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Risco ocupacional em unidades de Suporte Básico e Avançado de Vida em Emergências

Riesgo laboral en las Unidades de Soporte Básico y Avanzado de Vida en Emergencia

Occupational risk in Basic and Advanced Emergency Life Support Units

Resumos

O estudo objetivou identificar os fatores de risco ocupacional a que estão expostos os profissionais da equipe das Unidades de Suporte Básico e Avançado de Vida em Emergências. Utilizou-se a técnica de entrevista semi-estruturada para coleta dos dados. Constituíram-se sujeitos do estudo 40 trabalhadores de duas equipes do Sistema de Atendimento Médico a Urgência de uma cidade do interior do Estado de São Paulo. Os fatores de risco identificados pela maioria dos trabalhadores foram: físicos (elevados níveis de temperatura e ruído ambiental); químicos (manipulação de substâncias químicas); biológicos (exposição a microorganismos e falta de materiais disponíveis). Os riscos peculiares à atividade foram: risco de ocorrência de acidentes automobilísticos (90% dos trabalhadores), agressões física e moral (90% dos trabalhadores) e acidentes com material pérfuro-cortante (72,5% dos trabalhadores). A violência foi descrita por 75 % dos trabalhadores como fator de risco mais preocupante no trabalho. A maioria dos trabalhadores identificou os riscos ocupacionais. No entanto, a minoria utiliza medidas adequadas de segurança, revelando a necessidade de intervenções.

Risco ocupacional; Enfermagem em emergência; Saúde ocupacional


Este estudio se realizó con el objetivo de identificar los factores de riesgo laboral a los que están expuestos los profesionales del equipo de las Unidades de Soporte Básico y Avanzado de Vida en Emergencias. Se utilizó la entrevista semiestructurada. Los sujetos de estudio fueron 40 trabajadores componentes de dos equipos del Sistema de Atención Médica de Urgencia de una ciudad del interior de São Paulo-Brasil. Los factores de riesgo identificados por la mayoría de los trabajadores fueron: físicos (elevados niveles de temperatura y ruido ambiental); químicos (manipulación de substancias químicas); biológicos (exposición a microorganismos y falta de materiales disponibles). Los riesgos peculiares a la actividad fueron: riesgo de ocurrencia de accidentes automovilísticos (90% de los trabajadores), agresiones física y moral (90% de los trabajadores) y accidentes con material punzante o cortante (72,5% de los trabajadores). 75% de los trabajadores describieron la violencia como factor de riesgo más preocupante en el trabajo efectuado. La mayoría de los trabajadores identificó los riesgos laborales. Sin embargo, una minoría de los trabajadores utiliza medidas adecuadas de seguridad, manifestando la necesidad de intervenciones.

Riesgos laborales; Enfermería de urgencia; Salud ocupacional


This study aimed to identify occupational risk factors the professionals of Basic and Advanced Emergency Life Support are exposed. Semi-structured interview was used. The study subjects were 40 workers who are part of two Emergency Healthcare System teams in a city of São Paulo State-Brazil. Most workers identified the following risk factors: physical (high temperature and environmental noise levels); chemical (manipulating chemical substances); biological (exposure to microorganisms and lack of material available). Typical risks of emergency activities were: risk of car accidents (90% of the workers), physical and moral aggression (90% of the workers) and accidents with piercing and cutting material (72,5% of the workers). 75% of the workers described violence as the most worrying risk factor at work. Most of the workers identified the occupational risks. However only a minority of them uses adequate safety measures, which reveals the need for interventions.

Occupational risk; Emergency nursing; Occupational health


PESQUISA

Risco ocupacional em unidades de Suporte Básico e Avançado de Vida em Emergências

Occupational risk in Basic and Advanced Emergency Life Support Units

Riesgo laboral en las Unidades de Soporte Básico y Avanzado de Vida en Emergencia

Amanda dos Santos ZapparoliI; Maria Helena Palucci MarzialeII

IEnfermeira. Aluna de Mestrado do Programa de Pós-graduação Enfermagem Fundamental da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto Universidade de São Paulo-Brasil. a_zapparoli@yahoo.com.br

IIProfessor Associado da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto Universidade de São Paulo-Brasil. Centro Colaborador da OMS. marziale@eerp.usp.br

