants and dispersion of local education spending in Brazil. Regional Studies, 52(2), 239–249. http://dx.doi.org/10.1080/00343404.2017.1287891
http://dx.doi.org/10.1080/00343404.2017....
e T. Cruz e Silva (2020)Cruz, T., & Silva, T. (2020). Minimum spending in education and the fypaper effect. Economics of Education Review, 77(102012). http://dx.doi.org/10.1016/j.econedurev.2020.102012
http://dx.doi.org/10.1016/j.econedurev.2...
argumentam que a origem dos recursos pode ser importante na alocação dos gastos (Flypaper effect). Uma análise que leve em consideração todos esses fatores, no entanto, está fora do escopo deste artigo. Nesse sentido, os resultados apresentados e reportados devem ser interpretados com a devida cautela.

A partir dos dois cenários, primeiramente será estimado o efeito que o Fundeb possui sobre a distribuição de recursos entre municípios. Para isso, será utilizado o índice de Gini de desigualdade de gasto por aluno. Este índice mede quão longe se está de uma distribuição completamente igualitária de gasto por aluno, ou seja, do cenário em que todos os municípios gastam exatamente o mesmo valor nominal.

Em seguida, para avaliar em que medida a redistribuição promovida pelo Fundeb está associada à qualidade da educação, estima-se a relação entre gasto por aluno e desempenho na Prova Brasil com os dados observados na realidade e atribui-se essa relação ao cenário contrafactual para estimar o desempenho médio dos alunos se não houvesse Fundeb. Vale ressaltar que a metodologia adotada não permite interpretações causais dos efeitos encontrados.

Formalmente, conforme demonstrado em Angrist e Pischke (2008)Angrist, J. D., & Pischke, J.-S. (2008). Mostly harmless econometrics: An empiricist’s companion. Princeton University Press., denotando Y como a nota média do município e X como o valor gasto por aluno do mesmo município, ambos em um mesmo período, a Função de Esperança Condicional E[YX] é o previsor de Erro Quadrático Médio Mínimo de Y dado X. Também seria fácil demonstrar que o modelo linear é a melhor aproximação da Função de Esperança Condicional E[YX]. Nesse sentido, para realizar esta simulação, basta regredir a nota média sobre o gasto por aluno com o Fundeb e depois usar o coeficiente e a constante da regressão junto com o gasto por aluno sem o Fundeb e gerar a variável simulada. Essa operação é representada pela equação abaixo:

(1) N o t a C m , e , t = β ^ 0 + β ^ 1 G a s t o C m , e + β ^ 2 G a s t o C m , e 2 + β ^ 3 G a s t o C m , e 3 + γ ^ e + δ ^ t ,

onde Nota Cm,e,t é a nota média do município m do estado e em um cenário sem Fundeb no período de tempo t contido no conjunto de anos impares entre 2007 e 2017 (aplicação da Prova Brasil); Gasto Cm,e é o gasto contrafactual por aluno do município m em um cenário sem Fundeb; γ^e é o efeito fixo do estado do município; e δ^t é o efeito fixo de tempo. Juntamente com β^0 a β^3 são os parâmetros estimados por Mínimos Quadrados Ordinários a partir da equação abaixo:

(2) N o t a m , e , t = β 0 + β 1 G a s t o m , e + β 2 G a s t o m , e 2 + β 3 G a s t o m , e 3 + γ e + δ t + ε m , e , t ,

onde Notam,e,t e Gastom,e são, respectivamente, a nota média observada e o gasto por aluno observado no município m no estado e; e ϵm,e é o termo de erro aleatório. Como pode ser observado na Figura 1, seria difícil argumentar que a nota seja um polinômio de grau 1 dos gastos. O polinômio que maximiza o R2 ajustado da equação (2) é o de grau 9; porém este modelo introduz muita variância nas simulações. Optou-se por adotar um polinômio de grau 3, que resulta no segundo maior R2 ajustado, com uma diferença muito pequena para o polinômio de grau 9, mas com a vantagem de não introduzir muita variância nas simulações.

