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ANÁLISE DA IMPORTÂNCIA CLÍNICA DA ROTINA DA VERIFICACÃO DA FREQÜÊNCIA RESPIRATÓRIA EM PACIENTES HOSPITALIZADOS

I - INTRODUÇÃO

Sinais vitais sempre foram elementos importantes como auxílio no prognóstico clínico de doenças, principalmente das infecciosas, e numa época em que outros recursos de diagnóstico eram precários.

Segundo observações de GARCIA e TOSCANO (1966)2 GARCIA, Lourdes T. & TOSCANO, P.A.D. - A rotina hospitalar de T.P.R. e seu papel em bons e eficiente cuidados de enfermagem. Rev. Bras. Enf. 19 (4) :303-315, ago. 1966., "a rotina hospitalar de T.P.R. (temperatura, pulso e respiração), quando não estabelece critérios definidos como base para julgamento, deixa livre o campo para que critérios pessoais e individuais sejam seguidos. Estes critérios individuais podem desvalorizá-lo, ou "rotinizá-lo" a tal ponto, que a forma original sobre modificações, mesmo onde não entre o julgamento individual".

CANETTO (1964)1 CANETTO, Victaria - T.P.R. q. 4 h ad infinitum? Amer. J. Nurs., 64 (11): 132, Nov. 1964. afirma que a medida periódica dos sinais vitais tem-se tornado menos importante e que o número de rotinas tem continuado o mesmo, embora os médicos façam pouco uso dessas anotações.

Com o advento dos novos métodos de diagnóstico, assim como dos tratamentos, a rotina repetida da verificação de freqüência respiratória (F.R.) parece que não continua com a mesma importância clínica.

Podemos então aceitar a opinião de WALKER e SELMANOFF (1965)3 WALKER, Virgínia & SELMANOFF E. - A note on the accuracy of the Temperature, Pulse and Respiration Procedures. Nurs. Research 14 (1): 72-77, 1965. quando levantam a hipótese de que a enfermagem tem procedimentos que tendem a ser apenas um ritual por natureza.

Posto isto, consideramos que um estudo sobre a rotina de verificação da freqüência respiratória forneceria resultados para serem discutidos, avaliados, e que permitiria a realização de outros trabalhos de interesse no campo de enfermagem.

Hipótese de trabalho: há um decréscimo de importância da verificação da freqüência respiratória como atividade de rotina.

Oobjetivo do presente trabalho será avaliar a hipótese anteriormente formulada, isto é, "há um decréscimo da importância da verificação da freqüência respiratória como atividade de rotina".

II - MATERIAL E MÉTODO

Tomaram-se todos os prontuários dos pacientes que tiveram alta nos meses de março e abril, no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, que estavam internados nas Clínicas Médica e Cirúrgica* * As monitoras de Enfermagem Médica participaram da coleta de dados. .

A partir destas, fomos observar informações registradas com respeito à anotação de sinais vitais, anotadas pela enfermagem ou solicitadas pelo médico, a saber: temperatura (T), pulso (P), respiração (R) e pressão arterial (PA).

Poderíamos encontrar prescrição desses sinais vitais, seguida do registro no gráfico pela enfermagem, bem como, prescrições sem registro algum e registros sem prescrição.

Observamos todas as anotações feitas, em três dias consecutivos para cada paciente, tomando-se três dias quaisquer, casualmente, durante seu período de internação.

Dado que o Hospital das Clínicas é um hospital-escola, servindo de treinamento para estudantes de medicina e também enfermeiras, auxiliares de enfermagem e atendentes, procuramos escolher os meses de março e abril, meses estes em que não há nenhuma das três categorias de enfermagem em estágio, fato este que poderia invalidar nossas observações.

Além disso, aplicamos questionários entre médicos das Clínicas Médica e Cirúrgica, em n.º de 20 e 16, respectivamente, e entre 16 enfermeiras das mesmas clínicas.

No questionário para os médicos perguntou-se especificamente:

1) No caso de se eliminar a rotina da verificação de freqüência respiratória, quantos pacientes hospitalizados diretamente sob seus cuidados teriam necessidade daquela rotina?

2) Indique um paciente para quem a verificação da freqüência respiratória lhe interessa por qualquer razão.

No questionário efetuado entre as enfermeiras, perguntou-se especificamente:

  1. Quais os horários que são considerados pela enfermagem como rotina de verificação de TPR e PA?

  2. Quando a prescrição médica é TPR e PA (indica o horário) a enfermeira determina o horário de sua verificação.

  3. Colocar os sinais vitais em ordem de importância, começando do mais importante para o menor importante.

4) Por que consideraria esse último de menor importância?

