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A saúde mental no Programa de Saúde da Família

La salud mental en el Programa de Salud de la Família

Mental health in the Family Health Program

Resumos

Trata-se de estudo descritivo que teve como objetivo identificar a formação e as ações do enfermeiro em Saúde Mental (SM), no PSF. A amostra foi constituída por 134 enfermeiros atuantes no PSF de Teresina - PI. Os resultados mostram que 95,5% não possuem formação específica em SM. Dos entrevistados, 97% referem que existem pacientes, em sua área de atuação, que necessitam deste tipo de atendimento. As ações referidas foram visitas domiciliares (60%), consultas (27,7%), encaminhamentos (21,5%), entrega de medicação (15,4%), sem atividade (14,6%), atendimento ambulatorial (7,7%), terapia comunitária (5,4%) e levantamento de casos (0,8%). Medidas/estratégias de políticas públicas voltadas a esta área devem ser rediscutidas e operacionalizadas para (re)direcionar caminhos à reforma nas ações e nos serviços de SM.

Enfermagem; Saúde mental; Programa Saúde da Família


Se trata de estudio descriptivo que tuvo como objetivo identificar la formación y las acciones del enfermero en Salud Mental (SM), en el Programa de salud de la família. La muestra fue constituida por 134 enfermeros actuantes en el Programa de salud de la família de Teresina - PI. Los resultados muestran que 95,5% no poseen formación específica en SM. De los entrevistados 97% refieren que existen pacientes, en su área de actuación, que necesitan este tipo de servicio. Las acciones referidas fueron visitas domiciliar (60%), consultas (27,7%), encaminamientos (21,5%), entrega de medicación (15,4%), sin actividad (14,6%), servicio ambulatorio (7,7%), terapia comunitaria (5,4%) y levantamiento de casos (0,8%). Medidas/estrategias de políticas públicas dirigidas a esta área deben ser rediscutidas y operacionalizadas, para orientarr caminos hacia la reforma de las acciones y de los servicios de SM.

Enfermería; Salud mental; Programa de Salud de la Familia


A descriptive study whose objective was to identify the education and actions of the nurse in Mental Health (MH), in the Family Health Program. The sample consisted of 134 acting nurses at the Family Health Program in Teresina, Piauí. The results show that 95.5% don't have the specified education in MH. Of those interviewed, 97% state that there are patients, in their assigned areas, that need this type of care. The referenced actions were home visits (60%) appointments (27.7%), referrals (21.5%), medication delivery (15.4%), inactivity (14.6%), ambulatory service (7.7%), community therapy (5.4%) and casework (0.8%). Methods and strategies of public policies related to this area should be revisited and instituted in order to (re)direct ways of reform in the actions and services of mental health.

Nursing; Mental health; Family Health Program


PESQUISA

A saúde mental no Programa de Saúde da Família

Mental health in the Family Health Program

La salud mental en el Programa de Salud de la Família

Aline de Jesus Fontineli SouzaI; Gina Nogueira MatiasII; Kenia de Fátima Alencar Gomes III ; Adriana da Cunha Menezes Parente IV

IEnfermeira formada pela Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí-NOVAFAPI, Teresina, PI

IIEnfermeira formada pela Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí-NOVAFAPI, Teresina, PI

IIIEnfermeira formada pela Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí-NOVAFAPI, Teresina, PI

IVEnfermeira. Mestre em Enfermagem Psiquiátrica e Saúde Mental. Professora da Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí-NOVAFAPI, Teresina, PI. Endereço para contato:Rua Padre Cirilo Chaves, 1877 – Aptº 602, Bairro dos Noivos. Teresina - PI CEP: 64 045 310. adriana.parente@uol.com.br