RESUMO

O estudo objetivou identificar os fatores de risco ocupacional a que estão expostos os profissionais da equipe das Unidades de Suporte Básico e Avançado de Vida em Emergências. Utilizou-se a técnica de entrevista semi-estruturada para coleta dos dados. Constituíram-se sujeitos do estudo 40 trabalhadores de duas equipes do Sistema de Atendimento Médico a Urgência de uma cidade do interior do Estado de São Paulo. Os fatores de risco identificados pela maioria dos trabalhadores foram: físicos (elevados níveis de temperatura e ruído ambiental); químicos (manipulação de substâncias químicas); biológicos (exposição a microorganismos e falta de materiais disponíveis). Os riscos peculiares à atividade foram: risco de ocorrência de acidentes automobilísticos (90% dos trabalhadores), agressões física e moral (90% dos trabalhadores) e acidentes com material pérfuro-cortante (72,5% dos trabalhadores). A violência foi descrita por 75 % dos trabalhadores como fator de risco mais preocupante no trabalho. A maioria dos trabalhadores identificou os riscos ocupacionais. No entanto, a minoria utiliza medidas adequadas de segurança, revelando a necessidade de intervenções.

Descritores: Risco ocupacional; Enfermagem em emergência; Saúde ocupacional.

ABSTRACT

This study aimed to identify occupational risk factors the professionals of Basic and Advanced Emergency Life Support are exposed. Semi-structured interview was used. The study subjects were 40 workers who are part of two Emergency Healthcare System teams in a city of São Paulo State-Brazil. Most workers identified the following risk factors: physical (high temperature and environmental noise levels); chemical (manipulating chemical substances); biological (exposure to microorganisms and lack of material available). Typical risks of emergency activities were: risk of car accidents (90% of the workers), physical and moral aggression (90% of the workers) and accidents with piercing and cutting material (72,5% of the workers). 75% of the workers described violence as the most worrying risk factor at work. Most of the workers identified the occupational risks. However only a minority of them uses adequate safety measures, which reveals the need for interventions.

Descriptors: Occupational risk; Emergency nursing; Occupational health.

RESUMEN

Este estudio se realizó con el objetivo de identificar los factores de riesgo laboral a los que están expuestos los profesionales del equipo de las Unidades de Soporte Básico y Avanzado de Vida en Emergencias. Se utilizó la entrevista semiestructurada. Los sujetos de estudio fueron 40 trabajadores componentes de dos equipos del Sistema de Atención Médica de Urgencia de una ciudad del interior de São Paulo-Brasil. Los factores de riesgo identificados por la mayoría de los trabajadores fueron: físicos (elevados niveles de temperatura y ruido ambiental); químicos (manipulación de substancias químicas); biológicos (exposición a microorganismos y falta de materiales disponibles). Los riesgos peculiares a la actividad fueron: riesgo de ocurrencia de accidentes automovilísticos (90% de los trabajadores), agresiones física y moral (90% de los trabajadores) y accidentes con material punzante o cortante (72,5% de los trabajadores). 75% de los trabajadores describieron la violencia como factor de riesgo más preocupante en el trabajo efectuado. La mayoría de los trabajadores identificó los riesgos laborales. Sin embargo, una minoría de los trabajadores utiliza medidas adecuadas de seguridad, manifestando la necesidad de intervenciones.

Descriptores: Riesgos laborales; Enfermería de urgencia; Salud ocupacional.

1. INTRODUÇÃO

O trabalho é concebido como uma atividade em que o homem, orientado por uma finalidade, transforma um determinado objeto em um produto final. O trabalho em saúde por sua vez, tem a finalidade de controlar as doenças em escala social e recuperar a força de trabalho incapacitada e toma como objeto o corpo humano investido socialmente nas dimensões individual e coletiva. Para a transformação desse objeto utiliza meios e instrumentos: força de trabalho, saber, materiais específicos, equipamentos e o local de trabalho(1).

Para que a execução das atividades não acarrete danos à saúde dos trabalhadores, condições adequadas de trabalho são necessárias. Em termos gerais, essas condições representam o conjunto de fatores capaz de determinar a conduta do trabalhador(2). Esses fatores são constituídos pelas exigências definidoras do trabalho objetivo, com seus critérios de avaliação e condições de execução propriamente ditas, aí incluídas as regras de sua utilização, a organização do trabalho, a remuneração e o ambiente.