5) Qual sua opinião a respeito de se eliminar a verificação dessa técnica?

6) Todos os sinais vitais são registrados rotineiramente no gráfico dessa clínica?

7) O que não é registrado poderia ser retirado do gráfico?

Obs.: A repetição quanto ao sentido de algumas questões foi com o propósito de se obter confirmação das respostas anteriores.

III - RESULTADOS

Encontramos 40 prontuários para nossa observação.

Os sinais vitais, prescritos ou registrados nas Clínicas Médica e Cirúrgica do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, estão na tabela 1.

Tabela 01
Sinais vitais prescritos ou registrados nas Clínicas Médica e Cirúrgica do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto.

Observamos que foi prescrito um total de 221 verificações de temperatura e registradas pela enfermagem 295, bem como foram prescritos 198 verificações de freqüência de pulso e registradas 284; de PA prescritas 192 e registradas 226.

Quanto à FR na Clínica Médica não foi prescrita nenhuma vez, tendo sido registradas 28 vezes no gráfico (dado não utilizado pelo médico); entretanto, na Clínica Cirúrgica, foi prescrita 7 vezes a verificação de FR sendo omitido esse procedimento pela enfermagem (prescrição essa, que não foi reclamada pelo médico).

RESULTADO DOS 36 QUESTIONÁRIOS RESPONDIDOS PELOS MÉDICOS DAS CLÍNICAS MÉDICAS E CIRÚRGICA

1) Para a questão, quantos de seus pacientes teriam necessidade da rotina de FR, 29 médicos responderam que todos ou alguns.

Apenas 5 deles responderam nenhum.

2) Para a solicitação de indicar para qual paciente a FR interessa, 16 médicos indicaram pelo menos um paciente e 20 médicos não indicaram paciente algum.

Quanto a sugestão dadas pelos médicos as opiniões mais freqüentes foram agrupadas nos seguintes itens:

a) nos primeiros 3 dias de pós-operatório;

b) para pacientes cardíacos ou patologia arterial;

c) complicações pulmonares, como enfisema e edema agudo;

d) deve ser vista apenas em casos especiais.

As sugestões menos freqüentes foram assim agrupadas:

e) não se deve eliminar porque é importante na avaliação da gravidade do quadro clínico;

f) pacientes neurológicos;

g) distúrbios eletrolíticos e paciente renal crônico;

h) paciente idoso.

RESULTADO DOS 16 QUESTIONÁRIOS RESPONDIDOS PELAS ENFERMEIRAS DO HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO

1) Horário de rotina de verificação do TPR e PA:

11 enfermeiras responderam ser às 8 e às 16 horas;

4 enfermeiras responderam ser cada 4 horas;

1 enfermeira respondeu ser a critério de cada enfermeira.

2) Quando é prescrito verificação de sinais vitais sem determinar horário:

7 enfermeiras responderam que deve ser verificado às 8 e às 16 horas;

6 enfermeiras responderam que deve ser cada 4 horas:

2 enfermeiras responderam que deve ser a critério da enfermeira.

3) Os sinais vitais foram colocados segundo o grau de importância na seguinte ordem decrescente PA-TPR.

4) A maioria justifica a atribuição de menor importância a R, em virtude de os médicos não darem valor a esse dado.

5) Quanto à eliminação da rotina de verificação dessa técnica:

7 enfermeiras concordaram que deve ser eliminada;

6 enfermeiras afirmaram que não deve ser eliminada;

3 enfermeiras deixaram sem resposta.

6) Quanto ao registro da verificação de FR nos gráficos:

10 enfermeiras responderem que esse registro é feito ;

6 enfermeiras responderam que não é registrado.

7) Opinião das enfermeiras sobre a retirada do gráfico do que não é registrado:

7 enfermeiras não apoiam essa sugestão;

3 enfermeiras apoiam ;

6 enfermeiras não responderam.

IV - DISCUSSÃO

Para um total de 618 prescrições médicas de verificação de sinais vitais, foram efetuados 833 registros de verificações dos mesmos nos gráficos das Clínicas Médica e Cirúrgica. Embora o número de registros seja superior ao número de prescrições, não pode ser esquecido que, se a rotina é executada no mínimo duas vezs ao dia, na realidade o total de verificações deveria ser muito maior.

Em se tratando de freqüência respiratória, observou-se que esta foi prescrita pouco mais que 1 % e verificada pouco mais que 3%. Portanto, a relação prescrição-verificação é inexistente. Na Clínica Cirúrgica foi prescrita a observação da FR, não tendo sido executada pela enfermagem; já na Clínica Médica, esse sinal vital foi observado sem que houvesse prescrição. Em ambos os casos não houve observação alguma por parte dos médicos.

