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Brasil: sistemas locais de saúde - enfermagem

Brasil - sistemas locais de saúde - enfermagem* * Conferência Regional "Desarrollo de Enfermagem en los Sistemas Locales de Salud en la America Latina", Caracas/Venezuela, maio/1990

Stella Maria P.F. BarrosI; Nair Fábio da SilvaII

IPresidente da ABEn - Nacional

IICoordenadora da Comissão de Serviços da ABEn - Nacional

ANÁLISE PRELIMINAR

A sociedade brasileira, como outras sociedades da América Latina, passou por um longo período de ditadura, onde o Estado no setor saúde, desempenhou relevante papel na implantação de uma política de privatização dos serviços de saúde, e, conseqüentemente sucateamento dos serviços públicos. Em 1981, aproximadamente 77% dos leitos hospitalares eram ofertados pelo setor privado, enquanto 71,8% dos ambulatórios eram do setor público, demonstrando a hegemonia do setor privado nas unidades de internação e no setor público no segundo, além de observar que destes ambulatórios públicos apenas, 25% se encontra a nível do município10.

Com um sistema de saúde desorganizado, descoordenado, oferecendo baixa resolutividade às reais necessidades de saúde da população, incapaz de fazer frente aos perfis epidemiológicos apresentados, é que no início da década de 80, no bojo dos processos de conquistas democráticas, toma corpo o Movimento pela Reforma Sanitária Brasileira, que entre outras concepções entende "a saúde como expressão das condições gerais de vida" e não simplesmente como simples oferta de serviços; Saúde enquanto Direito de Cidadania e Dever do Estado.

Este processo de mudança político-cultural na saúde faz parte de um processo mais geral das lutas pela democratização da sociedade, e conta com a participação das forças populares e progressistas da sociedade brasileira.

Os espaços democráticos conquistados não só foram frutos, mas viabilizaram o fortalecimento das entidades, do movimento sindical e dos diversos grupos organizados da sociedade civil.

A Associação Brasileira de Enfermagem-ABEn, uma das entidades de enfermagem do País, participou ativamente não só nas lutas específicas da categoria e da saúde, como também nas lutas mais gerais dos trabalhadores brasileiros.

Após um período de 30 anos, foram realizadas em 1989, eleições para Presidente da República, quando então, dois projetos políticos, basicamente mobilizaram a sociedade brasileira: uma de orientação neo-liberal e o outro, de orientação democrática e popular. O projeto neo-Úberal foi vitorioso nas urnas. Assim é que no momento, estamos vivendo, uma nova ordem política, com profundas reformas monetárias, cambial e administrativa, com objetivo declarado de abaixar a taxa de inflação. Estas reformas, em curso há dois meses, pelo número elevado de desemprego que vem causando, nos coloca num processo altamente recessivo, que se não for devidamente controlado poderá nos levar a uma séria depressão econômica, com efeitos particularmente trágicos para a saúde da população.

Assim é que no momento, estamos vivendo uma nova crise política, que exige uma intensificação da organização e mobilização da sociedade em torno do projeto da Reforma Sanitária. Esta mobilização requer a elevação da consciência sanitária de todos, em defesa da democratização na saúde.

Para melhor compreensão da Enfermagem nos Sistemas Locais de Saúde, comumente designados Distritos Sanitários de Saúde e, do trabalho da ABEn em todo processo, dividiremos nossa análise em três aspectos: político-jurídico, político-institucional e técnico operacional. Obviamente estes aspectos não são momentos estanques, pois supõem interseções.

ASPECTO POLÍTICO-JURÍDICO

Por político-jurídico entendemos todo o processo de definição e decisões que demanda uma legitimação e legalização.

- VIII Conferência Nacional de Saúde - realizada em março de 1986, convocada pelo presidente da República e pelo Ministro de Estado da Saúde, contou com a participação de cerca de cinco mil participantes, sendo dois mil delegados (50% representante do Estado e 50% representante da sociedade civil - associações da ABEn, sindicatos, organizações populares, partidos etc.). O Relatório Final aprovado, definiu o marco doutrinário da proposta da Reforma Sanitária Brasileira: saúde-direito do cidadão e dever do Estado; oferta de serviços de saúde de forma universal, igualitária, integral organizados de forma descentralizada, hierarquizada e com participação da sociedade (controle social).