Figura 1
Relação entre gasto por aluno e desempenho em matemática na Prova Brasil –2017

Além da nota média, estima-se também o efeito sobre a taxa de aprovação e o percentual de alunos com defasagem idade-serie. Para isso, basta substituir a nota média na equação (2) pelas respectivas variáveis para se obter um cenário sem Fundeb.

4.2 Ganhadores e Perdedores

Primeiramente, analisa-se o perfil dos municípios em cada grupo de acordo com a transferência líquida com o Fundeb. A Tabela 2 reporta, para municípios, o gasto observado por aluno, transferência líquida com o Fundeb por aluno, número de matrículas, nível de proficiência e receita de impostos locais por habitante. A tabela apresenta as estatísticas para 2007 e 2017. Os valores monetários estão a preços de 2018, tanto desta quanto das próximas tabelas. Todas as variáveis são estimadas para Ganhadores, Perdedores e Indefinidos. As diferenças entre Ganhadores e Perdedores são reportadas na última coluna da tabela.

Tabela 2
Características dos municípios de acordo com transferência líquida com o Fundeb – 2007 e 2017

Tanto em 2007 quanto em 2017, o gasto por aluno observado foi consideravelmente maior para os municípios perdedores, mesmo após a redistribuição promovida pelo fundo. Em 2007, o município perdedor gastou em média 118% a mais que o ganhador. Em 2017, o mesmo percentual ficou em 72%. Parte da redução se deve ao fato de que aumentar gastos que já estão em níveis mais elevados é mais difícil (o gasto médio dos ganhadores aumentou 79,5% enquanto o dos perdedores, 41,8%). Em termos absolutos, no entanto, a diferença média aumentou ligeiramente.

Em média, um município ganhador recebeu R$1.823 por aluno em 2007 (transferência líquida).11 11 O valor líquido é dividido pelo número de matrículas para se chegar ao valor transferido por aluno. Para os perdedores, Isso supõe que o valor transferido ao fundo iria para educação caso não houvesse vinculação. Por outro lado, um município perdedor transferiu um volume de recursos equivalente a aproximadamente R$5.000 por aluno. Enquanto esse montante se reduziu em 2017 em cerca de 40%, o valor médio recebido pelos ganhadores aumentou em torno de 10%. Chama a atenção o fato de que os municípios perdedores são municípios pequenos, com menos de 1000 matrículas em média. Isso ocorre porque, de acordo com as regras do Fundo e com os dados, quanto maior o número de matrículas, maior a probabilidade de o município ser identificado como ganhador. Os municípios de Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo, são ganhadores de acordo com o critério. Cabe salientar também que, em geral, municípios com mais receita própria por habitante têm maior probabilidade de classificação como Perdedores. Isso não significa, no entanto, que os municípios com maior volume absoluto de receitas são os perdedores.

A Tabela 2 traz adicionalmente indicadores associados à qualidade da educação: desempenho na Prova Brasil em Matemática, Taxa de Aprovação e a Taxa de Alunos Defasados para anos iniciais do Ensino Fundamental.12 12 Primeiro ao quinto ano. Observa-se que os municípios ganhadores em 2007 tinham média de desempenho abaixo da observada para municípios perdedores, 18 pontos em média, o que equivale, grosso modo, a pouco mais de um ano de escolaridade. Dez anos depois, todos os grupos de municípios melhoraram seu desempenho médio; porém, a diferença entre ganhadores e perdedores aumentou, para 25 pontos em média, equivalente a dois anos de escolaridade.

Em termos de aprovação, em 2007, os municípios perdedores aprovavam 91% de seus alunos, o equivalente a 10 pontos percentuais acima dos municípios ganhadores (81%). Em 2017, a taxa de aprovação cresceu em ambos os grupos de municípios; porém, a diferença entre os grupos se reduziu para 5 pontos percentuais. Em outras palavras, a taxa de aprovação cresceu mais para o grupo de municípios ganhadores, que contava com um nível mais baixo de aprovação anteriormente.