A essas condições, o indivíduo responde com a execução de uma atividade ou manifestação de conduta passível de ser analisada sob diferentes aspectos perceptivos, motores e cognitivos. Enfim, essa atividade pode ter conseqüências sobre os estados físico, mental e psicológico do sujeito, gerando os efeitos descritos sob as denominações de satisfação, conforto, carga de trabalho, fadiga, estresse, doenças e acidentes de trabalho(3).

A legislação brasileira contempla por meio de Norma Regulamentadora relativa a Segurança do Trabalho a existência de riscos ocupacionais peculiares a cada atividade profissional(4).

Os trabalhadores do setor saúde estão expostos a riscos ocupacionais peculiares à atividade, como risco biológico (evidenciado pelo contato com microorganismos), físico (condições inadequadas de iluminação, temperatura, ruído, radiações, etc), químico (manipulação de desinfetantes, medicamentos, etc), psicossocial (atenção constante, pressão da chefia, estresse e fadiga, ritmo acelerado, trabalho em turnos alternados, etc) e ergonômico (peso excessivo, trabalho em posições incômodas)(4).

Dentre os vários campos de atuação dos trabalhadores de saúde, elegemos para estudo os profissionais que atuam na assistência Pré-Hospitalar (APH) em unidades móveis de emergência (ambulâncias) com vistas a investigar os riscos a que estão expostos, sobretudo devido a insipiência de pesquisas que abordam esta temática e pelas transformações vivenciadas no mundo do trabalho em nosso país, contextualizada pela situação de crise sócio-econômica. Os estudos sobre a referida temática são escassos e os estudos encontrados enfocam apenas alguns dos componentes da equipe de APH.

Um estudo realizado com motoristas descreve que o trabalho em situações de emergência, principalmente em unidades móveis, possui particularidades devido às características deste ambiente laboral. Dentre os riscos biológicos, vírus, fungos e bactérias podem ser transmitidos pelas mãos ou pela utilização de materiais não limpos, desinfetados ou esterilizados e pelo contágio indireto, por objetos contaminados do paciente (fômites) ou por intermédio do ar(5).

O risco químico é evidenciado pelo uso do hipoclorito de sódio, que é utilizado na desinfecção do veículo e pela inalação de agentes químicos provenientes da combustão dos automóveis.

Os riscos ergonômicos, provenientes de freqüente levantamento de peso para movimentação e transporte de pacientes e equipamento, posturas prolongadas e inadequadas, flexões da coluna vertebral em atividades de organização e assistência. Além disso, os trabalhadores realizam rodízio de turnos e trabalho noturno. Essas ações podem causar problemas posturais, fadiga, hérnias, fraturas, torções, contusões, lombalgias e varizes(5).

Nas últimas décadas, em vários países, houve expansão de serviços de APH voltados ao trauma, impulsionados pela demanda e pelo desenvolvimento do conhecimento.

No Brasil, acompanhando a tendência internacional de concentração populacional e de formação de complexos centros urbanos, também ocorreu a necessidade de implementar serviços para combater a morbi-mortalidade por trauma(6).

Em 1990, foi criado no Estado de São Paulo o Sistema de Atendimento Médico de Urgências (SAMU), que é de responsabilidade do Estado(7). Atualmente existem inúmeras empresas privadas prestadoras de serviços na área de APH, tanto nas cidades como em rodovias, e de repente, inúmeros postos de pronto atendimento, ambulâncias cada vez mais sofisticadas, veículos de resgate e helicópteros são introduzidos(8).

As emergências são atendidas não só por meio do transporte terrestre, mas também aéreo e marítimo. Além disso, o APH envolve uma série de profissionais quais sejam: bombeiros, policiais, médicos, enfermeiros(9).

As ações rápidas e precisas que caracterizam o atendimento de urgência, exigem do profissional um alto grau de domínio cognitivo, afetivo e psico-motor nas atividades a serem desempenhadas(10).

Há três princípios básicos a serem seguidos pelos profissionais que atuam no APH: chegar até a vítima o mais rápido possível; estabilizá-la no local, proporcionando de forma rápida e eficiente o restabelecimento de suas funções vitais e transportá-la rapidamente ao hospital. A chegada rápida até a vítima depende de um sistema de serviços de emergências que permita acesso rápido ao sistema, um bom esquema de comunicação e despacho das unidades e socorristas bem preparados e treinados(11).

