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ENSAIO SOBRE INTEGRAÇÃO DE ENFERMAGEM EM REABILlTAÇÃO NAS DISCIPLINAS DE ENFERMAGEM

INTRODUÇÃO -

Com o aumento da população idosa e a crescente incidência de acidentes que deixam lesões incapacitantes, a enfermeira, ao elaborar o plano de assistência de enfermagem, para seus pacientes deve, com freqüência, encontrar-se diante de problemas cujas soluções poderiam possivelmente estar no processo de reabilitação. Entretanto, embora o termo reabilitação seja amplamente utilizado, não se pode afirmar que a enfermeira, por usar o termo, esteja aplicando algum princípio ou conceito de enfermagem em reabilitação, uma vez que no currículo de graduação não se vê enfermagem em reabilitação integrada nas disciplinas de enfermagem de maneira claramente definida. Acredita-se, no entanto, que a integração de enfermagem em reabilitação nas disciplinas de enfermagem, possibilitará à estudante aprender e aplicar princípios de reabilitação ao prestar assistência de enfermagem a seus pacientes.

Reabilitação encontra-se muitas vezes referida como “a terceira fase da assistência médica”. Lamenta-se que esta frase infeliz tenha sido tão divulgada uma vez que ela, por si só, sugere que reabilitação está separada da fase aguda e da fase de convalescença, o que pode fazer pensar que este processo só é adotado quando tudo o mais já foi feito. É provável que este tipo de abordagem tenha prejudicado o interesse no assunto, uma vez que, as chamadas primeiras e segunda fase da medicina que representam, respectivamente as fases preventiva e curativa são consideradas prioritárias nos países em desenvolvimento. Entretanto, devido aos seus aspectos preventivos, o conceito de enfermagem em reabilitação deveria estar integrado na assistência de enfermagem prestada ao paciente, independente da fase da moléstia, do tipo ou da sua duração, assim como deveria este conceito estar também integrado na assistência de enfermagem prestada no hospital ou no domicílio do paciente.

Reabilitação representa por si só um campo bastante vasto e ,a integração de enfermagem em reabilitação nas disciplinas de enfermagem é um assunto que exige um estudo acurado, portanto, nesta primeira abordagem, limita-se a tentar a integração de alguns conceitos de reabilitação no programa de graduação.

Para o propósito deste trabalho define-se reabilitação como um processo criativo que começa com os aspectos de prevenção, na fase inicial da doença ou acidente, e continua na fase de recuperação, abrangendo a adaptação do indivíduo às modificações ocorridas em sua vida, devidas à afecção.

O processo de reabilitação inclue tanto o aspecto físico quanto os componentes psicológicos do paciente, estes considerados como: comunicação com o paciente e sua família; conhecimento e compreensão do paciente e de seus problemas e relacionamento que ofereça segurança ao paciente.

CONCEITUAÇÃO -

Em questionário piloto* * As respostas ao questionário mencionado, não foram computadas devido as falhas que prejudicaram sua utilização, na totalidade. respondido por enfermeiras sobre enfermagem em reabilitação, verificou-se que a maioria delas estava interessada em participar de alguma experiência de aprendizado relativa ao assunto. Verificou-se também que a maioria das enfermeiras afirmou que quando o paciente “necessita de reabilitação deve ser encaminhado a outros profissionais da equipe de saúde”. Estas respostas permitem pensar que aquelas enfermeiras não tiveram oportunidade de aprender o que podem fazer de reabilitação dentro das atividades próprias de enfermagem.

Pode ser que essa atitude seja decorrente da falta de estímulo ou porque elas não tiveram oportunidade de aprender alguns conceitos de reabilitação durante o programa de graduação, muito embora tenham ocorrido com freqüência o termo reabilitação. Devido ao aumento da incidência de pessoas com doenças crônicas, ou que sofreram alguma forma de traumatismo que requer assistência prolongada para poderem retornar à comunidade com o máximo de sua funcionalidade, os autores de enfermagem se referem com muita freqüência ao processo de reabilitação, o que facilita as enfermeiras interessadas no assunto. Em geral, são dois os aspectos que mais preocupam os autores de enfermagem: primeiro o aumento da população idosa e de acidentados; segundo, a falha no planejamento do tipo de assistência de enfermagem, que previna complicações e mantenha em bom funcionamento as partes do corpo não afetadas, ou, remanescentes do traumatismo ou amputação cirúrgica. Estes aspectos são abordados amplamente por Mathenay, que enfatiza a importância da prevenção em reabilitação quando diz:

“Qualquer problema de saúde resultante de períodos prolongados de inatividade ou repouso ou que leva a uma necessária modificação na vida, tem potencial para produzir incapacidade aguda, transitória ou permanente. Muitas pessoas adquiriram incapacidade permanente porque seu potencial não foi reconhecido ou incluído no plano terapêutico de enfermagem elaborado para elas”.