RESUMO

Trata-se de estudo descritivo que teve como objetivo identificar a formação e as ações do enfermeiro em Saúde Mental (SM), no PSF. A amostra foi constituída por 134 enfermeiros atuantes no PSF de Teresina - PI. Os resultados mostram que 95,5% não possuem formação específica em SM. Dos entrevistados, 97% referem que existem pacientes, em sua área de atuação, que necessitam deste tipo de atendimento. As ações referidas foram visitas domiciliares (60%), consultas (27,7%), encaminhamentos (21,5%), entrega de medicação (15,4%), sem atividade (14,6%), atendimento ambulatorial (7,7%), terapia comunitária (5,4%) e levantamento de casos (0,8%). Medidas/estratégias de políticas públicas voltadas a esta área devem ser rediscutidas e operacionalizadas para (re)direcionar caminhos à reforma nas ações e nos serviços de SM.

Descritores: Enfermagem; Saúde mental; Programa Saúde da Família.

ABSTRACT

A descriptive study whose objective was to identify the education and actions of the nurse in Mental Health (MH), in the Family Health Program. The sample consisted of 134 acting nurses at the Family Health Program in Teresina, Piauí. The results show that 95.5% don't have the specified education in MH. Of those interviewed, 97% state that there are patients, in their assigned areas, that need this type of care. The referenced actions were home visits (60%) appointments (27.7%), referrals (21.5%), medication delivery (15.4%), inactivity (14.6%), ambulatory service (7.7%), community therapy (5.4%) and casework (0.8%). Methods and strategies of public policies related to this area should be revisited and instituted in order to (re)direct ways of reform in the actions and services of mental health.

Descriptors: Nursing; Mental health; Family Health Program.

RESUMEN

Se trata de estudio descriptivo que tuvo como objetivo identificar la formación y las acciones del enfermero en Salud Mental (SM), en el Programa de salud de la família. La muestra fue constituida por 134 enfermeros actuantes en el Programa de salud de la família de Teresina - PI. Los resultados muestran que 95,5% no poseen formación específica en SM. De los entrevistados 97% refieren que existen pacientes, en su área de actuación, que necesitan este tipo de servicio. Las acciones referidas fueron visitas domiciliar (60%), consultas (27,7%), encaminamientos (21,5%), entrega de medicación (15,4%), sin actividad (14,6%), servicio ambulatorio (7,7%), terapia comunitaria (5,4%) y levantamiento de casos (0,8%). Medidas/estrategias de políticas públicas dirigidas a esta área deben ser rediscutidas y operacionalizadas, para orientarr caminos hacia la reforma de las acciones y de los servicios de SM.

Descriptores: Enfermería; Salud mental; Programa de Salud de la Familia.

1. INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira vivencia, atualmente, uma transformação no modelo de assistência ao paciente com transtorno psiquiátrico conhecida nacionalmente, desde a década de 80, como Reforma Psiquiátrica Brasileira. Esta se deve ao conjunto de fatores e atores que buscam substituir o modelo asilar, segregador, excludente, reducionista e tutelar que tem como centro de atendimento o hospitalar psiquiátrico.

A Política Nacional de Saúde Mental, vigente no Brasil, objetiva reduzir progressivamente os leitos em hospitais psiquiátricos, expandindo, qualificando e fortalecendo a rede extra-hospitalar através da implementação de serviços substitutivos como: Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Serviços Residenciais Terapêuticos (SRTs) e Unidades Psiquiátricas em Hospitais Gerais (UPHG) - incluindo as ações da saúde mental na atenção básica, implementação de política de atenção integral a usuários de álcool e outras drogas, programa "De Volta Para Casa", entre outros(1).

Esta redução progressiva do número de leitos em Hospitais Psiquiátricos é amparada pela Lei Nº 10.216 de abril de 2001(2), porém é recomendado que aconteça concomitantemente à criação de serviços comunitários de assistência à saúde mental. Deste modo, nos últimos anos, observa-se a multiplicação de iniciativas de implantação de serviços substitutivos que buscam construir uma rede assistencial na própria comunidade para, conseqüentemente, haver uma natural redução de leitos para internação integral(3) .