- Comissão Nacional da Reforma Sanitária criada pelo Ministério da Saúde com o objetivo de elaborar uma proposta de ante-projeto na área de saúde para a Nova Constituição Brasileira. Esta comissão foi composta por representantes do Estado e entidades da Sociedade civil, a Presidente da ABEn participou desta comissão durante todo processo de elaboração da proposta 1986/87.

- Assembléia Nacional Constituinte (1987/88)

- processo de elaboração da nova Constituição. A ABEn participou no encaminhamento das emendas populares e nas audiências públicas do Legislativo, nos itens referentes aos direitos sociais, seguridade social (saúde e previdência social), educação, entre outros. Atuou em conjunto com os grupos progressistas que defendiam a saúde como Direito de Cidadania e Dever do Estado e lutou e resistiu as investidas dos opositores liderados pelo grupo empresarial da saúde.

- Constituição Brasileira - promulgada em 05.10.1988. Observa-se que pela primeira vez aparece na Constituição uma seção no Título VIII da Ordem Social Capítulo II da Seguridade Social, que garante ao cidadão o direito a saúde. (Art. 196 Constituição Federal).

Em relação aos trabalhadores em geral e, assim, também, aos da saúde, houve alguns avanços como direito a sindicalização do servidor público, haja vista que grande parte dos trabalhadores de enfermagem está inserida nas instituições públicas. Esta luta foi também travada a nível estadual e municipal.

- Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde

- lei que regulamentará as propostas contidas na Constituição, principalmente no que concerne a organização do Sistema Único de Saúde. A ABEn em conjunto com outras entidades nacionais de saúde, criou um organismo que unifica as propostas e lutas nacionalmente, chamada Plenária Nacional de Saúde. Esta vem desenvolvendo intenso trabalho de formulação e acompanhamento do projeto de lei, que se encontra em fase de tramitação no Legislativo onde novamente se transforma no palco de luta política entre os aliados e opositores da Reforma Sanitária. No momento o Ministro da Saúde ora empossado, busca impor emendas que garantam o planejamento e auditoria centralizados o que de uma certa forma inviabiliza o principio de descentralização requerido pelo Sistema Único de Saúde-SUS.

Neste plano político-jurídico a ABEn entende ser de fundamental importância sua participação em conjunto com as demais entidades de enfermagem. Assim é que, em 1988 foi criado o Fórum Nacional de Entidades de Enfermagem (Associação Brasileira de Enfermagem-ABEn, Conselho Federal de Enferma-gem-COFEn, Federação dos Enfermeiros e Movimento de Nível Médio) posteriormente incluído a União Nacional de Técnicos e Auxiliares de Enferma-gem-ÜNATE. Este fórum vem se reunindo mais objetivamente nos últimos sete meses.

Outras questões que são fundamentais ao desenvolvimento da Enfermagem Brasileira já foram encaminhadas ou estão em fase de elaboração e decisão:

a) Lei do Exercício Profissional de Enfermagem (Lei nº 7498/86 e Decreto nº 94.406/87) - define atividades privativas do enfermeiro, dos técnicos e auxiliares de enfermagem, ao tempo em que delimita um prazo de dez anos para a extinção dos chamados atendentes de enfermagem - pessoal não qualificado, existente na rede de serviços de saúde.

b) Proposta do novo Currículo Mínimo para oscursos de graduação em enfermagem - visando adaptá-lo à construção de um novo perfil de profissional que responda a uma composição tecnológica exigida pela nova organização do trabalho.

c) Plano de Carreira - discussão e participação ativa na luta pelo seu estabelecimento a nível federal, estadual e municipal.