Parece que as enfermeiras, no geral, não dão muita ênfase aos aspectos preventivos da saúde quando elaboram seu plano de assistência. Genericamente falando, parece que elas estão muito mais voltadas para o planejamento da assistência a pacientes na fase aguda, com objetivos a serem alcançados a curto prazo, devido à preocupação em manter a vida do paciente. Entretanto, muitas vezes as enfermeiras esquecem a necessidade de exercício e atividades para evitar perda ou diminuição funcional e possibilitar ao paciente, quando passar a fase aguda, ter o potencial necessário para continuar sua recuperação no máximo requerido para o seu bem estar. Ainda de acordo com Mathenay, as enfermeiras precisam começar precocemente a prevenir e limitar complicações que podem se desenvolver durante o período de imobilidade.

O uso dos conceitos de reabilitação relativos à prevenção e manutenção de funções ainda não está incorporado como um valor em enfermagem. Esta deve ser a razão porque nos programas de educação de enfermagem estes conceitos não sejam valorizados durante a elaboração das experiências para as estudantes.

Stryker afirma que: “Um aspecto da história da reabilitação é a sua lenta incorporação nos programas educacionais”.

Em Rusk encontra-se o seguinte comentário :

“Reabilitação difere da atuação tradicional da enfermeira. Em vez de fazer tudo pelo paciente, em reabilitação a enfermeira assume a posição de ensinar o paciente a fazer por ele”.

Muito embora não se tenha feito ampla revisão literária, pode-se dizer que na literatura se encontra apoio para a afirmação de que conceitos de reabilitação devem ser integrados nos planos de assistência ao paciente. Para tornar esta afirmação uma realidade, as educadoras de enfermagem precisariam planejar a integração desses conceitos no currículo básico.

Pensa-se que as estudantes que tiverem oportunidade de usar os conceitos de reabilitação no planejamento da assistência de enfermagem para seus pacientes, poderão incorporar estes conceitos e utilizá-los automativamente durante sua vida profissional.

APLICAÇÃO DE ALGUNS PRINCÍPIOS DE APRENDIZADO NO ENSINO DE CONCEITO DE ENFERMAGEM EM HABILITAÇÃO

Sabe-se que os profesores das escolas de enfermagem são capazes de fazer a integração deste ou de outro aspecto de enfermagem no qual estejam interessados, mas uma vez que estamos tratando do assunto, parece-nos oportuno deixar registrado como se pensa que enfermagem em reabilitação pode ser integrada nos programas de graduação.

Considera-se que conceitos de reabilitação devem ser integrados nas disciplinas iniciais de enfermagem, de forma que a estudante possa familiarizar-se e usar esses conceitos no planejamento de assistência para todos os seus pacientes. Se a estudante de enfermagem incorporar o valor desses conceitos, que lhe são apresentados no início do curso e se os mesmos forem reforçados durante sua formação, ela poderá posteriormente, na vida profissional, usá-los com segurança.

Naturalmente não é esta a oportunidade para se abordar diversos aos quais a estudante pode ser exposta no início de sua formação. Entretanto, pode-se recordar que os alunos nesta fase, têm oportunidade de aprendizado relativas à mecânica e alinhamento corporal, posições e mobilização do paciente. Estes aspectos têm particular importância no planejamento, para prevenir deformidades e manter as habilidades existentes. Esta é portanto uma fase na qual alguns conceitos de enfermagem em reabilitação podem ser integrados.

Escolheu-se para abordar o aspecto da mobilização que se refere à utilização da cadeira de rodas. Sabe-se que são muitas as oportunidades nas quais o paciente precisa ou deve utilizar-se da cadeira de rodas. Sabe-se tambem que, na nossa cultura, existe algum preconceito relativo ao uso dela. O que não se sabe com certeza é se a enfermeira está preparada para ensinar o paciente a deixar o leito e utilizar-se da cadeira de rodas, usufruindo todos os benefícios decorrentes do seu uso. Também não se sabe se a enfermeira pode fazer isto, oferecendo todo o conforto e segurança necessários ao paciente. Sabe-se, entretanto, que a maioria das enfermeiras que responderam ao questionário anteriormente mencionado, acreditam que oferecem maior conforto e segurança ao paciente quando utilizam macas para mobilizá-los. Pode-se perguntar se é mais seguro para o paciente permanecer deitado, quando esta posição poderá levá-lo a complicações, tão conhecidas por todos nós. Será que, no caso, não existe uma falha na adoção do termo segurança, uma vez que por “segurança” deixa-se o paciente em posição que pode ter conseqüências prejudiciais, evitáveis em outras posições? Segurança deve significar também, ou talvez principalmente, prevenir complicações. A segurança de evitar complicações pela mobilização do paciente faz parte do contexto geral das funções da enfermeira.