No Brasil, as internações psiquiátricas vêm representando um dos maiores gastos com a rede de serviços hospitalares do Sistema Único de Saúde (SUS). Os leitos, tanto privados quanto públicos, apresentam internações duradouras, chegando a alcançar, em média, o teto máximo permitido, atualmente, de dias de internação(4).

O conjunto dos marcos legislativos do Sistema Único de Saúde Constituição Federal (1988), Leis 8080/1990 e 8142/1990, Lei Federal 10.216/2001 possibilitou e estabeleceu diretrizes para uma assistência à saúde mental centrada em recursos comunitários e em um atendimento extra-hospitalar, ou seja, preconiza a desinstitucionalização, além de garantir os direitos dos sujeitos acometidos por transtornos psiquiátricos(1).

Esse cenário se apresenta como um grande desafio aos pesquisadores, gestores, órgãos e instituições formadoras e usuários do serviço de saúde do estado e do município. Cabe a eles, portanto, de forma democrática e pactuada, articular saberes e desenvolver estratégias de mudanças no modelo assistencial e na legislação em saúde mental, para que, gradativamente, observem-se mudanças culturais secularmente enraizadas na sociedade.

Diante do exposto, percebe-se que as políticas públicas em Saúde Mental têm investido e incentivado o atendimento de sujeitos acometidos por transtorno psiquiátrico em serviços comunitários (de saúde mental). Em contrapartida, observa-se que os movimentos da Reforma Sanitária e Psiquiátrica passam por um relativo estado de estagnação. Este fato pode ser evidenciado quando ocorre a redução de leitos hospitalares, como exigência do Ministério da Saúde, sem a criação de novos dispositivos, suficientes para atender a demanda(5).

Porém, as medidas mencionadas não andam por um caminho isolado da saúde. Elas surgem com princípios reguladores ministeriais que contam, para seu amplo funcionamento, com um conjunto de serviços entrelaçados, entre eles, o Programa de Saúde da Família (PSF) que, por atuar com a lógica da desinstitucionalização com maior ênfase no vínculo, constitui-se em uma estratégia adequada para trabalhar a saúde mental na atenção básica, estando suas equipes engajadas no dia-a-dia da comunidade, incorporando ações de promoção e educação para saúde na perspectiva da melhoria das condições de vida da população(6,7).

A estratégia do programa (PSF)(7) iniciou-se no Brasil em junho de 1991, com a implantação do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Em janeiro de 1994, foram formadas as primeiras equipes de Saúde da Família, incorporando e ampliando a atuação dos agentes. Seu principal propósito é o de reorganizar a prática da atenção à saúde e substituir o modelo tradicional, levando a saúde para mais perto da família(8).

Uma das propostas deste programa é a de que os profissionais, através das trocas existentes em seus relacionamentos com as famílias e comunidade, busquem humanizar e adequar a assistência prestada em suas práticas diárias de saúde, objetivando a satisfação dos usuários e conscientizando-os de que saúde é um direito do cidadão e um alicerce da qualidade de vida(9).

Ainda, neste programa, utiliza-se como estratégia as ações de prevenção e recuperação da saúde das pessoas, de forma integral e contínua. O mesmo favorece o atendimento domiciliar, propiciando uma assistência mais humanizada, o que possibilita a promoção da saúde e redução das internações, contrapondo-se aos trabalhos desenvolvidos em hospitais psiquiátricos e em outras instituições de saúde voltadas para atividades técnicas.

Para tanto, a Lei nº 10.216/2001(2) vem preconizar atendimento aos portadores de transtornos psiquiátricos preferencialmente em nível comunitário e junto à família, enfocando a melhoria da qualidade de vida que tem implícita a promoção da saúde mental e o acompanhamento de pacientes e de sua família nas ações básicas. Sendo assim, não é possível haver uma (re) inserção social com a família desassistida, pois, para contar com sua colaboração no processo terapêutico é necessário que os profissionais estejam presentes no processo, assistindo-a.