O atendimento eficiente na cena do acidente exige socorristas bem treinados na rápida identificação das condições das vítimas, controle das vias aéreas, procedimentos de imobilização adequada e tratamento do choque. O socorrista deve priorizar os procedimentos que devem ser realizados no local também como executá-los de forma eficiente e determinar o que deve ser feito a caminho do hospital(11).

A estratégia de transporte ao traumatizado varia de acordo com a situação enfrentada pela equipe de resgate. A presença de perigos no local, o número de socorristas disponíveis, o diagnóstico, a gravidade do paciente e a cena do resgate influenciam o tipo de transporte. Quando se utilizam técnicas incorretas, o paciente pode sofrer um segundo trauma (iatrogênico) e o próprio socorrista lesão muscular ou de coluna vertebral, queimaduras ou choque elétrico(12).

A abordagem pré-hospitalar ao paciente traumatizado divide-se em três principais fases: avaliação do local de atendimento, medidas de proteção aos socorristas e exame / tratamento do paciente. A avaliação da cena do acidente tem o objetivo de preservar a segurança da equipe de socorro e auxiliar o diagnóstico. O local deve ser avaliado quanto à presença de situações de risco antes de os socorristas se aproximarem da vítima, tais como possibilidades de atropelamento, de colisão de veículos, de problemas com produtos tóxicos, de violência, incêndio e agressões(12).

A primeira responsabilidade da equipe de resgate é garantir sua própria segurança, avaliando o local, determinando riscos potenciais, e a segurança de populares que estejam cercando o local(13). Assim, é de suma importância a identificação dos riscos ocupacionais peculiares a atividade e a adoção de medidas preventivas visando a manutenção da saúde do trabalhador e do cliente assistido.

Diante do contexto ora descrito, o propósito deste estudo foi investigar os riscos ocupacionais peculiares ao trabalho de atendimento pré-hospitalar com a finalidade de orientar práticas preventivas a ocorrência de danos a saúde dos trabalhadores.

2. OBJETIVO

- Identificar os riscos ocupacionais a que estão expostos os profissionais da equipe de Unidades de Suporte Básico e Avançado de vida em emergências.

3. MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa exploratória, descritiva com análise quantitativa dos dados.

Local: O estudo foi realizado no Sistema de Atendimento Médico de Urgências (SAMU) do Serviço Público de Saúde do Município de Ribeirão Preto-SP.

O SAMU é composto por Unidades de Suporte Básico (USB) e Unidades de Suporte Avançado (USA). A equipe profissional da USB é composta por motorista, auxiliar de enfermagem e/ou técnico de enfermagem. A equipe da USA é formada por médico, enfermeiro e motorista.

População: Composta pelos 110 trabalhadores que atuam nas equipes do Sistema de Atendimento Móvel a Urgência (SAMU), sendo 21 médicos, 09 enfermeiros, 53 técnicos e auxiliares de enfermagem e 27 motoristas.

Amostra: A amostra foi constituída pelos trabalhadores de ambos os sexos que voluntariamente aceitaram participar da pesquisa e estavam trabalhando no mês de janeiro de 2003, data da coleta de dados. Foram excluídos do estudo os trabalhadores que estavam em férias ou licenças durante o período e aqueles que não consentiram em participar da pesquisa. A amostra foi constituída por 40 trabalhadores, ou seja, 36% da população total de trabalhadores da equipe de APH.

Procedimentos: Os dados foram coletados por meio de entrevistas realizadas com os trabalhadores no local de trabalho, utilizou-se para tal um roteiro de coleta de dados. O referido instrumento foi submetido a apreciação de três enfermeiros pesquisadores em relação a conteúdo e objetividade sendo considerado adequado ao estudo realizado. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo comitê de ética e pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / USP e houve permissão concedida pela Secretaria de Saúde do Município.

Análise dos dados: Utilizou-se da estatística descritiva com uso de cálculos percentuais e apresentação de resultados em tabelas e figuras.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O estudo foi realizado com 40 sujeitos pertencentes às seguintes categorias: 01 médico, 03 enfermeiros, 12 técnicos de enfermagem, 10 auxiliares de enfermagem e 14 motoristas.