ASPECTO POLÍTICO-INSTITUCIONAL

Por político-institucional entendemos todo processo de modificação ao nível político e administrativo ocorrido no interior das instituições.

O caos que se constata no sistema de saúde do País, impõe a necessidade de reorientar a organização dos seus serviços, que como vimos, necessita de uma nova ordem jurídica (em fase de conclusão) e de uma vontade e decisão política.

Assim, cabe as forças políticas que desencadearam esse processo, manter viva a mobilização da sociedade e dos políticos, para que os princípios norteadores da Reforma Sanitária Brasileira, mesmo no limite do texto da Lei Orgânica da Saúde (LOS), sejam implantados e viabilizados na prática.

Como podemos constatar, as políticas de saúde desenvolvidas no Brasil principalmente na década de 80, tiveram um caráter recionalizador. A situação econômico-financeira do País após 1981, a agudização da crise da Previdência Social, reforçaram a tendência reacionalizadora dessas políticas, que se encontra na base das iniciativas mais urgentes surgidas na década, como a criação do CONA SP (Conselho Nacional Adm. Saúde Prev.) e a estratégia das AIS (Ações Integradas de Saúde), em 1985, sendo do que a última surge como forma de integrar recursos federais, estaduais e municipais, sem contudo haver perda de autonomia das instituições. A criação de instâncias deliberativas Comissão Interinstitucional de Saúde (CIS), Comissão Regional Interinstitucional de Saúde (CRIS), e Comissão Municipais Interinstitucional de Saúde (CMIS) inicia o processo de descentralização do planejamento enquanto programação orçamentária.

Enquanto isso, o movimento pela Reforma Sanitária toma corpo a partir da VIII Conferência Nacional de Saúde, passando a expressar um projeto político de mudança de concepção e das práticas de saúde no País, possível graças ao processo de democratização da sociedade brasileira.

No bojo desse movimento é criado em 1987, um programa Reforma Administrativa Governamental, designado como SUDS (Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde), na tentativa de aperfeiçoar as AIS e fortalecer princípios filosóficos e organizacionais que fundamentam o Sistema Único de Saúde (SUS) definidos na VIII Conferência.

Estes princípios - universalidade, integralidade e eqüidade na assistência aliados as estratégias de descentralização, hierarquização e participação popular, que tem como eixo principal a Municipalização das ações de saúde, não serão facilmente implementados, pois requer um processo de luta inter e intra-institucional.

Como se observa essa é uma proposta que se constitiu em um espaço singular de luta-política. Assim, é que, as alianças feitas entre os grupos liais progressistas das entidades e dos trabalhadores de saúde, da técno-burocracia do setor, das universidades, permitiram em muitos momentos avançar, somados ao apoio de entidades e associações da sociedade civil organizados. Por outro lado, contou com a oposição de grupos mais conservadores da sociedade, a exemplo dos empresários da saúde, burocratas do Estado com receios de perder o status e interesses corporativos de alguns grupos de servidores da área12.

A ABEn participou da maioria das discussões em eventos e mobilizações realizadas.

Assim a materialização dessas concepções e propostas vem se dando no que se convencionou chamar no País, Distrito Sanitário (DS), "unidade operacional e administrativa mínima do sistema de saúde, definida com critérios geográficos, populacionais, epidemiológicos, administrativos e políticos, onde se localizam recursos de natureza pública e privada, organizados através de um conjunto de mecanismos político-institucionais, com a participação da sociedade civil organizada para desenvolver ações integrais de saúde capazes de resolver a maior quantidade possível de problemas de saúde". (8,11)

Como se observa, a implantação da proposta e a operacionalização dessa estrutura básica do sistema não é tarefa fácil, principalmente pelos interesses políticos corporativos, clientelistas, arraigados ao setor.

Contudo, vários são os estados brasileiros onde a proposta está sendo implementada com maiores ou menores avanços, que variam de acordo com o grau de compreensão e mobilização dos profissionais de saúde e da sociedade organizada.