No que se refere ao percentual de alunos defasados, em 2007, os municípios perdedores possuíam um percentual de 26%, 16 pontos percentuais abaixo dos municípios ganhadores (42%). O percentual dos ganhadores (30%) e dos perdedores (16%) caiu em 2017, bem como a diferença entre eles (14 pontos percentuais).

Em geral, os dados acima apontam que o Fundeb transfere recursos de municípios com melhor desempenho acadêmico (perdedores) para municípios com pior desempenho acadêmico (ganhadores).

4.3 Gasto real vs contrafactual

Nesta seção são reportados os resultados da estimativa do gasto por aluno contrafactual e uma comparação com os dados do gasto de fato realizado. A Tabela 3 apresenta, para cada ano, a média e o desvio-padrão do gasto por aluno para municípios. Cabe ressaltar que os valores são calculados apenas para as redes municipais. À esquerda, encontra-se o gasto real e à direita, o gasto contrafactual.

Tabela 3
Gasto médio por aluno real e contrafactual para redes municipais (em R$2018) – 2007–2018

Como pode ser observado, o gasto médio real é maior que o contrafactual na maioria dos anos. Isso ocorre porque, sem o Fundeb, não há complementação da União. Além disso, o desvio-padrão para o gasto real é consideravelmente menor do que o desvio-padrão para o gasto contrafactual. Tal fato se deve ao caráter redistributivo do Fundeb implicando maior variância e concentração de gastos caso não houvesse o Fundeb. Em alguns anos, o desvio-padrão é maior que a média, indicando grande variabilidade de gasto por aluno entre as redes municipais.

4.4 Equidade

Esta seção traz evidências adicionais a respeito da equidade do gasto após a análise descritiva na seção anterior. A Figura 2 reporta a evolução temporal do índice de Gini do gasto por aluno das redes municipais do Brasil. A partir deste gráfico, as análises serão feitas para os municípios que estiveram presentes em todos os anos no SIOPE. O índice é calculado para cada ano a partir dos dados observados (linha hachurada) e para o cenário contrafactual (linha contínua). Vale lembrar que o índice varia de zero a um, sendo que valores menores indicam menor desigualdade.

Figura 2
Evolução do índice de Gini com e sem Fundeb entre todos os municípios

A figura mostra a redução no índice de Gini ao longo dos anos, com ou sem Fundeb. No entanto, nota-se que, para o caso com Fundeb, a redução entre 2006 e 2010 é mais acentuada do que a redução sem o Fundeb. Nesse sentido, pode-se argumentar que o Fundeb, introduzido em 2007, acelerou a queda da desigualdade de gastos por aluno, ainda que a queda já viesse ocorrendo antes do Fundeb.

Além disso, a figura mostra ainda uma grande diferença entre os índices com e sem o Fundeb ano a ano. A cada ano, a desigualdade estimada é sempre maior no cenário sem o Fundeb. Em 2007, a desigualdade com Fundeb é 57% menor; já em 2017, é 80% menor. Em média, o índice de Gini com o Fundeb é 74% menor que o índice para o cenário sem Fundeb no período analisado. Tal resultado significa que o Fundeb está associado a uma grande redução na desigualdade dos gastos por aluno em educação entre municípios. A próxima seção analisa algumas das consequências dessa redução.

4.5 Efeitos sobre qualidade

A redistribuição de recursos, na prática, gera um aumento de gasto para os municípios ganhadores e redução de gasto para perdedores. Em que medida isso se associa com a qualidade da educação?

A Tabela 4 agrupa os municípios por gasto por aluno dividindo-os em percentis para o ano de 2017. Esta estimação usa o conjunto de municípios que estavam presentes em todos os anos da amostra, ainda que ela trate apenas do ano de 2017. Para cada grupo, apresenta-se uma série de estatísticas, algumas já apresentadas no texto, mas reportadas novamente neste outro formato por conveniência.

Tabela 4
Características dos municípios por percentil de gasto por aluno

A distribuição de gasto é aproximadamente normal, haja vista o número de municípios por grupo. Observa-se que os municípios com maior média de gasto por aluno perdem recursos para o Fundeb, possuem nota média e taxa de aprovação maiores e menor taxa de defasagem escolar. Eles também possuem um número de matrículas menor que a média de todos os municípios.