Diante da formação da equipe de atendimento pré-hospitalar e a dinâmica do trabalho adotada optou-se efetuar a análise dos dados da equipe como um todo.

Na Tabela 1 são apresentadas algumas características dos trabalhadores componentes da amostra estudada.

Os trabalhadores da equipe de APH possuíam idade entre 18 e 61 anos sendo que a faixa etária mais freqüente observada foi àquela compreendida entre 28 e 48 anos (95 %). Quanto ao sexo, 67,5% dos trabalhadores eram do sexo masculino e 32,5% do sexo feminino; 47,5% dos trabalhadores eram casados e 52,5% dos trabalhadores solteiros ou separados. Em relação à experiência profissional, 25 trabalhadores (62,5%) possuíam tempo de serviço na profissão inferior a 5 anos e 26 trabalhadores (65%), possuíam tempo de serviço na unidade inferior a 5 anos.

Investigando-se o esquema de horário de trabalho, foi constatado que os médicos trabalhavam em turnos alternados nos horários: manhã e tarde (07:00h às 19:00h) e noite (19:00h às 07:00h). Os médicos que trabalhavam nas unidades móveis, também trabalhavam na Central de Regulaçãoa a Central de Regulação: Atende aos chamados telefônicos e tem sempre um médico regulador que ouve a solicitação, analisa e dá melhor resposta possível, garantindo o acesso do paciente a unidade de saúde. , respeitando o mesmo esquema de plantão. Os enfermeiros trabalhavam em esquema de turnos alternados, com plantões de 12 horas de duração e 36 horas de descanso. Os auxiliares e técnicos de enfermagem trabalhavam em turnos fixos com carga horária de 6 horas diárias, sendo manhã (06:00 às 12:00h), tarde (12:00h às 18:00h) e noite (18:00h às 06:00h). Os motoristas trabalhavam em turnos fixos, com carga horária de 12 horas diárias e 36 horas de folga, sendo manhã e tarde (06:00 às 18:00) e noite (18:00 às 06:00h).

A literatura mostra que o trabalho em turnos alternados pode ocasionar problemas sociais, familiares e de saúde nos trabalhadores, especialmente distúrbios de sono, distúrbios alimentares, dificuldade de concentração e atenção e fadiga(14).

Na Tabela 2 são apresentados dados relativos a opinião dos trabalhadores quanto aos fatores de risco do trabalho executado no APH.

Todos os trabalhadores da APH identificaram como fator de risco a possibilidade de adquirir infecções no trabalho. A maioria dos trabalhadores identificou a ocorrência de acidentes automobilísticos (90%), agressões morais (92,5%), agressões físicas (90%), risco de adoecimento pelo trabalho (92,5%), falta de material disponível para execução da tarefa (75%), risco de acidente com material pérfuro-cortante (72,5%), temperatura ambiental elevada (67,5%), elevada carga mental dispendida (67,5%), nível de ruído elevado (62,5%) e elevada carga física dispendida (62,5%).

Vários dos fatores identificados pelos trabalhadores relacionam-se a diferentes formas de violência. Quando indagados sobre o fator de risco ocupacional mais preocupante na situação de trabalho no APH, 30 trabalhadores (75%) apontaram a violência como fator preocupante. Os depoimentos descritos a seguir demonstram o fato:

"Trabalhamos em locais onde existem baleados, esfaqueados, brigas, pessoas armadas nas favelas, transporte de pacientes envolvidos com trafico de drogas, locais onde existe presença de pessoas com armamentos pesados como pistolas automáticas, granadas, bombas, metralhadoras AR15. Geralmente a polícia é acionada antes para locais assim, mas muitas vezes o SAMU chega antes, tendo que fazer o enfrentamento nesses locais" (S16)

"Sofremos risco de morte, pois já houve casos do paciente ser exterminado dentro da viatura" (S13)

Os depoimentos revelam como fator preocupante no trabalho em APH a violência. A violência no trabalho pode estar explícita ou estar oculta nas condições materiais do trabalho, na forma de organização e divisão das atividades, todavia, outros tipos de violência podem também afetar a vida do trabalhador, como as pressões de diversas naturezas e o assédio moral(15).

Em 1996 uma resolução da Assembléia Mundial de Saúde declarou a violência como um problema de Saúde Pública global, conceituando-a como "uso intencional da força ou poder físicos, ameaçante ou real, de uma pessoa a si mesma, de outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade, que resulte ou tenha uma alta possibilidade de resultar em feridas, morte ou dano sociológico, disfunções ou privações"(16).