Hoje, o Brasil tem uma única instituição a nível federal responsável pela saúde - Ministério da Saúde, porém, com a reforma administrativa proposta, poderá inviabilizar o Sistema Único de Saúde já aprovado pela Constituição.

Percebe-se, assim, um processo de recuo nas propostas da Reforma Sanitária, principalmente no que tange a descentralização das ações de saúde e a participação popular.

As entidades de enfermagem e em particular a ABEn, têm promovido um amplo debate sobre a reestruturação dos serviços de saúde e a posição da enfermagem nesta nova estrutura.

Cabe acrescentar que engajamento dos enfermeiros nesse processo tem possibilitado inclusive a conquista de novos espaços de atuação não só a nível de gerenciamento de Distritos Sanitários, Unidades de Saúde e até exercido cargos executivos como Secretarias Municipais de Saúde, como também a nível direto da assistência e resgate da área de treinamento de pessoal.

ASPECTO TÉCNICO-OPERACIONAL

Compreendido como o âmbito onde se procede de fato a reorganização das práticas, o processo tecnológico do trabalho ria saúde e em particular na enfermagem encontra-se, ainda, baseado no modelo assistencial hegemônico, que privilegia a assistência individual, biologizada, curativa, centrada no ato médico e eminentemente hospitalar, prestado de forma desigual à população. Esse modelo, face a divisão técnica e social do trabalho que aí se estabelece, tem imprimido na prática das enfermeiras a predominância de atividades gerenciais, reflexo também da composição da pirâmide ocupacional, onde o enfermeiro representa 8,5% da força de trabalho da enfermagem, enquanto os técnicos e auxiliares 27,7% e os atendentes 63,8%9.

A perspectiva de transformação dessa prática, objetivando integrar as ações de caráter coletivo e individual de forma igualitária e universal dentro de um processo de democratização do setor saúde com presença do controle social, está sendo um grande desafio.

As metodologias e instrumentos de trabalho já conhecidos, o nível de competência de cada agente, terão que sofrer transformações e mudanças que possibilitem uma nova composição tecnológica, que, de fato, atenda aos perfis epidemiológicos da população, e assim, de uma forma eficaz e efetiva, desenvolva ações de impacto com um custo operacional ao menos conhecidos.(8)

Nessa direção torna-se fundamental para a Enfermagem Brasileira, a compreensão do seu Processo de Trabalho e sua articulação com o processo de trabalho coletivo da saúde. Além disso, os trabalhadores de enfermagem devem comprometer-se enquanto atores sociais na transformação da realidade, e não se transformarem em simples recursos humanos, meros insumos necessários à produção dos serviços de saúde.

Como o Distrito Sanitário (DS) se constitui numa unidade operacional composta por uma rede ambulatorial e hospitalar, a Enfermagem terá que entender seu processo de trabalho basicamente, nesses dois tipos de unidades produtoras de serviços7.

"As unidades ambulatoriais são centradas na ação coletiva, no sentido de prevenção de riscos, mesmo quando executa ações de recuperação de indivíduos. As unidades hospitalares, embora compreendendo a expressão do coletivo nos problemas individuais, centra as suas ações na expressão única de riscos subjacentes em formas agudas ou crônicas manifestadas em um indivíduo. Assim, a composição tecnológica comporta graus de maior e menor complexidade em ambos os tipos de unidades produtoras, mas obedecem, em essência, a princípios organizativos de natureza distinta, conseqüentemente determinando um perfil de prática particular para cada uma delas7".

Como a Enfermagem Brasileira vem enfrentando os desafios da competência técnica e política a nível de assistência, gerência e do ensino?

Como a Enfermagem Brasileira desenvolverá um processo de trabalho que dê conta dos novos perfis ocupacionais que garanta uma composição tecnológica adequada, sem contudo desconhecer a realidade de sua pirâmide ocupacional?