Uma vez que o gasto por aluno com e sem Fundeb estão estimados ao nível do município, pode-se simular como essa diferença de gastos alterariam indicadores de qualidade da educação. Usando a metodologia exposta na seção 4, foi estimada a distribuição contrafactual de desempenho em matemática, da taxa de aprovação e da taxa de distorção idade-série no nível do município. A Tabela 5 mostra os resultados. Para cada variável, apresenta-se a média observada, a média simulada, e a diferença entre as médias. Vale notar que, neste exercício, utilizam-se dados de municípios que estiveram presentes em todos os anos de 2007 a 2017, mas incluindo apenas os anos em que a Prova Brasil fora realizada.

Tabela 5
Nota média em matemática, taxa de aprovação e taxa de distorção idade-série real e simulada

Pode-se notar que a nota de matemática, a taxa de aprovação e a taxa de alunos defasados dos alunos dos anos iniciais do ensino fundamental não sofrem muito impacto devido ao Fundeb. De fato, em 2007, as notas sem o Fundeb seriam 1,3 ponto menor, a taxa de alunos defasados aumentaria em 1,2 ponto percentual e a taxa de aprovação diminuiria em 0,8 ponto percentual. Tal resultado está associado à pequena diferença entre as médias dos gastos em educação com e sem Fundeb. Pode-se observar que, em 2017, as notas diminuiriam 2,7 pontos, a taxa de alunos defasados aumentaria 2,2 pontos percentuais e a taxa de aprovação diminuiria em 1,4 pontos percentuais.

A Tabela 5 apresentou o resultado agregado. A Tabela 6 reporta os resultados separados para cada grupo de municípios de acordo com a transferência líquida para o Fundeb. Nesta estimação, as regressões (equação (2)) e o cálculo das médias das simulações (equação (1)) ocorrem separadamente para cada grupo de municípios (ganhadores, perdedores e indefinidos). As colunas 1, 3 e 5 mostram o valor médio da nota em matemática, da distorção idade-série e da aprovação para cada grupo considerando o cenário real, respectivamente. As colunas 2, 4 e 6 apresentam a diferença entre a média sob o Fundeb e a média sem a existência do Fundeb para cada grupo. Assim, valores positivos indicam que a média é maior com o Fundeb.

Tabela 6
Nota média em matemática e taxa de aprovação real e simulada por categorias de municípios

De forma geral, a existência do Fundeb está associada a uma melhora nos indicadores de qualidade para ganhadores e a uma piora, em menor magnitude, para os perdedores. Observa-se na coluna 2 que os valores estimados para o cenário com Fundeb são maiores para desempenho em matemática e aprovação e menores para distorção idade-série. Por outro lado, a coluna 4 mostra o inverso: com Fundeb, os valores para perdedores são menores em matemática e aprovação e maiores para distorção idade-série. Comparando as colunas 2 e 4, nota-se que os ganhadores melhoram mais do que os perdedores pioram quando se passa de um cenário sem Fundeb para outro com Fundeb. Na coluna 6, pode-se observar que as diferenças entre desempenho em matemática, distorção série-idade e taxa de aprovação não são estatisticamente significativas para os indefinidos. Em outras palavras, a ausência ou presença do Fundeb não faz diferença para os indefinidos.

A Tabela 6 indica também que não há uma tendência de aumento ou redução das diferenças entre os cenários ao longo do tempo. Isso sugere que, mesmo sem o Fundeb, os indicadores continuariam a evoluir no período. Em todos os indicadores, a melhora entre 2007 e 2017 é mais significativa que a diferença observada entre os cenários. Por exemplo, a nota em matemática avançou 27,8 pontos entre os ganhadores com a presença do Fundeb. Na ausência do mesmo, a nota avançaria 26,1. A distorção idade-série recuou 9,1 pontos percentuais entre perdedores com Fundeb, mas teria recuado 9,2 na ausência do Fundeb.