Assim, partindo do pressuposto de que os pacientes com transtornos psiquiátricos necessitam de cuidados básicos de saúde e que o Sistema Único de Saúde preconiza a desinstitucionalização e assistência humanizada, o Programa de Saúde da Família torna-se, dessa forma, uma importante estratégia para a (re) inserção do doente mental na sociedade(6). Este fato tem ainda maior relevância quando as comunidades não contam com uma rede de serviços extra-hospitalares de Saúde Mental, suficientes para os atendimentos necessários.

Deste modo, acredita-se que se conhecendo as ações de saúde mental dos enfermeiros (PSF) em uma capital do nordeste brasileiro, possa-se contribuir com o planejamento de estratégias que venham auxiliar na assistência a saúde mental em nível comunitário, bem como contribuir para discussões desta temática em nível nacional.

Portanto, o estudo tem como objetivo identificar as ações e a formação do enfermeiro (a), em Saúde Mental, no Programa de Saúde da Família (PSF).

2. METODOLOGIA

Esta pesquisa é de cunho quantitativo descritivo, que se caracteriza pela aplicação da quantificação tanto no que se refere à coleta de informações quanto no tratamento dos dados, representando assim, a intenção de garantir resultados precisos(10,11) .

Este estudo foi realizado na capital do Estado do Piauí, Teresina, nas áreas de abrangência dos serviços de PSF (urbana e rural), isto é, nas Unidades de Saúde do município onde atuam as equipes de PSF.

A população ou universo do estudo, que se define como "um conjunto bem definido que tem certas propriedades específicas"(12),compreendeu 207 profissionais de enfermagem de nível superior que atuavam na equipe do Programa de Saúde da Família do Município de Teresina-PI.

O Programa de Saúde da Família possui uma cobertura de 80% da população do município. As equipes têm seu funcionamento previsto para os turnos manhã e tarde semanalmente, de segunda a sexta-feira, sendo que cada equipe cobre (para atendimento) em média 1.200 famílias. Estas equipes estão distribuídas em zonas, sendo que na zona Sul atuam 80 equipes, na zona Centro-Norte 59 equipes e na zona Leste-Sudeste 68 equipes(13).

A amostra se constituiu de 134 enfermeiras. Este tamanho de amostra permitiu que obtivéssemos estimativas com nível de segurança de 95% e margem de erro de 5%. O critério de seleção desta amostra foi probabilístico, do tipo estratificado proporcional, onde os extratos são as zonas Sul, Leste-Sudeste e Centro-Norte.

Após a autorização da Fundação Municipal de Saúde do Município de Teresina-PI (FMS-PI) e da aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da NOVAFAPI (buscando garantir a todos os envolvidos a autonomia, a não maleficência, a benevolência e a justiça, isto é, as exigências éticas e científicas), iniciou-se a coleta de dados no segundo semestre de 2005.

Deste modo, foi realizada visita a todas as Unidades de Saúde, nos dois turnos de funcionamento (manhã/tarde), onde atuam as equipes do PSF que foram selecionadas aleatoriamente a fazerem parte deste estudo. Foi realizado um convite individual a cada enfermeiro e, após seu aceite em participar da pesquisa, esclarecemos todos os procedimentos que compreendem este estudo através do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Para a realização de análise de dados estatísticos, realizou-se categorização de dados mediante respostas das questões abertas e estes foram processados pelo programa Statistical Product and Service Solutions SPSS (versão 11.0).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO DOS DADOS

O universo deste estudo equivale a um total de 207 profissionais e a amostra se limitou a 134 enfermeiros.

Quanto à formação em Saúde Mental dos enfermeiros do PSF pesquisados, 95,5% afirmaram não possuir formação específica em Saúde Mental, e 4,5% asseguraram possuir especialização na área.