A violência social encontrada no cotidiano das ruas tem como causa a disparidade sócio-econômica-cultural ocasionada por inúmeros fatores entre os quais destacamos as inadequações de políticas públicas e a má distribuição de renda da população e esta violência também pode ter implicações diretas nas condições de trabalho, como observado pelas falas dos trabalhadores da equipe de APH.

Em um estudo sobre exposição dos trabalhadores de APH à violência e abuso descreve que após ter experimentado um assalto durante o trabalho, 80% responderam que se sentiram furiosos e 69% se sentiram irritados(17). Outro estudo relata que 19% dos trabalhadores admitiram sempre carregar uma arma no trabalho(18).

Dentre o pessoal da saúde, os trabalhadores de ambulâncias e as enfermeiras são os mais susceptíveis à violência, porém, as enfermeiras apresentam três vezes mais probabilidade de sofrerem violência no local de trabalho do que outros grupos profissionais(19).

A carga mental despendida foi identificada pela maioria dos trabalhadores como inadequada devido à responsabilidade da atividade e a situação de urgência, fatores considerados como estressores ocupacionais.

Os estressores ocupacionais descritos em um estudo sobre o estresse em uma equipe militar de resgate pré-hospitalar(20) foram classificados como:

- temor do desconhecido: toque da sirene, o deslocamento para as ocorrências e o estar sempre em estado de alerta, são fontes relacionadas pelos socorristas como provocadores de tensão e ansiedade.

- violência das cenas: violência das cenas atendidas, assim como o envolvimento com crianças, idosos e familiares; atitudes, crenças e estados emocionais que vão de amor e compaixão a medo e raiva.

- exigências organizacionais e pessoais: o grande número de ocorrências, a extensa carga horária, obrigações de serem hábeis e rápidos, insatisfação no trabalho e a busca do perfeccionismo.

Dentre os fatores identificados pelo menor número de trabalhadores estão: falta de treinamento dos profissionais (37,5%), risco de contaminação por substâncias químicas (30%) e problemas com a chefia (20%).

Ressalta-se que mesmo diante da detecção de riscos ocupacionais, 82,5% dos trabalhadores descreveram satisfação pelo trabalho executado no APH e que muitos trabalhadores consideraram adequadas às condições de organização do trabalho (52,5%), iluminação (67,5%) e volume de tarefas que executam rotineiramente (47,5%).

Em relação às medidas adotadas pelos trabalhadores para tornar a prática do trabalho segura foi constatado que embora equipamentos de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) sejam disponibilizados pelo serviço, cerca de 1/3 dos trabalhadores referiram não utilizá-los.

O alto risco de adquirir infecções devido a execução de atividades onde ocorre o contato com fluídos e secreções e material contaminado exige que os trabalhadores utilizem além dos EPIs as medidas de segurança conhecidas como precauções padrão.

As precauções padrão surgiram como tentativa de aumentar a segurança do profissional de saúde, dada a alta freqüência de exposições a fluídos e secreções ligadas às suas atividades. Essas precauções incluem o uso de barreiras para a proteção individual (EPIs): avental, luvas, óculos, máscaras, gorros e botas. Grande ênfase é dada para a lavagem das mãos e cuidados com instrumentos pérfuro-cortante(21).

Apesar da possibilidade de prevenção de acidentes pelo uso destas precauções nem sempre são facilmente praticadas, pois ainda se observa um alto índice de acidentes e adoecimentos(22).

Considerando de suma importância que o trabalhador conheça os riscos ocupacionais a que estão expostos e as atividades que lhes são legalmente prescritas, indagamos também aos trabalhadores sobre as informações que possuíam em relação às atividades de competência de sua categoria profissional. Através da tabela 3 são apresentados os resultados obtidos.

Os resultados revelaram que 14 trabalhadores (35%) não souberam informar sobre as atividades que lhes são legalmente atribuídas, o que indica a necessidade de aquisição de informações, 08 trabalhadores (20%) demonstraram desconhecimento pelas atividades legalmente atribuídas, uma vez que emitiram respostas em desacordo com a lei de exercício profissional da categoria profissional. Apenas 18 trabalhadores (45%) informaram sobre as atividades que lhe compete em concordância com a legislação profissional.