Os resultados são intuitivos. Ganhadores tenderiam a reduzir o gasto por aluno enquanto perdedores fariam o contrário caso o Fundeb não existisse, afetando a qualidade da educação. No entanto, as diferenças entre os cenários são bastante modestas, principalmente para os perdedores. De fato, como observado na Figura 1, há uma associação positiva entre gasto por aluno e desempenho (Matemática – Prova Brasil 2017) até aproximadamente R$7.000. Como boa parte dos municípios ganhadores gasta menos que isso, espera-se um aumento da nota média para este grupo. Por outro lado, reduzir o gasto para municípios que já gastam acima da média não estaria associado a grandes perdas. Isso ressalta o caráter redistributivo do Fundeb. Vale lembrar que este não é um resultado que possa ser considerado causal, dadas as limitações do estudo, o qual se baseia em uma análise estática. Em particular, não se leva em consideração a reação de municípios e estados sobre o quanto gastar em educação na hipótese de o Fundeb deixar de existir da noite para o dia.

5. Um Fundeb Nacional

Ainda que seja redistributivo, o Fundeb possui uma distorção: o fato de municípios ricos em estados pobres poderem receber valores por aluno maiores que municípios pobres de estados ricos. Esta seção tem como objetivo simular a distribuição de recursos do Fundeb caso o fundo tivesse outras regras e avaliar em que medida esse novo Fundeb reduziria aquela distorção. Como dito anteriormente, o Fundo redistribui recursos para os municípios dentro de cada estado proporcionalmente ao número de matrículas na educação básica das redes municipais e das redes estaduais. Após somar todo o valor dos 27 Fundos, a União faz uma complementação de 10% sobre este total. A complementação é direcionada para os Fundos de estados que não atingiram um mínimo de gasto por aluno definido nacionalmente a cada ano.

A proposta a seguir geraria o “Fundeb Nacional”. A primeira regra a ser alterada seria a redistribuição a nível estadual para uma redistribuição a nível nacional. Em outras palavras,ao invés dos 27 fundos formados comosrecursos de seus respectivos municípios e estados, a simulação faz a fusão destes 27 fundos, gerando um único fundo nacional. A seguir, a União complementaria o fundo com os mesmos 10% atuais.13 13 Importante salientar uma hipótese para a realização destes exercícios: a capacidade de arrecadar recursos dos estados e municípios (esforço, coordenação, combate à evasão) não pode ser afetada pela fusão do Fundeb em um Fundeb Nacional. No Fundeb Nacional, os recursos seriam distribuídos proporcionalmente ao número de matrículas das redes estaduais e municipais, independentemente da localização das matrículas.

A metodologia realizada consiste na seguinte forma: 1) Dados do FINBRA são coletados para extrair as informações do total recebido de cada um dos 27 Fundos com origem derecursos próprios edo totalrecebido com origem de complementação, ambas separadas pelas redes municipais e estaduais; 2) Calcular a ponderação para cada ente federativo do Fundeb real e do contrafactual Fundeb Nacional com dados do Censo da Educação Básica e pesos de acordo com o art. 36 da Lei 11.494 de 2007; 3) Estimações dos valores recebidos pelo Fundeb real e pelo Fundeb Nacional com as equações abaixo:

(3) F u n d R e a l r , e = w r r , e × F r , e
(4) F u n d N a c i o n a l r , e = w n r , e × F N r ,

onde r se refere à rede estadual ou municipal; e se refere ao ente federativo (um dos mais de 5.000 municípios brasileiros ou um dos 26 estados e DF); Fr,e se refere ao total anual recebido por cada um dos 27 Fundos, ou seja, são os recursos próprios somados a complementação da União para cada rede r; wrr,e é o peso de cada ente federativo14 14 Como os valores estão separados por redes, wrr,e assume valor 1 quando referente a uma UF e valores menores que 1 quando referente a um município (em relação a todos os municípios da UF). do Fundeb real; wnr,e é o peso de cada ente federativo do Fundeb Nacional FNr é o valor total recebido pelos 27 Fundos somados ao nível nacional incluindo a complementação separado por rede r.