A não formação específica ou ausência de atualizações na área de Saúde Mental pode tornar-se um complicante, bem como dificultar o acompanhamento de mudanças propostas pela Reforma Psiquiátrica em níveis nacional, estadual e municipal.

A formação específica pode proporcionar uma ampliação de horizontes, conduzir a reflexão sobre o processo de humanização, solidariedade, respeito, compromisso, julgamento, aceitação, liberdade e responsabilidade que devem permear os preceitos da Reforma Psiquiátrica, que é estendida ao atendimento básico de saúde(14).

Quanto ao questionamento das necessidades de atendimento em Saúde Mental no PSF do município, 97% dos entrevistados informaram existir pacientes, em sua área geográfica de atuação, que necessitam deste tipo de atendimento específico, e 3% mencionaram não existir demanda que necessite de atendimentos nesta área.

O Manual de Enfermagem (PSF) do Ministério da Saúde(15) chama a atenção, não só do enfermeiro, mas de toda a equipe de saúde, para que percebam a importância da multicausalidade dos agravos à saúde, sejam eles de ordem física, mental ou social, tanto individual como coletiva, tendo sempre em vista os indivíduos como sujeitos cidadãos em seu meio ambiente e em seu contexto sócio-familiar. Desta forma, o Manual chama atenção para a necessidade de uma visão mais ampla dos indivíduos assistidos pelas equipes do PSF, para que se promova uma atenção mais completa a estes. Considerando-se que cada equipe atende, em média, 1.200 famílias, e pensando-se em Saúde Mental de uma forma ampla, é muito pouco provável que, neste universo, não existam pessoas que necessitem de suporte em Saúde Mental.

Outro fator que vem ratificar essa consideração é o estudo em que se investigou o perfil sócio-demográfico de pacientes reinternos nos hospitais psiquiátricos de Teresina-PI(16), e constatou-se que 73% da amostra reside na capital do Estado, isto é, está na área geográfica de atuação do PSF uma porcentagem significativa de pacientes que fazem uso de serviços de internação integral duas ou mais vezes por ano.

Ao se questionar a estimativa das pessoas que necessitavam de atendimento em saúde mental, dentre as famílias acompanhadas pela equipe, 77,6% dos sujeitos estimaram uma média de 33,13 pessoas (desvio padrão de 75,62). Houve grande variabilidade na estimativa realizada pelos entrevistados (de 01 a 600), sendo que destes 70% estimaram a demanda como sendo inferior a 50 pessoas. Dos entrevistados, 22,4% disseram não poderem realizar tal estimativa, ou não haver necessidade de atendimento em sua área geográfica.

Este fato nos conduz a discutir o conceito do termo Saúde Mental que se justifica por ser uma área de conhecimento que, mais do que diagnosticar e tratar, liga-se à prevenção e promoção de saúde, além de preocupar-se em reabilitação e inclusão do paciente em seu contexto social, o que nos remete ao pensamento de que prevenir e promover não se limita somente a pacientes psiquiátricos e sim à população de maneira geral(15).

Há estudos em que já se identifica a visão estereotipada que se faz do conceito de Saúde Mental, sendo esta identificada e relacionada, muitas vezes, com a doença mental(6).

Ressalta-se também que a reabilitação psicossocial deverá laborar como uma abordagem cuja estratégia global implica numa mudança total a toda a política dos serviços de saúde mental, por isso ela deve englobar os trabalhadores de saúde-saúde mental, e a todos os trabalhadores do processo saúde-doença, ou seja, todos os usuários, todas as famílias dos usuários e finalmente, a comunidade inteira(17).

Por outro lado, é sabido que um modelo de atenção à Saúde Mental, que procura dar conta da complexidade que envolve o sujeito que sofre, deve partir das considerações dos sentidos atribuídos a essa experiência pelos indivíduos na relação com o contexto cultural mais amplo ao qual pertencem.