- A Assistência de Enfermagem - configurada na prestação direta de cuidados ao cliente tem sido em sua maioria executada pelo pessoal auxiliar. Apesar disso a nível ambulatorial, encontram-se enfermeiras prestando assistência na área Pré-Natal, Puericultura, Doenças Crônicas e Doenças Transmissíveis, de uma forma bastante fragmentada. Desenvolveu-se atualmente um processo de Educação Continuada para os enfermeiros, com vistas a recuperar a prática assistencial, naquela que possibilite uma assistência integral à saúde de Mulher, da Criança, do Adulto, do Trabalhador e do Idoso, com competência clínica e epidemiológica

O principal instrumento de enfermagem na prestação da assistência individual é a Consulta de Enfermagem. Para que ela se transforme num instrumento resolutivo, faz-se necessário fundamentar a metodologia utilizada, definir a clientela e caracterizar a terminalidade de sua ação.

A assistência de enfermagem prestada ao nível coletivo, ou seja: trabalho com grupos de risco específico (clientes com doenças crônicas, transmissíveis); trabalho em escolas, creches e outros grupos da comunidade, não têm sido desenvolvido com o impacto necessário para aumentar a cobertura das ações. O exercício deste instrumento de trabalho deve ser estimulado, desde quando ele complemente os programas de Vigilância Sanitária, Vigilância Epidemiológicas e os programas de Educação para a Saúde, que visam os aspectos preventivos e promocionais, fundamentais na criação de uma consciência sanitária.

A nível hospitalar a assistência de enfermagem se torna mais complexa pela necessidade de continuidade da assistência que, permanece ainda fragmentada pelo parcelamento das tarefas assistenciais executadas, pelos diversos agentes da enfermagem. Constituiu-se num grande desafio o plano assistencial individualizado e a manutenção de um processo de supervisão do pessoal auxiliar de forma a torná-lo educativo e não controlador.

A assistência à saúde no Brasil está sendo ofertada de forma bipolarizada, ou sejam, pelo médico e pelo atendente. Pensar em um novo modelo assistencial, significa modificar esta relação e reediscutir a composição tecnológica do trabalho.

- As atividades administrativas - são as predominantes no trabalho das enfermeiras. Estas têm sido desenvolvidas de forma empírica, artezanal e acriticamente. Há uma incompreensão por parte inclusive das enfermeiras (serviço e da academia), de que as atividades gerenciais desse trabalho não são inerentes à sua área de atuação e, por isso, poderiam ser exercidas por outros profissionais. Esta questão, no nossso entendimento, tem relação com outro fator de incompreensão da Enfermagem - seu Objeto de Trabalho.

Para dar conta dessas atividades não há instrumento próprios de elaboração da área, visto que a gerência está relacionada com os processos de organização de trabalho, e assim com a questão do planejamento e da programação no que concerne aos recursos humanos, materiais e financeiros de forma a definir uma composição tecnológica adequada ao nosso modelo de assistência. Assim a discussão sobre padrão de qualidade de assistência, deve estar fundamentada em parâmetros que definam recursos humanos, materiais e financeiros suficientes. Requer por isso mesmo, o atendimento quanto a totalidade do processo de trabalho na saúde e na enfermagem.

Com a descentralização das ações de saúde, os serviços deverão passar a serem unidades programáticas, como também unidades orçamentárias. Assim, a administração terá que responder questões básicas, tais como: competência dos agentes, parâmetro para cálculo de recursos humanos, levando em consideração a concentração e o rendimento, avaliação de desempenho, educação continuada e métodos de supervisão.

Apesar do Plano de Carreira e o Plano de cargos e Salários serem funções de ordem maior é importante a luta pela sua implantação como forma de vibilizar o trabalho.

Em relação ao desenvolvimento dessa atividade na prática, observa-se tanto ao nível ambulatorial e com maior predominância ao nível hospitalar, práticas administrativas que parcelam o processo de trabalho de enfermagem (cada agente faz uma tarefa, uma parte da assistência), separa o trabalho intelectual do manual (enfermeira pensa, auxiliar faz) estabelece uma relação de denominação e subordinação (enfermeiropessoal auxiliar) através de uma gerência autoritária e disciplinadora.