Intuitivamente, o Fundeb Nacional aumenta a transferência de recursos entre municípios e estados. Por um lado, ao não restringir a distribuição de recursos de um determinado estado apenas a municípios do mesmo estado, há uma transferência de recursos de estados ricos para estados pobres. Por outro lado, a complementação da União, que antes tinha como destino apenas estados pobres, agora passa a ter como destino todos os estados. Nos dois casos, os maiores beneficiários são os municípios mais pobres.

Após adefinição dovalor que cada ente receberia, somam-se as demais despesas com educação para se chegar ao valor do gasto por aluno em cada ente. Essa nova distribuição será comparada à distribuição do gasto por aluno original, ou seja, aquela observada atualmente (no caso, para o ano de 2017).

Uma proposta alternativa seria direcionar a complementação da União aos municípios com menor poder de arrecadação, algo na linha sugerida pela PEC 15/2015.15 15 https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=1198512. Nesse sentido, uma segunda simulação é realizada da forma descrita a seguir. O fundo único, composto pelos 27 fundos estaduais e distrital, não incluirá a complementaçãodaUnião inicialmente. Primeiramente, será obtido o valor recebido do Fundeb Nacional para cada ente, tal qual a equação (4), com a diferença de que FN não inclui a complementação da União. Esta será distribuída aos municípios e estados de acordo com o valor por aluno (respeitados os devidos pesos do Fundeb) obtido após a soma dos recursos do fundo único com as demais receitas vinculadas à educação (recursos próprios e outras transferências). A distribuição ocorrerá a partir do ente com menor valor por aluno, de modo a igualar o segundo menor valor por aluno. A seguir, distribuem-se recursos aos dois entes com menor valor por aluno a fim de igualar o valor por aluno do terceiro ente com menor valor por aluno. E assim sucessivamente, até que se esgotem os recursos da complementação da União.

As diferenças deste mecanismo para aquele utilizado no atual Fundeb são duas: i) a ordenação dos entes federativos não obedece a ordenação dos estados; ii) o valor por aluno não inclui apenas os recursos do Fundeb. A distribuição final do gasto por aluno entre municípios de acordo com a segunda alternativa para o novo Fundeb será comparada com as duas anteriores: a original e a do Fundo Nacional.

A Tabela 7 reporta estatísticas descritivas para os três casos: Fundeb original (colunas 1 e 4), Fundeb Nacional (colunas 2 e 5) e Fundeb Nacional com complementação à parte (colunas 3 e 6). Os valores reportados referem-se ao gasto por aluno em educação de estados e municípios, considerando todos os gastos e não somente os recursos do Fundeb. As simulações não excluem entes sem informações sobre os gastos, mas estes são omitidos do resultado devido à necessidade de contar com essas informações na fase final das estimações. Novamente, vale ressaltar que não se leva em consideração nessas simulações o fato de que alterações nas regras do Fundeb resultariam em mudança de comportamento por parte dos municípios, que reagiriam de modo a ajustar receitas e despesas.

Tabela 7
Gasto por aluno resultante de três versões do Fundeb: Fundeb Original, Fundeb Nacional e Fundeb Nacional com complementação à parte – 2017

De modo geral, o Fundeb Nacional reduz menos a desigualdade do gasto por aluno entre municípios do que o Fundeb Nacional com complementação à parte. Ao mesmo tempo, ambos reduzem o gasto médio e mediano relativamente ao cenário original. O gasto médio por aluno dos municípios cairia R$83 (1%) no primeiro caso e R$219 (3%) no segundo caso. Por outro lado, o desvio-padrão cairia 9% com o Fundeb Nacional e 15% com o Fundeb Nacional com complementação à parte. Observa-se também um aumento de 9% no gasto do município na cauda inferior da distribuição de gasto sob as regras do Fundeb Nacional, enquanto no Fundeb Nacional com complementação à parte, o aumento seria o dobro disso. Finalmente, o índice de Gini de desigualdade de gasto se reduziria 14% no primeiro caso, e pela metade (0,11 pontos) no segundo.