Para se avaliar, quantas vezes nas clínicas Médica e Cirúrgica a FR deveria ser observada de acordo com os horários de rotina, investigamos sua existência. As opiniões divergem, parecendo não haver rotina estabelecida para o horário de verificação (pode ser às 8 e às 16 horas, ou de 4 em 4 horas, conforme as respostas obtidas).

Para 87% das enfermeiras a FR é de menor importância na verificação dos sinais comparada com outros sinais vitais, sendo que as mesmas justificam isso pelo fato de os médicos não utilizarem esses dados.

Embora a FR não tenha sido registrada nas Clínicas onde a investigação foi processada, 62% das enfermeiras responderam ser todos os sinais vitais registrados.

80% dos médicos consideram necessária a rotina da verificação da FR para todos ou alguns dos seus pacientes, mas quando solicitados a indicar um de seus pacientes que por alguma razão necessitavam da verificação da FR, mais da metade não o fez.

Podemos então admitir que enfermeiros e médicos estariam tão arraigados à tradição da rotina da verificação da FR que mesmo sem ser observada não conseguem dela se desprender.

Sabemos que a habilidade em observar é o resultado de um processo longo e árduo de deliberação e identificação de problemas a que os conhecimentos científicos servem de base para que esta observação seja principalmente objetiva. Então, todas as observações devem ser registradas; a enfermeira deve saber selecionar o que observar, quando fazê-lo e sem necessidade de prescrições.

Não foram encontradas quaisquer anotações sobre FR, tanto por parte dos médicos como das enfermeiras, tudo indicando não ser a FR, na maioria das vezes, um parâmetro para alterações de conduta no tratamento médico. Parece que nós, as enfermeiras, nem sempre nos lembramos de que no contato diário e constante com o paciente, temos a oportunidade única de observa-lo, registrar essas observações e que estas nos proporcionam uma valiosa fonte de dados indispensáveis à pesquisa.

É sabido que a FR pode ser modificada por causa de processos fisiopatológicos ou emocionais. É importante também que a enfermeira reconheça imediatamente essas modificações e decida que conduta tomar. Nos casos em que há alteração da FR, a exigência de cuidados imediatos e o reconhecimento das características da FR têm prioridade sobre a verificação de índices da FR.

A verificação desse sinal deve continuar a fazer parte do programa de ensino nas Escolas de Enfermagem para tornar a enfermeira apta a detectar qualquer modificação, mas poderia não ser verificada rotineiramente, pois parece não ter nenhum significado como rotina, e não é utilizado pelos médicos, nem pela enfermagem.

Importante seria verificar a exatidão da medida da freqüência respiratória, assim como informar por quem é executada, como é feita e o tempo dispendido. De utilidade seria ainda fazer a previsão do pessoal necessário e a estimativa do custo desse procedimento. Isto poderia ser conhecido se encontrássemos a freqüência respiratória sendo observada e utilizada como auxílio na alteração da conduta médica.

V - CONCLUSÃO

Na verificação de prontuários das Clínicas Médica e Cirúrgica do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, nos meses de março e abril de 1973, nossa hipótese foi confirmada, isto é:

  • - há decréscimo de importância da verificação da freqüência respiratória como atividade de rotina.

Conseqüentemente:

  • - esse procedimento pode ser eliminado dos gráficos;

  • - a verificação da freqüência respiratória deverá ser observada quando se fizer necessário.

  • MACHADO, M. H. , colaboradores. - Análise da importância clínica da rotina da verificação da freqüência respiratória em pacientes hospitalizado. Reavaliação de rotinas em Enfermagem. Rev. Bras. Enf.; 28: 23-27, 1975.
  • *
    As monitoras de Enfermagem Médica participaram da coleta de dados.

BIBLIOGRAFIA

  • 1
    CANETTO, Victaria - T.P.R. q. 4 h ad infinitum? Amer. J. Nurs., 64 (11): 132, Nov. 1964.
  • 2
    GARCIA, Lourdes T. & TOSCANO, P.A.D. - A rotina hospitalar de T.P.R. e seu papel em bons e eficiente cuidados de enfermagem. Rev. Bras. Enf 19 (4) :303-315, ago. 1966.
  • 3
    WALKER, Virgínia & SELMANOFF E. - A note on the accuracy of the Temperature, Pulse and Respiration Procedures. Nurs. Research 14 (1): 72-77, 1965.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr-Jun 1975
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