Assim, um trabalho de Saúde Mental na comunidade visando à promoção, prevenção e ao tratamento dos casos identificados, precisa se apoiar num conjunto de ações que visem o melhoramento ou a manutenção da saúde da população. Estas ações devem ser organizadas dentro da lógica extra-mural e da lógica da reconstrução da cidadania plena(18).

Quanto às atividades desenvolvidas pela equipe de PSF e voltadas para a Saúde Mental, os enfermeiros entrevistados fizeram referências, prioritariamente, ao desenvolvimento de atividades gerais, conforme números evidenciados na Tabela 1.

A visita domiciliar foi a atividade mais referida pelos profissionais de enfermagem, com uma freqüência de 60%, seguida pela consulta (27,7%), encaminhamentos (21,5%) e entrega de medicação (15,4%). Ainda, 14,6% referiram que sua equipe não realiza nenhuma atividade voltada à Saúde Mental, o que é um dado relevante, visto que 97% dos profissionais referiram haver demanda de Saúde Mental em sua área de cobertura.

As atividades voltadas exclusivamente à área discutida foram: o atendimento ambulatorial (7,7%), a terapia comunitária (5,4%) e o levantamento de casos (0,8%).

Todavia, os últimos oito anos testemunharam a implantação nos municípios de um modelo de atenção primária em Saúde Mental, regionalizado, hierarquizado e multiprofissional(19). No nível primário de assistência, as Unidades Básicas de Saúde deixaram de ser apenas encaminhadoras de pacientes, passando a funcionar como a primeira instância de diagnóstico e tratamento.

Assim, o PSF aponta como um de seus objetivos humanizar as práticas de saúde, buscando a satisfação do usuário através do estreito relacionamento dos profissionais com a comunidade e estimulando-a ao reconhecimento da saúde como um direito de cidadania e, portanto, expressão de qualidade de vida. O mesmo faculta possuir características favoráveis ao atendimento às famílias por oferecerem um espaço adequado à saúde mental(6).

Desta forma, o PSF constitui uma estratégia adequada para trabalhar a saúde mental, pois suas equipes apresentam-se engajadas no dia-a-dia da comunidade, com a perspectiva de melhorar as condições de vida da população, incorporando ações de promoção e educação para a saúde(6).

De acordo com o que já foi referido, observa-se que no Programa de Saúde da Família, do município estudado, a inserção da assistência a Saúde Mental na atenção básica é um processo ainda em implementação, em que os profissionais comumente não realizam atividades voltadas especificamente à Saúde Mental.

Este fato reflete-se na conduta frente a pacientes psiquiátricos Tabela 2. Pois, estas, em sua grande maioria, mais precisamente 72,3%, correspondem a encaminhamentos, sendo que 47,7% realizam atendimentos. Destes, 21% ressalvam que o atendimento na unidade, nesses casos, é prioritariamente realizado pelo médico.

Porém, cabe às equipes das Unidades Básicas de Saúde realizarem o acolhimento dos pacientes com queixas relacionadas à Saúde Mental, diagnosticar e tratar os casos de sofrimento mental inespecífico, bem como investigar possíveis causas orgânicas para o transtorno apresentado, considerando que na sua vivência os profissionais precisam estar preparados para trabalhar com esta grande diversidade de casos(20).

Em relação aos serviços de referência em Saúde Mental/Psiquiatria utilizados pelas equipes de PSF, foram citados com maior freqüência o Hospital Psiquiátrico (87,7%) e o ambulatório (42,3%) seguidos, entretanto em um menor número, o CAPS ad (19,2%), Fundação Municipal de Saúde (1,5%), Hospital-Dia (4,6%) e atendimentos particulares (2,3%), tendo 2,3% apontado que não possuem nenhum serviço de referência.

Embora o Ministério da Saúde venha tentando mudar a realidade quanto ao tratamento da Saúde Mental, haja vista existência de leis que incluam esse tipo de atendimento no rol de especificidades do PSF, os resultados apontam que os Hospitais Psiquiátricos ainda constituem a maior referência quanto a serviço nesse sentido.