Recriar uma gerência de Recursos Humanos que: pense o trabalho coletivo onde todos os agentes participem de forma a não aliená-los, explicite os conflitos inerentes nas relações de trabalho onde o poder se faz presente e exercite uma prática democrática, é etapa necessária que confronta com o tipo de organizações existentes nas sociedades capitalistas.

Em relação não só a administração de recursos materiais, a enfermagem muito pouco tem contribuido no desenvolvimento de uma tecnologia própria. A informática, pelo menos na área de serviços públicos está se iniciando. A preparação das enfermeiras não prevê uma profundidade nos aspectos administrativos, principalmente com aquela referente a recursos financeiros.

A atividade administrativa da enfermeira deverá garantir o poder de decisão sobre seu próprio processo de trabalho, no planejamento, programação e, acompanhamento e avaliação e a participação do pessoal auxiliar em todas estas etapas.

- Atividades predagógicas ou de ensino - Ainda como atividade na função pedagógica desse trabalho, cabe às enfermeiras o preparo e a formação do pessoal de enfermagem.

Nas escolas e cursos que formam técnicos e auxiliares de enfermagem, e por que não dizer naqueles que forma a própria enfermeira, a prática pedagógica tem sido, em sua maioria, exercida de forma autoritária, distante da realidade da prática dos serviços de saúde e acrítica, transformando esses profissionais em agentes robotizados e alienados.

Repensar nova prática pedagógica, significa implementar um método pedagógico que interaja o ensino com o serviço, estimule e exercite o espírito crítico reflexivo, construindo assim o conhecimento no próprio processo de trabalho de enfermagem (real) visando à sua transformação.

Um dos grandes desafios vividos neste momento pela Enfermagem no Brasil, é o da Profissionalização dos atendentes de enfermagem, haja vista o quantitativo presente na rede de serviços de saúde (pública e privada), o que significa deterioramento da qualidade de assistência, trazendo sérios riscos aos usuários.

Em todas essas atividades o enfermeiro terá que exercitar o trabalho compartilhado não só com o pessoal auxiliar, mas principalmente como usuário da assistência de enfermagem.

O princípio da participação popular não pode ser entendido, apenas nos espaços dos Conselho Nacionais, Estaduais e Municipais de Saúde, e Conselhos Diretores das Unidades. É importante entender essa participação desde o momento da assistência individual na consulta, como única forma de diminuir a medicalização da sociedade, ampliar sua consciência sanitária e desenvolver o saber sobre a saúde e assim o poder de decisão sobre sua vida.

Neste aspecto a ABEn tem desenvolvido debates, jornadas, seminários, encontros regionais e nacionais e divulgado seus resultados em boletins e revistas.

A atual orientação da ABEn é de incentivo e estímulo ao desenvolvimento da dimensão políticado trabalho de enfermagem, não só pela participação direta nas lutas, mas estimulando a ocupação de cargos de direção por enfermeiras nas Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde, Gerência de Distritos Sanitários, Diretorias de Hospitais e Unidades Ambulatoriais.

Estimula também a participação nos diversos níveis de decisão, tais como: Conselhos Estaduais, Municipais de Saúde, Conselho Diretor e Técnico da & Unidades.

Em relação a dimensão técnica, quer seja ela assistencial, administrativa ou pedagógica, a ABEn tem desenvolvido intenso movimento no sentido de repensar a prática da enfermagem, compreendendo-a enquanto um trabalho realizado dentro de uma sociedade concreta - a Brasileira. Os três últimos Congressos Nacionais de Enfermagem (87, 88 e 89) tiveram como temas centrais: Enfermagem e Objeto de Trabalho; Força de Trabalho na Enfermagem e Desafios da Enfermagem para os anos 90, sendo que o próximo a ser realizado em outubro, terá como tema "Enfermagem, construindo uma nova prática".