Através da portaria nº. 814/GM de 01 de junho de 2001, são descritas as competências dos profissionais de saúde na assistência pré-hospitalar(23). Dentre os quais destacamos:

Enfermeiro - supervisionar e avaliar as ações de enfermagem da equipe; executar prescrições médicas por telemedicina; prestar cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica; realizar partos sem distócia; participar de atividades educativas e de treinamento; realizar manobras de extração manual de vítimas, etc...

Técnico de enfermagem - assistir ao enfermeiro nas atividades de assistência de enfermagem; prestar cuidados diretos de enfermagem a pacientes sob supervisão do enfermeiro; participar de programas de treinamento e aprimoramento profissional; realizar manobras de extração manual de vítimas.

Auxiliar de enfermagem - auxiliar o enfermeiro na assistência de enfermagem; prestar cuidados de enfermagem a pacientes sob supervisão direta ou à distância do enfermeiro e realizar manobras de extração manual de vítimas.

Médico - exercer a regulação médica pelo telefone; recepção dos chamados de auxílio, análise da demanda, classificação em prioridades de atendimento, seleção de meios para atendimento, determinação do local de destino; prestar assistência direta aos pacientes nas ambulâncias, realizar atos médicos possíveis e necessários.

Médico regulador - julgar e decidir sobre a gravidade de um caso, enviar os recursos necessários ao atendimento, definir e acionar o serviço de destino do paciente e seguir os protocolos de intervenção médica pré-hospitalar.

Motorista - conduzir veículo de urgência destinadas ao atendimento e transporte de pacientes; conhecer integralmente o veículo e seus equipamentos; realizar manutenção básica do veículo; estabelecer contato radiofônico/telefônico com a central.

5. CONCLUSÃO

O presente estudo permitiu concluir que os trabalhadores do APH possuíam como características mais freqüentes: faixa etária entre 28 e 48 anos, a maioria dos trabalhadores em do sexo masculino, solteiros ou separados; possuíam tempo de serviço na profissão e na unidade inferior a 5 anos.

Os fatores de riscos peculiares ao APH identificados pelos trabalhadores foram: acidentes automobilísticos, agressões físicas causadas por pacientes e comunidade, principalmente de localidades violentas, risco de adquirir infecções devido ao contato principalmente com sangue e fluidos corpóreos. A maioria dos trabalhadores identificou a ocorrência de agressões morais e risco de adoecimento pelo trabalho, nível de ruído e temperatura ambiental elevados, grande carga mental e carga física despendidas e falta de material para execução das tarefas.

A violência mostrou ser um preocupante fator de risco do trabalho de APH e merece ser investigado a fim de subsidiar o preparo dos trabalhadores para o enfrentamento desses fatores e na promoção de maior segurança no trabalho.

Dentre os fatores identificados pelo menor número de trabalhadores estão: risco de contaminação por substâncias químicas, problemas com a chefia e falta de treinamento dos profissionais.

Quanto às medidas utilizadas pelos trabalhadores para tornar o trabalho seguro foi constatado que embora os EPIs estivessem disponíveis, as luvas foram os equipamentos mais utilizados pelos trabalhadores, seguidos pelo uso de óculos e máscaras.

Quanto ao conhecimento que os trabalhadores possuíam em relação às atividades que lhe eram prescritas, grande parte não soube informar sobre as atividades que lhes são legalmente atribuídas na Lei de Exercício Profissional, demonstrando a alienação de muitos trabalhadores em relação a suas obrigações, direitos e deveres.Considerando que as ações da área de Saúde do Trabalhador precisam ser direcionadas além do ambiente fabril, com utilização de uma abordagem profunda no seu aspecto cultural e sócio-econômico, capaz de condicionar melhores níveis de vida e de saúde em favor dos trabalhadores das diferentes categorias profissionais, novos estudos necessitam ser direcionados ao trabalho em APH com vistas a elaborar, aplicar e avaliar estratégias preventivas à ocorrência de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais e melhorar as condições de trabalho neste setor.

Submissão: 24/02/2005

Aprovação: 24/10/2005

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Jun 2008
    • Data do Fascículo
      Fev 2006

    Histórico

    • Aceito
      24 Out 2005
    • Recebido
      24 Fev 2005
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