Entre estados, apenas o Fundeb Nacional reduziria a desigualdade, com o desvio-padrão sendo 13% menor. No caso do Fundeb Nacional com complementação à parte, o desvio-padrão aumentaria 15%. Este também é o valor percentual de aumento no gasto médio por aluno para estados. Entretanto, note que, apesar do aumento da desigualdade, esta continua sendo menor que a observada entre municípios. Ademais, o aumento do valor médio do gasto por aluno aproxima o valor gasto por estados daquele observado para municípios. Sob o Fundeb original, o gasto médio dos municípios é 13% maior que o dos estados; sob o Fundeb Nacional com complementação à parte, o gasto dos estados é 5,5% maior.

Assim, em um cenário sem aumento de recursos totais, ambas as alternativas reduziriam a desigualdade de gasto por aluno entre municípios, sendo que utilizar a complementação para favorecer os que arrecadam menos teria um efeito maior em termos de equidade do gasto. As duas simulações também gerariam aumento do gasto por aluno dos estados, aproximando-os do gasto observado para os municípios. No entanto, uma aproximação maior em termos de média de gastos aumentaria a desigualdade entre os estados, ainda que esta desigualdade continue menor que entre municípios.

O objetivo desta seção foi apenas o de levantar a discussão sobre a renovação do Fundeb e mostrar que há espaço para aprofundar o caráter redistributivo do fundo. Dado o vencimento do atual Fundeb em 2020, há uma boa oportunidade para aprimorar o mais importante mecanismo de financiamento da educação pública no Brasil. Uma dificuldade para se implementar um Fundo Nacional na prática é que estados de maior renda transfeririam recursos para estados de menor renda, o que certamente geraria resistência por parte dos estados mais ricos. Seria necessário um período de transição, com ressarcimento ou não das perdas. Outra ideia seria, por exemplo, utilizar a complementação da União para gerar incentivos a estados e municípios para melhorar a qualidade da educação, algo na linha do que o estado do Ceará faz com os recursos do ICMS e do que consta na PEC 15/2015.

6. Conclusão

Este artigo apresentou primeiramente uma visão geral sobre o Fundeb. Definiu-se a estrutura do Fundo, explicou-se sua forma de atuação, importância, origem histórica e magnitude. Em seguida, analisou-se o papel do Fundeb sobre a equidade do gasto entre municípios. Destaca-se o papel do Fundeb na redução de desigualdades dos gastos por aluno entre as redes municipais. Em 2017, a existência do Fundeb está associada a uma redução do índice de Gini em mais de 50%.

O artigo discutiu também o que ocorreria com a equidade do gasto caso as regras do Fundeb fossem alteradas. Uma proposta seria a criação de um Fundo Nacional que juntasse os recursos de todos os fundos para serem distribuídos em seguida. A distribuição dos recursos não mais ocorreria somente entre municípios de um mesmo estado, mas, sim, entre todos os entes da federação. Isso tenderia a potencializar a redistribuição de recursos, reduzindo ainda mais as diferenças de gasto por aluno entre estados e municípios. Outra proposta seria a distribuição da complementação da União de acordo com ovalor por aluno antes da distribuição dos recursosdo Fundeb. A segunda alternativa tem potencial para reduzir a desigualdade de gasto por aluno entre os municípios ainda mais que a primeira. Vale lembrar que as análises são limitadas pelo fato de não modelar a reação dos municípios na ausência do Fundeb.

A existência ou não do Fundeb não parece afetar substancialmente indicadores de qualidade da educação medida por desempenho dos alunos em Matemática, taxa de aprovação e distorção idade-série. No entanto, há algumas diferenças entre ganhadores e perdedores. As simulações realizadas indicam que o grupo de ganhadores teria nota média em matemática na Prova Brasil um pouco menor caso não houvesse Fundeb, ao passo que, para os perdedores, ocorreria o contrário, mas em magnitude ainda menor. No entanto, este não é um resultado causal; não se pode deixar de salientar que esta correlação omite variáveis importantes que podem afetar conjuntamente desempenho e gastos. Por exemplo, municípios ineficientes provavelmente gastam mais por aluno com uma gestão escolar ruim, o que deve afetar as notas negativamente. Um estudo focando em causa-efeito do gasto nas notas poderia solucionar este problema e realizar simulações mais rigorosas nesta dimensão.