Além disso, o papel do PSF é o de agente de atendimento básico em Saúde Mental(1). Deste modo os profissionais necessitam aprimorar a prática de trabalhar em equipe e com a família, estimando as reais necessidades da comunidade através da sua participação no planejamento das ações, realizando atendimento integral à família independente da área específica necessitada, o que poderá ocorrer à medida que forem se reformulando as prática e o ensino(6).

Portanto, é diariamente que edificamos e construímos o conhecimento em Saúde Mental, sendo necessário dar significados aos achados ou às descobertas realizadas, procurando contextualizá-los em situações similares, tentando assim superar os embates inerentes ao ciclo de mudanças de um sistema de atendimento(21).

4. CONCLUSÃO

O Programa de Saúde da Família, desde sua implantação, vem crescendo com relação à extensão territorial de atendimento, com relação a implementações de ações direcionadas a população geral, com programas e ações singularizadas, isto é, as de necessidades específicas de uma comunidade.

Portanto, este programa vem sendo considerado um aliado no que diz respeito à promoção, prevenção e intervenções básicas de saúde para diversas áreas, entre elas a saúde mental.

Além disso, o PSF possui uma característica imprescindível para o atendimento às famílias: ter o domicilio como espaço terapêutico e a assistência humanizada como instrumento facilitador para criação de vínculos e aproximação dos profissionais com o cotidiano das famílias. Deste modo, o PSF pode se tornar uma adequada estratégia para atender o paciente na área de Saúde Mental, visto que o atendimento está inserido no convívio social do paciente (22).

Porém, sem formação específica em Saúde Mental, treinamentos e/ou atualizações, os profissionais de enfermagem podem encontrar dificuldades para desenvolver ações nesta área, bem como para acompanhar mudanças propostas nas diretrizes da Reforma Psiquiátrica Brasileira.

Contudo, observamos neste estudo que os profissionais entrevistados demonstram reconhecer a existência de uma população, em sua área geográfica de atuação, com necessidade de atendimento em Saúde Mental, porém, relatam que comumente não exercem atividades específicas voltadas para a esta área.

Percebe-se, assim, que as ações em Saúde Mental que são realizadas para atender a população são isoladas, o que leva uma parte da comunidade a ficar sem atendimento específico. E sabe-se que as ações públicas necessitam de um fim definido e de articulação em sua operacionalização para se tornarem políticas públicas e assim caminharem para o encadeamento de ações que visem a atender uma parcela maior da população.

Para tanto, poderia haver a possibilidade de se incluir treinamentos específicos no campo da Saúde Mental, bem como existem qualificações em outras áreas (AIDIPI, Hanseníase, TB, entre outros). Com essa medida poderia ser possível obter um grande contingente de enfermeiros que teriam idéias e experiências compartilhadas, estratégias bem definidas, conceitos repensados, serviços de apoio indicados e uma linguagem similar abordada.

A Saúde Mental, se bem conduzida e trabalhada com as equipes de PSF, poderia contribuir decisivamente para diminuição das internações hospitalares psiquiátricas. Deste modo, chama-se a atenção para que os enfermeiros reflitam juntamente com toda sua equipe sobre o importante papel que podem desempenhar na promoção da desinstitucionalização do paciente psiquiátrico.

No entanto, deve-se ressaltar que o PSF não é um instrumento único que irá resolver todos os problemas relacionados à Saúde Mental, o programa deve ser considerado um componente de uma rede de atendimento, interligados entre si. Mas, para isso faz-se necessário adotar medidas com o intuito de direcionar caminhos que levem a almejada reforma nas ações e nos serviços de Saúde Mental / Psiquiatria.

Submissão: 03/05/2007

Aprovação: 12/07/2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Out 2007
  • Data do Fascículo
    Ago 2007

Histórico

  • Aceito
    12 Jul 2007
  • Recebido
    03 Maio 2007
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