A entidade tem colocado como um dos eixos fundamentais a compreensão do processo de trabalho da enfermagem, objetivando a partir do seu conhecimento propor mudanças capazes de viabilizar uma assistência de enfermagem sem riscos para o usuário e para o trabalhador de enfermagem. Com esse objetivo a ABEn tem promovido o debate e elaborado documentos, nos seguintes aspectos:

- Seminário sobre Política de Profissionais zação dos atendentes de enfermagem - Documento elaborado3. Criação de Comissões Estaduais de Entidades de Enfermagem com a finalidade de acompanhar e avaliar o processo.

- Formação do pessoal auxiliar de enfermagem de nfvel médio - Em fase de execução do projeto.

- Formação de enfermeiros - na área de graduação, após discussões estaduais e decisão num fórum nacional, foi aprovado o novo Currículo Mínimo de enfermagem4. Enquanto que na área de pós graduação (doutorado, mestrado e especialização) foram realizados alguns seminários que definiram uma Política de Formação a nível de pós graduação para enfermagem no Brasil2.

- Oficina de trabalho sobre "Assitência de Enfermagem rumo a Reforma Sanitária" - documento inicial de discussão1.

- Oficina de trabalho sobre "A Enfermagem no Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), Parâmetros para cálculo de pessoal de enfermagem e auditoria5.

- Definição de um Política de Educação Continuada para os enfermeiros e pessoal auxiliar (em fase de elaboração7).

- Discussão sobre o Código de Ética - de forma a transformá-lo num instrumento que garanta o direito de cidadania ao usuário da assistência e aos que fazem a enfermagem, ou seja, seus trabalhadores.

Importante observar que estas atividades não têm sido fruto apenas de iniciativa da ABEn, mas fruto de outras entidades de enfermagem existentes no Brasil e que por isso buscam um trabalho articulado.

  • 1 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENFERMAGEM. Subsídios para a conceituação da assistência de enfermagem rumo à reforma sanitária. Brasília, 1987.
  • 2 ______ Proposta de desenvolvimento da pós-graduação e pesquisa da área de enfermagem. Brasília, abril, 1989.
  • 3 ______ Política diretrizes para o plano de profissionalização dos atendentes. Brasília, março, 1989, Mimeogr.
  • 4 ______ Uma nova proposta de currículo mínimo para formação do enfermeiro. Brasília, 28/06/89, Mimeogr.
  • 5 ______ Enfermagem e o sistema único de saúde; auditoria e parâmetros de enfermagem. Brasília, junho, 1989, Mimeogr.
  • 6 ______ Reflexões sobre o processo de trabalho de enfermagem na organização dos serviços de saúde na sociedade brasileira. Brasília, julho, a987.55p.
  • 7 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria Geral. Secretaria de Modernização Administrativa e Recursos Humanos. A educação continuada de enfermeiros no sistema único de saúde. Brasília: Centro de Documentação do Ministério da Saúde, 1990.
  • 8 ______ Modelos assistenciais no sistema único de saúde. Brasília, 1990.
  • 9 COFEn/ABEn. O exercício da enfermagem nas instituições de saúde do Brasil 1982/83. Força de trabalho em enfermagem, vol. 1, 1985.
  • 10 FUNDAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO ADMINISTRATIVO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Sistema de assistência médico-sanitária e perspectivas para a década de 90. São Paulo, 1989.
  • 11 MOREIRA, V.A. Distrito sanitário. Divulgação em saúde para debate. 1:6-7, set, 1989.
  • 12 PAIM, J,S, Obstáculos não superados na impolantação do SUDS-Ba. Saúde em Debate. 28: 16-21, março, 1990.
  • 13 A democratização da saúde e SUDS: o caso da Bahia. Saúde em Debate. 21:29-44, jun. 1988.
  • 14 SANTOS, I. et alii. Formação de pessoal de nível médio pelas instituições de Saúde: Projeto Larga Escala, uma experiência em construção. Saúde em debate. 24: 61-64, março, 1989.
  • *
    Conferência Regional "Desarrollo de Enfermagem en los Sistemas Locales de Salud en la America Latina", Caracas/Venezuela, maio/1990
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Fev 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 1990
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