  • 1
    Dados compilados a partir de Maduro (2007)Maduro, P. R. R., Jr. (2007). Taxas de matrícula e gastos em educação no Brasil (Dissertação de Mestrado em Economia, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro). http://hdl.handle.net/10438/110
    http://hdl.handle.net/10438/110...
    , FINBRA, SIOPE, Siga Brasil, Portal Transparência, Inep, e IBGE.
  • 2
    Para uma análise do sistema de financiamento brasileiro, ver J. A. d. Castro e Sadeck (2003)Castro, J. A. d., & Sadeck, F. (2003). Financiamento do gasto em educação das três esferas de governo em 2000 (Texto para Discussão Nº 955). Ipea. http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/2887
    http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11...
    .
  • 3
    De acordo com a lei, o fundo seria composto por 15% do ICMS e IPI e 15% do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e IPI.
  • 4
    20% do FPM, ITR, IPVA e ITCMD.
  • 5
    20% do ITR, ICMS, ITCMD e de transferências do FPE.
  • 6
    Matrículas em diferentes etapas de ensino recebem pesos diferentes. A lista completa de pesos é reportada na Lei 11.494.
  • 7
    A transferência também será contabilizada como uma dedução de receita do respectivo Estado.
  • 8
    Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.
  • 9
    O exame também é aplicado a alunos do 3º ano do ensino médio. De 2005 a 2015, o exame ocorreu de forma amostra. A partir de 2017, tornou-se censitário. De 1995 a 2003, o Saeb foi aplicado de forma amostral nas mesmas séries. No entanto, os resultados não são válidos a nível municipal, por isso não são utilizados neste artigo.
  • 10
    O artigo foca no papel redistributivo do Fundeb e não em seus possíveis efeitos sobre acesso à educação. De acordo com G. F. d. Cruz e Rocha (2018)Cruz, G. F. d., & Rocha, R. (2018). Efeitos do FUNDEF/B sobre frequência escolar, fuxo escolar e trabalho infantil: Uma análise com base nos censos de 2000 e 2010. Estudos Econômicos, 48(1), 39–75. http://dx.doi.org/10.1590/0101-4161481239gcr
    http://dx.doi.org/10.1590/0101-416148123...
    , o efeito sobre frequência escolar é pequeno.
  • 11
    O valor líquido é dividido pelo número de matrículas para se chegar ao valor transferido por aluno. Para os perdedores, Isso supõe que o valor transferido ao fundo iria para educação caso não houvesse vinculação.
  • 12
    Primeiro ao quinto ano.
  • 13
    Importante salientar uma hipótese para a realização destes exercícios: a capacidade de arrecadar recursos dos estados e municípios (esforço, coordenação, combate à evasão) não pode ser afetada pela fusão do Fundeb em um Fundeb Nacional.
  • 14
    Como os valores estão separados por redes, wrr,e assume valor 1 quando referente a uma UF e valores menores que 1 quando referente a um município (em relação a todos os municípios da UF).
  • 15
  • *
    Os autores gostariam de agradecer a Ricardo Cavalcanti (editor), Talita Silva e um parecerista anônimo por sugestões e comentários. Agradecem ainda a Casemiro Campos e Isabella Helter pela excelente assistência dada a esta pesquisa.
  • Este autor agradece o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.
  • JEL Codes G1, H1, H5, I2

Referências bibliográficas

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    01 Ago 2020
  • Aceito
    01 Mar 2021
Fundação Getúlio Vargas Praia de Botafogo, 190 11º andar, 22253-900 Rio de Janeiro RJ Brazil, Tel.: +55 21 3799-5831 , Fax: +55 21 2553-8821 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rbe@fgv.br