O conceito de mobilização do paciente tem significado muito particular quando é planejado para prevenir deformidades e manter as habilidades existentes. Para ajudar a estudante a aprender estes conceitos e integrá-los nos seus planos de assistência de enfermagem, alguns princípios de aprendizado devem ser levados em consideração. Os princípios utilizados neste ensaio são:

  1. o desenvolvimento de conceito á parte do processo de aprendizado;

  2. o novo aprendizado deve ser baseado em conhecimento e experiências anteriores;

  3. a imitação é um processo de aprendizado;

  4. o aprendizado eficiente requer participação ativa do estudante ;

  5. a repetição reforça o aprendizado ;

  6. o indivíduo precisa estar motivado para aprender.

As atividades de aprendizado, as quais nos referimos a seguir, podem ser incorporadas quando a aluna está aprendendo e praticando como ajudar o paciente a satisfazer suas necessidades fisiológicas relativas a segurança, exercício e mobilização. Nesta oportunidade, a estudante aprende os princípios de mecânica e alinhamento corporal e sua aplicação nas diversas posições que podem ser utilizadas quando está trabalhando com o paciente ou em outras atividades. Estes conhecimentos são também aplicados para movimentar o paciente no leito e para mobilizá-lo para deixar o leito e passar para a cadeira de rodas.

O plano de ensino-aprendizado, apresentado na página seguinte inclué:

  • - Princípios de aprendizado

  • - Objetivo

  • - Conteúdo

  • - Atividade de aprendizado do estudante

  • - Referências sugeridas.

Na primeira experiência de aprendizado, o conceito de mecânica e o de alinhamento corporal podem ser desenvolvidos e praticados juntos. A segunda atividade de aprendizado poderá ser a de aprender e praticar diferentes posições que podem ser utilizadas para mudar o alinhamento do paciente quando ele está acamado e impossibilitado de movimentar-se sem auxílio.

A terceira atividade de aprendizado poderá ser o uso da mecânica e alinhamento corporal para ajudar o paciente a mover-se da cama para a cadeira. A quarta poderá ser para a estudante planejar o cuidado de enfermagem, para e com o paciente. Nesta oportunidade, ela demonstrará o uso de boa mecânica e alinhamento corporal para ela e para o paciente; demonstrará a posição do paciente, levando em consideração as limitações físicas dele; demonstrará ainda como ajudar o paciente a movimentar-se da cama para a cadeira de rodas.

Alguns estudantes necessitarão praticar mais vezes que outros, até demonstrar que ocorreu a integração e que são capazes de generalizar os conceitos de reabilitação aprendidos.

CONCLUSAO -

Enfermagem em reabilitação ainda não está suficientemente divulgada no meio profissional, entretanto, se durante o período de formação da estudante de enfermagem, forem oferecidàs oportunidades de aprendizado sobra o assunto, a divulgação, possivelmente ocorrerá pela gratificação que a prática desta atividade oferece.

Conclui-se, portanto, que essa integração nos programas de graduação que ainda não o fizeram, será bastante motivadora, o que facilitará muito o seu aprendizado.

  • CARRENO. C.C. e colaboradora - Ensaio sobre integração de enfermagem em reabilitação nas disciplinas de enfermagem. Rev. Bras. Enf. ; DF, 31 : 47-54, 1978.
  • *
    As respostas ao questionário mencionado, não foram computadas devido as falhas que prejudicaram sua utilização, na totalidade.

PLANO - ENSINO/APRENDIZADO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • 1
    MATHENAY, R. V. et all - Fundamentais of paliente-centered Nursing (3rd ed. St. Louis: The C. V. Mosby Co. 1972). P. 265.
  • 2
    RUSK, H. A. - Rehabilitation belongs in the General Hospital-American Journal of Nursing, LVII, n. 9 (1962). P. 62, 63.
  • 3
    STRYKER, R. P. - Rehabilitative aspects of acute and chronic nursing care- Philadelphia: W. B. Saunders Co. 1972. P. 7.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 1978
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